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Destaque do traço repetido, onde os outros só têm olhos para o
novo, atrai para a reflexão um público desatento e apressado.
Corresponde ao gesto do cavalheiro que, convidando sua dama
para a valsa, interrompe os rodopios vertiginosos e ensaia os
passos medidos do minuete. Primeiro a dama se choca, mas, logo,
sorri satisfeita. Pode observar todos os convidados e perceber que
se tornou o centro das atenções. Se “este mundo é um baile”, o
convidado folhetinista nem sempre dança conforme a música.
Para se apresentar, a cada semana, diante dos leitores, o cronista
cria atrações, descobre excentricidades e emprega ditos alheios,
“metendo-lhes o jocoso”. Se não o entendem, de pronto, tanto
melhor. “Conto com isso”, diz, “para gozar um pouco da sua
estupefação, um dos raros e últimos prazeres deste ofício de
escritor”. Ofício certamente pesado, pois obriga a ter “idéias”, a todo
momento, ou a tomá-las de empréstimo quando não se possui
nenhuma. O objetivo é, nada menos, que “produzir a maior
revolução do século. Uma revolução? A maior do século? Dar-se-á
que alguma alfaiataria...” (21/01/1885).
Criador dos padrões de elegância, o cronista é, assim, como o
costureiro que, duas vezes ao ano, desenha modelos – acessíveis a
baronesas e a bailarinas. A mudança periódica dos figurinos e a
disseminação dos modelos, bem como da informação iniciaram-se
nos oitocentos e, especialmente, nas suas últimas décadas, se se
trata do Brasil. (CARDOSO, 1992, p. 139)
Como cronista, Humberto de Campos atingiu a fama na primeira metade do
século XX. Encantava leitores, criticava os poderosos da sociedade, fazia piada
com fatos corriqueiros e poesia com situações coloquiais. Suas crônicas eram
marcadas pela simplicidade e, ao mesmo tempo, pela erudição, esta inspirada na
Antigüidade Clássica. Perpetuou seu nome fazendo-se entender pelos ricos e
pobres, pelos intelectuais e leitores comuns, através do lirismo e do sarcasmo de
seus textos.
Logo no início de sua carreira, são perceptíveis os caminhos narrativos e as
temáticas preferidas de Campos. Interessam-lhe o fato cotidiano e a análise do
mesmo. Muitas vezes, os acontecimentos escolhidos por Campos – como o da
traição da mulher pelo marido, por exemplo - não eram importantes sob o aspecto
da notícia; eram situações pitorescas, humanas e mundanas, que ocorriam em
todas as cidades. Assim, o autor aproveitava para escrever um texto, de certa
forma, real, no que se referia ao assunto, enfatizando a ironia e o tom zombeteiro