Santo Tomás desenha a contraposição de monarquia e tirania,
aristocracia e oligarquia,
politia
e democracia
836
.
Em absoluto, qualquer dos regimes de governo, nos
escritos do Aquinate, goza de defesa incondicionada, mesmo a
monarquia pura, aparentemente defendida na obra
Do Reino ou Do
Governo dos Príncipes
, onde um só homem concentra em sua mão a
totalidade do poder
837
. Antes de qualquer outra consideração pela
totalidade de seu pensamento, devemos lançar mão das informações
oferecidas por Torrell,
838
o qual postula que se deve levar em
conta não somente a circunstância histórica e política
839
do
836
Idem.
Do Reino ou Do Governo dos Príncipes ao Rei de Chipre. 1997, L.
I, c. 2, nº. 6, p. 129: “Caso, então, seja exercido por um só governo
injusto, buscando pelo governo os seus interesses e não o bem da
multidão a si sujeita, tal governante se chama tirano, nome derivado de
força, porque oprime pelo poder, ao invés de governar pela justiça; por
isso também, entre os antigos, os potentados se chamavam tiranos.
Fazendo-se, entretanto, não por um só, senão por vários, se bem que
poucos, chama-se oligarquia, isto é, principado de poucos, dado que
esses poucos, por terem riquezas, oprimem sua plebe, diferindo do tirano
apenas no número. Se, porém, o regime iníquo se exerce por muitos,
nomeia-se democracia, quer dizer, poder do povo, sempre que o povo dos
plebeus oprime os ricos pelo poder da multidão, sendo então todo o povo
como que um só tirano. Semelhantemente se há de também fazer distinção
quanto ao regime justo. Se a administração está com a multidão, se lhe
chama com o nome de politia, como quando a turbamulta dos guerreiros
domina na cidade ou no país. E, se administram poucos, mas virtuosos,
chama-se aristocracia tal governo, isto é, poder melhor, ou dos
melhores, que, por isso, se chamam optimates. Pertencendo, porém, a um
só o governo justo, chama-se ele, propriamente, rei [...]”.
837
GALÁN GUTIÉRREZ.
Op. Cit.
p. 158: “Ninguna de las rectas formas de
gobierno admitidas por Santo Tomás es absoluta, es decir, no sujeta a
límites, no conforme a principios y normas, aun que en el caso de que se
trate de la monarquía pura, donde un solo hombre concentra en su mano la
totalidad del poder y lo ejerce sin compartido con el pueblo o con una
asamblea aristocrática”.
838
TORRELL. Iniciação ao Estudo de Santo Tomás de Aquino. 1999, p. 199:
“Enquanto o mais das vezes ele [Tomás] recomenda um governo misto, em
que o rei colabora com uma aristocracia eleita pelo conjunto da
população, aqui Tomás recomenda uma monarquia absoluta. Talvez seja o
caso de ver a razão para isso no que ele conhecia da situação particular
de Chipre na época em que escrevia. Mas é preciso acentuar também o
estado da obra, que não pôde ser revista pelo autor”.
839
CHENU. Introduction à l’Étude de Saint Thomas d’Aquin, 1954, p. 287:
“L’opuscule en effet fut adressé, en 1266, au roi de Chypre, Hugues II,
alors placé dans des conjonctures délicates. ‘Nous connaissons mal la
situation politique de ce pays en 1266. Nous savons, d’une part, que, en
1233, pour légitimer juridiquement, une révolte contre leur chef
seigneur, les Chypriotes adoptèrent la législation du royaune de
Jérusalem. Or cette législation obligeait le prince à ne jamais prendre
aucune mesure sans l’octroi des liges; les liges avaient intérêt à
refuser tout service public et l’Etat se dissocia. […] Si, en 1266, les
liges apparaissaient en Chypre comme des champions de l’anarchie et le