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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE PÓS - GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
" FIDES NOSTRA, VICTORIAN NOSTRA"
Os italianos católicos e o processo de aquisição
do poder político na Intendência de Caxias
( 1890 - 1924 )
Eliana Rela Alves
Dissertação elaborada sob orientação da
Profª. Dr. Margaret Marchiori Bakos e apresentada como
requisito parcial e final para obtenção do grau de Mestre em
História/Área de História do Brasil
Porto Alegre
1995
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2
S u m á r i o
Sumário ................................................................................................... 4
Lista de quadros ...................................................................................... 5
Introdução ............................................................................................... 6
C a p í t u l o I - A R o m a n i z a ç ã o e m T e r r a s D e v o l u t a ....... 21
1.1 A ocupação de terras gaúchas pelos imigrantes italianos ................ 23
1.2 O contexto da unificação italiana ................................................. 25
1.3 A Igreja no século da unificação italiana ....................................... 26
1.4 A postura da Igreja católica no final do século XIX e início
do século XX ..................................................................................... 28
1.5 A Igreja católica e a transição no Brasil ......................................... 29
1.6 O Rio Grande e o catolicismo ......................................................
33
1.7 Os imigrantes italianos católicos e a colonização na região nordeste. 36
1.8 Formação política da Colônia Caxias ............................................ 39
1.9 A Colônia Caxias: o imbricamento da necessidade política com o clima
de cristandade ................................................................................... 47
C a p í t u l o I I - U m P r o c e s s o e m D u a s F a s e s ..................... 55
2.1 A extensão do PRR em Caxias ...................................................... 56
2.2 O primeiro momento: enfrentamentos ........................................... 62
2.3 O segundo momento: Monsenhor Meneguzzi e a mudança de postura da
Igreja local .......................................................................................... 75
C a p í t u l o I I I - A E x p e r i ê n c i a I t a l i a n a d e P o d e r .......... 89
3.1 Um plano de consenso .................................................................. 90
3.2 O início da experiência .................................................................. 93
3.3 O positivismo da administração: o progresso pelas obras .................. 103
3.4 O progresso gerador de crise .........................................................
107
Conclusão .................................................................................................. 112
Referências bibliográficas ........................................................................ 117
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3
L i s t a d e q u a d r o s
Quadro 1 - Integrantes do Conselho Municipal de
Caxias 1890-1928 ................................................................................ 42
Quadro 2 - Relação dos Intendentes Municipais de Caxias do Sul
1890-1928 ........................................................................................... 45
Quadro 3 - Comitês da Federação Católica Caxias ................................... 64
Quadro 4 - Eleições municipais - 1924 .................................................... 94
4
I n t r o d u ç ã o
No ano em que completamos 120 anos de imigração italiana no
estado do Rio Grande do Sul, elaboramos uma dissertação cujo tema é uma
vertente pouco explorada: o aspecto político da Igreja católica na imigração
italiana.
Ao definirmos o tema e arrolarmos as problemáticas já
pesquisadas, chamou-nos atenção a abordagem dada à Igreja: de elemento
secundário nas análises e não como o objeto de estudo propriamente dito. E,
sendo muitos os fatos, no processo histórico de Caxias, que envolveram
elementos do clero, um especificamente tornou-se o fato motivador. A
Arquidiocese de Porto Alegre enviou para a região, em 15 de julho de 1896, o
jovem padre Nosadini. Recém-
-chegado da Itália, ele criou comitês católicos cujo principal objetivo era o
combate à Maçonaria.
A atuação do Padre Nosadini, através dos comitês católicos,
provocou acirradas lutas entre os elementos católicos, os membros da
administração pública e os integrantes da Maçonaria em Caxias. Como
resultado dessas lutas houve: a crescente manifestação dos imigrantes
italianos católicos contra administração pública; constantes ataques à sociedade
maçônica; e a expulsão do Padre Nosadini, um ano depois da sua chegada.
5
A partir daí, nos motivamos para um estudo detalhado do
envolvimento da Igreja nas questões políticas de Caxias durante o período
República Velha.
A bibliografia específica sobre o tema em estudo é reduzida e a
existente tende a revelar o caráter da religiosidade como assistencialista.
Nessa ótica, o papel da Igreja, é amparar espiritualmente ao imigrante e sua
família, ou ainda, o de auxiliar a organização social dos colonos.
Como exemplo de bibliografia com a visão acima referida, temos o
trabalho O significado das capelas nas colônias italianas do Rio Grande do Sul,
no qual Pe. Antonio Galioto apresenta um estudo sobre o aparecimento e a
evolução do fenômeno das Capelas no sul do Brasil .
1
A capela, organização típica da colonização, era construída com a
doação de materiais e da própria mão-de-obra dos colonos.
“Ao redor dela surgiu a bodega (esta, muitas vezes, a precedeu), o salão
de festas, a cancha de bochas, o cemitério e, quando foi o caso, também
a escola ... . A capela foi uma realização espontânea do grupo, como tal,
que se organizou, traçou normas, escolheu dirigentes ... “.
2
Carlos A. Zagonel escreveu Igreja e imigração italiana -
Capuchinhos de Sabóia um contributo para a Igreja no Rio Grande do Sul. Em
seu trabalho encontramos os dados que explicam a trajetória desenvolvida pelos
religiosos de origem francesa, que trabalharam na Colônia italiana e
" ... organizaram uma Missão na área nordeste do estado, com
finalidade específica de pregação de missões populares, mas terminaram
por fundar seminários, dirigir paróquias, organizar escolas, publicar um
jornal e administrar o próprio seminário diocesano...".
3
Dom José Baréa organizou em 1925, La vita spirituale nelle
colonie italiane dello Stato. Monografia realizada por decorrência das atividades
comemorativas do cinqüentenário da imigração italiana no estado. Nessa
monografia, D. José Baréa, escreveu sobre o trabalho dos sacerdotes que, a
1
Antonio GALIOTO In: Luis DE BONI (org.). A presença italiana no RS. p. 293-312.
2
Luis DE BONI In: José H. DACANAL (org.). RS: Imigração & colonização. p. 236-237.
3
Carlos A. ZAGONEL. Igreja e imigração - Capuchinhos de Sabóia um contributo para a Igreja no Rio
Grande do Sul (1895-1915). p. 10.
6
princípio, teriam sido o principal elo entre o imigrado e a pátria mãe. Falando na
língua do imigrante, os sacerdotes recordavam o que de mais precioso haviam
deixado e também recomendavam aos colonos que os mesmos deveriam
manter-se na tradição da família, da Pátria e da religião.
4
Em sua cronologia sobre as primeiras assistências religiosas em
Caxias, D. José Baréa abordou a atuação do Padre Nosadini que se notabilizou
por lutar contra a Maçonaria.
Em uma perspectiva diferenciada, Luis A. De Boni, estuda a Igreja
católica da imigração sob a ótica das grandes mudanças estruturais ocorridas
no período que está entre a proclamação da República e a metade do século
XX. Seu trabalho O catolicismo da imigração: do triunfo à crise retoma a questão
da língua como fator de integração; a organização das capelas e avança para as
questões da participação da Igreja em um período em que se havia
restabelecido um clima de cristandade.
5
" Num clima como este, os valores religiosos e sua expressão normativa
tendem a tornar-se valores sociais, ou melhor, estes se legitimam através
dos valores e normas sagrados".
6
Um trabalho que remete a uma radiografia para a compreensão da
posição política adotada pelo magistério católico gaúcho, durante o período da
República Velha aa cada de 40 é O cajado da ordem - Catolicismo e projeto
político no Rio Grande do Sul: D. João Becker e o autoritarismo. Elaborado pelo
Prof. Dr. Artur Cesar Isaia, é obra ímpar, que imprime fôlego e credibilidade às
pesquisas que buscam ultrapassar os limites da História Eclesiástica.
A Igreja católica no Brasil e o Regime Republicano, de Oscar de
Figueiredo Lustosa, apresenta uma coletânea de textos sobre o relacionamento
entre a Igreja católica e o regime republicano e suas conseqüências no
processo do catolicismo nacional. O trabalho expõe, de forma concisa, o
4
D. José BARÉA. La vita spirituale nelle colonie italiane dello stato. p. 56.
5
Pablo Richard define cristandade como uma forma determinada de relação entre a Igreja e a sociedade
civil, relação cuja mediação fundamental é o Estado. Em um regime de cristandade, a Igreja procura
assegurar sua presença e expandir seu poder na sociedade civil, utilizando antes de tudo a mediação do
Estado. Pablo RICHARD. Morte das cristandades e nascimento da Igreja. p. 9.
6
Luis DE BONI In: José H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 242.
7
processo desenvolvido pela Igreja para encaixar-se "... no novo regime que
acabava de ser estabelecido ... “.
7
Leitura indispensável para elucidar a atuação da
Igreja católica, em nível nacional, durante o período da República Velha.
Sergio Miceli em seu trabalho A elite eclesiástica brasileira aborda
questões que envolvem o relacionamento dos membros da Igreja com a classe
dirigente, bem como as figuras chaves na condução da política eclesiástica
destinada aos grupos dirigentes. O autor apresenta, também, a estratégia
utilizada pela Igreja na tentativa de sua aproximação com os grupos dirigentes
locais. Era o processo de "estadualização" que seguia os padrões de controle
político e de tendências descentralizadoras do regime republicano.
8
Loraine Slomp Giron publicou, em 1994, As sombras do littorio - O
fascismo no Rio Grande do Sul. Neste trabalho, a historiadora aborda o papel da
Igreja na Região Colonial Italiana, afirmando ter sido ele decisivo na formação
cultural e política dos imigrantes italianos. Apresenta uma síntese da atuação
política da instituição religiosa, em nível local e estadual, bem como dos
conflitos e incidentes políticos em que esteve envolvida. Um desses incidentes
diz respeito à Revolução de 1923. Dele, a historiadora escreve:
"A participação política do clero secular nos incidentes da Revolução de
1923 demonstra que os padres se colocavam ao lado do Partido
Liberador, contra o Partido Republicano. A posição do clero era coerente,
visto que o PRR no poder revelara-se agnóstico, positivista e ligado à
Maçonaria, o que contrariava as posições regionais".
9
O posicionamento descrito pela autora é coerente com a
documentação existente, porém , acreditamos que deveria ser complementado
com a informação sobre a opção da Arquidiocese de Porto Alegre, a qual se
havia posicionado a favor do PRR, corroborando um padrão de relacionamento
harmônico, entre ambos. A ausência dessa informação dificulta a
compreeensão da súbita mudança de postura da Igreja caxiense, no período
1923-24.
7
Oscar de F. LUSTOSA. A Igreja Católica no Brasil e o Regime Republicano. p. 10.
8
Sergio MICELI. A elite elcesiástica brasileira.
9
Loraine S. GIRON. As sombras do Littorio. p. 56.
8
Com relação a estudos realizados sobre Maçonaria (um dos
aspectos abordados pela nossa pesquisa), destacamos o excelente trabalho do
Pe. José Antonio Ferrer Benimeli
intitulado Relaciones Iglesia Catolica -
Masoneria.
10
Pe. Benimeli resgata o processo histórico das relações Igreja-
Maçonaria, sendo sua obra imprescindível para a compreensão das relações
que se travaram em sociedades onde aquelas duas instituições estavam
presentes.O resgate do processo histórico inicia no c. XVI e chega ao ano de
1980, apresentando análises de encíclicas, publicações antimaçônicas e
resoluções de Direito Canônico, que promoveram períodos de crises profundas
até períodos em que se percebe relações de tolerância entre Igreja e Maçonaria.
A bibliografia acima relacionada possibilitou, a partir de suas
análises, selecionar o tipo de documentação a ser utilizada, bem como o que
deveria ser destacado no próprio documento. O inter-relacionamento
bibliografia-fontes documentais nos permitiu articular o contexto sócio-político
desta pesquisa.
Frente ao material disponível e à lacuna existente, este estudo,
busca demonstrar o processo de aquisição do poder administrativo local pelo
grupo de imigrantes italianos católicos, bem como as expressivas manifestações
desse grupo, que, associado ao clero, enfrentam maçons e lusos na luta pelos
seus fins.
Os trabalhos realizados abordam isoladamente, ora o aspecto
político local, ora o aspecto religioso, que recebe um tratamento de História
Eclesiástica, aqui compreendida como a história cujo objeto fica centrado na
própria obra da Igreja, isto é, tem por base uma autocompreensão dominante,
em um dado momento, limitando a compreensão do que lhe é exterior a sua
própria (ao que ela é e ao que ela faz).
Na concepção deste trabalho tentamos ampliar essa idéia de
História Eclesiástica. Ao invés de buscarmos explicações teológicas para a
10
José Antonio F. BENIMELI Apud E.VASQUES & O.D.B. DUTRA. Maçonaria em Caxias do Sul.
9
participação da Igreja no processo político local, buscaremos explicações
históricas.
11
Em nível nacional vários trabalhos foram publicados na perspectiva
acima e demonstrando a relação religião-sociedade. Oscar de Figueiredo
Lustosa, Sergio Miceli, José Ivo Follmann e Pablo Richard nos remetem a temas
como: relacionamento entre Igreja Católica e regime republicano; processo de
"construção institucional" da Igreja Católica brasileira ao largo da República
Velha (1890-1930); Igreja e classes sociais; relações Igreja, sociedade civil e
estado
12
, que são abordados como parte de um contexto maior e integrado às
relações manifestas no mesmo.
Tais análises buscam entender o papel da religião, na sociedade
civil, entendida como "o conjunto dos organismos vulgarmente ditos ‘privados’ e
corresponde à função de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a
sociedade."
13
É também em Gramsci que vamos buscar a leitura e a
compreensão do que é Religião. Gramsci procurou precisá-la tomando de "...
Croce a idéia de que a religião é uma concepção da vida a que corresponde uma
atitude ética e a aplica ao conjunto das ideologias."
14
O próprio Gramsci coloca:
“Mas, neste ponto, coloca-se o problema fundamental de toda
concepção do mundo, de toda filosofia que se transforma em um
movimento cultural, em uma ‘religião’, em uma ‘fé’, isto é, que produziu
uma atividade prática e uma vontade, nas quais esteja contida como
‘premissa’ teórica implícita (que é uma ‘ideologia’, poderemos dizer
desde que se ao termo ‘ideologia’ o significado mais alto de uma
concepção do mundo, que se manifesta implicitamente na arte, no
direito, na atividade econômica, em todas as manifestações de vida
individuais e coletivas ... “.
15
11
Emile POULAT. Compreensão histórica da Igreja e compreensão eclesiástica da história. p. 812-816.
12
Oscar de F. LUSTOSA. A Igreja católica no Brasil e o Regime Republicano. 1990.
Sergio MICELI. A elite eclesiástica brasileira. 1988.
José Ivo FOLLMANN. Igreja, ideologia e classes sociais. 1985.
Pablo RICHARD. Morte das cristandades e nascimento da Igreja. 1982.
13
Hugues PORTELLI. Gramsci e o bloco histórico. p. 20.
Para aprofundar o assunto ver: Antonio GRAMSCI. Os intelectuais e a organização da cultura. p. 10-11.
14
J. M. PIOTTE Apud Carlos A. DÓRIA. Religião e política em Gramsci (elementos de uma pesquisa).
Religião e Sociedade. p. 146.
15
Antonio GRAMSCI. Concepção dialética da História. p. 16.
10
Na sua visão dialética, Gramsci atribui à religião, uma forma
ideológica, complexa e heterogênea,
“... por atravessar o conjunto das classes sociais de um país e sofrer os
condicionamentos inerentes à diversidade de situações, além de vincular
as formas de consciência com a tradição, isto é, com situações históricas
passadas."
16
Compreendemos então que, no nível conceitual, o lugar da
religião pode ser o de " espaço em que os homens se tornam coesos para a ação."
17
No contexto da colonização italiana local, observamos, na prática,
a coesão do grupo de imigrantes italianos católicos pela necessidade de
supremacia frente a um grupo social que era dominante nas três décadas de
existência da Colônia Caxias: os descendentes dos lusos, funcionários públicos
designados pelo Estado para a Diretoria de Terras e Colonização, e que
geralmente estavam vinculados à Maçonaria.
A superação desse domínio luso, com o desmantelamento da
eficácia organizativa de suas ideologias, corresponderá à conquista do poder
governativo, pelo grupo de imigrantes italianos católicos. Este grupo,
demonstrou buscar, no decorrer do processo histórico analisado, a condição de
dirigente antes mesmo de conquistar o poder governativo.
Entendemos que, em Caxias, política e religião caminharam
juntas. Isto se explica pela autocompreensão que a Igreja, enquanto instituição,
possuía:
"... a de uma Igreja cuja função não é mais de um magistério divino,
ligado à propriedade de uma essência divina, mas a de uma assembléia
de crentes comungando somente a fé no Cristo."
18
16
J. M. PIOTTE Apud Carlos A. DÓRIA. Religião e política em Gramsci (elementos de uma pesquisa).
Religião e Sociedade. p. 149.
17
Carlos A. DÓRIA. Religião e política em Gramsci (elementos de uma pesquisa). Religião e sociedade.
p. 157.
18
Antoine SAUCEROTTE. As sucessivas autocompreensões da Igreja vista por um marxista. p. 913.
11
Nossa pesquisa abrange o período de estudo de 1890 a 1924. O
marco inicial, 1890, por ser o período de imposição, no Rio Grande do Sul, de
uma Constituição Positivista e, também, momento de separação entre Estado e
Igreja. Fechamos esse período no ano de 1924, por ter início a primeira
experiência político-administrativa local, pelos italianos.
No decorrer desse período, a Igreja havia retomado a consciência
de si mesma como depositária da vontade de Deus, reafirmava a perenidade
dos princípios e a volta da supremacia Papal, sob centralização e proteção de
Roma. Essas características registravam a visão ultramontana do catolicismo
vigente então, a qual buscava combater a racionalidade contemporânea e os
movimentos de modernização surgidos na sociedade civil.
No período em estudo, o Brasil estava em meio aos efervescentes
movimentos que tendiam a uma reorganização da sociedade civil. E aquela
hierarquia eclesial enfrentava, além dos conflitos impostos pela modernização,
também a separação entre Estado e Igreja, representada pela extinção do
regime de Padroado.
O momento não poderia ser de maiores embates, pois:
" Os Papas proclamaram, desde Leão XIII, não somente o direito, mas
também o dever de a Igreja intervir em matéria econômica e social ( em
sentido lato), uma vez que esse domínio não pode ser isolado da
moral."
19
Para o período, a concepção da Igreja era a valorização da noção
tridentina
" ... na qual a Igreja aparece como sociedade perfeita ao lado do
Estado... . Esta concepção conviverá, como orientação do catolicismo
brasileiro na primeira metade do século XX, com o modelo medieval,
onde se identificam as idéias de e nacionalidade, confundindo-se os
interesses da Igreja com os do Estado" .
20
Na mescla de interesses onde a Igreja buscava, frente ao mundo,
a ascendência espiritual e moral, as regiões brasileiras que receberam
imigrantes italianos, ficaram expostas à atuação do catolicismo ultramontano
19
Hugues PORTELLI. Os socialismos no discurso social católico. p. 11.
12
bem como àquela noção tridentina. As regiões do estado do Rio Grande do Sul,
tendo recebido numeroso contingente de imigrantes italianos
(aproximadamente 70.000)
21
não fugiram daquela situação.
O processo de imigração decorreu da própria situação
sócio-
-político-econômica da Itália e da Europa como um todo. Nação recém
unificada, em um contexto de expansão do capitalismo, possuia um significativo
contingente de mão-de-obra excedente. Este fato, aliado à política do governo
brasileiro para substituição da mão-de-obra, povoou parte da região nordeste do
estado, incluindo-se aí a criação da Colônia Caxias.
Para esta Colônia foi enviado um grupo numeroso de italianos
católicos, que possuíam entre si a idéia comum de defesa ao direito que o Papa
teria sobre as regiões pontifícias, anexadas pelo Reino da Itália. Esse apoio
irrestrito ao direito do Papa sobre o território italiano era sustentado, também,
pelos padres que na Colônia atuavam. Em menor mero estavam os italianos
maçons, que, aqui estabelecidos integraram, mais tarde, o grupo maçônico
local.
Na Península Itálica, os maçons participaram do processo de
unificação. Conforme Benimeli, para os Estados Católicos, pertencer à
Maçonaria constituía-se em delito político, pela sua matiz de sociedade secreta
e como algo relacionado com a ordem pública mais do que com a religiosa.
22
Aliados os interesses entre os governos italiano e brasileiro,
aliviaram-se tensões, de um lado, e impulsionou-se a engrenagem capitalista,
por outro. e nacionalidade demonstravam ser idéias subservientes ao poder
civil e ao poder eclesial. A Igreja saberia, naquele contexto, utilizar-se do
processo imigratório e, da idéia propagada pela unificação do Estado Italiano,
de que esta teria sido realizada de forma anticatólica. O quadro para retomada
do projeto de formação de um Estado Católico estava pronto.
20
Cesar A. L. R. MOREIRA Apud Artur C. ISAIA. Catolicismo, regeneração social e castilhismo na
República Velha Gaúcha. Estudos Ibero- Americanos. p. 13.
21
Correio do Povo. Porto Alegre, 18 maio 1975. p. 19.
22
José Antonio F. BENIMELI Apud E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. Maçonaria em Caxias do Sul. p. 7-8.
13
Os imigrantes italianos, “...isolados da sociedade gaúcha,
abandonados pelo poder público, carentes de recursos..."
23
, a princípio não
possuíam um fator comum que os unisse. Recém-chegados, eram tratados
como estrangeiros. Porém, também, não se sentiam mais italianos, pois a
recente unificação atingira suas convicções, quer políticas, quer religiosas. A
língua também o servia como fator de agrupamento, pois os dialetos eram os
mais variados. Restou à
"... religião atuar como elo de união entre eles: a quase totalidade
confessava-se católica, e a fé católica forneceu-lhes os subsídios
indispensáveis para reiniciar, individual e coletivamente a existência.”
24
Aqui colocados, os colonos, manifestavam a preocupação de criar
novas raízes, de compreender a nova língua e a nova linguagem existente para
os diferentes mecanismos de funcionamento sócio-político-econômico. E num
local onde "...não havia grandes fortunas e, a política estava reservada aos luso-
brasileiros..."
25
,
faria parte da construção das novas raízes a necessidade natural
de participação, não apenas nas questões do espírito , mas também nas
questões políticas.
Era necessário ao grupo de imigrantes italianos organizar-se e
mobilizar-se a fim de conseguirem desde uma estrutura básica no
desenvolvimento local, até o acesso e o predomínio efetivo da administração.
Frente ao exposto, este trabalho se propõe a precisar os
elementos fundamentais integrantes do processo de busca de hegemonia local
na relação italianos católicos e Igreja.
Hegemonia, aqui compreendida segundo os estudos de Gramsci,
como “... a ‘direção’ e a ‘dominação’ da sociedade, isto é, o controle das sociedades
civil e política.”
26
Para precisarmos estes elementos fundamentais, trabalharemos
as seguintes hipóteses:
23
Luis DE BONI In: José H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 235.
24
Luis DE BONI In: José H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 235.
25
Id., Ibid., p. 243.
26
Hugues PORTELLI. Gramsci e o bloco histórico. p. 62-63.
14
a) Os imigrantes italianos que se radicaram em Caxias, trouxeram
em sua bagagem também a vivência da política de romanização, pois, na Itália,
era operacionalizada pela hierarquia eclesial. Portanto, a Igreja e o grupo de
imigrantes italianos, em Caxias, de 1890 a 1924, buscavam o seu fortalecimento
político conjunto, através do processo de romanização da comunidade local. A
busca desse fortalecimento era necessária tendo em vista a necessidade de
superar a predominância luso-brasileira na administração de Caxias.
Por romanização compreendemos o conjunto de diretrizes
políticas, adotado pela Igreja católica, em vigor durante o período da República
Velha. Esse conjunto fazia parte de um esforço para uma sintonia
organizacional e doutrinária com a firme disposição de implantar o estilo de
mando episcopal europeizado.
27
As diretrizes de romanização previam desde a adoção das
pastorais, como instrumento por excelência de difusão das palavras de ordem
eclesiástica, as visitas pastorais regulares, a convocação de sínodos e retiros
para o clero, a imposição de novos padrões litúrgicos às diversas solenidades
de culto, a divisão do trabalho diocesano ajustada a esse conjunto de
mudanças, o controle do perfil doutrinário político dos jornais e periódicos
diocesanos, até a criação de escolas e colégios diocesanos, de obras pias e
assistenciais e novas dioceses.
28
b) No período de 1890 a 1924, a Igreja católica local intensifica
relações com o grupo de imigrantes italianos católicos, através da ativa atuação
das associações católicas, para preparar lideranças na sociedade civil. Essas
lideranças formariam o grupo social que conquistaria o poder governativo em
1924.
c) Em 1924, a eleição do engenheiro agrônomo italiano, Celeste
Gobbato, vinculado ao PRR, representará a primeira experiência do grupo de
italianos católicos na administração de Caxias. Essa eleição se em
Para aprofundar a noção de hegemonia ver: Antonio GRAMSCI. Concepção dialética da história. p. 21.
27
Sergio MICELI. A elite eclesiástica brasileira.. p. 135.
28
Id., Ibid., p. 135-136.
15
detrimento do grupo luso-brasileiro que possuía entre seus membros atuantes,
um número expressivo de maçons.
As dissidências entre os dois grupos possuíam raízes remotas não
apenas no processo de relacionamento Igreja-Maçonaria, mas também no
processo de unificação italiana. Durante esse processo, a Europa viu surgir e
proliferar as sociedades secretas. Entre elas os iluminados, bávaros, jacobinos
e carbonários que, erroneamente, tinham seus membros identificados como
maçons. A aparição das chamadas sociedades secretas patrióticas ou políticas
e suas lutas pela unificação italiana, em especial os carbonários, atraíram a
preocupação e os ataques de Roma.
29
Segundo Benimeli, a “Carbonária
não deriva da Maçonaria nem sequer
havia sido calcada sobre ela."
30
Essa confusão foi trazida pelos imigrantes e na Colônia havia o
consenso de que maçons e carbonários eram inimigos dos católicos pelo fato de
terem auxiliado na derrocada dos Estados Pontifícios e haverem isolado o Papa
Pio IX no Vaticano.
Na Colônia os maçons atuavam desde 1887 e o governo
republicano designava para os cargos político-administrativos membros italianos
da Loja "Força e Fraternidade", que traziam em si o gérmen das idéias liberais.
Postos chaves, como Prefeitura, escolas, polícia, cartório, tudo estava nas mãos de
maçons."
31
Quanto à sociedade política faremos a leitura de "sociedade política
ou Estado, que corresponde à (função de) ‘dominação direta’ ou comando que se
exprime no Estado ou governo jurídico."
32
Chamamos a atenção de que a opção de destacar o aspecto
político da pesquisao significa desvinculá-lo do processo. " A análise separada
29
José Antonio F. BENIMELI Apud E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. Maçonaria em Caxias do Sul p. 10.
30
Id., Ibid.,. p. 10.
31
E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. Maçonaria em Caxias do Sul. p. 17.
32
A. GRAMSCI Apud Hugues PORTELLI. Gramsci e o bloco histórico. p. 30.
Para aprofundar o conceito de sociedade política ver: Antonio GRAMSCI. Os intelectuais e a organização
da cultura. p. 10-11.
16
de cada uma das duas esferas do momento superestrutural o corresponde,
evidentemente, à realidade prática."
33
Até por que Gramsci considera o bloco histórico - ou em termos
luckacsianos, a totalidade concreta - a estrutura global na qual se inserem,
como momentos dialéticos, a estrutura econômica e as superestruturas
ieológicas. Não existe, assim, uma hierarquia a priori dos momentos da
realidade.
34
Para apresentarmos o inter-relacionamento proposto neste
trabalho, desenvolveremos as hipóteses, anteriormente citadas, de forma a
estruturar a argumentação nos seguintes capítulos:
O primeiro capítulo será A Romanização em Terras Devolutas. Seus
objetivos serão: (a) desenvolver nossa primeira hipótese e apresentar o contexto
local onde se desenrolou a política de romanização.
Um Processo em Duas Fases será o segundo capítulo, que nos
trará a elaboração da segunda hipótese. Nele, analisaremos a atuação da Igreja
católica junto ao grupo de imigrantes italianos católicos, bem como, destes com
os grupos que ocupavam o poder administrativo local.
O terceiro capítulo: A Experiência Italiana de Poder , visa analisar o
processo desenvolvido pela primeira administração efetivamente italiana católica
e, também, identificar as características que o definem como uma administração
italiana católica.
Com relação ao processo metodológico para a composição desta
pesquisa consultamos os seguintes arquivos:
Arquivo Histórico Municipal de Caxias do Sul, Arquivo Jornal
Correio Riograndense, Arquivo Paróquia Santa Teresa de Caxias do Sul,
Arquivo do Pio Sodalício Damas de Caridade, Secretaria do Apostolado da
Oração, Biblioteca Pública de Caxias do Sul, entrevista com Sr. Hermes Jo
Dip, entrevista com Sr.ª Sueli Bascù, entrevista com Sr.ª Paulina Moretto.
33
Hugues PORTELLI. Gramsci e o bloco histórico. p. 32.
34
Antonio GRAMSCI. Concepção dialética da história. p. 4.
17
Quanto ao tratamento dado às fontes, realizamos uma distinção
entre as mesmas. Essa distinção classificou documentos possíveis de fornecer
uma análise quantitativa e documentos possíveis de oferecer uma análise
qualitativa.
Os documentos que possibilitaram a análise quantitativa foram os
relatórios da intendência municipal, demonstrativos dos funcionários municipais
e atas da comissão eleitoral. A análise qualitativa ficou por conta das fontes
impressas, jornais e periódicos, quer de origem republicana, católica ou
independente.
Iniciamos o trabalho pelo material que nos possibilitou uma
avaliação quantitativa, como foi o caso dos relatórios dos intendentes,
publicados ao final de cada ano. Estes nos permitiram fazer um levantamento
exaustivo com relação aos cargos ocupados na intendência, quem os ocupava e
por quanto tempo.
A seguir, realizamos um quadro com a descrição dos intendentes e
vices, um quadro com os conselheiros e uma listagem com os funcionários da
intendência cujos nomes foram confrontados com o livro de recolhimento de
impostos.
As atas da comissão municipal e do conselho complementaram os
dados para o quadro de Intendentes e Conselheiros.
A identificação como maçons, daqueles elementos, foi realizada
com o auxílio de fonte complementar: uma entrevista com Sr. Hermes Dip,
maçom atuante, que realizou a investigação e identificação dos nomes.
O tratamento qualitativo foi iniciado a partir das fontes que, no
período em estudo, consistiam de vários títulos publicados semanalmente. As
publicações ficavam divididas em quatro correntes : jornais intitulados órgãos do
Partido Republicano Riograndense, jornais ditos " Folhas Independentes",
fazendo oposição à administração municipal republicana; jornais de orientação
religiosa e jornais humorísticos e literários.
Nossa análise qualitativa prendeu-se às três primeiras correntes e
deles retiramos a documentação que poderia integrar um arquivo, cuja
18
classificação obedeceria aos seguintes itens: imigração italiana, clero italiano,
intendentes, Partido Republicano Riograndense, maçom, caso Padre Nosadini,
associações católicas, romanização, relações Igreja x Maçonaria, relações Igreja
local x administração pública local, Celeste Gobbato.
Após essa primeira classificação e uma análise do conjunto
documental, realizamos um novo arranjo dessa documentação, cujo conjunto
documental foi organizado por capítulo , isto é, conforme a narrativa exigida
para a comprovação das hipóteses estabelecidas.
A ampliação da documentação, em alguns casos, foi inviabilizada,
ou pela sua ausência ou pela falta de acesso a algum arquivo. A ausência de
documentação corresponde às associações católicas. Do Apostolado da
Oração, existe unicamente a ata de abertura e do Círculo Dante apenas os
registros do Livro Tombo.
Com relação à falta de acesso à documentação, ocorreu com o
Arquivo da Paróquia S. Teresa , a qual fez restrições, primeiro à consulta, e
após várias tentativas, quanto à documentação que poderia ser consultada.
Esses fatos tornam o trabalho de pesquisa que envolva a temática proposta,
uma verdadeira "penitência", que em seu sentido mais católico, significa operar
sacrifícios para remissão das culpas.
O título desta pesquisa: "Fides Nostra, Victorian Nostra": os
italianos católicos e o processo de aquisição do poder político na Intendência de
Caxias (1890-1924), tem os dizeres em latim assim traduzidos: " Nossa ,
Nossa Vitória". Este foi o dístico utilizado por D. José Baréa, primeiro Bispo de
Caxias. Os dizeres por si revelam o processo histórico contido nesta
pesquisa, justificando a escolha do título.
19
C a p í t u l o I
A R o m a n i z a ç ã o e m T e r r a s D e v o l u t a s
20
I - A R o m a n i z a ç ã o e m T e r r a s D e v o l u t a s
Este primeiro capítulo possui dois objetivos. Um é desenvolver
nossa primeira hipótese, a qual demonstrará a busca de fortalecimento político
da Igreja e do grupo de imigrantes italianos através do processo de romanização
da sociedade local. O outro é a exposição do contexto onde se desenvolveu
aquele processo de romanização.
A forma de abordar esse contexto trará informações sobre o
povoamento do local alvo desta pesquisa; a imigração italiana, como uma das
parcelas daquele povoamento; as condições italiana e brasileira da imigração; o
conflito ocorrido entre Igreja e Estado italianos; a postura da Igreja italiana e
brasileira no período da imigração e a formação política da Colônia Caxias.
A opção por essa disposição das informações justifica-se, na
medida em que utilizamos o avanço do capitalismo como gerador de problemas
diferenciados de uma nação para outra. O que representava uma dificuldade a
ser resolvida para uma, poderia ser a solução para outra. Em nosso caso, o
excedente populacional italiano, visto como problema para aquela nação, foi a
alternativa para a carência de o-de-obra livre no Brasil e também a opção
para um povoamento a ser concluído no Rio Grande do Sul. É por essa
perspectiva que desenvolveremos a temática deste capítulo.
21
1 . 1 A o c u p a ç ã o d e t e r r a s g a ú c h a s p e l o s i m i g r a n t e s
i t a l i a n o s
O estudo da ocupação das terras gaúchas pelos imigrantes
italianos ocorre, como referimos, no contexto da expansão do capitalismo na
Europa e no Brasil.
No velho Continente, à medida que a economia liberal expandia-
se, formava-se uma nova ordem política capaz de reorganizar estados e
substituir antigos governos. Essa situação, aliada à expansão tecnológica,
provocou desequilíbrios sociais, solucionáveis pela exportação não de
produtos industrializados e também da população excedente.
O Brasil, cuja economia estava assentada na monocultura
escravista, não estava alheio à nova ordem mundial, gerenciada pelas idéias
liberais. A substituição da mão-de-obra escrava pela mão-de-obra livre foi um
ponto fundamental a ser resolvido. Outro ponto foi a política de terras que
complementou o primeiro.
A substituição da mão-de-obra obteve solução no que era um
problema europeu: o excedente populacional ocorrido com a nova ordem.
Concomitantemente à substituição da o-de-obra, a política de terras foi
resolvida com a Lei de Terras de 1850, que
"Dispõe sobre as terras devolutas do Império, acerca das que são
possuídas por títulos de sesmarias sem preenchimento das condições
legaes, bem como por simples títulos de posse mansa e pacífica; e
determina que, medidas e demarcadas as primeiras, sejão ellas cedidas
á titulo oneroso, assim para emprezas particulares, como para
estabelecimento de colonias nacionaes e estrangeiros, autorizado o
governo a promover a colonização estrangeira na forma que se declara."
1
A partir dessa Lei, as terras só poderiam ser adquiridas mediante
a compra. Foi fixada também a sua forma de pagamento e organizada a
Repartição Geral das Terras cuja responsabilidade seria criar e administrar as
colônias, vender as terras e legalizar as mesmas.
1
Augusto T. de FREITAS Jr. Terras e Colonização. p. 1.
22
No território rio-grandense, até aquele momento, apenas os
campos haviam sido esquadrinhados e agregados aos imensos latifúndios
criadores, permanecendo as zonas florestais em abandono. O governo imperial,
utilizando-se da nova política de terras, implementou o processo de expansão
da pequena e média propriedades.
Se o processo de imigração atendeu duplamente o problema da
mão-de-obra, o processo de colonização completou o de povoamento do Rio
Grande do Sul. Objetivando o isolamento entre imigrantes e gaúchos, o Império,
estrategicamente, criou colônias
"... entre a região dos Campos de Cima da Serra, onde habitavam os
descendentes de portugueses ocupados na pecuária, a Depressão
Central, onde se localizavam os alemães, e a zona da Campanha."
2
Em 1875, iniciou o povoamento da Colônia Caxias, que, enquanto
espaço agrário, ficou dividida em duas regiões distintas, pelos seus momentos
históricos de criação e pelas funções específicas dessas regiões.
3
Uma região
foi identificada como " zona de campo", parte integrante dos campos da Vacaria
dos Pinhais e com suas bases ligadas ao momento histórico em que as terras
do Brasil foram distribuídas sob forma de sesmarias. A fração social de luso-
brasileiros, seus primeiros ocupantes, na utilização do solo agrícola, introduziu
a criação de gado para corte, de muares e outros, com a adoção de sistemas
extensivos em áreas revestidas por uma vegetação natural de gramíneas.
A outra região foi identificada como "zona de Colônia", gerada no
momento histórico da colonização italiana no Rio Grande do Sul, ocorrido no
último quartel do século XIX. Suas bases foram assentadas na pequena e
média propriedades policultoras, empregadoras da mão-de-obra familiar.
O imigrante italiano, seguindo os rumos traçados pelo movimento
imigrantista brasileiro, planejado e dirigido, passa a ocupar uma fração de terras
"devolutas", florestadas e fortemente acidentadas. Ficou, então,
institucionalizada a pequena propriedade individual, explorada via sistema
policultor e com mão-
2
Nilo BERNARDES. Bases geográficas do povoamento do Rio Grande do Sul. p. 34.
23
-de-obra familiar.
1 . 2 O C o n t e x t o d a U n i f i c a ç ã o I t a l i a n a
A Itália, após o Congresso de Viena, estava dividida, ao norte, em
Reino do Piemonte e Sardenha, Reino Lombardo e Veneziano, sob o domínio
austríaco, e os ducados de Parma, Toscana e dena, governados por duques
também ligados ao reino austríaco. Ao centro, os Estados Pontifícios, sob o
domínio temporal do Papa, dominavam a Itália central e Roma. Ao sul, havia o
reino das Duas Sicílias, governados pelos Bourbons de Nápoles.
Em 1840, surgiu o movimento de exaltação nacionalista chamado "
Jovem Itália" completado pelo movimento chamado " Risorgimento", cuja
finalidade era reconstituir o espírito italiano da Renascença e do Império
Romano. Este mesmo espírito de unificação nacional era articulado e difundido,
também, pelas sociedades secretas nacionalistas, como os carbonários.
Entre os nacionalistas italianos havia divisões: os revolucionários e
republicanos pretendiam a unificação nacional com a República; os moderados
católicos defendiam o estabelecimento de uma federação sob a presidência do
Papa; os moderados monarquistas, liderados por Cavour, pretendiam a
unificação em torno do Piemonte, com regime monárquico parlamentar.
Cavour, como primeiro-ministro do Piemonte, liderou o processo
de unificação. Venceu os austríacos, anexando ao Piemonte, a Lombardia,
Parma, Toscana e Módena. Garibaldi dominou a Sicília e Nápoles. Em 1866, a
Itália recebeu Veneza e, em 1870, os italianos ocuparam Roma , após a derrota
da França na Guerra com a Prússia. Durante o processo de unificação, Cavour
não podia atacar os Estados papais, pois estes estavam sob proteção de
Napoleão III. Com a sua queda, Garibaldi anexou os Estados papais às demais
regiões e ao Piemonte, passando a ser Roma a capital da Itália.
3
Eliana Rela ALVES & Loraine S. GIROM. Caxias do Sul: Homem, tempo, espaço - subsídios. p. 56-57.
24
O Papa da época, Pio IX, declarou-se prisioneiro do governo
italiano, gerando uma situação que foi resolvida meio século depois, em
1929, com a assinatura do Tratado de Latrão, através do qual o estado do
Vaticano obteve independência.
Concomitantemente às dissidências e conflitos gerados pelo
processo de unificação, o país continuava agrário, socialmente atrasado, e
com uma população carente. A emigração passou a representar, por um lado, o
alívio de tensões políticas e sociais; por outro, esperanças de crescimento
interno para o País: "... além da solução individual dos problemas econômicos, a
saída dos italianos tornou-se um empreendimento altamente rentável para o Reino".
4
1 . 3 A I g r e j a n o s é c u l o d a u n i f i c a ç ã o i t a l i a n a
Foi no contexto da unificação, que ocorreram as modificações
básicas pelas quais passou a Igreja católica, que, após ter-se unido
incondicionalmente às forças reacionárias, representou o último baluarte do
"antigo Regime". Ela estava em meio à "... luta entre a Cultura e o Cristianismo ,
entre a razão e a fé, entre os homens da ciência e os homens da religião".
5
Dentro desse espírito, apareceu, também, uma instituição que se
empenhou na luta contra o chamado "domínio dos padres". Foi a Maçonaria,
que já surgiu incorporada à sociedade não-cristã da época.
Nesse período, a característica fundamental foi o cisma criado
entre sociedade moderna e Igreja, entendida então, como: "... uma realidade
religiosa bem determinada, fora da sociedade moderna".
6
Existe, ainda, durante o século XIX, uma reação contra a postura
política da Igreja, que, em meio às grandes ideologias, lutava contra o
racionalismo e o liberalismo.
4
Loraine S. GIRON In J. H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 52.
5
D. Dadeus GRINGS. Dialética da política - História dialética do cristianismo. p. 218.
6
Id., Ibid.,. p. 220.
25
Tanto o Papa Gregório XVI, quanto Pio IX, rejeitaram de forma
global o Racionalismo e o Liberalismo, constituintes do florescente mundo
moderno.
Pio IX, com sua postura e sua longa permanência no pontificado,
... numa época de profundas transformações sociais no mundo, foi um verdadeiro
desastre para a Igreja.”
7
Sua concepção política estava muito voltada para o
absolutismo, tanto nas questões políticas e religiosas, quanto nas culturais e
nas morais. De uma certa forma, centrados em sua figura estavam a Igreja e o
Estado. Enquanto Estado, dirigia-o através da teocracia. Todos os postos eram
ocupados por clérigos, isolando os leigos. Sua concepção tratava, também, o
reino como propriedade de uma família real.
Com o movimento das novas ideologias, "o povo começava a tomar
consciência de seus direitos e responsabilidades.”
8
A tensão existente não revelava
um descontentamento com o papel religioso, e sim com o papel político
adotado.
"Reconhecia-se sem pestanejar, a autoridade religiosa do Romano
Pontífice. Nenhum italiano dela duvidava. Mas revidava-se com a
exigência de outra autoridade, de base popular e participação do povo,
para dirigir os destinos temporais."
9
Em 1870, quando se dava por consumada a unificação italiana,
através da anexação de todos os reinos, inclusive dos Estados Pontifícios, Pio
IX lançou a excomunhão contra o rei italiano e proibiu os católicos de participar
da política. Cortou também qualquer possibilidade de diálogo com o mundo
moderno.
Os intelectuais católicos desligavam-se cada vez mais da realidade
e "a Igreja se tornava um gueto, tendo cortado toda a comunicação com o mundo
externo. Uma Igreja fora do mundo.”
10
1 . 4 A p o s t u r a d a I g r e j a C a t ó l i c a n o f i n a l d o s é c u l o X I X
e i n í c i o d o s é c u l o X X
7
D. Dadeus GRINGS. Dialética da política - História dialética do cristianismo. p. 264.
8
Id. Ibid., p. 265.
9
Id., Ibid., p. 267.
10
Id., Ibid., p. 267.
26
Pensamos abordar esse tema, tendo em vista que as mudanças
de postura da Igreja católica na Itália, refletir-se-ão na região de abrangência
desta pesquisa, o que , enquanto temática, nos auxilia na argumentação da
primeira hipótese estabelecida.
Dos fins do século XIX ao início do século XX, a Igreja Católica
Romana, era clerical, isto é, “... o leigo não tem vez".
11
Ela defendia a ortodoxia e
priorizava a teoria em detrimento da prática.
Até 1903 pontificou Leão XIII, que, assumindo em 1878, ficou
conhecido pela sua atuação política. Sua ampla visão da problemática humana
tirou a Igreja da atitude puramente defensiva e de condenações, que haviam
marcado os dois últimos pontificados. Durante seus vinte e cinco anos à frente
da Igreja católica, buscou o diálogo entre a Igreja e o mundo laico.
Escreveu a encíclica “Rerum Novarum”, a qual transformou-se em
base para a doutrina social da Igreja, situando a problemática social num amplo
contexto ético-religioso-político. Para dar suporte ao pensamento católico,
retomou a filosofia perene e estimulou o estudo de S. Tomás. No campo
político, tentou o diálogo com as diversas autoridades civis, e enquanto
movimentava-se nos vários acontecimentos das nações européias, apresentava
sua concepção cristã de Estado. Também proclamava ser a política uma
atividade pertinente aos leigos e, portanto, o clero deveria manter-se afastado
dela.
12
Ao chegar o ano de 1903, o novo Papa, Pio X, retornou à política
das condenações indiscriminadas sem analisar e relacionar a complexidade dos
problemas modernos. Ele via perigo em tudo. Na política italiana, manteve a
proibição de os católicos participarem das eleições legislativas, o que favoreceu
aos anticatólicos dirigir os destinos da Itália, além de proibir os primeiros de
participar de qualquer associação acatólica.
11
D. Dadeus GRINGS. Dialética da política - História dialética do cristianismo. p. 269.
12
Id., Ibid., p. 282-287.
27
As atitudes de Pio X, incluindo-se a condenação ao modernismo,
geraram, por um lado, o temor a todo o progresso científico, além de barrar
toda e qualquer interpretação mais atualizada da teologia. Por outro lado,
favoreceu a criação de um regime de terror no interior da instituição religiosa e
um clima de insegurança geral entre todos os que, de algum modo,
procurassem responder aos problemas da época.
13
O pontífice mostrou que seu pensamento religioso estava voltado
à perspectiva de uma Igreja Clerical, em seu sentido mais extremo. Ele defendia
a "desencarnada" da realidade e o homem, nessa visão, seria temente a
Deus e com medo de tudo o que o cercasse. Sua posição, autoritária e
reacionária, opunha-se ao próprio sentido da História, asua morte, em 1922.
14
Com a morte de Pio X, voltou à Igreja Clerical a política de seu
antecessor, Leão XIII, a qual passou a ser linha mestra de todos os sucessores
de Pio X: de Bento XV a João Paulo II.
1 . 5 A I g r e j a C a t ó l i c a e a t r a n s i ç ã o n o B r a s i l
No Brasil, a administração central da Igreja Católica concentrou
esforços no revigoramento do trabalho missionário, nos incentivos à
nacionalização do clero e da alta hierarquia em áreas coloniais de missão.
Também se fazia necessário avançar na prestação de serviços educacionais e
assistenciais.
No caso da América Latina, e em especial do Brasil, a política
expansionista da Santa Sé adotou uma postura patrimonialista, sem abrir mão
das metas de romanização, tanto em nível de preparo dos membros do clero,
como da distribuição do território brasileiro entre as congregações religiosas.
Ao mesmo tempo em que a Igreja intensificava sua atuação no
Brasil, necessitava também adequar-se a uma nova realidade surgida com a
Proclamação da República. A separação entre a Igreja e o Estado, que havia
13
D. Dadeus GRINGS. Dialética da política - História dialética do cristianismo. p. 270.
28
acontecido em algumas nações européias, ocorreu também no Brasil. Pelo
decreto 119 A, de 7 de janeiro de 1890, o Estado desvinculou-se do poder
eclesiástico: golpe fatal no regime de padroado.
Pelo antigo regime, o clero era funcionário público, e o governo
imperial era responsável pela criação de dioceses, paróquias, seminários, etc.
Com o fim desse regime, sob o
"... ponto de vista político organizacional, a separação cancelava
praticamente todos os direitos de intervenção sobre os negócios
eclesiásticos de que dispunha o poder central conforme estipulava o
regime de padroado. A criação de novas dioceses e paróquias, a
fundação de seminários e outras obras, a distribuição do clero pelos
diversos cargos e carreiras alternativas, a indicação e nomeação de
prelados, a fixação de normas e diretrizes de interesse para as atividades
e serviços eclesiásticos, e outras tantas atribuições até então de
competência do próprio imperador ou de seus altos prepostos, passava a
depender do alvitri da alta hierarquia eclesiástica.”
15
Esta nova situação colocara um duplo desafio à Igreja nacional. O
primeiro era buscar novas formas de obter autonomia financeira, institucional e
doutrinária capazes de garantir futuros projetos de influência política. O
segundo envolvia a saída da estagnação organizacional em que se encontrava.
Com a separação da Igreja e do Estado, o ensino religioso
obrigatório foi retirado das escolas públicas. Os bens da Igreja continuavam nas
mãos do clero na condição de proverem a manutenção dos mesmos , mas
alguns serviços, como a administração de cemitérios, passaram ao domínio das
municipalidades. A República passou a reconhecer apenas o casamento civil,
que deveria preceder ao casamento religioso e impediu clérigos e religiosos de
qualquer confissão de fazer parte do Congresso Nacional.
16
É cil entender que tais medidas, inevitavelmente, desarticularam
o episcopado. Tudo o que, antes da República, significava espaço de influência
da Igreja, após 1890, ao contrário, favoreceu o prestígio crescente do Estado.
No mesmo ano de 1890, a Igreja, no Brasil, traçou um plano de
reformas liderado inicialmente por D. Macedo Costa. Após a morte deste, a
14
Id., Ibid., p. 270.
15
Sergio MICELI. A elite eclesiástica brasileira. p. 19-29.
16
Ivan LINS. História do positivismo no Brasil. p. 355-370.
29
condução do plano de reformas foi feita diretamente por Roma, através das
normas do Concílio Plenário Latino-Americano.
Por este plano, a hierarquia eclesial brasileira, espelhou-se no
governo republicano para dar partida em suas reformas. Refletiu-se nas
tendências descentralizadoras do regime republicano, promovendo a
organização de sedes diocesanas em todas as capitais estaduais, " ... para cuja
gestão foram muitas vezes convocados elementos do clero originário de importantes
grupos oligárquicos."
17
Dessa forma, a médio prazo, os prelados, pela
familiaridade junto aos círculos de mando, obtiveram o levantamento de
recursos necessários à formação de um patrimônio diocesano.
Se em nível nacional a Igreja encontrou no sistema da própria
República o modelo para reorganizar-se no novo contexto e intensificar as
alianças com os detentores locais do poder oligárquico, nos níveis regional e
local, a instituição recorreu aos ditames do novo catolicismo europeizado e
romanizado. Para tal, adotou estratégias repressivas em relação ao catolicismo
mais popular, e de estilo luso-brasileiro.
Na sua investida contra o catolicismo popular, a Igreja enfrentou
resistências, tanto à penetração do novo estilo romanizado, quanto às sanções
feitas às práticas do quotidiano.
Os "santos" tradicionais enfrentam a concorrência dos novos
"santos", introduzidos na sociedade brasileira, pelas congregações européias, e
as antigas irmandades são substituídas por associações religiosas. Foi o
momento de congregar a sociedade em torno do Sagrado Coração de Jesus,
cuja propaganda era sustentada pelo Apostolado da Oração, e, também, dar
lugar às Virgens de Lourdes, Salete e Fátima.
As solenidades, procissões e festas que propagandeavam os
"santos" europeizados, recém-chegados ao Brasil, converteram-se, assim, em
espaços de demonstração e legitimação do poder oligárquico local. Os prelados
tornaram-se progressivamente figuras de primeiro plano, participando
ativamente na política local de seus estados.
17
Sergio MICELI. A elite eclesiástica brasileira. p. 21.
30
Aos poucos, e de forma sistemática, a Igreja Católica
operacionalizou o seu objetivo de estabelecer influência em todo o país. Driblou
as medidas impostas pelo governo, que possuía a intenção de cercear a sua
influência política e, na estratégia de " estadualização",
18
ganhou campo para
educar as elites e recrutar elementos para a formação de novos prelados,
dignos de seus quadros.
A formação dos elementos da hierarquia eclesial passava também
pelo conjunto de diretrizes da romanização. No momento em que a organização
eclesial nacional reaproximou-se de Roma, esta passou a exercer uma
orientação doutrinária disciplinar para que houvesse
"... a ‘moralização’ e profissionalização do clero nos termos das reformas
estimuladas por pontífices enfraquecidos politicamente e desejosos de
remanejar os recursos internos da organização."
19
O clero nacional mais profissionalizado era preparado para ocupar
postos-chave nos altos escalões da organização eclesial, assim, auxiliaria,
também, num melhor relacionamento entre a Igreja e o governo republicano.
Em nível nacional, as relações "... entre as duas instituições eram amigáveis,
embora oficialmente muito formais ... .”
20
Em nível estadual, o mesmo o
acontecia, existindo " ... lacunas organizacionais, falta de coesão, comunicação e
lideranças, como pontos nevrálgicos da organização no período em questão."
21
Naquele momento, foi concentrado todo o esforço na intenção de
atrair os novos candidatos que passariam pelos seminários e pela nova
formação profissionalizante do clero. E, segundo D. Paulo Evaristo Arns:
" O novo catolicismo romanizado encontra seu habitat natural na área de
imigração em regime de pequena propriedade no Rio Grande do Sul e
Santa Catarina. Daí saírão as vocações para a maior parte das
18
Sergio MICELI descreve a “política de estadualização” como: “... uma política expansionista adotada
pela Igreja (...) foi implementada através de estratégias diferenciadas conforme o peso político e a
contribuição econômica de cada unidade federativa para a manutenção do pacto oligárquico e,
conseqüentemente, em função da margem de influência e prestígio conquistada pela Igreja, do grau de
receptividade à sua contribuição por parte dos círculos dirigentes locais e do potencial de mobilização dos
católicos como grupos articulados de pressão a ponto de influir sobre as decisões governamentais
suscetíveis de afetar as áreas vitais de interesse para a própria organização eclesiástica. Sergio MICELI. A
elite eclesiástica brasileira. p. 22. e 67.
19
Id., Ibid.,. p. 27.
20
Thomas G. BRUNEAU Apud Sergio MICELI. A elite eclesiástica brasileira. p. 25.
21
Sergio MICELI. A elite eclesiástica brasileira. p. 25.
31
congregações européias que ingressavam no país e para o clero
secular.”
22
No contexto de um Brasil em transição, como foi o ocorrido na
passagem de um governo imperial para um governo republicano, a Igreja
nacional passa pelo desafio da separação Igreja-Estado, utilizando-se das
mesmas estratégias do governo republicano. Sua situação, durante todo o
período da República Velha, caracterizou-se por um processo de dependência.
Uma primeira em relação ao Estado e à oligarquia liberal , e a outra com
relação ao centro romano.
A "política de estadualização" reforçava a primeira dependência, e
os ditames exigidos pela situação de europeização e romanização, introduzidos
no país, reforçavam a segunda. O prelado, por sua vez, precisou preparar-se
profissionalmente para atuar nas articulações políticas que se estabeleceram
entre a sociedade burguesa, as lideranças provincianas e os membros da
hierarquia eclesial.
1 . 6 O R i o G r a n d e e o C a t o l i c i s m o
Tendo presente a problemática deste trabalho, a qual se passa na
Colônia Caxias, núcleo de imigração italiana, nos deteremos em estudar apenas
a inserção do clero secular italiano no estado do Rio Grande do Sul.
Quando a República tornou-se sinônimo de progresso,
urbanização e industrialização, a Sé Romana gradativamente transladava para o
Rio Grande do Sul, sua política de romanização: enviou para este estado cento
e quarenta e oito padres italianos, entre os anos de 1876 e 1930
23
. Foi o
momento em que se associaram tarefas de incentivo à formação de um clero
natural deste estado com a entrada de um clero estrangeiro. O principal
articulador dessas tarefas foi D. Cláudio JoGonçalves Ponce de Leão, que
assumiu a Diocese de Porto Alegre no ano de 1890.
24
22
Paulo E. ARNS. O que é Igreja . p. 128-129.
23
Pe. RUBERT Apud José O. BEOZZO In Luis DE BONI (org.). A presença italiana no Rio Grande do Sul.
p. 60.
24
Carlos Albino ZAGONEL. Igreja e imigração italiana - Capuchinhos de Sabóia um contributo para a
Igreja no Rio Grande do Sul (1895-1915). p. 75.
32
Os padres que aqui chegavam eram formados pelo Seminário Pio
Latino-Americano, em Roma, cujo principal objetivo era a formação de membros
da hierarquia eclesiástica para atender às necessidades da Igreja de toda a
América Latina. Os padres e seminaristas brasileiros, ao voltarem desse colégio
para o Brasil, tinham a incumbência de auxiliar na formação de novos
seminaristas dentro do mesmo espírito romano e da influência italiana de
estudos dos quais haviam feito parte.
25
No contexto eclesiástico do estado, o mero de párocos era
reduzidíssimo. Faltavam ordenações de elementos originários da sociedade
local, fator este que tornava deficiente o atendimento às freguesias da
campanha, bem como o atendimento às famílias de imigrantes que chegavam
incessantemente. Embora a diocese promovesse a vinda de
padres estrangeiros, agora escolhía-os com um certo rigor, ainda assim
"O serviço pastoral é extremamente dificultado pela extensão e pelo
território acidentado; (...) São pequenos grupos semeados entre vales e
montes e cada paróquia tem 5, 10, 15 e até 20 capelas."
26
Os imigrantes italianos recém-vindos, e muitos provenientes
dos
Estados Pontifícios, ao se instalarem e se depararem com a ausência de quem
ministrasse os sacramentos religiosos, acabavam por introduzir, aqui, a figura do
padre-leigo. Esse poderia ser a pessoa mais velha na comunidade, como
poderia ser aquela que tivesse trazido o livro de orações ou mesmo a imagem
ou quadro de algum santo. Deveria, ele, exercer a função de um padre de
capela, no dizer de Carlos A. Zagonel, significando que poderia realizar
procissões, bençãos de velas e de ramos, missa cantada e exéquias de enterro.
A figura do padre-leigo, não poucas vezes, provocou incidentes,
pois comumente, a população " ... tomava a defesa de ‘seu padre' contra o
exclusivismo dos sacerdotes que lhe proibiam qualquer atividade como indevida e
supersticiosa.”
27
25
José O. BEOZZO In Luis DE BONI (org.). A presença italiana no Rio Grande do Sul. p. 60.
26
Carlos A. ZAGONEL. Igreja e imigração italiana - Capuchinhos de Sabóia um contributo para a Igreja
no Rio Grande do Sul (1895-1915). p. 84-85..
27
Carlos A. ZAGONEL. Igreja e imigração italiana - Capuchinhos de Sabóia um contributo para a Igreja
no Rio Grande do Sul (1895-1915). p. 55.
33
A capela, na zona rural, foi outro elemento próprio, que assim
como o padre-leigo, surgiu da necessidade e do isolamento dos imigrantes.
Constituía-se de um conjunto do qual faziam parte: a igreja, o cemitério e, mais
tarde, a torre, o sino e o local para a festa do padroeiro.
28
A zona de imigração italiana buscou a continuidade de sua
vivência religiosa, praticada nas aldeias rurais da Itália. A separação da Igreja e
do Estado, no Brasil, obrigava a uma outra prática do catolicismo, quer por parte
da hierarquia eclesial, quer por parte do imigrante italiano. As práticas
diferenciadas que foram impostas pelo próprio contexto não deixaram de criar
um clima de cristandade nessa região de colonização.
Nos dizeres de Luiz Alberto De Boni
29
constituía-se o clima de
cristandade, fazendo recordar os tempos áureos da Igreja medieval. Capela e
paróquias, escolas religiosas, jornal católico, missões populares, aulas de
catecismo e uma severa vigilância exercida pelo confessionário faziam a
manutenção e a consolidação desse clima.
Com as características do novo contexto proporcionado pela
imigração no estado, as transformações manifestaram-se quer em nível
econômico--político com a implementação da pequena e dia propriedades
policultoras, quer em nível social com a formação de uma classe média urbana;
mas sobremaneira em nível cultural, no qual a Igreja, enquanto instituição,
participou da formação de uma nova postura moral, ética e intelectual,
importando, via romanização, os elementos necessários.
1 . 7 O s i m i g r a n t e s i t a l i a n o s c a t ó l i c o s e a c o l o n i z a ç ã o
n a r e g i ã o n o r d e s t e
A imigração italiana, toma fôlego a partir de 1875, quando, em
nível de Rio Grande do Sul, são criadas e organizadas as colônias na região
28
Pe. Antonio GALIOTTO In Luis DE BONI (org.). A presença italiana no Rio Grande do Sul. p. 298-99.
29
Luis DE BONI In J. H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 242-243.
34
das matas. As terras designadas para isso foram as terras devolutas do então
governo imperial.
O imigrante, contratado na Europa, chegava à província para
povoar o território e, a médio prazo, produzir gêneros para o mercado interno e
para o nascente mercado urbano. Aqui chegando, era instalado em um dos
núcleos coloniais, cuja divisão das terras obedecia ao sistema de glebas
contínuas, denominadas léguas, e
"A demarcação dos lotes, realizada pelos engenheiros e agrimensores
da comissão, era feita a partir da primeira légua, sendo, a partir desta,
sistematicamente, demarcadas as demais.”
30
Comumente, os imigrantes eram ocupados como mão-de-obra em
trabalhos que envolviam a abertura de caminhos e o desmatamento da região,
indiferentemente da profissão exercida antes da imigração. O governo, ao
procurá- -los, exigia que no mínimo 90% dos embarcados tivessem como
profissão a agricultura. Porém, não era feita uma verificação do que os
candidatos à imigração diziam de si mesmos. O fato é que, pouco tempo após
sua chegada, muitos colonos haviam instalado oficinas de funilaria, carpintaria,
ferraria, sapataria, enquanto outros construíram moinhos a água e olarias.
31
Assim, como a quase totalidade dos imigrantes italianos
confessava-
-se de profissão agricultor, dos 70.000 vênetos que entraram em terras
gaúchas, a maioria confessava-se católico convicto.
32
Tendo eles saído de uma nação recém unificada, onde o Papa
perdera o poder e o direito sobre os Estados Pontifícios, sendo também
proibida aos católicos a participação na política, ao retomarem a vida nessas
terras, trouxeram a característica de "... população rural aglomerada em torno das
igrejas paroquiais onde cultuavam suas devoções mariais e ouviam a pregação do
sacerdote.”
33
30
Loraine S. GIRON In J.H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 62-63.
31
Correio do Povo. Porto Alegre, 12 maio 1975. p. 2.
32
Jornal de Caxias. Caxias do Sul, 23 jul. 1977. p. 19.
33
Carlos A. ZAGONEL. Igreja e imigração italiana - Capuchinhos de Sabóia um contributo para a Igreja
no Rio Grande do Sul (1895-1915). p. 47.
35
Longe das dissidências políticas entre Igreja e Estado, os
italianos, aqui, estavam longe, também, das divergências da Igreja com as
ideologias próprias do novo século. Enquanto, na Itália, socialismo,
industrialização e urbanização eram idéias com caráter subversivo, aqui, nos
núcleos coloniais, aquela população reconstruía suas vidas ao redor de igrejas
e capelas imediatamente erguidas. Aqui a preocupação o era com os
socialistas, e sim com a organização de comissões para obter do bispo um
pároco.
"Famílias de pequenos proprietários, vivendo do trabalho da terra, num
ideal frugal de vida que beirava o subconsumo, tudo isto sob a bênção e
a vigilância da Igreja, estes colonos pareciam oferecer as mais propícias
condições para a criação de algo assim como um estado cristão."
34
A Igreja aproveita o fértil campo para criar um clima de
cristandade, utilizando-se para isso do objetivo de prestar assistência religiosa
aos colonos, uma vez que, entre eles, a realidade manifesta era diferente da
realidade apresentada pelo catolicismo da campanha gaúcha. Neste, imperava
o formalismo religioso quase sem sacramentos e, naquele, gradativamente
ocorre a "... participação maciça dos fiéis nas cerimônias da vida religiosa , a
freqüência aos sacramentos e a internalização de um código de ética católica ...".
Todos esses elementos " ... faziam recordar os períodos áureos da Igreja medieval".
35
A forma de vida rural dos colonos era um fator que cooperava
para criar o clima de cristandade, que seria abalado, apenas, pela presença de
carbonários, maçons, luso-brasileiros e positivistas. Encontrados nas cidades e
vilas maiores, eles representavam obstáculos aos objetivos da Igreja Católica.
A instituição religiosa, na tentativa de recuperar o terreno que
havia perdido, desde a Europa, alia o processo de secularização e o clima de
cristandade, isto é, tenta a aproximação do que é religioso e do que é leigo, com
vistas a reedificar seu poder na sociedade civil.
34
Luis A. DE BONI In J.H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 242.
35
Id., Ibid., p. 242.
36
Fizeram parte do processo de secularização a criação de inúmeros
colégios católicos, por toda a região colonial, com o objetivo de formar uma nova
elite intelectual de projeção estadual e nacional. Além dos colégios católicos, a
Igreja criou também jornais semanários.
A Igreja consegue, através de sua "assistência espiritual" ao
imigrante italiano, tornar o Rio Grande do Sul um " Estado católico”
36
, pois
muitos membros atuantes nos movimentos eclesiásticos, tais como
congregações Marianas e Ação Católica, destacaram-se como lideranças
políticas.
E, se, enquanto necessidade religiosa, o imigrante italiano tinha
participação efetiva (festejos e sacramentos), enquanto necessidade política da
República Velha, ele era " massa eleitoral de manobra, dentro de uma política de
cabresto ‘de uma estrutura oligárquica de mando'".
37
Havia o problema dos intendentes, que não eram pessoas ligadas
aos interesses locais. Assim, a região colonial, invariavelmente, estava sujeita
aos desígnios de políticos vinculados à região da campanha, influentes
tradicionalmente.
Alguns italianos, naquele momento, apoiavam o partido do
governo - Partido Republicano Riograndense (PRR) -, na medida em que isso
representa ganhos na troca de favores.
No caso específico de Caxias, por longo tempo, houve
intendentes de origem luso-brasileira. Aos italianos era facultada a vice-
intendência e, em situações excepcionais (substituições por afastamento
temporário ou morte) é que chegavam ao cargo de intendentes. Somente no
ano de 1924, um italiano é eleito para esse cargo.
De um lado, o imigrante italiano pertenceu a um grupo
considerado secundário, para os trâmites políticos do PRR, de outro lado, os
movimentos eclesiásticos e as associações católicas foram de vital importância
para o seu engajamento no processo político local e estadual.
36
Luis A. DE BONI In J.H. DACANAL (org.).. RS: Imigração & Colonização. p. 248.
37
Sandra J. PESAVENTO In J.H. DACANAL (org.). RS: Imigração & Colonização. p. 180.
37
Parece-nos prudente, agora, inserir nessa análise o processo de
formação política da Colônia Caxias.
1 . 8 F o r m a ç ã o P o l í t i c a d a C o l ô n i a C a x i a s
A colônia Caxias, por haver sido previamente planejada, desde o
seu início, contou com uma administração necessária à acomodação dos
imigrantes.
A administração passou por três marcos distintos, sendo o primeiro
de 1875 a 1884; o segundo de 1884 a 1890; e o terceiro desde 1890 até hoje.
O primeiro período administrativo, de 1875 a 1884, era
denominada Colônia e estava ligada diretamente ao Governo Imperial. Sua
administração era feita pela Comissão de Terras, aqui centralizada na pessoa
do diretor da colônia. O segundo período de 1884 a 1890, foi caracterizado pela
fase de distrito vinculado ao município de São Sebastião do Caí. O terceiro
período, inicia em 1890, quando o distrito passa a categoria de município
autônomo.
No decorrer dos dois primeiros períodos não havia eleições na
Colônia Caxias e mesmo que houvesse, não era facultado ao imigrante ser
eleitor. A administração era realizada por funcionários blicos designados pelo
governo provincial. Eles dirigiam a distribuição de lotes e recolhiam os impostos
e os valores das dívidas contraídas pelos colonos por ocasião de sua chegada.
38
A situação administrativa sofre alterações após o ano de 1890,
quando da emancipação. O presidente do Estado, General ndido Jo da
Costa, nomeou a primeira Junta Governativa, composta pelos imigrantes Angelo
Chittolina, natural de Mântua e membro da ordem maçônica
39
, Ernesto Marsiay,
natural de Feltre e Salvador Sartori, natural de Vicenza. Essa junta governativa,
38
Anelise CAVAGNOLLI , Mari T.A. MIORELLI. Boletim Informativo do Museu e Arquivo Histórico
Municipal - Ocorrências. Caxias do Sul, n. 8, out., 1988.
38
vinculada ao PRR, permanece até 1892, enfrentando todas as controvérsias do
período.
No município, a situação política era o confusa, quanto no
estado. Em novembro de 1891, "(...) o poder municipal é tomado por um grupo de
revoltosos que assume como Junta Revolucionária Municipal”
40
, permanecendo no
poder até dezembro do mesmo ano. Essa junta era liderada pelo italiano
Francisco Salerno, que se dizia fiel ao presidente deposto, Júlio de Castilhos.
Meses mais tarde, o governo provisório do estado nomeia dois
membros da ex-junta governativa revolucionária colocando-os lado-a-lado com
conselheiros eleitos.
A situação do então município é de grave crise política. Para tentar
amenizá-la, o governo estadual nomeia o primeiro Intendente Antonio Xavier da
Luz.
Simultaneamente a essa situação, na qual os italianos
demonstram não formar um grupo homogêneo, sob o ponto de vista político,
podiam ser identificadas claramente suas divisões. Os chamados "austríacos"
formavam uma corrente; outra era formada pelo grupo maçom; e uma terceira
integrada pelos imigrantes ditos católicos.
Segundo o mapa estatístico da Colônia Caxias, no período que se
estende de 1872 a 1886, os imigrantes italianos representavam 70% dos
povoadores e os imigrantes austríacos 23%. Havia um pequeno número de
povoadores brasileiros (2,10%) e também boêmios e alemães (respectivamente
1,38% e 0,95%) .
41
Os imigrantes italianos eram provenientes do Vêneto, Lombardia e
demais regiões do Norte da Itália. " Os chamados ‘austríacos' vieram com
passaporte do Império Austro-Húngaro, sendo, em sua maioria, trentinos,“
42
e foram
isolados dos demais imigrantes desde sua chegada, passando pelo
assentamento nas terras, asua participação política. No aspecto espacial,
39
Heloisa BERGAMASCHI In E. R. ALVES & L. G. GIRON. Caxias do Sul: homem, tempo, espaço -
subsídios. p. 79.
40
Id., Ibid., p. 80.
41
Loraine S. GIRON In E.R. ALVES & L.S. GIRON. Caxias do Sul: homem, tempo, espaço - subsídios. p.
70.
39
foram colocados nos travessões "Tirolês" e "Trentino", permanecendo em sua
maioria na zona rural. Foram raros, também, os elementos austríacos que
participaram das lutas políticas locais.
43
Diferentemente, o grupo maçom organizou-se no ano de 1887,
agrupando luso-brasileiros e imigrantes italianos que fundaram a loja "Força e
Fraternidade".
Os fundadores desta loja foram Cristiano Horn grau 30 (doravante
gr.: 30.) Venerável; Benjamim Cortes Rodrigues - gr.:3. Vigilante; Felice
Gavioli - gr.:3. Vigilante; José Domingos D'Almeida - gr.: 18. Orador; Rodolfo
Felice Laner - gr.: 17. Secretário; Angelo Chittolina - gr.: 3. Tesoureiro; Antonio
Pieruccini- gr.:3; Alexandre Canali - gr.:3.
44
Esta loja permaneceu em atividade até o ano de 1903, quando foi
fechada por existirem desavenças internas. Não encontramos documentação
que explicitasse quais foram as desavenças, porém uma análise a luz dos fatos
sugere uma hipótese: a diferença de postura entre carbonários e maçons,
integrantes dessa Loja seria o motivo das desavenças. Não abordaremos essa
questão por não se constituir objetivo deste trabalho.
Para os imigrantes católicos, ambos os termos - carbonário e
maçom - apontavam para sociedades secretas que haviam lutado contra o
Papa, na Península Itálica, e usurpado os Estados Pontifícios em nome da
unificação.
45
As diferentes posturas filosóficas, em um primeiro momento, não
impediram maçons e carbonários de participarem ativa e conjuntamente da vida
política de Caxias. No ano de 1895, foi nomeado como intendente o maçom
42
L. S. GIRON In E.A. ALVES & L.S. GIRON. Caxias do Sul: homem, tempo, espaço - susídios. p. 70.
43
Id., Ibid., p. 79.
44
E. A. VASQUES & O.D.B. DUTRA. Maçonaria em Caxias do Sul. p. 17.
45
“Havia grandes afinidades entre a Maçonaria e o Carbonarismo, no tocante aos objetivos. As duas
Instituições lutavam pela Liberdade do Homem contra os agressores. Liberdade, Igualdade e Fraternidade,
lema da Maçonaria, foi adotado pelos carbonários. Aquelas três palavras sintetizavam um programa de
dignificação do Homem. Distinguiam-se pelos processos seguidos, pelo sistema de ação. A Maçonaria
preferia e prefere persuadir mas sempre de acordo com seu princípio de tolerância (...). A Carbonária era
intolerante, utilizava-se de métodos violentos, procurando atingir mais rapidamente o seu objetivo. A luta
pela Liberdade sagrada, pelo direito, livre de pensamento aproximou os maçons e carbonários e explica o
fato de muitos elementos da Carbonária terem ingressado na Maçonaria e vice-versa”. A. Tenório
D’ALBUQUERQUE. Sociedades secretas - as suas organizações, os seus mistérios, os seus objetivos. p.
116-117.
40
José Cândido Campos Júnior, motivo que gerou veemente descontentamento
entre os italianos católicos.
Dentre os fundadores da loja, o italiano Angelo Chittolina, em
1890, foi nomeado pelo presidente do estado, para compor a primeira Junta
Governativa. José Domingos D'Almeida, natural de Taquari, outro fundador, fez
parte do primeiro Conselho, ocupando cargo de secretário. Ele foi o redator de
todo o ante-projeto da 1ª Lei Orgânica do nascente município. Benjamim Cortes
Rodrigues, uruguaio naturalizado brasileiro, membro fundador da loja, também
integrava aquele primeiro Conselho Municipal.
Durante os dezesseis anos de atividades da Loja maçônica
" ... o
governo republicano designa para cargos político-administrativos, irmãos dessa loja,
...".
46
Apresentamos dois quadros a seguir. O primeiro com o número de
Conselheiros Municipais , destacando os vinculados à Maçonaria. O segundo,
mostrando os intendentes, e sua identificação com a Maçonaria.
Quadro 1
Integrantes do Conselho Muncipal de Caxias do Sul 1890 - 1928
Conselheiros Período Partido
político
Maçonaria
Ernesto Marsiaj 1890-1892
1892-1896
PRR maçom
Hugo Luciano Ronca 1890-1892
1892-1896
1900-1904
Romano Lunardi 1890-1892
1892-1896
Agapito Conz 1890-1892
1892-1896
Salvador Sartori 1890-1892
1892-1896
Angelo Chitolina 1890-1892
1892-1896
maçom
Benjamim C. Rodrigues 1890-1904 maçom
José Domingos de Almeida 1890-1892 PRR maçom
Maurício Nunes de Almeida 1896-1900 maçom
Arcádio Pezzi 1896-1900
Cincinato D’Ávila 1896-1900
1904-1907
Francisco Bonato 1896-1900
1900-1904
maçom
Vitório Panarari 1896-1900 maçom
Antonio de Oliveira Santos 1900-1904 PRR maçom
46
E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. A Maçonaria em Caxias do Sul. p. 15.
41
Jacinto Raymundo da Silva
Flores
1900-1904
Miguel Muratore 1900-1904
1912-1916
1916-1920
1920-1924
maçom
Tancredo Appio Feijó 1896-1900
1900-1904
1908-1910
Antônio José Ribeiro Mendes 1900-1904
Luiz Pieruccini 1904-1907 maçom
Mansueto Pezzi 1904-1907
1912-1920
Antonio Moro 1904-1907 maçom
Caetano Boscato 1904-1907
Francisco Mascarello 1904-1907
Marco Torelli 1904-1907
Antonio Azambuja Kroef 1906-1907 maçom
Martim Francisco Ayres 1906-1907
Antonio Giuriolo 1906-1912
André Fossati 1906-1907
Jacinto Tonge 1906-1907 maçom
Aristides Germani 1906-1907
1920-1924
Antonio de Oliveira Santos 1908-1910
Angelo Antonello 1908-1910
1910-1912
1924-1928
Caetano Belincanta 1908-1910
1910-1912
Antonio Pieruccini 1908-1910
1910-1912
1924-1928
maçom
Adelino Sassi 1908-1910
1910-1912
1916-1920
1920-1924
maçom
Henrique Moro 1912-1916
1916-1920
João Luiz Guedes 1912-1916
Orestes Manfro 1912-1916
1924-1928
Benedeto Bigarella 1912-1916
João José Rosa 1912-1916
1916-1920
Samuel Alovisi 1916-1920
1920-1924
João Crisóstomo Teixeira
Gonçalves
1916-1920
1920-1924
Alfredo da Silva Carvalho 1920-1924
Henrique Saldanha Figueiredo 1920-1924
Saverio Defelippis 1923-1924
José D’Arrigo 1923-1924
João Francisco da Rosa 1923-1924
Ruffino Inácio Bezerra 1924-1928
Armando Antunes 1924-1928
Angelo De Carli 1924-1928
Leonel Mosele 1924-1928
Fontes: Depoimento de Hermes Dip.
VASQUES, E. A. & DUTRA, O.D.B.. A Maçonaria em Caxias do Sul. monografia. 1981.
42
Boletim Informativo do Museu e Arquivo Histórico Municipal - Ocorrências. Caxias do Sul,
n. 09, dez., 1988.
Relatórios apresentados ao Conselho Municipal pelos Intendentes Municipais. Caxias do Sul,
1904-1928.
GARDELIN, Mário. Caxias do Sul: Câmara de Vereadores 1892-1950. Porto Alegre: EST, 1993.
Neste quadro temos um total de cinqüenta e um nomes.
Identificamos trinta sobrenomes italianos, dezessete luso-brasileiros e com
relação aos quatro restantes não possuímos comprovação documental da
origem de seus sobrenomes. O número de sobrenomes italianos corresponde a
58,82%, os luso--brasileiros a 33,33% e os não identificados a 7,85%.
De um lado, o expressivo número de sobrenomes italianos pode
significar uma estratégia do PRR de acomodação da situação vigente, pois mais
da metade dos conselhos era formada por eles . De outro lado, a dependência
dos Conselhos Municipais com relação aos Intendentes, e destes com as
diretrizes do PRR estadual, impediam qualquer tomada de decisão por parte dos
políticos caxienses. " As decisões do conselho eram estruturadas pelo intendente e
pelo Partido Republicano Riograndense, que estava no poder.”
47
Daquele total de Conselheiros Municipais, identificamos quinze
como pertencentes à sociedade maçônica, o que representa um percentual de
29%, ou quase 1/3 dos membros dos Conselhos no período em estudo.
Esse percentual torna-se expressivo se pensarmos que, no
período de maior concentração de conselheiros maçons, 1890 a 1904, este
grupo consolida, no município, a primeira Lei Orgânica que terá vigência até
1934, sofrendo uma reformulação em 1902, no que diz respeito aos Arts. ,
e , que falavam, respectivamente, da repartição da Intendência e das
atribuições do secretário municipal e do contínuo. A Lei Orgânica "... foi revista,
alterada e modificada pelo Governo do Estado, conforme se no Decreto 484, de
26.4.1902.”
48
Uma outra alteração ocorre no ano de 1914, e atingiu os artigos ,
, 9º, 10º, 1, 48º, 49º e 50º. As alterações referem-se às responsabilidades
47
Mário GARDELIN. Caxias do Sul: Câmara de Vereadores 1892-1950. p. 32.
48
Mário GARDELIM. Caxias do Sul: Câmara de Vereadores 1892-1950. p. 5.
43
do intendente, a não reeleição deste para o quadriênio subseqüente e às formas
de substituição no caso do seu impedimento.
Quadro 2
Relação dos Intendentes Municipais de Caxias do Sul
1890 -1928
* Membros nomeados da Junta Governativa instalada após a emancipação do município em 1892.
Fontes: Depoimento de Hermes Dip.
E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. A Maçonaria em Caxias do Sul. Monografia. 1981.
Boletim Informativo do Museu e Arquivo Histórico Municipal - Ocorrências. Caxias do Sul, n. 9, dez., 1988.
Relatórios apresentados ao Conselho Municipal pelos Intendentes Municipais. Caxias do Sul, 1904 -1928.
GARDELIN, Mario. Caxias do Sul: Câmara de Vereadores 1892-1950. Porto Alegre: EST, 1993
.
Nesse quadro, de 15 períodos governativos apresentados, 13 o
administrados por luso-brasileiros, representando 86,66% de predomínio. O
cargo de intendente permanece nas mãos da Maçonaria de 1894 a 1902,
período anteriormente analisado.
A corrente formada pelos italianos católicos, das três citadas,
era a mais numerosa e ressentia-se pelo fato de, politicamente, ocupar cargos
secundários, como nos mostram, parcialmente, os quadros já apresentados.
Os cargos da intendência destinados aos italianos católicos eram
de sub-intendentes, inspetores, fiscais, zeladores de estradas e cemitérios,
Intendentes Muncipais Período Partido político Maçonaria
* Angelo Chitolina 1890-1892 PRR
* Ernesto Marsiaj 1890-1892
* Salvador Sartori 1890-1892
Antonio Xavier da Luz 1892-1894
José Domingos de Almeida 1894-1895 PRR (nomeado) maçom
Alorino Machado de Lucena 1895 PRR (nomeado) maçom
José Cândido de Campos Jr. 1895-1896
1896-1900
1900-1902
PRR (nomeado)
PRR (eleito)
PRR (eleito)
maçom
Dr. Alfredo Soares de Abreu 1900-1902
1902-1904
PRR (nomeado)
PRR (eleito)
Firmino Paim de Souza 1904 PRR (nomeado)
Serafim Terra 1904-1907 PRR (eleito)
Vicente Rovêa 1907-1908
1908-1910
PRR (nomeado)
PRR (leito)
Cel. Tancredo Appio Feijó 1910-1912 PRR ( vice em
exercício)
Cel. José Penna de Moraes 1912-1916
1916-1920
1920-1924
PRR (eleito)
Ten. Hercules Galló 1914-1915 PRR (vice em
exercício)
Major José Batista 1915 PRR (nomeado)
Adaucto Cruz 1918 PRR (vice em
exercício)
Celeste Gobbato 1924-1928
44
auxiliares de obras públicas, cobradores de impostos e ajudantes. As funções
eram desempenhadas no próprio travessão (zona rural) concomitantemente à
atividade econômica desenvolvida pelo imigrante.
Construímos uma listagem de funcionários da Intendência, a partir
de informações fornecidas pelos relatórios dos intendentes, livro de funcionários
e livro de impostos. Dela obtivemos as seguintes informações: de um total de
novecentos e sessenta e nove cargos listados a partir das fontes, 85,03% foram
ocupados por italianos. Os demais 14,96% foram ocupados por luso-brasileiros,
uruguaios e alemães. Com base nessas informações, concluímos que os cargos
secundários da administração tinham suas funções desempenhadas pelos
colonos italianos católicos.
49
Por questões políticas, italianos católicos e maçons , no decorrer
da administração do intendente JoCândido Campos Jr., vivenciaram intensa
crise. Os maçons, mostravam-se voltados ao PRR local e ao governo do
estado. Os italianos católicos, cultivavam ainda dissabores pela perda dos
Estados Pontifícios e, em Caxias, essa corrente continuou a defender o direito
do Papa sobre as regiões pontifícias anexadas pelo Reino da Itália.
Por outro lado, face à forte atuação maçônica local, a Igreja, pelo
seu plano de romanização, não poderia perder seu espaço em Caxias e -lo
ameaçado por aquela sociedade.
Nesse contexto existente, o Bispado, em 1895, enviou para o
município de Caxias um jovem padre recém-chegado da Europa: Padre
Nosadini. Este funda, na região, os comitatos católicos Santa Tereza e o Círculo
São Luiz Gonzaga de Juventude Católica. Ambos expandiram-se em muito
pouco tempo, pelas várias linhas e léguas, demonstrando seu antagonismo à
Maçonaria, através de manifestações públicas.
A situação de instabilidade política local manteve-se até o ano de
1902, quando o PRR estadual posicionou-se, retirando da intendência Campos
Júnior. A loja maçônica foi fechada no ano seguinte.
49
A listagem elaborada não foi anexada ao trabalho devido à grande extensão (969 nomes). A mesma
será repassada ao Arquivo Histórico Municipal de Caxias do Sul, onde poderá ser consultada.
45
Com a demissão de Campos Júnior, assumiu o vice, Vicente
Rovea, imigrante italiano. A seguir os lusos retornaram à intendência, até o ano
de 1924.
As articulações políticas posteriores terão nos italianos católicos e
na Igreja os personagens principais do movimento pela superação do domínio
luso e pela quebra de sua eficácia organizativa , com vistas ao poder local.
Nesse processo o privilegiamos a participação dos austríacos,
pois, apesar de elemento constitutivo do mesmo, há falta de dados sobre este
fato, a o momento. A busca dessas informações certamente poderá render
uma pesquisa específica, no futuro.
1 . 9 A Co l ô n i a C a x i a s : o i m b r i c a m e n t o d a n e c e s s i d a d e
p o l í t i c a c o m o c l i m a d e c r i s t a n d a d e
A Colônia Santa Tereza de Caxias evidenciou, nos seus
primeiros tempos, uma falta de homogeneidade política entre os seus membros.
A ausência de unidade não foi tão somente política. No campo religioso, a
atuação
do clero, a exemplo dos elementos atuantes no segmento político
partidário, era condicionada pelos interesses e necessidades momentâneos. O
mau comportamento de alguns padres provocava preocupações e pressões da
Igreja estadual, ratificando, também, nessa área a falta de homogeneidade.
Ofícios como o que encontramos no livro Conheça-me por dentro,
de nº 37, e data de 05 de fevereiro de 1881, registra a intimação que o
engenheiro chefe e diretor da Colônia fez ao Padre Antonio Passagi para que o
mesmo se retirasse em 24 horas. O referido padre havia sido suspenso das
ordens eclesiásticas, pelo Bispo Diocesano, considerando queixas de desordem
e habitual estado de embriaguez.
A desordem na hierarquia eclesial podia não ser somente pelos
motivos apresentados. Como registra o ofício 430 do referido livro: a diretoria
da Colônia comunicava ao Bispo da Diocese da Província a desavença
46
existente entre o Padre Agostinho Mangom (dito capelão da Colônia) e o Padre
Luiz Centini, capelão da 3ª, 4ª, 5ª e léguas. Existia uma única Igreja na sede
e deveria ser utilizada por esses dois padres. Em ofício de 27 de julho de 1884,
passados dois anos, conforme o documento de 118-B, o mesmo padre Luiz
Centini continuava a promover discórdias, desta vez com o Padre Pasquali
Matteu e ex-colonos.
Como se não bastassem as difíceis condições do lugar,
encontradas pelos imigrantes italianos, praticar as obrigações religiosas era
sinônimo de enfrentar vaidades pessoais, antigos conflitos trazidos das regiões
italianas, a falta de preparo de alguns religiosos e ainda presenciar a disputa
pelo dinheiro arrecadado, através de uma espécie de loteria (a qual não é
definida na documentação consultada), entre a comissão de construção da
igreja e um grupo de negociantes que desejava dispor do dinheiro como melhor
entendesse.
50
Entre os antigos conflitos regionais, que aqui tiveram continuidade,
se fez presente o difícil relacionamento da Igreja com as sociedades secretas.
No ano de 1889,
"... carbonários quiseram celebrar o 20º aniversário da tomada dos
Estados Pontifícios (1869-1889), prepararam morteiros e um canhão a
fim de celebrar a data com tiros e muita alegria, Padre Henrique Vieter,
ficou sabendo e com a cooperação de pessoas fiéis às suas ordens,
frustraram a festa.
51
Após o estabelecimento do governo republicano e da separação
Igreja-Estado, com a necessidade de buscar recursos materiais próprios, e não
mais do governo, a Igreja faz chegar aa Colônia Caxias os indícios da política
de romanização. D. Cláudio José Ponce de Leão faz a primeira visita pastoral à
colônia italiana. Era 1892, e entre as determinações que deixou, ao constatar a
situação local, encontra-se:
" - Recomenda mansidão e não violência; - Proíbe todo e qualquer
sacerdote envolver-se em política ou fazer qualquer propaganda, do
50
Ofício n. 55-B de 23 de novembro de 1885. Conheça-me por dentro. p. 105.
51
Ernesto A. BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 27.
47
púlpito ou através de cartazes, visando conseguir benefícios para a
Igreja; - Reclama da necessidade de uma boa e mais decente Igreja
matriz; - Reclama contra o mau estado do cemitério e da Capela do
mesmo. Crisma 1995 pessoas e distribui a sagrada comunhão a mais de
mil pessoas.”
52
As observações do Bispo com relação a não violência e à
proibição dos sacerdotes de se envolverem em política ratificam os conflitos
existentes na comunidade, quer com os carbonários e maçons, que tendiam a
crescer em mero de adeptos com as idéias positivistas, ganhando campo no
governo republicano, quer entre os próprios sacerdotes que disputavam
liderança nas comunidades.
Construir e manter uma igreja passou a ser responsabilidade da
instituição e era necessário mostrar que a Igreja eram todos os católicos,
portanto a responsabilidade de construí-la era da comunidade. O cemitério havia
passado à tutela da administração municipal. Configurava-se aí uma dura crítica
a ela face às condições em que o cemitério se encontrava.
O alto mero de membros que receberam a crisma e a sagrada
comunhão demonstram o esforço de D. Cláudio José Ponce de Leão, através
da operacionalização dos princípios da romanização, em promover na região o
tão desejado clima de cristandade. Em sua segunda visita pastoral, ocorrida em
1900, realizou a benção da nova igreja, formalizando a recomendação deixada
oito anos antes e demonstrando que os objetivos da Sé Romana estavam sendo
desenvolvidos pelos católicos. As visitas pastorais prosseguiram com as
presenças de Mons. Pimenta, em 1911, e Mons. D. João Becker, em 1914,
1918 e 1924.
Se as visitas pastorais amealhavam almas e promoviam simpatias
entre os católicos, as associações católicas leigas conhecidas como "comitatos"
e círculos católicos ganhavam impulso com a presença de padres italianos na
paróquia local.
Em 1893, Padre Nosadini, então Vigário, fundou diversos comitês
católicos, pulverizados na zona rural do município. Em quase todas as léguas
52
Id., Ibid., p. 29.
48
surgia um comitê católico: Santo Antônio (7ª légua); Nossa Sra. das Neves (9ª
Légua); Círculo S. Tarcísio (São Marcos da Linha Feijó) e na sede, Santa
Teresa, o Círculo São Luis Gonzaga, para os jovens.
O objetivo do Padre Nosadini ao fundá-los era quebrar a influência
da Maçonaria local, o que desencadeou lutas e atentados entre os grupos.
Nesse episódio, o espírito político positivista, que predominava no grupo
maçônico e na administração municipal, foi colocado em um dos lados e, de
outro lado, ficou a Igreja, com sua tentativa de europeização e romanização da
sociedade.
53
O Padre Nosadini, preparado para atuar conforme as diretrizes da
Romana, iniciou em 1898 a publicação de um boletim mensal intitulado " Il
Colono Italiano". Sua publicação era feita na língua italiana e tinha como
objetivo defender os interesses dos colonos italianos. Fazia oposição ao jornal
"O Caxiense", de propriedade do intendente local, Campos Junior.
54
A imprensa católica local sofre um recesso motivado pela saída do
Padre Nosadini. Em 1909, a publicação do jornal " La Libertà", fundado pelo
Padre Carmine Fasulo, põe fim ao recesso. Em sua primeira publicação, no dia
13 de fevereiro, na primeira página lia-se a filosofia pretendida pela Igreja, para
o jornal:
" Jornal semanal e de índole essencialmente católica, apostólica,
romana, será papal no mais estrito senso da palavra. Nós não
saberíamos conceber um jornal católico sem que seja papal. Para um
verdadeiro católico, depois de Deus, o Papa é tudo.”
55
Nesses tempos, a Igreja ainda deixava transparecer suas
insatisfações com a situação ocorrida Pós-República. A autoridade do Papa era
concebida publicamente como acima da autoridade dos governantes
republicanos.
53
Este episódio, pela sua importância, será analisado no Capítulo II, uma vez que, estabelecidas as
relações, veremos caracterizada a primeira fase de atuação política da Igreja local.
54
Ernesto A. BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 31.
55
O Jornal La Libertá, publicou em língua italiana o que segue:
“Jornale settimanale e d’índole prettamente ed essecialmente cattolico, apostolico, romano, sará papale
nel piú streto senso della parola. Noi non sappiamo concepire un gionale cattolico, senza che sia papale.
Per un vero cattolico, dopo Dio, il Papa é tuto.” La Libertá. Garibaldi, 13 fev. 1909. p. 1.
49
Se anteriormente houve a criação dos comitês católicos que, "...
além de fazer surgir líderes no campo religioso e civil, constituiu verdadeiras
comunidades eclesiais de base, unindo os católicos contra a perseguição maçônica"
56
,
entre os anos de 1911 e 1913, foram criadas novas associações. Nesse
momento, o combate ao perigo maçônico não era o principal objetivo. O
essencial estava no preparo das lideranças religiosas e civis que se formariam
no interior de associações como o Apostolado da Oração, o Recreio Dante e
Damas de Caridade.
57
Se no primeiro momento os comitês foram instalados nas léguas
(zona rural), agora as associações criadas e coordenadas pelo Mons. João
Meneguzzi, membro do clero secular, cuidadosamente escolhido para dirigir os
caminhos da romanização local,
atingiam a população urbana.
Além de envolver os principais membros da comunidade
municipal, quer homens, mulheres ou jovens, pois para cada um existia uma
associação católica específica para atendê-los, fez demonstrar também que
havia chegado o momento de intensificar as relações políticas da sua instituição
com o poder de mando republicano local.
A construção da nova canônica foi uma de suas demonstrações,
pois, à medida que Mons. João Meneguzzi atendia aos princípios da política de
estadualização, também munia o clero da paróquia central de um elegante
palacete, visto que:
" O empenho de dotar cada diocese de um prédio luxuoso para servir
como residência episcopal prendia-se à tradição romanizante que
concebia política e simbolicamente a posição de bispo como chefe
supremo da igreja local e representante encarnado da figura do papa.
Após a ruptura entre Igreja e Estado, era preciso edificar um espaço
arquitetônico ajustado às pretensões de influência política e espiritual de
que estavam imbuídos os integrantes da primeira geração de prelados
nomeados pós-separação."
58
O crescente desenvolvimento do município instigava a Igreja a
investir na sociedade local. O governo do estado, em 1922 , também voltou seus
56
Ernesto A. BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 33.
57
Essas três associações serão analisadas no Capítulo II, pela responsabilidade que tiveram no processo
de aquisição do poder administrativo municipal e por evidenciarem uma mudança na postura da Igreja.
50
olhares para a região dos colonos italianos católicos. A intendência local,
tradicionalmente, possuía vínculos com o Partido Republicano Riograndense e
na campanha eleitoral para Presidente da Província, desse ano, a disputa
exaltou os ânimos dos colonos, principalmente, quando não lhes foram
entregues os títulos de eleitor.
Padre Ernesto Brandalise externou sua opinião sobre a razão
dessa omissão:
"O situacionismo empregou todas as fraudes imagináveis para a quinta
reeleição. Não eram entregues os títulos de eleitor aos da oposição. ... .
Os da oposição resolveram ir até o Comitê Pró Assis. De dirigiram-se,
novamente, para a Intendência (Prefeitura), de chicote na mão, pois
grande número era de colonos, para reclamar o Título que não lhes era
entregue.”
59
O enfrentamento político, ocorrido durante as eleições para
presidência da Província, entre o intendente Coronel Penna de Moraes e os
colonos que reclamavam a falta de seus títulos eleitorais, teve na figura do
Mons. João Meneguzzi um pretendente a intermediador e apaziguador. O
mesmo foi barrado às portas da intendência pela Brigada, quando pretendia
obter justificativas do intendente, pela falta dos títulos.
60
Na ocasião, não houve
disponibilidade para o diálogo, por parte do intendente, tendo o vigário que
dispersar a multidão, a fim de evitar embaraços e enfrentamentos entre as
autoridades civil, eclesiástica e os colonos.
A controvertida atitude do vigário ia de encontro a posição
assumida por D. João Becker, Bispo diocesano, pois o mesmo havia-se
declarado "simpático" à candidatura de Borges de Medeiros
61
. Tal fato
demonstra a divergência de postura entre a Igreja estadual e a local.
As eleições finalizam com a vitória de Dr. Borges de Medeiros para
o governo do estado, porém a religião católica ficou marcada, na região colonial,
pela propaganda durante a campanha, na qual assisistas acusavam os
borgistas de serem inimigos da religião católica. Inimigos pelo fato de serem
58
Sergio MICELI. A elite eclesiástica brasileira. p. 142-143.
59
Ernesto A. BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 45.
60
Ernesto BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 45.
61
A Resistência. Caxias do Sul, 22 nov. 1922. p. 4.
51
positivistas, portanto, incompatíveis. A propaganda foi de grande peso entre os
colonos italianos, em sua grande maioria, confessadamente católicos.
Passados dois anos, em 1924, foi promovida a campanha eleitoral
municipal. Desta vez, Dr. Borges de Medeiros e o PRR local lançaram mão,
pela primeira vez, de um candidato italiano ao governo municipal.
A imprensa católica apoiava o candidato e, na tomada de posse
na Intendência de Caxias, publicou:
"... o nosso Staffetta saúda no ilustre personagem Dr. Celeste Gobbato o
grande intendente da paz, da prosperidade e do verdadeiro progresso
deste nobre município de Caxias, a pérola das Colônias Italianas. Ele
será certamente o homem providencial tendo sido sempre muito amigo
dos agricultores e muito dedicado à agricultura.”
62
O intendente parecia ser o legítimo representante da sociedade
que havia se formado com a imigração italiana. E, embora ele o fosse
radicado no município, o fato de ser um italiano com estreitos vínculos com a
atividade agrícola, tornou a sua indicação necessária para atender aos
interesses da Igreja local, dos italianos católicos e do PRR estadual.
Para os deserdados da nação italiana e excluídos das decisões e
barganhas políticas do situacionismo estadual, o progresso econômico do
município trazia possibilidade de enquadramento no contexto sócio-econômico
do plano de modernização do país. E no plano político seria necessário adotar
estratégias para evitar o fortalecimento oposicionista, liderado por Assis Brasil.
A Igreja havia educado muitos filhos de prósperas famílias de
imigrantes em seus colégios religiosos municipais, durante a última década do
séc. XIX e as duas primeiras do séc. XX. A imprensa católica local havia se
encarregado de publicar as cartas pastorais, definindo para a população normas
e padrões de comportamento e as associações católicas leigas, congregando
cada membro da família (o homem, a mulher, os jovens), haviam formado e
preparado os novos líderes sociais e religiosos.
62
Conforme o texto original:
“... il nostro Staffeta saluta nell’illustre personaggio Dr. Celeste Gobbato il grande intendente della pace,
della prosperie del vero progresso di questo nobile municipio di Caxias, la perla delle Colonie Italiane. El
sará certamente l’uomo provvidenciale essendo sempre stato amicissimo degli agricoltori e molto dedicato
all’agricoltura.” La Staffeta Riograndense. Garibaldi, 22 out. 1924. p. 1.
52
Portanto, a sociedade local encontrava-se essencialmente
"romanizada" e "europeizada", a ponto de incluir, além dos membros da
sociedade civil preparados, membros da própria hierarquia eclesiástica, na
primeira e efetiva experiência italiana de poder local.
53
C a p í t u l o I I
U m P r o c e s s o e m D u a s F a s e s
54
I I - U m P r o c e s s o e m D u a s F a s e s
Neste capítulo discutiremos nossa segunda hipótese, que vem a
ser: no período de 1890 a 1924, a Igreja católica intensifica relações com o
grupo de imigrantes italianos católicos, através da ativa atuação das
associações católicas, para preparar lideranças na sociedade civil. Essas
lideranças formariam o grupo social que deteria o poder governativo a partir
1924.
Para desenvolvermos esta hipótese, o capítulo terá por objetivo:
(a) apresentar a versão do positivismo castilhista e sua atuação em Caxias,
versão essa geradora de descontentamentos em alguns grupos da sociedade
caxiense; (b) analisar os conflitos travados entre clero, maçons e italianos
católicos; as relações Igreja x Maçonaria; o caso Padre Nosadini e sua expulsão
da Colônia; o fechamento da Loja maçônica; o papel desempenhado por
Monsenhor João Meneguzzi e as associações católicas por ele organizadas.
2 . 1 A e x t e n s ã o d o P R R e m C a x i a s
A versão castilhista do positivismo como ideologia partidária para a
sociedade rio-grandense demonstrou em sua aplicação: a burocratização do
PRR; uma forte centralização, manifesta a partir da figura de Castilhos ; e a
55
constante valorização da perfeição da ordem constitucional, à qual atribuíam o
progresso e a ordem vigentes no estado.
1
A falta de alternância no poder também imprimiu uma das
características dessa versão, o que a tornava extremamente autoritária.
Contribuía para essa postura, também, a ausência de divisão dos poderes na
administração blica, centralizando-os, assim, nas mãos do Presidente do
Estado.
A submissão do indivíduo ao Estado, como forma de garantir a
ordem e o progresso, atribuíram ao Estado conotação de Estado anti-liberal .
Essa seria a forma de organizar a sociedade de maneira impessoal e de levar a
termo o objetivo de regeneração da sociedade através de uma política
moralizadora.
2
Em 1891, em Caxias, foi redigida e aprovada a
primeira Lei Orgânica Municipal, seguindo as diretrizes da Constituição Estadual
do mesmo ano. Pela Lei Orgânica, ficara definido o território do município de
Caxias, as atribuições e responsabilidades do intendente e sub-intendentes,
assim como do Conselho Municipal.
Somente dois anos depois, em 1894, é que ficou estabelecida a
Lei Eleitoral, qualificando os candidatos e eleitores, que deveriam ser cidadãos
brasileiros, maiores de 21 anos e alfabetizados. Para os candidatos a cargos
municipais, exigia-se, além da cidadania brasileira, idade mínima de 25 anos e
residência no município há mais de um ano.
3
Pela Lei Eleitoral estabelecida, ficava difícil o preenchimento dos
cargos municipais por italianos e seus descendentes. Desta forma, até a metade
da década de 20, os intendentes foram quase todos de origem lusa, salvo
exceções ocorridas por rápidas substituições de vice-intendentes de origem
italiana.
1
Artur C. ISAIA. O cajado da ordem - catolicismo e projeto político no Rio Grande do Sul: D. João Becker
e o autoritarismo. p. 90-96.
2
Id., Ibid.,. p. 92.
3
A. CAVAGNOLLI & Mari T.A. MIORELLI. Boletim Informativo do Museu e Arquivo Histórico Municipal -
Ocorrências. Caxias do Sul, n. 8, dez., 1988.
56
As indicações dos lusos estavam ligadas ao controle centralizador
exercido pelo PRR estadual, mantendo como intendentes os correligionários
que fizeram de Caxias um de seus redutos até a década de 30.
Até as eleições de 1924, os italianos participaram do Conselho
Municipal e dividiram com os lusos, os cargos dessa instituição. Porém, essa
participação era cerceada pelas relações da política castilhista, e,
posteriormente, borgista, na qual o eram tidos como prioridade municípios de
colonização italiana. Por outro lado:
" A razão do controle restrito sobre os 11 municípios coloniais parece
situar-se no relacionamento dos colonos para com o governo estadual e
na sua falta de integração dentro da cultura brasileira. O domínio
imperfeito da língua portuguesa bastava para tolher a mobilização política
fora do partido ‘oficial'.”
4
Os Conselhos Municipais o possuíam poder de mando ou
decisão, uma vez que a Constituição do estado dava ao seu presidente todo o
poder de legislar e, se conveniente fosse, substituir intendentes, exercendo
controle direto sobre as localidades.
Em Caxias, com a política articuladora do PRR estadual, os
sobrenomes lusos mantinham-se nos cargos da intendência. Com freqüência,
os membros vinculados ao PRR indicados para o cargo de intendente, ou ainda,
para ocupar uma vaga no Conselho Municipal, eram, também, maçons.
Nos primeiros anos da administração republicana em Caxias, a
participação dos maçons ganhou considerável espaço, seguindo uma tendência
da qual:
"... o Marechal Deodoro, chefe da nação, sendo maçom, houve por bem
colocar em postos-chaves da nova administração política, econômica e
social, irmãos da mesma filosofia ...".
5
Não fôra difícil para Caxias organizar um quadro republicano em
consonância com os quadros estadual e nacional, vigentes no período. Embora
a situação fosse de conformidade entre as estruturas políticas e díspares no
que se referia às prioridade de atendimento, o município, reiteradas vezes,
4
Joseph LOVE. O regionalismo gaúcho. p. 143.
57
necessitava organizar comissões para negociar diretamente com o governo do
estado.
Em março de 1898, uma dessas comissões, nomeada pelo
intendente municipal, José Cândido de Campos Jr., e integrada por Edmundo
Gonçalves de Carvalho, João Antunes de Cunha Netto e Jo Domingos de
Almeida, representou o "povo" de Caxias na posse de Borges de Medeiros. Ao
presidente do estado afirmaram
“... que não lhe faltaria o apoio do povo caxiense.
O presidente salientou reconhecer o merecimento da região colonial e
que, pela votação recebida em 25 de novembro último, percebeu como é
arraigado o sentimento republicano dos caxienses, ao mesmo tempo em
que se compromete a levar adiante o trabalho iniciado por seu
antecessor, Julio de Castilhos.”
6
Na troca de favores entre as comissões e os líderes do PRR, os
caxienses engajavam-se no sistema de cooptação, como nas demais regiões
do estado. A cooptação, em nível municipal, era feita através dos mecanismos
utilizados pelo aparato ideológico, sendo exemplo disso discursos, cerimônias
de homenagens políticas, elogios, inaugurações de retratos, entre outros.
No Jornal O Cosmopolita de 15/11/1902, uma nota publicada diz :
" ... Tenente Coronel Germano Parolini, oferecerá uma magnífica festa a
seus amigos que vierem votar na eleição do dia 25, para a reeleição do
dr. Borges de Medeiros.”
7
O elogio a Borges era dado por escrito, e em língua italiana para
que todo o povo pudesse compreendê-lo. O elogio vinha mesmo quando o
candidato indicado para as eleições municipais era de descendência lusa, o
candidato Serafim Terra .
A nota da imprensa publicava :
"O dr. B. de Medeiros não podia designar pessoa mais adequada para o
cargo de intendente de Caxias, nesta vila que necessita de um dirigente
que realize todas as suas reais necessidades. O sufrágio de todos os
habitantes de Caxias será a verdadeira prova da grande estima, e das
esperanças depositadas no novo intendente.
5
E. VASQUES & O.D.B. DUTRA . Maçonaria em Caxias. p. 15.
6
O Caxiense. Caxias, 15 mar. 1898. p. 1.
7
O Cosmopolita. Caxias, 15 nov. 1902. . p. 1.
58
Não é um sonho político, mas é um dever administrativo que cada
habitante de Caxias vote para o dr. Serafim Terra.”
8
À medida que o PRR cristaliza-se no poder local, as simpatias e os
ideais de progresso tomavam corpo junto a uma camada da sociedade civil,
cujos interesses eram atendidos, mesmo que de forma morosa. Uma outra parte
da sociedade civil solicitava, aos administradores, uma maior atenção com
relação aos mais pobres e pedia também que suas intenções não fossem
apenas com os graúdos.
9
Os descontentes com os planos regidos pelo Partido Republicano
Riograndense consideravam os chefes locais meras figuras decorativas, que, a
exemplo dos conselhos municipais , não governavam, obedeciam .
Outros grupos da economia local revelavam seus
descontentamentos, quando atingidos por atitudes como a do intendente, de
indeferir os requerimentos dos exportadores de vinho, que pretendiam a
liberação de multas contraídas.
10
Os grupos alijados das barganhas do PRR encontraram campo
favorável para manifestarem seus descontentamentos, por ocasião das eleições
estaduais de 1922. Na disputa entre Borges e Assis Brasil, uma parte da
sociedade civil de Caxias manifestou-se pró-Assis, engrossando o caldo da
oposição emergente. No município houve situações perturbadoras, levando a
Intendência a qualificar o povo de “ingrato”.
Pouco tempo depois, na tentativa de reverter o contexto
oposicionista instalado no município, ao realizarem-se as eleições municipais, o
PRR faculta a candidatura de um elemento italiano, para concorrer ao pleito e
assumir as diretrizes republicanas, velha aspiração do grupo de italianos
católicos.
8
No jornal, a matéria foi publicada em língua italiana, como segue: “Il dott. B. de Medeiros non poteva
designare persona piú adatta per l’ufficio d’intendente di Caxias, in questa villa che necessita di aver un
capo che provveda a tutti i suoi reali bisogni. Il suffragio di tutti gli abitanti di Caxias sará prova palese della
grande stima, e delle sperranze riposte nel nuovo intendente.
Non è un sogno politico, ma è un dovere ammistrativo che ogni abitante di caxias ha di votare per il dott.
S. Terra”. O Cosmopolita. Caxias, 12 ago. 1904. p. 2.
9
Il colono Italiano. Garibaldi, 03 fev. 1912. p. 2.
10
O Cosmopolita. Caxias, 20 set. 1904. p. 2.
59
Para o grupo de maçons, imbuídos do espírito republicano, as
possibilidades políticas mantiveram-se até 1903, momento em que a Loja
Maçônica foi fechada. Esse período foi concomitante à implantação e à
sedimentação da versão castilhista para o governo estadual, cujo discurso
privilegiava os objetivos de ordem, progresso, evolução para o estado positivo
da sociedade, bem como a regeneração moral da sociedade.
No município, foi o momento de maiores embates e entraves entre
a administração republicana com influências maçônicas e a facção católica . A
Igreja e também os italianos, ainda descontentes com a perda dos Estados
Pontifícios, viam na administração e nos elementos maçons os inimigos
anticlericais.
Observando o processo político, podemos concluir que a Igreja,
pretendendo estabelecer um clima de cristandade na região colonial, e
encontrando a facção dominante politicamente aliada a elementos maçônicos,
procurou atacar essa presença, enfrentando, conseqüentemente, as
administrações do PRR.
Vemos, assim, que em um mesmo contexto interagiam duas
posturas filosóficas diferentes, ambas buscando ascendência na sociedade
civil. Com relação à filosofia positivista e ao pensamento católico vigentes, Artur
C. Isaia escreve:
"Estado forte, antiliberalismo, política moralizadora, conservadorismo;
essas idéias tão caras ao comtismo, servem de ponto de intersecção
entre dois sistemas de idéias alicerçados em parâmetros opostos:
positivismo e catolicismo. Tanto o contismo quanto sua reinterpretação
castilhista, coincidiam com posições que no terreno político, identificavam
o ideário difundido pela Igreja.”
11
Embora a nível de idéias existisse um ponto de intersecção entre
as duas posições gerenciadoras, a nível prático, em Caxias, o anticlericalismo
dos administradores, visto pelo clero italiano aqui atuante, mobilizou os
imigrantes italianos católicos contra uma administração dependente, sem
11
Artur C. ISAIA. O cajado da ordem - catolicismo e projeto político n Rio Grande do Sul: D. João Becker
e o autoritarismo. p.96-97.
60
poderes decisórios, que, na maioria dos casos, não atendia aos interesses dos
colonos.
A Igreja assumiu parte desse papel político, angariando com isso,
além da efetivação da política de romanização local, um posto de confiança que
lhe conferiu, em um segundo momento político, o papel de formadora de uma
elite representante do grupo de italianos católicos e ela própria, também, passou
a representar esse grupo.
2 . 2 O p r i m e i r o m o m e n t o : e n f r e n t a m e n t o s
O Estado da República Velha, no Rio Grande do Sul, possuía
características positivistas, tais como, a visão harmônica da sociedade, o
autoritarismo, o aparato estatal administrativo burocratizado, o indivíduo
submetido a uma sociedade rígida e hierarquizada. Seu papel era
modernizador, o que se traduzia na tentativa de industrialização, na viabilização
de entrada de capital estrangeiro, na proposta de urbanização e também na
tentativa de facilitar a circulação interna dos produtos gaúchos, através da
encampação de portos e estradas de ferro. Essa modernização auxiliaria na
ultrapassagem da condição secundária, ocupada pelo Rio Grande do sul, com
vistas ao enfrentamento da hegemonia do estado paulista no contexto nacional.
Para a construção da hegemonia rio-grandense, a região de
colonização italiana foi uma base pela sua dinamização econômica e social,
expressa no modelo vitivinícola e na agricultura diversificada das pequenas e
médias propriedades rurais.
A articulação social foi favorecida pelos elementos da política de
romanização, implementada pela Igreja católica, com o objetivo de retomar o
clima de cristandade em nível local .
Tanto o Partido Republicano Riograndense, quanto a Igreja
católica buscaram sempre a hegemonia dos grupos em Caxias. O PRR cooptou,
61
com seu idela de ordem e progresso, nos primeiros tempos da Colônia, os
membros da Maçonaria, ligados ao incipiente comércio e a algumas profissões
liberais. A Igreja atuou na camada rural dos colonos italianos, através de idéias
que levavam à esperança e à fé em uma vida de conforto espiritual e material,
em contrapartida ao abandono e às dificuldades do reinício pós-imigração.
Desde a fundação da Loja Maçônica, em Caxias, no ano de
1887, os italianos católicos viam o fortalecimento dos membros da sociedade
que se estruturava, principalmente em nível administrativo, ou seja, o poder
decisório estava em mãos anticlericais. Aos olhos da hierarquia eclesial era uma
dupla heresia : uma por serem maçons e outra por empunharem o ideário
positivista.
Embora Leão XIII, nesse período, tenha tentado reverter a postura
da romana, renovando-a com a encíclica Rerum Novarum," A neo-escolástica
permitiu a aliança do catolicismo com o positivismo ... .”
12
Na Colônia, a posição do
clero ainda era a vivenciada no período anterior a Leão XIII. Posição essa de
condenação ao Modernismo, ao Racionalismo e ao Liberalismo.
Frente ao processo em análise e à documentação pesquisada,
podemos dizer que o atraso na postura da Igreja local promoveu o seu
enfrentamento com os membros da Maçonaria em sua maioria, elementos do
PRR atuantes na administração pública.
O PRR, naquele momento, tinha o consenso local, pela
confiança depositada na doutrina positivista. Cabia à hierarquia eclesiástica,
contrária àquela ideologia e àquele poder político-administrativo do PRR,
obstaculizar o processo hegemônico.
Como mencionamos no primeiro capítulo, a fim de reverter esse
quadro, a Igreja transferiu para Caxias um jovem membro de sua hierarquia,
Padre Nosadini. Ele chegou em fins de 1895, e uma de suas primeiras
providências foi a fundação das Sociedades Católicas, também conhecidas
como Comitês ou Comitatos. O objetivo primordial dessas sociedades era
formar líderes nos campos religioso e civil, congregando-os, também, em torno
12
Antonio GRAMSCI. Maquiavel, a política e o estado moderno. p. 340.
62
da luta anti-maçônica. O Padre Nosadini trabalhou ativamente, organizando as
sociedades na zona rural. A Paróquia Santa Tereza sediava um dos Comitês, e
os demais, organizados nas guas, eram considerados seções daquele. Na
presidência de todos estava Padre Nosadini .
Tornou-se uma prática instituir uma pessoa como "padrinho" de
cada seção dos comitês, preferencialmente algum membro de destaque na
comunidade. Na mesma cerimônia em que se instituía o "padrinho", procedia-se
à benção de uma bandeira representativa da seção.
No ano de 1898, os comitês reuniam oitocentos italianos como
associados
13
da Federação Católica Caxias, distribuídos nos seguintes comitês:
Quadro 3
Comitês da Federação Católica Caxias
Comitês e Círculos Légua Padrinho
Comitê Sto. Antonio 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Léguas -------
Comitê S. Giuseppe 9ª Légua -------
Comitê B.V. della Neve - S.
Marco da Linha Feijó e rculo
Tanisio
9ª Légua
-------
Comitê S. Fermo 4ª Légua Germano Parolini
Comitê Sto. Antonio e
B.V. del Caravaggio
6ª Légua
Francisco Meneguzzo
Luigi Michielin
Comitê S. Luigi 6ª Légua Antonio Florian
Comitê S. Ambrósio 6ª Légua Ambrosio Bonalume
Comitê B.V. Monte Bérico ------- Antonio Moro
Comitê B.V. della Salute Légua
G.B. Grossi e Presidente
Giuseppe Andreazza
Comitê Sta. Giustina 9ª Légua -------
Comitê S. Vigilio 6ª Légua -------
Comitê S. Gregorio 5ª Légua -------
Fonte:. Il Colono Italiano. Caxias, 15 jul. 1898. p. 1.
Esses comitês, reunidos sob a liderança da Federação Católica
Caxiense, esclareciam que as sociedades não possuíam nenhum fim oculto e
nem mesmo causariam perigo à ordem pública ou ao governo. Vejamos as
palavras do Padre Nosadini , em sessão solene do dia 14 de outubro:
13
Il Colono Italiano. Caxias, 01 jan. 1898. p. 1-3
63
" Eu, a princípio de tais declarações, tenho somente a dizer que a política
está absolutamente excluída de nossa Sociedade, e que nós, italianos
católicos que as compomos, faremos voto para o bem-estar e a
prosperidade do país que nos hospeda e não faremos a desobediência à
lei e às autoridades legitimamente constituídas ".
14
O padre se referia ao fato de aquelas sociedades serem
condenadas e perseguidas na Itália sob a acusação de terem cunho anarquista.
O jornal O Caxiense, de propriedade do então intendente municipal, Campos
Junior, publicou telegrama enviado de Roma, pelo Marquez de Rudini, o qual
dizia sobre as mesmas:
"Estas são ameaças à manutenção da ordem pública, são centros
subversivos; tanto que o Governo ou regime político vigente na Itália, é
sólido o suficiente para não se deixar abalar por tais idéias. No entanto,
sempre é possível que surjam daí perturbações da órdem pública.”
15
Com a publicação desse telegrama, o referido jornal pressionou
os brasileiros a não se filiar a tais associações, sob pena de incoerência
flagrante.
Pelos estatutos das Sociedades Católicas
16
eram previstas
algumas prerrogativas para seus filiados, tais como:
a) deveriam dilatar cada vez mais, entre os católicos, a Ordem
Terceira Franciscana, bem como as associações católicas, meio excelente de
aperfeiçoamento dos indivíduos para obterem rapidamente o triunfo do Reino de
Deus sobre o do Diabo;
b) atuar efetivamente para começar uma corrente em prol do
repouso aos domingos, em consonância com as normas existentes na Itália. A
presidência ficaria encarregada de buscar meios para que fosse instituído em
Caxias um mercado semanal e fosse suspenso aquele existente aos domingos;
14
Transcrição da nota conforme original: “Io al principio di tale adunanza tengo a solennemente
dicchiarare che la politica é assolutamente esclusa dalle nostre Societá e che noi cattolici italiani che le
componiamo facciamo voti pel benessere e per lla prosperitá del paese che ci ospita e non verremo mai
meno all’obbedienza alle leggi ed all’Autorità legittimamente costituite.”. Il Colono Italiano. Caxias, 1 jan.
1898. p. 1-3.
15
O Caxiense. Caxias, 15 jan. 1898. p. 2.
64
c) manter vigília para que houvesse o catecismo nas escolas
italianas, e manter os seus filhos longe daquela em que tal ensinamento esteja
excluído;
d) considerando que o objetivo da sociedade católica era o de
providenciar não o bem-estar espiritual, mas também o material dos seus
membros, deliberava instituir uma Secretaria do Povo, na qual os membros da
sociedade obteriam, gratuitamente, conselhos, endereços e ajuda nos
momentos em que não conseguissem resolver sozinhos seus problemas;
e) todos os membros da sociedade católica deveriam abster-se de
ler qualquer jornal que não fosse de sentido católico. Para que esse item fosse
atendido, uma vez por mês circularia o jornal IL Colono Italiano. Este manter-se-
ia longe da política, mas animando os católicos a desenvolver uma ação católica
e sobretudo a obediência às autoridades civis e eclesiásticas legitimamente
constituídas.
Tais estatutos demonstravam, no nosso entender, as
desconfianças da Igreja em relação aos comportamentos da sociedade
moderna, e também em relação ao poder governativo nos aspectos da não-
obrigatoriedade do ensino religioso e da não-observância do descanço aos
domingos. Suas prerrogativas enquadrariam a população de imigrantes
católicos no mais perfeito clima de cristandade.
O processo de romanização, além de buscar o triunfo do Reino de
Deus, buscava: legalizar o descanso aos domingos (movendo para os dias de
semana o mercado); auxiliar oficialmente na busca de meios materiais e
escolas apenas com ensino religioso, excluindo as públicas . Tal processo
culminava com a recomendação da leitura de jornais com espírito católico.
Essas determinações acabaram por provocar desconforto junto à
administração blica. Alguns membros de grupos representativos do comércio
local voltaram-se contra os italianos católicos que, àquelas alturas, eram parte
da massa devota do referido padre.
16
Il Colono Italiano. Caxias, 01 jan. 1898. p. 1-3.
65
Ricardo da Cruz Netto, membro da sociedade maçônica, em 1977,
sobre o assunto escreveu:
" O povo em geral era bem intensionado e pacífico, mas, naquela época,
sem instrução e muito obediente e crente nos sacerdotes, aceitou o que
se lhe pregava, passando a constituir o ‘eleitorado' do padre, que assim
adquiriu ‘poder'. Isto é preparou a ‘massa', .... e, assim, do pulpito
começou a investir contra os maçons, e fora dali, por sua influência,
começaram as intrigas, subornos, denúncias, difamações, brigas,
emboscadas, ameaças e boicotes e tudo quanto os pudesse atormentar."
17
Aos grupos de comerciantes e funcionários da administração, a
atuação do Padre oferecia grandes obstáculos à hegemonia por eles mantida.
Podemos afirmar quePadre Nosadini atuou como um intelectual de
tipo rural, identificado por Gramsci como aquele membro ligado à massa social
camponesa e pequeno-burguesa das cidades, o qual põe em contato a massa
camponesa com a administração estatal ou local, o que lhe confere uma grande
função político-social
18
. Na zona rural, o intelectual, representado pelo padre,
era visto pelo contadino, como uma representação do que gostaria de ser. A
possibilidade de algum membro da família vir a ser um religioso, isto é, um
intelectual, conferia a ela um grau de status. Padre Nosadini interpretou
exatamente o papel atribuído ao intelectual de tipo rural, pois a organização dos
colonos italianos, para solicitar resoluções de seus problemas, iniciou a partir de
sua atuação. O padre conseguiu, até certo ponto, reunir em torno de si, os
colonos, e estes, por sua vez, dependiam de Nosadini para se fazerem ouvir.
Durante sua permanência em Caxias, o Padre mobilizou os
colonos de tal forma, em torno dos ‘comitatos' que, ao menor sinal de
descontentamento, os católicos, promoviam manifestações de desagrado,
criticando sempre a administração.
Um exemplo disso foi a cerimônia na qual brasileiros e italianos
deveriam comemorar, na data de 20 de setembro de 1897, o aniversário da
unificação italiana e da proclamação da república rio-grandense. A cerimônia
organizada pela intendência expôs os retratos de Giuseppe Garibaldi, Bento
17
Ricardo da C. NETTO In E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. Maçonaria em Caxias. p. 29-30.
66
Gonçalves, Floriano Peixoto, Deodoro da Fonseca, Julio de Castilhos e da
família imperial da Itália. Descontente com o toque político da confraternização,
o padre manifestou-se contra a mesma condenando-a do púlpito.
19
Outro exemplo de manifestação aos descontentamentos refere-se
aos casamentos. Conforme nota no jornal O Caxiense, de 6 de novembro de
1897, o vigário realizava os casamentos, efetuando a cerimônia religiosa,
desaconselhando, no entanto, o casamento civil. Nessa nota, o jornal
aconselhava que o mesmo fosse realizado, uma vez que apenas ele possuía
força de lei no país.
A obrigatoriedade do casamento civil, vista pela Igreja como um
ato coercitivo, representava a invasão do domínio alheio e o abuso do poder
temporal para intervir no domínio da consciência, no domínio do poder religioso.
20
Esta mescla entre poder temporal e poder espiritual subjacente na
ótica da hierarquia católica facultava a ela sustentar
"... que não pode haver dupla soberania sobre a mesma ordem de
objetivos, isto exatamente porque sustenta a distinção dos fins e declara-
se a única soberana no terreno espiritual. “
21
As manifestações de descontentamento entre a massa devota do
padre Nosadini e os grupos que administravam Caxias, tiveram seu clímax no
assalto à casa canônica, na noite de 07 de fevereiro de 1897, de onde retiraram
o padre Nosadini e o expulsaram de Caxias. Segundo informou Ricardo da Cruz
Netto
22
, um estudioso em Maçonaria, tal feito foi atribuído ao grupo maçom,
alvo constante do padre e suas sociedades. Embora toda a oposição católica
local, a Maçonaria crescia, tendo neste período, ingressado na Ordem " ... em
1895, entraram 12 iniciados, em 1896 entraram 16, e em 1897 entraram 32.”
23
18
Antonio GRAMSCI. Os intelectuais e a organização da cultura. p. 13.
19
Heloísa BERGAMASCHI In E.R. ALVES & L.S. GIRON. Caxias do Sul: homem, tempo, espaço -
subsídios. p. 82.
20
La Libertà. Garibaldi, 25 set. 1909. p. 3.
21
Antonio GRAMSCI. Maquiavel, a política e o estado moderno. p. 314.
22
Ricardo da C. NETTO In E. VASQUES & O.D.B.. DUTRA . Maçonaria em Caxias. p. 30.
23
Id., Ibid., p. 31.
67
O jornal católico, Il Colono Italiano, questionava a Maçonaria com
malícia ao perguntar se uma sociedade fraterna e beneficente, " precisa ser
secreta? Porque não expõe à clara luz seus objetivos ? "
24
As críticas às sociedades secretas, por parte da Igreja católica,
não eram apenas locais. A cada novo papado, novas enciclícas condenatórias
eram promulgadas. Vejamos a seguir:
" De Pio IX a Leão XIII, ou seja de 1846 a 1903, encontramos nada
menos do que 350 intervenções pontifícias contra a Maçonaria.
Praticamente todas elas vêem nas Lojas uma espécie de conspiração
contra a Igreja e os regimes monárquicos. (...). A separação entre a
Igreja e o Estado, e a proclamação da liberdade de consciência, com a
conseqüente secularização da vida social, propugnadas pelos liberais,
aparecem, naquela época, aos olhos de muitos católicos como ações
diretamente dirigidas contra a Igreja Católica e contra os legítimos
poderes constituídos. Daí a repetição das condenações da Maçonaria,
que se apresenta como impulsora dessa separação.”
25
A Maçonaria, por sua vez, empenhava-se em fazer fracassar a
propaganda ultramontana em favor do ensino religioso nas escolas. Visava
impedir, também, o triunfo do movimento social católico e recolocar a sociedade
secreta em posição-chave política e socialmente.
26
Após a expulsão do padre Nosadini, as acusações de
envolvimento da Maçonaria na execução do atentado à casa canônica levaram
o intendente maçom Campos Jr., a questionar a Loja sobre seu envolvimento
no atentado. Segundo Ricardo da Cruz Netto, o intendente, ouvindo uma
resposta negativa, falou: " ... teria sido um gesto muito delicado e perigoso, pois com
isso estariam atraindo a animosidade da população.”
27
O intendente Campos Jr., em relatório ao presidente do estado,
sobre a questão Nosadini, dizia temer sua deposição e alertava para os perigos
da permanência do vigário, uma vez que aconselhava os colonos a solicitar a
saída do intendente.
28
24
Il Colono Italiano. Garibaldi, 09 out. 1913. p.2.
25
Pe. Jesús HORTAL. A Maçonaria e a Igreja, in Pergunte e responderemos. p. 62.
26
Staffetta Riograndense. Garibaldi, 22 abr. 1920. p 2.
27
Ricardo da C. NETTO In E. VASQUES & O.D.B.. DUTRA. Maçonaria em Caxias. p. 31.
28
J.S. ADAMI. História de Caxias do Sul. p. 248.
68
As autoridades eclesiásticas acharam por bem transferir o padre
Nosadini para a localidade de Nova Pádua e
"... durante o tempo em que esteve, assinava os registros: ‘Pe. Pedro
Nosadini, Vigário de Caxias'. Os caxienses iram batizar os filhos ou
casar-se em Nova Pádua.”
29
A expulsão do padre Nosadini não fez diminuir as queixas dos
colonos. Os ressentimentos existentes, diante do predomínio luso, levavam os
colonos a solicitar cônsules italianos mais enérgicos, pois os que residiam em
Caxias, necessitavam recorrer contra a prepotência das autoridades locais.
Queixavam-se os colonos que os funcionários enviados pelo PRR em suas
acomodações de cooptação eram viajantes nesta cidade e enriqueciam às
custas da sopa preparada pelos imigrantes.
O clero, por sua vez, demonstrava seu descontentamento pelo fato
de lusos deterem o poder local. Por vezes, negavam atendimento aos brasileiros
. Padre Donato, em uma madrugada, recusou-se a atender a um chamado, pois
o mesmo havia sido feito por um emissor que falava português. Na manhã do
dia seguinte, o padre relatou:
“... dirigindo-me para a agencia do correio para buscar minhas
correspondências, ahi me disseram que havia fallecido quasi
improvisamente d. Luiza Sassi. Nesta ocasião exclamei: Meu Deus, eu
pensei, que fosse a brasileira.”
30
A senhora Sassi era italiana e pertencente a uma família de muita
influência. O episódio provocou ainda mais dissabores entre os luso-brasileiros,
diretamente atingidos pelo descaso do clero italiano.
Quando da realização do IIº Congresso Católico Italiano em
Caxias, em maio de 1898, o número de participantes foi superior a duas mil
pessoas, e, segundo a imprensa católica, poderia ter sido o dobro, caso não
tivessem ocorrido pressões para que a população ficasse em casa.
31
Até aqui caracterizamos a primeira fase do processo de confrontos
entre a hierarquia eclesial, os italianos católicos, os maçons e os membros da
29
Pe. Ernesto BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 32.
30
Il Colono Italiano. Garibaldi, 01 jul. 1911. p. 1.
69
intendência. O período estende-se até o ano de 1911, quando é nomeado um
novo coadjutor, Monsenhor Meneguzzi .
No tempo que sucedeu à saída de Padre Nosadini, a Paróquia
Santa Teresa enfrentou sucessivas trocas de rocos. Segundo Padre Ernesto
Brandalise, Caxias foi castigada pela expulsão do Padre Nosadini e ficou sem
Vigário durante seis meses. Apenas em dezembro de 1898, nomearam um
Vigário, Padre Antonio Pertille, cuja tarefa Brandalise informou ter sido
reconciliar os ânimos exasperados devido à luta religiosa, sustentada pelos
antecessores com os carbonários e maçons.
32
As constantes trocas de padres, ao que indicam os documentos
disponíveis, ocorreram por desentendimentos entre esses e a comunidade. Até
mesmo o jornal "Lá Libertá", fundado pelo Padre Carmine Fasulo e
posteriormente sob direção do Pe. Baldasserre "... tornou-se inútil e escandaloso,
insultando sacerdotes, fabriqueiros e fiéis.”
33
Até mesmo os livros de registros como batismo, casamento e
óbitos tiveram prejuízos irrecuperáveis. O livro de registro de óbitos ficou sem
registro dos assentamentos desde o ano de 1893 ao ano de 1909.
34
Neste
ano, assumiu Pe. Ângelo Donato, cujo trabalho esteve voltado à reorganização
administrativa da Paróquia. Um aspecto era resolvido, porém continuava
faltando um sacerdote que articulasse novamente os princípios da política de
romanização. Ele havia sido recomendado por D. Cláudio José Ponce de Leão
em sua visita pastoral de 1904, que via a necessidade de um sacerdote secular,
preparado o bastante para uma sociedade civil em franco desenvolvimento.
Não foram apenas as Sociedades Católicas de Padre Nosadini
que congregaram os italianos católicos durante aquele primeiro momento.
Existiu também o Círculo S. Luis Gonzaga para os moços católicos, tendo sido
nomeado presidente Carlos Balen. Esse Círculo estava integrado ao Círculo da
31
Il Colono Italiano. Caxias, 15 maio 1898. p. 1.
32
Pe. Ernesto BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 32-33.
33
Id., Ibid., p. 35.
34
Id., Ibid., p. 35.
70
Juventude Católica que postulava sobre a defesa da pequena propriedade e
sobre a salvação do patrimônio da fé.
35
Dentre as atividades desenvolvidas pelos moços do Círculo,
estava o grupo de teatro católico, cuja idéia era manter os jovens católicos longe
do indiferentismo social.
36
Se aquelas sociedades preparavam os espíritos dos mais velhos
para tentarem a ruptura da estrutura vigente em nível local, esta segunda
impelia os espíritos, desde jovens, a buscar respostas espirituais e também
políticas.
Neste momento, a atuação das Sociedades Católicas
desempenharam um papel fundamental que foi além dos objetivos da
romanização. Este papel foi o de instigar, no grupo de italianos católicos, a
busca da unidade e do consenso com vistas ao poder de mando local. Nesse
sentido, foi necessário o enfrentamento com o grupo politicamente dominante,
naquele momento, composto por lusos e maçons republicanos.
O PRR local, a exemplo da hierarquia eclesial, passou por um
período no qual suas ações administrativas concentravam-se em reagir às
tentativas de cisão de sua preponderância político-administrativa .
De 1898 a 1911, as crises políticas sucediam-se provocando
trocas de intendentes, bem como dos conselheiros. A falta de consonância entre
intendente, fiéis ao PRR estadual e à prática castilhista, e o conselho, formado
pelos interesses locais, provocava crises como a de 1905. Nesse ano, o
Conselho não aprovou as contas do intendente Serafim Terra e reduziu
consideravelmente o orçamento para o ano seguinte. O intendente recorreu ao
PRR, em Porto Alegre, obtendo ganho de causa quanto ao orçamento. Os
conselheiros sentindo-se desautorizados exoneraram-se, sendo necessárias
novas eleições.
37
O novo conselho pareceu corroborar as intenções do intendente,
pois segundo comentou o historiador rio Gardelin, em recente trabalho sobre
35
Pe. Ernesto BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 35.
36
Il Colono Italiano. Garibaldi, 19 nov. 1910. p. 2.
37
Mário GARDELIN. Caxias do Sul: Câmara de Vereadores 1892-1950. p. 38.
71
a Câmara Municipal, o conselho eleito anulava atos do conselho anterior, dava
parecer favorável às contas municipais e sobretudo passava telegrama ao
Presidente do Estado, "... assegurando indefectível fidelidade partidária.”
38
Quando as sociedades católicas ganharam impulso, pela liderança
de Padre Nosadini, o grupo que representava o poder político local demonstrava
sua falta de coesão . O intendente representava uma facção de interesses,
enquanto o Conselho representava outra. A falta de paridade entre intendentes
e conselhos, que parece ter sido uma constante, levou italianos católicos a
aproveitarem o fato, avançando na formação de líderes civis que pudessem,
oportunamente realizar a consonância entre ambos .
Os maçons, por sua vez, permaneciam na Intendência, porém a
situação " ...naquelle templo onde a fraternidade devia ser rigorosamente observada,
era, pelo contrário, o foco da discordia, da difamação e da anarchia ...”.
39
Configurou-
se o desequilíbrio, que levou ao fechamento da Loja Maçônica no ano de 1903,
por determinação do Grão Mestre do Grande Oriente de Porto Alegre.
40
Essa
atitude significou, posteriormente, uma redução da participação desse grupo na
intendência local. Essa situação, associada ao avanço social e político
promovido pelas organizações católicas leigas, favoreceu o início da passagem
do grupo dirigido a grupo dirigente.
Com o fechamento da Loja Maçônica perdurando até o ano de
1931, quando foi fundada uma nova loja, os membros que fizeram parte dela,
acabaram fundando novas associações e "pulverizando-se" entre elas no
momento em que a referida loja foi encerrada em 1903. Uma dessas
associações foi a Associação dos Comerciantes, hoje Câmara de Indústria e
Comércio de Caxias do Sul.
41
Nessa primeira fase, o catolicismo vigente no grupo de imigrantes
italianos possibilitou à Igreja retomar seus desejos de, se não ser o próprio
38
Mário GARDELIN. Caxias do Sul: Câmara de Vereadores 1892-1950. p. 39.
39
O Cosmopolita. Caxias, 21 jun. 1903. p. 1.
40
Id., Ibid., p. 1.
41
Ricardo da C. NETTO In E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. A Maçonaria em Caxias. p. 26.
Não é objetivo deste trabalho investigar a atuação dos maçons em situações que não sejam de
envolvimento direto com a administração pública e a hierarquia eclesial, no período proposto para essa
pesquisa. Portanto, esse assunto fica como sugestão para um futura investigação.
72
Estado, ao menos penetrar nele, apoiando-se, para isso, na ão leiga das
associações e ou sociedades católicas. Ratifica essa análise as palavras de
Gramsci:
"A Igreja, na sua fase atual, em virtude do impulso proporcionado pelo
Papa à Ação Católica, não pode concentrar-se apenas em formar
padres; ela almeja permear o Estado (...) e para isso são necessários os
leigos, é necessária uma concentração de cultura católica representada
por leigos. Muitas personalidades podem-se tornar auxiliares mais
preciosos da administração, etc., do que como cardeais ou bispos.”
42
Embora os "Comitatos" fundados por Nosadini ficassem sem uma
de suas tarefas a partir de 1903, a de lutar contra o avanço da Maçonaria, o
período que segue parece ter sido marcado pela tentativa de conciliação entre
Igreja e republicanos lusos e italianos . Essa postura era vivenciada em nível
de estado, uma vez que, castilhismo e catolicismo possuíam um padrão de
relacionamento harmônico.
43
A tentativa de conciliação da Igreja local, com os republicanos, no
período que se seguiu à expulsão do Padre Nosadini, comparou- se a um
remédio amargo que precisava ser ingerido para a melhora do corpo político. A
divisão dos grupos não era salutar, pois mantinha Caxias afastada do poder
decisório estadual e poderia ser analisada como uma postura liberal, quando o
positivismo castilhista possuía a idéia de colaboração corporativa como
mecanismo para o progresso.
Conciliar os grupos locais foi tarefa
empreendida pela
Arquidiocese, cujo pensamento político corroborava idéias do positivismo
castilhista, especialmente aquela sobre os homens que deviam conduzir a
sociedade. Para o arcebispo, "condutores de homens" seriam aqueles que m
"... a vontade de moldar e conduzir outros a um fim elevado”.
44
42
Antonio GRAMSCI. Maquiavel, a política e o estado moderno. p. 308.
43
Artur C. ISAIA. O cajado da ordem - Catolicismo e projeto político no Rio Grande do Sul: D. João
Becker e o autoritarismo. p. 103.
Com relação ao padrão de relacionamento castilhismo-catolicismo, consultar a tese de doutoramento de
Artur C. Isaia acima citada.
44
D. João BECKER Apud Artur C. ISAIA. O cajado da ordem - Catolicismo e projeto político no Rio
Grande do Sul: D. João Becker e o autoritarismo. p. 110.
73
Em Caxias, a tarefa do "condutor" seria obter o consenso dos
grupos locais, com vistas à aproximação da política local com a estadual. Para a
Arquidiocese, o homem era Monsenhor Meneguzzi, cujo desempenho
prepararia o grupo de italianos católicos para o consenso.
Enfrentamentos; criação de associações católicas; divisões e
enfraquecimento político; ausência, no PRR, de uma liderança altruísta e
identificada com o bem comum; tentativa de conciliação entre Igreja e
republicanos
foram características da primeira fase
do processo de aquisição
do poder político- -administrativo pelos italianos católicos.
2 . 3 S e g u n d o M o m e n t o : M o n s e n h o r M e n e g u z z i e a
M u d a n ç a d e P o s t u r a d a I g r e j a L o c a l
Iniciada a ruptura da hegemonia do PRR local, pela Igreja, via
associações e sociedades católicas leigas, o processo de aquisição do poder
político-administrativo de Caxias passará por uma segunda fase, a partir de
1911, com a chegada de Monsenhor João Meneguzzi. Orientado pelos
superiores da Arquidiocese de Porto Alegre para reconduzir a Igreja local nas
relações com o estado, Meneguzzi atuou com base nas associações e
sociedades católicas leigas.
Homem de larga visão política, conhecia os caminhos que
levavam a Igreja a uma aproximação dos grupos fundamentais, e, ao mesmo
tempo, conhecia os caminhos que a afastavam do grupo dominante, como
acontecera na primeira fase do processo, contrariando o padrão de
posicionamento do catolicismo rio- -grandense. Este padrão, segundo Artur
Cesar Isaia, era " baseado em um ‘modus vivendi' harmônico”
45
com a prática
castilhista.
45
Artur C. ISAIA. O cajado da ordem: Catolicismo e projeto político no Rio Grande do Sul: D. João Becker
e o autoritarismo. p. 103.
74
Ainda segundo o mesmo pesquisador,
"... o catolicismo rio-grandense via com simpatias uma experiência
governamental fundamentada em princípios como a moralidade como
norma administrativa, o apelo à ordem, o desdém à consulta popular
como princípio legitimante e realizador do bem comum ...”.
46
Fora da tutela do estado, existia a necessidade constante de
prover a Igreja e suas obras de verbas que garantissem o aumento do seu
patrimônio e não o desgaste do mesmo.
Assim, era preciso investir em uma postura que não fosse de
oposição e nem de enfrentamentos ao poder do partido dominante, mas que,
enquanto instituição, a Igreja fizesse muitas concessões aos adversários para
se defender melhor
47
e continuar conduzindo os italianos católicos ao
consenso.
O Padre João Meneguzzi assumiu a paróquia Santa Teresa no
ano de 1911, tendo encontrado uma dívida de is 16.181$550. Seu vicariato de
trinta e dois anos foi realizado com base nas obras apostólicas, entre as quais
destacaram-se a fundação do Apostolado da Oração, Associação Damas de
Caridade e Sociedade Recreio Dante.
Essas associações e a sociedade Recreio Dante seguiram o
mesmo papel das associações e sociedades criadas no primeiro período. Como
procedemos anteriormente à análise daquelas, resta fazermos, agora, o
estudo das que seguem.
48
As sociedades e associações leigas haviam demonstrado que, se
bem conduzidas, eram pontos estratégicos tanto à Igreja quanto a alguns
grupos da sociedade civil. Para a Igreja local era imprescíndivel entrar em
consonância com o papel político do catolicismo promovido pela Arquidiocese
de Porto Alegre. Para os italianos católicos era o meio de congregar as
46
Artur C. ISAIA. O Cajado da ordem: Catolicismo e projeto político no Rio Grande do Sul: D. João
Becker e o autoritarismo. p. 104.
47
Antonio GRAMSCI. Maquiavel, a política e o estado moderno. p. 284.
48
Cabe aqui uma observação de cunho metodológico: das três associações selecionadas, a única que
possui um arquivo próprio e organizado é a Associação Damas de Caridade. O Apostolado da Oração da
Paróquia Santa Teresa, primeiro a ser fundado, só possui documentação a partir do ano de 1960. Do
Recreio Dante, são raras as informações ainda existentes, tendo persistido unicamente os registros
realizados no livro Tombo de nº 1 da Paróquia S. Teresa
75
diferenças regionais e culturais em um ideário comum: os princípios
moralizadores e regenadores do catolicismo.
Esses princípios duplamente utilizados, pelos italianos católicos e
pela Igreja, atuaram em uma missão com vistas a dois objetivos: um social e
outro político. O social consistia em afastar homens, mulheres e jovens de
reuniões perigosas e prejudiciais ao indivíduo ou à família. Lembramos que
estas reuniões ditas "perigosas" poderiam levar os membros da sociedade ao
contato com os preceitos da sociedade moderna.
A missão política voltava-se a uma sólida formação intelectual e
cultural dos membros associados, com vistas ao fato de posteriormente
poderem permear o estado, conciliando, assim, o poder de mando de um grupo
da sociedade civil que se fará representar e, concomitantemente representando
o ideário católico, promover a continuidade do processo de romanização local.
Dessa forma, Mons. João Meneguzzi criou a Associação
Apostolado da Oração, no mesmo ano em que assumiu. Essa associação, em
nível de Brasil, existia desde o ano de 1867, quando foi fundada pelo Pe. Bento
Schembri, no Recife. No ano de 1888, eram 300 centros do Apostolado da
Oração, com mais de 400.000 membros.
49
À época, o Cardeal D. Sebastião Leme afirmou ter sido o
Apostolado da Oração (A.O.) o principal responsável pela renovação espiritual
do Brasil
50
, pois a renovação da família pela Consagração ao Divino Coração
era o objetivo fundamental do A.O..
Essa associação procurava atingir às famílias através de pequenos
grupos de oração e vivência cristã, às quais era passada a corresponsabilidade
na salvação do mundo.
Para desenvolver esses objetivos, o Apostolado da Oração formou
uma organização que possuía como hierarquia: Diretor Geral; Secretários
nacionais e regionais; Diretores diocesanos; e Centros Paroquiais, formados por
uma diretoria, um corpo de zeladoras e famílias zeladas.
49
Hilda SCHINEIDER. O Apostolado da Oração. p. 140.
76
Em nível local, atuavam, e ainda atuam, os membros constantes
nos últimos itens, cabendo à diretoria diocesana ao vigário, uma diretoria de
leigos, um corpo de zeladoras com sólida formação espiritual e apostólica e, por
último, as famílias zeladas. Estas deviam ser distribuídas entre os zeladores e
não deviam ultrapassar o número de 15 famílias por zelador, segundo
informações dadas por D. Paulina Moretto, ex-presidente do Apostolado da
Oração.
A formação dos zeladores dava-se a partir de reuniões mensais,
retiros, turnos de reflexão e palestras. Os estudos para formação de zeladores
estavam previstos nos Estatutos do A.O., assim como na V seção estava
previsto que para haver uma efetiva adaptação da Igreja e das pessoas, a
associação devia ter seções peculiares para jovens, para homens, para os
doentes, para a união de todos os cristãos, etc.
Conforme essa orientação, o Apostolado da Oração fundado por
Mons. Meneguzzi, abrira uma seção para os homens e outra para as mulheres,
sendo que a freqüência maior estava justamente na seção dos homens. Em
entrevista realizada com D. Paulina Soldatelli Moretto, que presidiu um dos
centros do Apostolado da Oração em Caxias durante 50 anos, ela relata que,
antes de casar, seu marido também fazia parte desse grupo," e eles enchiam
aquela Catedral". As maiores batalhadoras que ela conheceu foram D. Clélia
Manfro, D. Angelina Comandulli, D. Zulmira de Lavra Pinto.
A primeira diretoria leiga instituída pelo Padre fora composta por D.
Amazília Pinto de Moraes (presidente), D. Hermelinda de Lavra Pinto
(secretária) e D. Luiza Ronca (tesoureira). Não encontramos dados para nos
certificarmos se esta diretoria respondia por todo o A.O., incluindo, assim, as
seções masculina, feminina e demais, ou se esta diretoria era específica para a
seção feminina. O fato é que iniciava, com a indicação dessa diretoria, o jogo
político de Monsenhor Meneguzzi.
As senhoras integrantes da diretoria eram nada mais nada menos
do que a esposa do Cel. José Penna de Moraes, que veio a ser Intendente no
50
Id., Ibid., p. 140.
77
ano seguinte. A tesoureira era esposa de um membro da sociedade que havia
realizado três mandatos consecutivos como conselheiro municipal. A secretária
era a esposa de um dos diretores do jornal Cidade de Caxias, de tendências
republicanas, fundado no ano de 1911.
A Igreja aproximava-se do Partido Republicano Riograndense.
Eram oferecidos cargos diretivos aos leigos, porém preferencialmente leigos que
possuíssem laços familiares com membros daquele partido. Se para a
associação Apostolado da Oração o objetivo essencial era atuar na família,
considerada base para a formação moral e social, a ocasião não poderia ser
melhor para corroborar o catolicismo local com o estadual que pautava por
aquele tipo de formação.
Essa prática repetiu-se quando da criação da Associação Damas
de Caridade, no ano de 1913. Segundo a ata de abertura datada de 12 de
agosto de 1913,
"... a base essencial desta associação será de empregar todos os meios
possiveis para diffundir a de Cristo afim de que não morra pessoa em
pecado mas sim confortados pela nossa Santa Religião.
Socorrer os pobres desvalidos, fornecer-le, se necessário for Médico,
medicamentos, mantimentos e leitos.
Para suprir as despesas ficou resolvido organizar uma Directoria para
angariar associados contribuindo com certa quantia mensalmente ou
com outro qualquer donativo, não ficando estipulada taxa fixa dando
cada uma o que entender.”
51
A diretoria foi formada pelo Vigário João Meneguzzi como Diretor
Presidente; Pe. Vicenzo Testani: Diretor; D. Amazília Pinto de Moraes:
Presidente; Ignes Parolini Thompson: Vice; Madre Felicidade: Secretária;
Santina Sartori: tesoureira. A associação teve constituído, também, um conselho
do qual faziam parte: Tereza Rossi, Carolina Bonalume, Giovanetta Corso,
Angela Spinato, Maria Filipini, Domênica Sartori, Elisa Eberle, Basílica Brand,
Teresa Duso, Fiorentina Iotti, Angela Canali, Orsolina Lavra Pinto, Rosa Dal
Canalli e Júlia Fochesatto.
51
Livro de Atas da Associação Damas de Caridade. Caxias, [s.p.]
78
Também nesse grupo, o vigário teve o cuidado de fazer presente
os elementos com nculos representativos em nível de partido político,
profissionais
liberais, industriais e até mesmo padrinhos dos comitês organizados
anteriormente por Pe. Nosadini.
Um ano após a fundação da associação, a presidente Amazília
Pinto de Moraes, em reunião com o diretor presidente Monsenhor Meneguzzi e
demais membros da diretoria, frente ao crescente número de chamados para
atendimento a carentes, decidiu por o mais fazer o atendimento a domicílio. A
partir daquela reunião, os esforços da associação se voltariam para a
construção de um hospital beneficente.
Posteriormente a essa decisão, Monsenhor Meneguzzi anunciou a
doação de três terrenos para a construção do hospital. A doação teria sido
realizada pelo então intendente Cel. Jo Penna de Moraes. No momento, a
associação contava com mais de 150 associadas
52
, cuja contribuição revertia
para a construção do hospital beneficente.
O terreno doado pelo intendente à associação, na época causou
desconforto pelo mesmo ter pertencido à Maçonaria. Essa sociedade secreta o
havia comprado quando a loja ainda estava em atividade. Tendo fechado logo
em seguida, o terreno ficou inaproveitado, até o momento em que a associação
Damas de Caridade por ele se interessou.
"O então Intendente, senhor José Penna de Moraes, escreveu ao Mestre
a carta com fotocópia inclusa, dizendo que 'devido ao fato de que
nenhum proveito a Maçonaria aufere do terreno, bem podia fazer doação
àquela entidade'.
53
Oficializada a doação pelo Sr. Marechal Carlos Frederico de
Mesquita, DD. e PP. Gr:. Mestre do Grande Oriente do RS, o mesmo transferiu
a propriedade do terreno recebendo em troca, o Grande Oriente, o título de
52
Livro de Atas da Associação Damas de Caridade. Caxias, 17 dez. 1914. [s.p.]
53
Ricardo da C. NETTO Apud E. VASQUES & O.D.B. DUTRA. A Maçonaria em Caxias. p. 27
79
Benfeitor do Hospital. Com a criação do Bispado de Caxias tal propriedade foi
incorporada à Mitra.
54
Após a construção do hospital, a associação permaneceu na sua
administração, situação mantida até os dias de hoje.
A terceira associação destacada neste trabalho trata-se da
Sociedade Recreio Dante, que iniciou suas atividades com uma freqüência de
40 alunos e atuou durante dez anos, de 1913 a 1923. Seu alvo era junto à
mocidade católica de Caxias com o objetivo de instruí-la
mediante aulas
noturnas. Com ela, a Igreja desempenhou "a função, que é diretiva e organizativa,
isto é, educativa, intelectual.”
55
A direção deste grupo ficou com José Panceri: presidente; Vicente
Argenta: vice; Cel. José Penna de Moraes: presidente honorário; Anuncio
Ungaretti: secretário; Alexandre De Antoni: vice-secretário; Abramo Eberle:
tesoureiro e mais nove conselheiros. O vigário seria sempre o diretor-presidente.
Abramo Eberle, em 1924, um ano após a extinção da Sociedade, faria parte da
chapa republicana para concorrer à sucessão intendencial.
A mudança de postura da Igreja se fez notar além das concessões
feitas ao outro partido. Agora as estratégias para penetrar no estado passam
antes pelo preparo e pela formação não moral, mas também intelectual do
grupo de italianos católicos. No primeiro momento das associações, a ênfase
maior estava na sólida formação moral, e esta deveria ser o exercício para a
ruptura do grupo hegemônico. A própria convivência com outros partidos parecia
inaceitável, mediante a filosofia impressa pela hierarquia local de então.
No segundo momento, as associações e sociedades tiveram
mudanças ocorridas sob dois aspectos: a formação deveria dar-se, além do
aspecto moral, também no aspecto intelectual e houve o deslocamento do
interesse da zona rural para a zona urbana.
Com estas mudanças de comportamento, a Igreja formou uma
camada de intelectuais capazes de discordar da hegemonia coercitiva realizada
pelo PRR, assim como preparou os associados para acompanhar as discussões
54
Id., Ibid., p. 27.
80
e os envolvimentos ideológicos monopolizados pelo Partido Republicano
Riograndense.
Prova disso foram os acontecimentos no ano de 1922, quando era
preparada a reeleição de Borges de Medeiros para a presidência do estado.
Desde 1892 não havia alternância no poder estadual. A interação
entre o poder da quina partidária e o controle do aparelho de estado foi
constante. A continuidade fôra garantida pela Constituição de 1891, que previa
todo o poder ao governador, tanto para cancelar eleições municipais como para
interferir na política dos mesmos, se necessário fosse, até mesmo por decretos.
Outra estratégia utilizada para a continuidade era o controle dos
assuntos partidários em nível municipal, através de coronéis e mandatários leais
exclusivamente ao governador. Os coronéis mobilizavam os votos em seus
distritos, e conforme a necessidade, empregavam a fraude e a violência para
garantí-los. Também a Brigada Militar podia ser empregada para fins políticos.
56
A necessidade de coronéis leais ao governo estadual justificava a
presença constante de elementos lusos na intendência de Caxias. A correlação
de forças se reproduzia nos pontos estratégicos da economia gaúcha,
preservada até meados da década de 20, sobre o setor agromercantil. Caxias
até esse momento fugia do alvo de tal setor, pois esteve com sua economia, até
então, voltada para o setor agrícola policultor, desenvolvendo, a partir da
segunda metade da década de 10, o setor de exportação vitivinícola.
A economia caxiense, assim diferenciada do padrão sulino,
ofereceu condições para acabar com o isolamento da região colonial e,
posteriormente, baseada no binômio comércio-indústria, adquiriria maior força
na engrenagem econômico-política do estado.
Após a Guerra Mundial, o estado sofreu alterações no setor
econômico, pelas dificuldades da situação nacional e mundial. Os produtos
mais atingidos foram os do setor agromercantil, levando seus produtores a
solicitarem a intervenção e proteção do estado. Essa solicitação não foi
atendida, uma vez que não caberia tal atitude por parte de um partido cujo
55
Antonio GRAMSCI. Os intelectuais e a organização da cultura. p. 15.
81
ideário possuía base positivista, o que não permitia privilegiar setores com a
intervenção estatal. A partir de tal negação, o descontentamento abriu
condições para a aproximação das oposições no estado.
57
Aliado ao contexto econômico, ocorreu um processo, ao nível
político, de "reestruturação das oposições conservadoras-liberais”
58
, promovidas a
partir da brecha deixada pelo governo ao falhar na tentativa de atender às
reivindicações pecuaristas.
59
As oposições congregadas abrangiam democratas, federalistas e
dissidentes republicanos. Apesar de um fundo ideológico liberal comum, houve
dificuldades em conciliar um programa que, durante a campanha, acabou por
defender
"... a necessidade da ‘tutela governamental' e da emissão de ‘papel
moeda' como medidas capazes de fazer face à crise. (...) Assis defende
a intervenção governamental em questões econômicas e com seu
‘realismo conservador' passa a ‘consubstanciar uma tendência mais de
acordo com a situação e necessidade dos produtos gaúchos em suas
relações do pós-
-guerra'.”
60
À época da campanha eleitoral, a imprensa caxiense circulava
com três correntes principais: a Pró-Assis, a republicana e a católica.
A corrente Pró-Assis sustentou toda sua campanha sobre dois
pilares. O primeiro foi a religião, e sob esta bandeira os assisistas afirmavam
que Borges de Medeiros, por ser positivista, era um inimigo declarado da religião
cristã. O segundo foi o ataque à falta de entrega dos títulos eleitorais.
O jornal dessa corrente alertava constantemente a população para
que não deixasse de adquirir seu títulos eleitorais e
"Caso lhes sejam negados, como continua e continuará acontecendo,
devem fazer o possivel para adquirir as segundas vias dos mesmos.
No Comitê Pró-Assis Brasil, encontrarão, diariamente, pessôa
competente encarregada de prestar os necessarios esclarecimentos a
respeito.”
61
56
Joseph L. LOVE. O regionalismo gaúcho. p. 83.
57
Helgio TRINDADE In J.H. DACANAL (org.). RS: Economia & Política. p. 152-153.
58
Id., Ibid., p. 153.
59
Id., Ibid., p. 159.
60
Id., Ibid., p. 157-158.
61
O Democrata. Caxias, 29 dez. 1922. p. 3.
82
O processo de campanha foi dos mais agitados do interior, sendo
matéria constante nos jornais. Em jornal da capital, a nota registrada era:
"Como è do dominio publico, é grave a situação política de Caxias com
os ultimos acontecimentos ali occorridos de ultraje á nacionalidade da
colonia e mais dexasperação publica com o acto do intendente e chefe
politico sonegando titulo á população eleitoral suspeita de não
acompanhar o ‘borgismo' enfermo.
62
A corrente republicana defendia-se das acusações, tornando
pública a idéia de falsa propaganda a que os caxienses de boa fé estavam
sendo submetidos. Complementavam dizendo :
"Eles abusam da vossa religiosa e a exploram, caluniando o atual
governo, eles abusam da vossa ignorancia política e em beneficio
próprio e exclusivo apresentam o seu candidato como o novo messias
portador de riquezas, de paz, de bem-estar, de felicidade ...”.
63
Com relação ao fator religioso, os republicanos publicavam
matérias, questionando aos colonos se alguma vez as autoridades haviam feito
qualquer censura à crença religiosa proferida por eles. Também questionavam
se em algum momento as festas religiosas em honra a qualquer santo haviam
sido proibidas. As contribuições do governo estadual para a construção de
Igrejas e capelas, naquele momento, foram constantemente cobradas pelos
fervorosos republicanos. No limite das cobranças de campanha eleitoral, os
republicanos escreviam:
"Mas não! Pobres colonos!.. Sois valorosos porém inconscientes!
Procurae emancipar-vos dessa onda negra que vos offusca toda
felicidade que buscaes na terra e toda a gloria que aspiraes no céu!.”
64
Pouco tempo depois
os membros situacionistas irão perceber que
a pregada ignorância política dos italianos católicos
não estava em o alto
grau.
A falta de consciência e a ingenuidade não haviam feito parte do currículo
das aulas ministradas pela Igreja em seus cursos noturnos para jovens, nem
62
A Resistencia. Caxias, 3 nov. 1922. p. 3.
Nota publicada originalmente pelo jornal A Ultima Hora de 30 de outubro de 1922.
63
A Resistencia. Caxias, 9 nov. 1922. p. 1.
A nota foi publicada em italiano como segue: “Essi abusano della vostra fede religiosa e la esplorano,
calluniando l’attuale governo; essi abusano della vostra ignoranza política e ne profittano a proprio ed
esclusivo vantaggio presentando il loro candidato qual novello Messia portatori dio richezza, di pace, di
benessere, di felicitá ...”.
83
nas reuniões de formação dos membros do Apostolado da Oração ou das
Damas de Caridade.
A imprensa de corrente católica, por sua vez, em Caxias, tentou
manter-se sem revelar seu real posicionamento. Em nota do dia 8 de novembro
de 1922, La Staffetta Riograndense publicava:
"Os leitores e amigos do Staffetta Riograndense estão esperando
alguma palavra de ordem, algum direcionamento.
Entretanto sabemos que é tempo perdido. O Staffeta decidiu não dar
nenhuma direção sobre este ponto, e por razões que são fáceis de
compreender.
O Staffetta pede que deixem a mais absoluta liberdade de voto aos
eleitores. Seria vergonhoso que em um estado como o nosso Rio Grande
se adotassem métodos eleitorais antiquados e incivilizados.”
65
A hierarquia eclesial local procurou permanecer em tal postura a
o momento dos resultados finais da votação. Embora o Arcebispo D. João
Becker tivesse feito uma declaração de simpatia à reeleição de Borges de
Medeiros, em nível local, mediante todas as especificidades do contexto, e
analisadas, esta postura parece o ter sido corroborada, nem pela hierarquia
eclesial, tampouco por boa parte da população.
No dia marcado para as eleições, a falta dos títulos eleitorais para
os cidadãos declaradamente da oposição provocou confrontos que dariam uma
prévia da revolta civil do ano seguinte.
O relato de todo o enfrentamento político está registrado em duas
folhas do Livro Tombo 1 da Paróquia Santa Teresa. O relato, registra que a
Brigada Militar aguardava apenas que a população desse mais alguns passos
para poder movimentar-se. Mediante às dificuldades, a população mandou
chamar Monsenhor Meneguzzi, a esta altura já com onze anos de administração
diocesana e grande ascendência sobre a sociedade civil. Chegando ao local,
este também foi barrado pela Brigada, sendo advertido:
"Retire-se Vigário, vai correr bala disse um sargento. O Vigário
respondeu:‘Vai correr bala nada. Quero falar com o Intendente' (Prefeito).
Então um da Brigada o acompanhou. Na presença do Intendente, que se
encontrava rodeado pelos do partido, verberou energicamente seu
proceder, responsabilizando-o por tudo que pudesse acontecer. O
64
A Resistencia. Caxias, 15 nov. 1922. p. 3.
65
La Staffetta Riograndense. Garibaldi, 8 nov. 1922. p. 1.
84
Intendente empalideceu, mas disse: ‘Se o povo der ainda três passos,
será fuzilado'.”
66
Pela análise realizada, Monsenhor Meneguzzi, aproveitou o
enfrentamento entre colonos e governo republicano para demonstrar, à
sociedade, sua autoridade e como andavam as relações da Igreja local com o
poder administrativo "republicano". Neste momento, ficou exposto o
posicionamento político da hierarquia eclesial caxiense. Conseguiu, ele,
dispersar os colonos e na noite deste dia foi realizada em frente à casa
canônica uma grande manifestação na qual os colonos denominaram o Vigário
como "Salvador de Caxias".
A derrota de Assis provocou a revolta de 1923, quando os grupos
de oposição enfrentaram-se com as forças leais ao governo estadual.
Em Caxias, o registro feito pela autoridade eclesial no Livro Tombo
1, revela:
“Durante esse período de revolução as auctoridades em geral portaram-
se muito mal. As de Caxias foram dignos emulos de Nero, Imperador de
Roma. Para implantar o terror, mataram no dia imediato ao das eleições,
em plena rua de Caxias, um jovem filho do professor Marcos Martini.”
67
A revolta de 23 cessou com a assinatura do Acordo de Pedras
Altas, no qual foram previstas desde a proibição das reeleições nos cargos
executivos, a garantia de que o PRR o disputaria um lugar para Deputado em
cada um dos Distritos, a a anistia e a presença do Ministro de Guerra por
ocasião do pleito para Deputado Federal e Senadores em maio de 1924.
68
Mais do que o acordo de paz, Assis conseguiu demonstrar
habilidade política ao reunir as oposições. As eleições de 22 marcaram o início
de uma luta comum na qual foram surgindo novos laços que, progressivamente,
sedimentariam a aliança da oposição.
Nessa hora coube ao Partido Republicano Riograndense fazer
concessões. Em Caxias, os italianos católicos demonstraram que a Colônia
66
Pa. Ernesto BRANDALISE. A Paróquia Sta. Tereza. p. 45.
67
Livro Tombo da Paróquia Sta. Tereza. Caxias, v.1, 1923. p. 62.
68
Helgio TRINDADE In J.H. DACANAL. RS: Economia & Política. p. 163.
85
estava se desenvolvendo econômica, política e socialmente, e que a
intelectualidade católica estivera agindo.
Na quarta visita pastoral, realizada por D. João Becker, cumprindo
uma das determinações da política de romanização, ele declarou:
"Depois agradecermos essa manifestação de apreço e carinho
demonstramos que a religião catholica tem sido o factor principal do
progresso e prosperidade que hoje admiramos por toda a parte,
porquanto foi a Religião e ella que deu força, alento e constancia aos
desbravadores destas mattas nas arduas luctas que tiveram de travar.”
69
A Igreja estadual neste momento permeara o governo estadual.
Os acontecimentos do ano de 1922 não poderiam, politicamente, interromper
aquele processo iniciado em 1911, com a fundação das associações e
sociedades católicas leigas, possibilitando o mesmo processo em nível local.
Essa visita pastoral ao município esteve, então, voltada a uma conciliação entre
a hierarquia católica local, o grupo de italianos católicos e o PRR local.
Concessões partidárias foram exigidas de ambas as partes. Ao
PRR cabia indicar um italiano para as eleições municipais de 1924, como
intendente municipal. À Igreja local exigia-se desisitir da candidatura do nego
Meneguzzi à Intendência de Caxias, lançada quando "... um grupo de senhores
dirigiu ao Vigário um officio proclamando-o candidato a Intendente de Caxias...”.
70
Essa candidatura foi oficialmente lançada à população caxiense
pela Aliança Libertadora Caxiense. Os republicanos, tentando manter a postura
política exigida pelo partido estadual, procuraram não discutir as " qualidades e
virtudes" do Sr. Cônego Meneguzzi. Discutiam, sim, o insulto e a calúnia à
administração vigente, contidos no lançamento de tal candidatura.
Para o PRR local a questão centrava-se no fato de o nego ter
consentido ou não na apresentação de seu nome pela facção política que
hostilizava o governo do estado. No último caso, ele deveria protesar
publicamente contra o fato, o que não ocorreu.
A visita pastoral, realizada às vésperas da campanha eleitoral
municipal, já reuniria em suas cerimônias as autoridades representativas da
69
Livro Tombo da Paróquia Santa Tereza. Caxias, v.1, 04 abr. 1924. p. 65.
70
Livro Tombo da Paróquia Santa Tereza. Caxias, v.1, 10 abri. 1924. p. 64.
86
população italiana, da mocidade de Caxias , do partido republicano e da Aliança
Libertadora Caxiense, restando ao Monsenhor Meneguzzi a tarefa de assimilar a
posição da Arquidiocese da capital.
Entretanto, a igreja católica estadual o poderia ter outra atitude,
senão aquela autoritária, removendo a candidatura do cônego, pois
Arquidiocese e Partido Republicano Riograndense estavam empenhados em
manter uma convivência harmoniosa. Durante a visita pastoral de D. João
Becker, o jornal republicano "O Brasil" exalta de forma gloriosa a visita de o
alto mandatário da hierarquia eclesial.
Naquelas eleições, Celeste Gobbato, engenheiro agronomo
italiano, simbolizava a concessão do PRR para os caxienses naquelas eleições.
Com o apoio do clero local, Gobbato representaria o elemento de interseção
capaz de atenuar o avanço das oposições assisistas e romper com o poder luso
local. A esfera da sociedade civil e do poder político-administrativo falariam a
mesma língua.
C a p í t u l o I I I
A E x p e r i ê n c i a I t a l i a n a d e P o d e r
88
III - A Experiência I taliana de Poder
Em 1924, a eleição do engenheiro agrônomo italiano, Celeste
Gobbato, vinculado ao PRR, representaria a primeira experiência do grupo de
italianos católicos na administração de Caxias. Esta eleição se dá em detrimento
do grupo luso-brasileiro, que possuía entre seus membros atuantes um número
expressivo de maçons.
Essa terceira hipótese originou um capítulo cujo texto analisa a
administração do intendente Celeste Gobbato, como representante de consenso
entre PRR e italianos católicos.
Destacam-se, neste capítulo, três momentos da experiência
italiana: um plano de consenso; o positivismo da administração: o progresso
pelas obras; e o isolamento gerando crise.
3 . 1 U m P l a n o d e C o n s e n s o
Estabelecido o consenso entre o PRR e a hierarquia eclesiástica
locais, a sucessão intendencial foi articulada pelo Dr. Otavio Rocha. Elemento
de confiança de Borges de Medeiros, criou uma comissão de propaganda
eleitoral com a participação de trinta e nove membros, entre eles Major Abramo
Eberle, Adelino Sassi, Miguel Muratore, Ettore Pezzi, Caetano Mattana, Alfredo
89
Carvalho, José D'Arrigo, Mario Caorsi.
1
Otavio Rocha reuniu o Centro
Republicano de Caxias por três vezes, até conseguir um acordo entre os
republicanos e o grupo de dissidentes filiados à Aliança Libertadora Caxiense.
A chapa submetida à assembléia foi aprovada por 50 votos contra 12, ficando
constituída da seguinte forma:
Intendente Dr. Celeste Gobbato - engenheiro agronômo, natural de
Treviso, Itália;
Vice-intendente Major Abramo Eberle - industrialista e membro da
diretoria da Sociedade Recreio Dante;
Conselheiros: Orestes Manfro - industrialista e marido de Clélia
Manfro, membro ativo no Apostolado da Oração e, mais tarde, na Sociedade
Damas de Caridade; Armando Antunes - industrialista; Angelo Antonello -
comerciante; Alexandre Zaniol - comerciante; Antonio Pieruccini - industrialista
maçom; Angelo de Carli - comerciante; Leonel Mosele - industrialista.
2
A chapa formada ficou conhecida como "chapa de conciliação",
pois julgavam ter sido combinada de acordo com os "homens condutores" e de
maior responsabilidade na coletividade caxiense. Visava apaziguar os espíritos
e congregar coletivamente a população em busca do bem comum.
Neste momento histórico, no qual estava sendo "permitida" a
candidatura de um elemento italiano à sucessão intendencial, uma questão
merece especial atenção: como a sociedade civil caxiense, envolvida pelo clima
de cristandade, permitia o rompimento de uma regra na Legislação Eleitoral?
Como informamos anteriormente, por aquela Legislação, o
candidato deveria estar residindo no município a, no mínimo, um ano. O
indicado e futuro intendente o residia em Caxias e se transferiu para às
vésperas das eleições para assistir ao pleito.
A necessidade de ser um intendente que pronunciasse o discurso
na mesma língua dos imigrantes católicos justificaria a transgressão da
legislação? Poderia ser, o italiano intendente, um eficaz promotor da ordem e
progresso, ambição não dos republicanos locais, mas também dos demais
1
O Brasil. Caxias, 11 mar. 1924. p. 2.
90
grupos da sociedade civil? A Igreja silenciara diante do fato de ser o futuro
intendente "um de fora". O desconhecer os problemas do município, em
profundidade, o representava uma heresia como havia sempre sido
propalado, nos casos anteriores, quando assumiam intendentes lusos vindos de
outras regiões.
A estratégia do Partido Republicano Riograndense fundira-se à da
Igreja. Se esta foi buscar seus líderes entre a população de italianos católicos,
via associações católicas leigas e dali retirando alguns candidatos para a chapa
de conciliação, que participou das eleições de 1924 (como por exemplo: Abramo
Eberle, diretor do Círculo Dante e Dr. Felix Spinato, cuja esposa era conselheira
da Associação Damas de Caridade, iniciadora do Hospital Pompéia), o PRR, por
sua vez, também foi buscar reforços políticos entre os elementos do mesmo
grupo; agoras industriais e comerciantes ligados às categorias urbanas.
Desde o momento da formação da “chapa de conciliação”, os
líderes republicanos e/ou católicos, estavam tentando demonstrar haver a
possibilidade de se fazer uma firme harmonia política e aliá-la a uma dinâmica
de desenvolvimento local. Nesse processo, os líderes republicanos deveriam
trabalhar, não com base em ideais pessoais, mas sim com base em ideais que
visassem o bem comum. A Igreja, por seu turno, compreendeu esse
pensamento como um benefício à pretendida reforma moral, também da
sociedade local.
A comissão de propaganda encarregou-se de divulgar durante o
período de campanha eleitoral as principais metas a serem alcançadas pelo
governo republicano que sucederia ao de Penna de Moraes. As metas deveriam
atingir pleno êxito no setor de transportes, nas áreas de higiene e saúde pública,
no sistema de abastecimento e distribuição de água, no setor agrícola, nos
setores da administração da intendência, no setor de obras de saneamento e
urbanização, na reforma tributária, e na criação de um setor para elaboração de
estatísticas necessárias ao município.
2
O Brasil. Caxias, 27 jul. 1924. p. 1.
91
O programa republicano, para a campanha eleitoral, atingia todas
as camadas cio-econômicas do município. Os adeptos a esse programa
haviam pensado na população da zona rural, na população da zona urbana, nos
industrialistas e comerciantes. A promessa de reforma tributária, especialmente
aquele imposto que envolvia bens imóveis, era solicitação antiga de
republicanos, católicos, libertadores e tantos grupos quantos fosse possível
existir.
A melhoria na prestação de serviços da intendência também era
solicitação da população em geral, visto que o intendente Penna de Moraes,
reeleito por três administrações sucessivas, não a havia promovido, ao longo do
tempo. Saúde pública, higiene, agricultura e obras de saneamento e
urbanização complementavam as promessas de campanha.
Homogeneizados os interesses dos vários grupos na proposta de
campanha eleitoreira ou aplacados interesses divergentes pelo posicionamento
autoritário de altos mandatários do PRR, a população entusiasmada com a idéia
de "italianos no poder" votou na chapa republicana, referendando os elementos
indicados por Borges de Medeiros.
3 . 2 O i n í c i o d a e x p e r i ê n c i a
A eleição do engenheiro agrônomo italiano procedeu-se sem
surpresas. A comissão de propaganda havia realizado o seu trabalho com
eficiência e a Igreja cooperou com eficácia, tendo em vista todo o processo
desenvolvido pela instituição. O quadro verificado na votação das eleições
municipais de 12 de agosto de 1924 ficou assim registrado:
92
Quadro 4
Eleições municipais - 1924
Candidato Total de votos
Dr. Celeste Gobbato 1119
Abramo Eberle 1118
Armando Antunes 893
Angelo De Carli 778
Angelo Antonello 776
Orestes Manfro 772
Leonel Mosele 770
Antonio Pieruccini 769
Alexandre Zaniol 607
Dr. Felix Spinato 249
Dr. Rufino Bezerra 254
Henrique Rossi 150
Fonte: O Brasil. 18 ago. 1924. p. 1.
Eleito, Gobbato tomou posse no dia 12 de outubro e, desde as
primeiras semanas no cargo, demonstrou possuir larga experiência em
administração pública. Uma de suas primeiras medidas foi a criação da
Comissão Pró-Caxias, formada por pessoas de destaque entre a população
caxiense. Gobbato atribuiu-lhe a função de "collaboração junto aos poderes
publicos municipaes na solução dos variados problemas que affectam a vida de
Caxias.”
3
A fundação da Comissão Pró-Caxias foi em 29 de novembro de
1924 e ela permaneceu até o final dessa administração. A diretoria foi composta
por Abramo Eberle (presidente), Tancredo Appio Feijó (vice-presidente),
Aristides Germani (2º vice-presidente), Paulo Rache (1º secretário), Felix
Spinato (2º secretário), Jorge de Mello Guimarães (3º secretário), João Ahrends
(1º tesoureiro), Joaquim Pedro Lisboa (2º tesoureiro), Hyginio Bernardi (3º
tesoureiro), Dante Marcucci (orador), e mais os seguintes diretores: Miguel
Muratore, João Pillar Guerreiro, João Chrysostomo, Cônego João Meneguzzi,
Vicente Bornacini e Olympio Rosa. Os diretores ficaram responsáveis pelas sub-
comissões criadas para promover os estudos necessários à resolução dos
problemas existentes no município.
3
Relatório apresentado ao Conselho Municipal pelo intendente Dr. Celeste Gobbato 1924-1925. Caxias,
12 out. 1924 a 31 dez. 1925. p. 22.
93
A forma de trabalho foi centrada nos estudos promovidos em cada
uma das sub-comissões, reunindo-se, a seguir, a grande comissão Pró-Caxias
que, em sessão aberta, discutia os resultados dos mesmos. A sub-comissão de
finanças, por exemplo, apresentou, na sessão do dia 31 de dezembro, um
estudo meticuloso sobre caixas rurais e cooperativas. Como resultado do
estudo, opinou pela criação de uma caixa municipal de depósitos populares.
Posto em votação o projeto de criação da Caixa, o mesmo foi aprovado por
unanimidade e o seu autor solicitou aos presentes que fizessem a devida
propaganda .
A propaganda oficiosa desta administração ficou ao encargo de
outra sub-comissão: a sub-comissão de propaganda, composta por seis padres
(Henrique Compagnoni, Giacomo Bombardelli, Albino Agazzi, Angelo Donato,
Antonio Rizzoto e Miguel Camandulenzi) presididos pelo Cônego João
Meneguzzi e secretariados por João Paternoster e padre Antonio Zattera.
Essa sub-comissão demonstra a penetração que a Igreja
conseguiu estabelecer no governo local. Não foram apenas os associados
católicos leigos que abriram espaço nas disputas elitorais para a administração
do município. Educados pela hierarquia eclesial para serem líderes, membros
das associações católicas, assumiram os postos-chave e o industrialista Abramo
Eberle, colaborador das sociedades católicas, vice-intendente e presidente da
Comissão Pró-Caxias, efetivou a participação da Igreja no governo de Celeste
Gobbato, quando aprovou a criação daquela sub-comissão. A Igreja não
participara diretamente do processo eleitoral de 1924, mas investia durante
longo tempo na organização e formação de um “grupo de pressão”
4
, cuja
atuação lhe facilitasse o acesso ao poder político com vistas a influenciar suas
decisões. A instituição católica não administraria o município por conta própria,
no entanto, estava organizada para influenciar e mudar aspectos da sociedade,
segundo seus interesses.
4
Em definitivo, podemos concluir que são os grupos de pressão os grupos organizados que, apesar de
influenciarem na distribuição dos recursos dentro de uma sociedade, seja para mentê-la inalterada, seja
para mudá-la em seu favor, não participam diretamente no processo eleitoral, em certo modo, não estão
interessados realmente em administrar por conta própria o poder político, mas sim em ter um acesso fácil
94
A característica administrativa do governo de Gobbato foi a de não
governar apenas com o partido republicano. A prática de governar respaldado
por comissões e sub-comissões foi uma constante, pelo menos nos anos de
1924, 1925 e 1926.
De todas as sub-comissões a que mais se destacou, enquanto
atuação, foi a de propaganda, pois estando nas mãos da hierarquia eclesial,
estavam à disposição da máquina governativa a imprensa católica, os sermões
dominicais, as capelas... . Para Monsenhor Meneguzzi, habituado aos jogos
políticos e às incursões pelos vários grupos sociais, recolher adeptos e
contribuidores para o novo governo não era difícil. Em reunião realizada pela
sub-comissão de propaganda, no dia 7 de setembro de 1925, presidida por
Meneguzzi, estavam presentes
"... muitos commerciantes e industrialistas, bem como o sr. Vigário da
Legua, rev. Angelo Donato e o Dr. Celeste Gobbato.
Com enthusiasmo os presentes subscreveram elevadas quantias,
collocando-se a disposição da Commissão " Pró-Caxias", para propagar
e levar avante esta tão util e nobre iniciativa, que bem demonstra, mais
uma vez, o civismo deste povo laborioso ... .
5
Tanto as quantias arrecadas pela comissão de propaganda como
pela Caixa de depósitos populares, destinavam-se às obras do plano de metas,
traçado pelo governo republicano.
No plano traçado pela Igreja, para valorização e apoio ao governo
de Celeste Gobbato, além das constantes matérias publicadas na imprensa
católica enaltecendo o intendente e o seu desempenho, havia a necessidade de
esse administrador participar das freqüentes comemorações promovidas pela
Igreja. Festas aos Santos, missas de aniversários, bençãos de sinos em várias
capelas. Tanto que, no Livro Tombo da Paróquia Santa Teresa, Celeste
Gobbato aparece como padrinho da benção dos sinos da Capela de Nª. Sª. de
Monte Bérico, da Capela de S. Valentim, da Capela de Nª. Sª. do Pedancino e
a este último e em influenciar suas decisões. Norbeto BOBBIO y Nicola MATTEUCCI. Diccionário de
política. p. 753.
5
Correio Colonial. Caxias, 01 out. 1925. p. 2.
95
da Capela de S. Joda VIª Légua. Todas as solenidades de benção dos sinos
foram realizadas pelo Cônego Meneguzzi.
À medida que a hierarquia eclesial articulava a propaganda do
Intendente e sua "laboriosa administração", o governo municipal, por sua vez,
autorizava subvenções aos padres ou intermediava a liberação de benefícios
doados pelo governo do estado. No primeiro caso, em 3 de janeiro de 1925, a
comissão de petições e reclamações deu parecer favorável aos despachos
requeridos pelo Padre Thiago Bombardelli, mantendo o subsídio por ele
recebido e ao Vigário Meneguzzi foi deferida sua petição, cabendo ao
intendente estabelecer uma subvenção que era compreendida como razoável.
6
No outro caso as subvenções foram enviadas pelo governo do
estado ao hospital dirigido palas "Damas de Caridade". O valor da importância
recebida foi de 2:000$000
7
. O Instituto Nª. Sª. do Carmo e Sociedade Porvir
Científico obtiveram aprovação do intendente para o requerimento no qual
solicitavam isenção de impostos, durante dois anos, para os prédios onde
funcionava o Instituto.
Atenção especial foi dada às escolas religiosas e aulas paroquiais
da municipalidade, no sentido de que estas também recebessem subvenções.
No primeiro ano da administração foram concedidas verbas ao Colégio Nª. Sª.
de Lourdes, ao Juvenato S. Carlos de Nova Milano e de S. Miguel, ao Colégio
D. João Becker, de S. Marcos, ao Colégio Nª. Sª. de Pompéia, de Ana Rech e
às aulas paroquiais da cidade. O benefício totalizou 618$330.
As solicitações de Gobbato eram prontamente atendidas pelos
membros da hierarquia eclesial, como foi o caso em que o intendente enviou
uma circular às autoridades e vigários do município, solicitando que
conseguissem, amigavelmente, dos colonos, os animais necessários para a
montaria das forças legais da região militar. Em 48 horas foram reunidos
nada mais do que quinhentos animais.
8
6
Correio Colonial. Caxias, 03 jan. 1925. p. 1.
7
Id., Ibid., p. 1.
8
O Regional. Caxias, 08 jan. 1927. p. 2.
96
Arquitetadas as bases da administração de Celeste Gobbato com
a Comissão Pró-Caxias, as sub-comissões e a hierarquia eclesial, o intendente
iniciou um processo de valorização da região de colonização italiana, bem como
de tudo o que fizesse referência ao que era italiano.
Caxias, município de colonização italiana, contava em 1925 com
27.034 habitantes, com uma produção agrícola, industrial e extrativa avaliada
em 70.000:000$000 dos quais 22.000:000$000 eram exportados. A elaboração
do vinho produzia mais de 7.000:000$000 por ano e a vitivinicultura ocupava
uma área de 5.500 hectares. Somando-se à produção das indústrias
metalúrgica, de tecelagem, moagem e serrarias, as reservas do município, em
1924, chegaram a 764:824$300.
9
A produção acima referida bem como sua diversidade foram
usadas para dar mostras do trabalho, empenho e desempenho dos italianos.
Em 1925, Celeste Gobbato promoveu as festividades comemorativas aos
cinqüenta anos de imigração italiana no estado.
Como era do seu costume, convocou uma reunião na intendência
com o objetivo de organizar e eleger uma grande comissão que ficaria
encarregada de organizar todas as comemorações daquela festividade. A
comissão foi constituída por Luigi Arduini, Celeste Gobbato, Vico Barbierie e
Cônego Meneguzzi, como presidentes honorários. Aristides Germani foi o
presidente efetivo; Dr. Felix Spinato, Mario Caorsi, Vicenzo Bornancini, Leonel
Mosele, Adelino Sassi, Tancredo Feijó e Angelo Antonello, vice-presidentes. Os
tesoureiros ficaram Galleazzo Paranelli e Fulvio Minghelli. Para secretários:
Mauricio Viola, Bruno Battocchio e Dante Marcucci.
Para marcar o evento de forma que as gerações futuras tivessem
a idéia da apologia realizada por tal administração, o intendente nomeou
sub-
-comissões que receberam o encargo de apresentar uma monografia alusiva
aos cinqüenta anos da imigração, bem como a importância do elemento italiano
para o progresso da região e do estado. À outra sub-comissão coube a tarefa de
9
Correio do Povo. Porto Alegre, 06 dez. 1925. p. 10.
97
organizar a exposição agro-industrial, na qual seria divulgado o potencial
econômico do município.
A auto-promoção do grupo de italianos católicos, subjacente aos
festejos do cinqüentenário da imigração italiana, certamente trabalhou mais na
divulgação do " imigrante que lutou e venceu", do que, propriamente, na
promoção do manancial econômico do município.
Enquanto a grande comissão do cinqüentenário trabalhava, uma
outra era articulada . No mês de maio de 1925, Celeste Gobbato realizou a
instalação do Congresso de Intendentes dos municípios da região de
colonização italiana, com a finalidade de estudarem os assuntos de vital
importância para essa região.
10
Na visão administrativa de Celeste Gobbato o poderia persistir,
na região, formas tão diversificadas de administração pública e condução de
questões vitais, quando a semelhança de condições agrícolas, econômicas e
sociais exigiam uma completa uniformidade de ações.
11
Para a realização deste Congresso, o intendente, usando de
diplomacia e cautela, solicitou a aprovação para sua realização ao presidente do
estado Borges de Medeiros. Obtendo aprovação e licença para concretizá-lo,
Gobbato enviou ofício aos intendentes dos municípios de Alfredo Chaves,
Antonio Prado, Bento Gonçalves, Encantado, Garibaldi, Guaporé, Nova Trento,
Prata, S. Francisco de Paula e S. Sebastião do Cai.
12
A proposta para estudos e discussões abordava essencialmente
seis pontos:
1- Unificação, se possível, das leis de impostos;
2- Substituição do imposto de estatística e expediente por outro
imposto equivalente;
3- Um estudo sobre as estradas rurais e intermunicipais;
4- Ensino elementar e profissionalizante;
5- Unificação eventual dos códigos de postura municipais;
10
La Staffetta Riograndense. Garibaldi, 29 abr. 1925. p. 10.
11
Ib., Ibib., p. 10.
12
Ib., Ibid., p. 10.
98
6- Criação de um viveiro intermunicipal e meios modernos para
ativar a cultura racional nas colônias.
13
Mediante aprovação do presidente do estado, Celeste Gobbato
realizou o Congresso de Intendentes nos dias 3,4,5 e 6 de maio de 1925. O
mesmo foi organizado em quatro reuniões, com uma pauta específica para cada
momento e, como determinava a ética política, estavam presentes o
representante de Borges de Medeiros, Dr. Renato Costa, eleito presidente do
Conselho, e o Cônsul da Itália Luigi Arduini.
A primeira reunião teve na sua pauta os discursos de abertura nos
quais o presidente esclarecia a aprovação dada por Borges de Medeiros à
iniciativa de Gobbato, e que contassem, os intendentes ali presentes, com a sua
colaboração na obra iniciada por aquele intendente. Finalizados os discursos, os
participantes enviaram um telegrama ao Presidente do Estado.
Os temas discutidos na segunda reunião versaram sobre as
estradas de rodagem, a unificação dos códigos de postura municipais e a
criação de campos de ensino para a agricultura.
As estradas de rodagem mereceram ampla discussão, sendo
deliberado pelo Conselho que a soma necessária para a conservação das
mesmas seria dividida entre o governo do estado e os municípios interessados
na sua manutenção. A Associação Comercial de Caxias aproveitou o momento
e solicitou a abertura de uma grande estrada que, ligando Caxias a Nova Trento,
Antonio Prado e Vacaria, pudesse facilitar o escoamento dos produtos
regionais. Os congressistas, considerando o volume de tal obra, decidiram,
prudentemente, colocar tal pedido à apreciação do Presidente do Estado.
A unificação dos códigos de postura parecia ser mais uma
necessidade do poder estadual do que do regional, tanto que foi Dr. Renato
Costa quem explicou as vantagens que poderiam ser adquiridas com tal
unificação. Para tanto, escolheram o código de posturas do município de Bento
Gonçalves para servir de base aos estudos necessários.
13
La Staffetta Riograndense. Garibaldi, 29 abri. 1925. p. 10.
99
A criação de campos para o ensino da agricultura, que deveriam
ser organizados ao lado das escolas, ficou como compromisso dos intendentes,
porém estes solicitavam ao Dr. Gobbato um maior número de explicações.
Novamente foi Dr. Renato Costa quem justificou essa necessidade. Precisava a
agricultura da região utilizar métodos mais modernos e mais científicos. O
Conselho decidiu, então, pela criação de um estabelecimento onde funcionaria
uma escola agrícola e um viveiro intermunicipais, cuja finalidade seria atender a
todos os agricultores, inclusive no fornecimento de mudas de árvores frutíferas.
Foi nomeada uma comissão para estudar e realizar a criação do referido
estabelecimento.
Os impostos e as rendas municipais foram os principais pontos de
discussão da terceira reunião. Os intendentes primavam pela extinção do
imposto de exportação regulador das mercadorias que passavam de um
município ao outro. A proposta apresentada pelo representante do estado não
cogitava a hipótese de extinção, mas uma nova tabela com taxas uniformizadas
para todos os municípios. Mais uma comissão foi nomeada para fazer os
estudos necessários à confecção de tal tabela.
Um aparte de Celeste Gobbato com relação aos tributos foi a
proposta de elevar a taxa de impostos das casas de comércio que não
fechavam aos domingos. O jornal católico Staffetta Riograndense acrescentou
ao final da nota a frase: Muito bem!.
14
As Caixas Rurais e Cooperativas foram
discutidas para alertar aos intendentes da necessidade de valorização dos
produtos de seus municípios. Ficou a promessa de ajuda do governo do estado
para promover aquelas instituições de bem comum, assim consideradas pelo Dr.
Renato Costa .
Nessa reunião, a última proposta de Gobbato foi lançar a idéia de
uma lei que proibisse a devastação das florestas pelos colonos, bem como
oferecer prêmios aos que promovessem o reflorestamento em suas colônias.
14
La Staffetta Riograndense. Garibaldi, 13 maio 1925. p.1.
100
A última reunião foi registrada apenas com os discursos de
encerramento, os quais primaram pela esperança de maiores progressos para a
região colonial italiana.
Ao findar o ano de 1925, Caxias havia sido palco de espetáculos
promocionais , capazes de provocar esquecimento nos mais ferrenhos
adversários políticos. A sub-comissão de propaganda, formada por membros do
clero, encarregava-se de valorizar os imigrantes italianos e a dinâmica
administração daquele momento. Essa sub-comissão enquadrou-se, também,
no plano recristrianizador, isto é, de regeneração da sociedade moderna sob
seu aspecto moral. Ao mesmo tempo em que o jornal católico Staffetta
Riograndense divulgava as cartas pastorais do Arcebispo Metropolitano de
Porto alegre, a sub-comissão possuía um espaço destinado à divulgação das
obras do “grande” administrador Celeste Gobbato. Enquanto em uma Carta
Pastoral falava-se das muitas dificuldades de atendimento aos paroquianos e
dos muitos sacrifícios que a Arquidiocese fazia para atendê-los, e que a
confiança em Deus tudo possibilitava, em uma outra coluna, do mesmo
semanário, lia-se um extenso artigo falando do inatacável intendente, o qual
desenvolvia uma administração de fecundo e febril trabalho, não se deixando
abater pela dificuldade e complexidade dos problemas que até ele chegavam.
Os redatores lembravam que todo o sacrifício era válido para o progresso do
município e para o bem-estar de seus habitantes e, certamente, ao final do
mandato, o intendente receberia de seus administrados aplausos e gratidão.
Por ocasião dos cinqüenta anos da imigração italiana no estado,
Gobbato promoveu um período de festividades, no qual os eventos alusivos à
imigração receberam ampla cobertura do jornal católico Staffetta Riograndense.
Nele a sub-comissão de propaganda publicou, em essência, o projeto
reformador da sociedade. O discurso enfatizou o trabalho constante, os suores
fecundos e o contínuo progresso daqueles cinqüenta anos. Eram dadas glória à
família cristã, aos bons costumes e à religião dos colonos, pois as igrejas
estavam cheias e as prisões vazias. Assim, um tripé havia se formado em busca
de cristianização: trabalho, oração e paz. Também destacaram, e sobremaneira,
101
o papel do administrador, enaltecendo-o por levar a bom termo as idéias que
permeavam as comemorações, e a execução de uma obra repleta de ideais.
Honra e gratidão foram palavras constantes nos registros da imprensa católica
para com aquele administrador.
Administrador público habilidoso, o intendente italiano reuniu, fora
do Conselho Municipal, representantes dos vários grupos da sociedade civil.
Igreja, industrialistas e comerciantes estavam sempre representados nas
comissões criadas para auxiliar na promoção de qualquer evento. A
administração havia começado com o consenso e a aprovação da sociedade.
As promessas de campanha aos poucos foram cumpridas,
contando com o indispensável apoio do governo estadual. Segundo o próprio
intendente
"... para a ordem e o progresso de nossa admnistração não
economizarei esforços a fim de proporcionar as melhorias de carater
municipal que ainda são necessárias.”
15
3 . 3 O P o s i t i v i s m o d a a d m i n i s t r a ç ã o : o p r o g r e s s o p e l a s
o b r a s
As lutas partidárias travadas nos anos anteriores à eleição de
Gobbato, afetaram a organização administrativa da intendência bem como os
serviços que por ela deveriam ter sido desenvolvidos. O intendente eleito
promoveu um diagnóstico da situação interna, resultando na modificação dos
serviços de secretaria e tesouraria. Deu aos dois setores o aspecto de
dependências comerciais, tornando-os mais ágeis e permitindo ao intendente ter
o conhecimento de todos os fatos acontecidos diariamente. Foi necessária a
organização de um arquivo, tendo em vista a ausência de qualquer tipo de
tratamento ou guarda dos papéis e documentos da Intendência, até então.
A necessidade crescente de escolas fez surgir a Inspetoria Escolar
que tinha por finalidade primeira organizar a parte administrativa escolar e
15
La Staffetta Riograndense. Garibaldi, 28 out. 1925. p.1-2.
102
preparar os seus quadros estatísticos. A partir de sua criação, Gobbato via a
possibilidade de dar ao ensino um caráter obrigatório. Até aquele momento a
única obrigatoriedade conseguida pelos positivistas do PRR local era a
comemoração, nas escolas, das datas de 7 de setembro e 15 de novembro.
A política de melhoramento da produção agrícola era liderada pelo
próprio intendente, cuja formação profissional o avalizava. O estado de
abandono ao qual foram submetidos os colonos durante as administrações
anteriores, dificultou o desenvolvimento dessa política. Intransigentes e
resistentes aos novos métodos científicos para a agricultura, obstaculizavam
qualquer tipo de modificação. A alternativa encontrada foi criar a Inspetoria
Agrícola Municipal, iniciando seu trabalho com um pomar didático.
O pomar começou com 500 exemplares de árvores frutíferas, de
10 espécies diferentes e 90 variedades. Organizou um vinhedo com 500 vinhas
divididas em mais de 20 variedades e um viveiro destinado a distribuir mudas de
videiras de boa qualidade. Também era tarefa da Inspetoria Agrícola distribuir
sementes de plantas para reflorestamento, promover o ajardinamento e a
arborização da cidade e publicar um boletim informativo que era distribuído
entre os habitantes do município.
Como incentivo à agricultura, o Conselho Municipal aprovou uma
Lei segundo a qual ficaria isento de pagar o imposto de conservação de
estradas o colono que:
a) plantasse 1/2 Ha ( 5.000 m²) de videiras apropriadas;
b) plantasse 1/2 Ha de eucaliptos;
c) plantasse 1/2 Ha de plantas frutíferas;
d) plantasse 1/2 Ha de erva-mate;
A inspetoria de Limpeza Pública também foi reformada, com o
objetivo de fiscalizar os estabelecimentos que comercializavam alimentos. A
partir dessa reforma, foram controladas a qualidade dos produtos,
especialmente o leite, a forma de exposição dos mesmos e suas embalagens.
Um técnico do Laboratório de Higiene do estado auxiliava na fiscalização.
103
A incidência de doenças venéreas fez surgir o Serviço de
Profilaxia, dirigido por umdico e com o auxílio de uma enfermeira.
As obras de saneamento e melhoria das condições urbanas
ficaram ao encargo da Secretaria de Serviços Públicos, que realizou, junto a um
engenheiro da Comissão de Saúde do Governo do Estado, um estudo para o
abastecimento eficaz de água potável. Nas obras de saneamento, foi
introduzida a utilização de tubos de cimento, tidos como material econômico e
proporcionador de agilidade aos trabalhos.
A zona rural foi alvo constante na ampliação, manutenção das
estradas e construção de pontes. Para os colonos que seguissem a tabela
indicada pela Intendência, no que se referia à quantidade de vinhas e plantas de
reflorestamento, seria concedida a isenção do imposto de conservação de
estradas.
16
A isenção de impostos foi uma prática comum durante essa
administração. Usada como incentivo, foi oferecida, pelo prazo de três anos, aos
proprietários de imóveis, que construíssem os prédios de alvenaria e não mais
de madeira, tanto nos limites urbanos como suburbanos. O imposto de
estatística e expediente foi abolido pelo prazo de 10 anos , para quem instalasse
no Município, moinhos com uma produção mínima de 300 sacos de farinha.
Para quem instalasse uma brica de refino de banha, a isenção seria pelo
prazo de cinco anos.
A característica positivista de administração pública "às claras" era
seguida por Celeste Gobbato. A imprensa católica, preferencialmente, publicava
com regularidade as propostas e realizações de sua administração. Era rotina,
também, a publicação dos relatórios anuais naquele jornal. Esse, não poupando
elogios , escrevia:
"Ele abraça a gestão administrativa em todas as suas formas, em todos
os seus pontos de contato, diriamos assim com a coletividade caxiense;
lembra as datas e festas importantes, explica com quadros e cifras o
movimento comercial, industrial, financeiro, agricola e profissional do
Município.”
17
16
Il Corriere Coloniale. Caxias, 03 jan. 1925. p. 5.
17
La Staffetta Riograndense. Garibaldi, 19 maio 1926. p. 2.
104
Todo o apoio externalizado pela Igreja local, ao intendente, obteve
deste o máximo empenho para a criação do Bispado de Caxias. No ano de
1927, o intendente viajou ao Rio de Janeiro, para, junto às autoridades
competentes, interceder pela referida criação, porém, foi no ano de 1934, que
ocorreu a fundação da Diocese e, no ano seguinte, a nomeação do Bispo.
Ainda nesta viagem, Gobbato tentou adotar medidas para evitar a
falsificação dos vinhos rio-grandenses, que estava ocorrendo nos estados do
centro do país. Getulio D. Vargas, ministro da fazenda, recebeu na ocasião o
pedido de adoção de um selo de consumo especial para o vinho elaborado no
Rio Grande do Sul.
Durante a entrevista com o Ministro, o intendente solicitou,
também, a concessão de impostos de direitos alfandegários para o material que
seria empregado nas obras de saneamento urbano e mais um auxílio de
200$000, anteriormente prometidos pelo Governo Federal, para a instalação
hidráulica no município.
O pedido de instalação de uma agência do Banco do Brasil na
cidade também fez parte da pauta desta viagem. No ano seguinte à entrevista
concedida pelo Ministro da Fazenda , Getulio D. Vargas, em visita a Caxias,
em seu discurso
comentava:
" ...Caxias não era a Perola das Colonias, como muito justamente a
chamara Julio de Castilhos ha mais de 30 annos, e sim a verdadeira
metropole, intellectual e moral de toda a rica e bella região colonial
italiana.”
18
O desejo de progresso, acalentado pelos imigrantes, havia
chegado pela administração de um italiano ligado ao partido republicano. Para o
grupo que passou da situação de dirigido para dirigente, o momento não poderia
ser mais vantajoso. Para os republicanos dissidentes, integrantes do grupo de
oposição, a situação parecia calamitosa. Tanto progresso deixaria o município
individado. E mesmo havendo a publicação, na imprensa católica e republicana,
das contas municipais, o aumento do patrimônio não era suficiente.
105
Para realizar uma administração, cujo objetivo era modernizar o
município, conforme os desejos das elites conservadoras locais, Gobbato
necessitou de empréstimos para resgatar a dívida municipal com o Banco
Nacional do Commercio. O valor do empréstimo realizado pelo governo do
estado, foi de trezentos e cinqüenta e sete mil, cento e quarenta e dois dólares-
ouro com oitenta e seis centavos, pagáveis no prazo de 40 anos, devendo as
amortizações e os juros serem pagos a cada seis meses.
19
Modernizar os municípios fazia parte do ideário republicano. O
processo por nós observado até aqui estava sendo vivenciado, também, pela
intendência de Porto Alegre. Nessa cidade, a política de modernização exigiu a
reforma tributária, a aquisição de vultuosos e sucessivos empréstimos saldados
a longo prazo, bem como, fez-se necessária a reforma administrativa. A
arquitetura e os serviços dos municípios deveriam causar “... impresão capaz de
atestar a eficiência do governo perrepista, através da ação de seus intendentes.”
20
3 . 4 O p r o g r e s s o g e r a d o r d e c r i s e
Nos primeiros tempos da administração, o intendente italiano,
como rezava a cartilha borgista, o realizava os projetos sem obter o
consentimento do Presidente do Estado. A atitude de Gobbato tinha uma dupla
finalidade: a primeira, atender às determinações de Borges e a segunda
disfarçar as razões pelas quais ele afastou das funções os antigos
correligionários lusos do PRR, da administração municipal. Esta é uma das
razões da futura crise do governo italiano.
Enquanto a Igreja promovia a propaganda pró-administração
Gobbato, os membros do partido que haviam sido isolados por essa
administração, o qualificavam de político sem habilidade, infeliz no que dizia
18
O Regional. Caxias, 23 abr. 1928. p.1.
19
O Regional. Caxias, 20 jun. 1927. p. 1.
20
Margaret M. BAKOS In Günter WEIMER. Urbanismo no Rio Grande do Sul. p. 76.
106
respeito às suas atitudes partidárias e com absoluta falta de tino
21
. As figuras
mais prestigiadas do partido republicano, em outras administrações, julgavam-
se diminuídas pela sonegação sistemática de atenções e consultas para os
assuntos referentes às exigências da política e da administração.
Esses republicanos acusavam o intendente de agir sozinho na
administração e,
"...que enfraqueceu e desarticulou, inteiramente, o partido Republicano
deste Municipio, deixando-o em condições de inefficácia absoluta, sem
arregimentação e sem disciplina, creando divergencias em todos os
cantos e desgostos em todas as partes.
22
Também o acusavam de preferir os industriais e comerciantes
italianos para a realização de negócios necessários à Intendência. Quando foi
proposta a divisão do cartório dirigido pelo Major Adaucto Cruz, ex-intendente, a
acusação era de que o intendente fazia tal proposta "... para aquinhoar um seu
patricio.”
23
O processo político instaurado levou aquele grupo a nomear uma
comissão que buscou entendimentos com o presidente do estado. Se as
divergências políticas pouco ou quase nada alteraram o relatório de obras da
gestão de Celeste Gobbato, elas certamente alteraram os rumos da sucessão
intendencial.
As vésperas de uma nova campanha eleitoral, Gobbato foi alvo
constante de boatos sobre sua renúncia, fato que não aconteceu, porém retirou
a indicação, por ele realizada, à sua sucessão. Interesses ligados às categorias
dos industriais, comerciantes, advogados, médicos e outros elementos
representativos da sociedade civil, levavam aqueles grupos a promoverem
manifestações de solidariedade ao intendente, pela sua atuação na
administração e no processo de sucessão.
Por outro lado, a Igreja começou a manifestar certo mal-estar pelo
rumo que a sucessão estava tomando. No Livro Tombo da Paróquia Santa
Teresa encontramos o seguinte registro:
21
Caxias. Caxias, 03 maio 1928. p.1.
22
Id., Ibid., p. 1.
23
Caxias. Caxias, 09 fev. 1928. p. 2.
107
"O Dr. Celeste Gobbato, Intendente de Caxias, estando prestes a
terminar o seu quadrienio em doze de Outubro p.v., apresentou para
candidato a Intendente de Caxias um homem de religião positivista. O
clero não deve meter-se em questões partidárias, porquanto elle é o pae
dos fieis afilhados a qualquer partido, mas tratando-se de candidatos
aversos a religião catholica, permanecer na indifferencia seria o mesmo
que renegar a fé. Por isto o Conego João Meneguzzi oppoz-se com toda
a destreza e não tendo podido conseguir que o Dr. Gobbato mudasse de
candidato, conseguiu que o povo o fizesse mudar, digo o povo sem
distinção partidária.”
24
À Igreja local seria necessário manter o seu espaço no governo
municipal. No momento em que se abria a possibilidade do rompimento, o clero
articulou-se com um outro grupo, ou seja, a oposição. Esta assumiria o antigo
discurso da Igreja
"...impugnando o candidato que lhe querem impôr e procurando
escolher outro que satisfaça os interesses da população, que mereça a
sua confiança e tenha o apoio da maioria do povo e esse candidato,
deve ser um homem daqui que conheça os interesse de Caxias..”.
25
A instituição que havia dado apoio incondicional àquela
administração, por ter sido parte dela, mudou o jogo político. Aos seus olhos e
do partido Republicano, esse governo intendencial chegava ao seu término
enfraquecido pelas críticas de individamento do município, pela condução
dos rumos internos do próprio partido e principalmente por indicar um positivista
à sucessão. Para evitar a saída da Igreja do governo local, D. João Becker,
enviou ao Cônego Meneguzzi a seguinte carta:
"O portador desta é meu eminente amigo General Firmino Paim, que vae
a Caxias, a fim de solucionar definitivamente o caso da renovação
intendencial dahi. Como a direção suprema do partido republicano tem
de resolver esse problema a bem da paz e tranquilidade social desse
importante municipio, é necessário que o clero preste todo apoio. Claro
está que os cathólicos republicanos antes duma deliberação definitiva do
governo tem o direito de apresentar esse ou aquelle candidato, uma vez
porem que o candidato seja officializado, exige a boa disciplina partidaria
que não haja nenhuma reluctancia e que todos estejam de accordo. O
mesmo deve-se dizer com relação a qualquer outro partido ao qual por
ventura outros catholicos pertençam.”
26
24
Livro Tombo da Paróquia Sta. Tereza. Caxias, n.1, 1 jul. 1928. p. 81.
25
Caxias. Caxias, 28 jun. 1928. p.1.
26
Livro Tombo da Paróquia Sta. Tereza. Caxias, n. 1, 13 jul. 1928. p. 81.
108
A ordem política emitida pelo Arcebispo teve de ser obedecida
pelo clero caxiense, especialmente por Monsenhor Meneguzzi, cujo apoio foi
dado ao candidato indicado pelo PRR estadual e, com a intervenção do
arcebispo, sendo designado um candidato católico.
27
O sucessor foi Thomáz
Beltrão de Queirós e seu vice Miguel Muratore.
Nesta primeira experiência italiana de poder, a administração
política, buscou como estratégia para o consenso a utilização de comissões
formadas por vários grupos da sociedade civil. A Igreja, como membro efetivo
desse poder, continuou assegurando, segundo terminologia de A. Gramsci, a
relação entre o catolicismo dos intelectuais e o dos " simplórios”
28
. Foi através
dessa relação que a instituição possibilitou a formação de líderes dentro do
contingente de imigrantes italianos via associações católicas leigas.
A disciplina de ferro mantida sobre os intelectuais, levou-os a
constituir um bloco cultural e social, que, a luz dos estudos daquele teórico,
observa-se:
"... a organicidade de pensamento e a solidez cultural poderiam
ocorrer se entre os intelectuais e os simplórios se verificasse a mesma
unidade que deve existir entre teoria e prática, isto é, se os intelectuais
fossem, organicamente, os intelectuais daquela massa, se tivessem
elaborado e tornado coerentes os princípios e os problemas que aquelas
massas colocavam com sua atividade prática, constituindo assim um
bloco cultural e social.”
29
Portanto, a experiência italiana de poder enquanto administração
pública respaldada pelo grupo de imigrantes católicos, evidenciou: (a) a
participação de políticos que haviam feito parte de pelo menos uma associação
católica, quer no Conselho, quer nas comissões; (b) a formação de opinião na
sociedade civil ficou ao encargo da Igreja que, através de sua hierarquia
eclesial, formou a sub-comissão de propaganda; (c) a constante parceria Igreja
e governo municipal comprovada, tanto pelas comemorações e solenidades
religiosas como pelas subvenções blicas para obras da Igreja; (d) a
27
Loraine S. GIRON. Às sombras do Littorio - o fascismo no Rio Grande do Sul. p. 88.
28
Antonio GRAMSCI. Concepção dialética da História. p. 19.
29
Id., Ibid., p. 18.
109
participação de Monsenhor Meneguzzi, sem a qual nada se realizava na
Intendência, representando a instituição eclesial dentro do governo municipal;
(e) Celeste Gobbato, em nível político, executou o papel de "condutor de
homens", cuja vontade moldou e conduziu outros homens a um fim maior, na
exata definição do Arcebispo de Porto Alegre, D. João Becker.
Verificamos que Gobbato e Monsenhor Meneguzzi
desempenharam papel semelhante. Se este era o intelectual que mantinha a
disciplina sobre a massa italiana católica, aquele tentou a disciplina entre os
intelectuais de outros municípios da região de colonização italiana.
Desde sua eleição, Celeste Gobbato acumulou os cargos de
Intendente, sub-chefe de polícia e diretor político, isto é, possuía nas mãos a
função coercitiva partidária, necessária à manutenção da coesão para o
Estado. O Partido Republicano Riograndense, com essa administração,
vivenciou uma fase de hegemonia entre grupos locais. O Estado foi, então,
concebido como organismo próprio de um grupo (italianos católicos), cuja
função foi criar condições favoráveis à expansão máxima desse grupo.
As obras materiais que revelaram as premissas positivistas "ordem
e progresso" servirão a um grupo fundamental, cuja super-valorização
tornou o município de colonização italiana permanente reduto do
conservadorismo político- -católico. Ou teria sido católico-político?
C o n c l u s ã o
110
Esta pesquisa buscou demonstrar o processo de aquisição do
poder administrativo local, pelo grupo de imigrantes italianos católicos, bem
como as expressivas manifestações desse grupo, que, associados ao clero,
enfrentou maçons e lusos na luta pelos seus fins. A Igreja demonstrou ter sido o
elemento centralizador daquele processo.
Os imigrantes italianos católicos instalados na Colônia Caxias
formaram um núcleo de povoamento cujas características foram moldadas pela
religiosidade e por uma forma de vida, na qual, a população se aglomerava em
torno das Igrejas paroquiais.
A religiosidade estava permeada por princípios moralizantes,
ortodoxos e críticos da sociedade moderna. Nesse contexto o racionalismo e o
liberalismo eram vistos pela Igreja como seus inimigos, tanto quanto as
sociedades secretas acatólicas (Maçonaria e carbonária) o eram. Essa postura
era determinada pela Romana e o clero, por sua vez, recebera a tarefa de
manter os católicos longe dos perigos da modernidade, utilizando-se, para isso,
da política de romanização. A vigilância realizada pelo confessionário, as visitas
pastorais, a formação de opinião pública através dos jornais de espírito católico,
as escolas religiosas, as associações de leigos e as obras pias integraram
aquela tarefa, que aliada ao plano de secularização da sociedade civil,
mesclaram-se na formação de um “Estado Católico”.
As visitas pastorais recomendavam, aos padres, mansidão e não
envolvimento em causas políticas. O jornal católico começou em 1896, com o
nome de Il Colono Italiano, depois denominou-se La Libertá e logo em seguida
La Staffetta Riograndense. As associações de leigos e as obras pias iniciaram
com o trabalho de Padre Nosadini que, chegando a Caxias em 1896, organizou
os Comitatos e os difundiu na zona rural.
Os imigrantes italianos, integrantes do processo de formação da
pequena e média propriedades, obtiveram intensa participação, conjuntamente
à Igreja, não em nível religioso, mas também em nível social. Economica e
politicamente formaram um grupo heterogêneo, o que não os impediu de
111
desenvolverem uma economia florescente, centrada a princípio, na produção
agrícola.
A hegemonia política, em Caxias, naquele momento, era a do
Partido Republicano Riograndense, cuja essência estava centrada na versão do
positivismo castilhista. Nela, o grupo dominante, em nível estadual, era o
vinculado à grande propriedade agropastoril e tradicionalmente composto
por luso-
-brasileiros. Devido às relações de acomodação dos interesses do PRR, em
nível estadual, era comum os intendentes de Caxias serem lusos. Com o
desenvolvimento econômico de alguns grupos locais, a Intendência é
ambicionada, também, pelo grupo de imigrantes italianos católicos. Esses
necessitariam buscar a hegemonia política para se assumirem como poder
político e administrativo local.
A busca da hegemonia revelou um processo no qual a Igreja como
instituição foi a principal articuladora. Ela possibilitou a formação de lideranças
na sociedade civil, ditou princípios morais e intelectuais e, articulou a massa
católica: primeiramente congregando-a contra o avanço do grupo maçom
presente na Intendência e, posteriormente, em torno da conciliação com o grupo
politicamente dominante em Caxias. Em ambos os casos os Comitês ou
associações católicas leigas foram o veículo.
No primeiro caso, destacamos a atuação de Padre Nosadini que,
através de seus comitatos, promovia a formação moral dos associados. Sua
posição crítica e denunciadora, facilitava a condução da massa católica, uma
vez que a Igreja era vista como a fonte das verdades absolutas.
No segundo momento, destacamos a atuação de Mons.
Meneguzzi, que organizou as associações e obras pias no sentido de promover,
além da formação moral, um preparo intelectual e cultural dos membros
associados com as atividades centralizadas na zona urbana. O papel
desempenhado por Meneguzzi proporcionou a formação de uma camada de
intelectuais capazes de discordar da forma coercitiva que se sobressaía na
112
hegemonia coercitiva do PRR. Os líderes preparados por ele, reivindicavam a
igualdade político-jurídica junto ao governo local.
Durante o período de atuação de Mons. Meneguzzi, Igreja e
Estado mantiveram relações de colaboração. Se esta o foi a tônica durante a
atuação de Nosadini, foi certamente a de Meneguzzi. Para ele, conciliar os
interesses do grupo de católicos e reconduzir a Igreja local a um processo de
relações harmoniosas com o governo municipal, eram tarefas que levariam a um
mesmo objetivo: a formação de um governo católico em Caxias do sul.
Aquela posição de consonância entre as posturas da Igreja
estadual e governos castilhistas não foi respeitada quando da atuação de
Nosadini. Retomada por Meneguzzi, sofreu nova ruptura, quando do processo
eleitoral de 1922. A Igreja local posicionou-se a favor da oposição. A troca de
acusações e a campanha opondo catolicismo e positivismo promoveram um
lance de oportunismo, no qual a Igreja aplicou o golpe final no PRR. Foi o exato
momento de ser obtida a concessão necessária para as eleições municipais que
se aproximavam. O candidato do PRR era o italiano Celeste Gobbato. Esse,
para o grupo de italianos católicos, representava a retirada dos lusos do poder,
e para a Igreja católica era a possibilidade de efetivação do plano de
moralização da sociedade, através de um representante de seu grupo. Esse
plano seria corroborado, também, pelo governo positivista-castilhista.
Assim a Igreja configurou-se como um grupo de pressão. As
ideologias “germinadas” anteriormente via associações e obras pias,
possibilitaram-lhe essa condição. As lideranças por ela preparadas conseguiram
a unicidade política, intelectual e moral da sociedade. O grupo de pressão
conseguiu a aprovação de uma “chapa de conciliação formada por “homens
condutores”, aspiração tanto da Igreja quanto do governo positivista-castilhista.
A hierarquia eclesial alterou seu discurso, esquecendo-se uma antiga
reivindicação; de que o intendente deveria ser um membro da sociedade local, e
passou a fazer parte da primeira experiência italiana de poder. Nela, os luso-
brasileiros tornaram-se oposição.
113
Celeste Gobbato administrou Caxias no mais perfeito estilo
positivista-castilhista: muitas obras demonstrando desenvolvimento e
modernização; administrador público agente do bem comum e contribuidor do
estabelecimento de relações harmoniosas entre Estado e Igreja. Nessa
administração, a hierarquia eclesial, responsasbilizou-se pela boa propaganda
da administração.
Monsenhor Meneguzzi foi membro ativo nas várias comissões
criadas por Gobbato. A consonância existente entre Igreja e governo estaduais
passou a fazer parte também do contexto local. Assim, evidenciou-se a
participação de políticos que haviam feito parte das associações católicas, a
contribuição da Igreja na formação de opinião da sociedade civil e a constante
parceria Igreja e governo municipal, quer em solenidades e comemorações,
quer através de subvenções públicas.
Essa parceria tendeu a diminuir ao final da administração, quando,
por pressões estaduais, Gobbato indicou um positivista para ser seu sucessor.
O fato desagradou a hierarquia eclesial que mudou de postura levando seu
discurso par ao grupo de republicanos dissidentes, os quais haviam sido
excluídos do poder durante a administração italiana.
Como vimos, o grupo de italianos católicos consolidou, ao longo do
processo de aquisição do poder administrativo local, sua hegemonia, necessária
àquela primeira experiência de governo, através de elementos como: política de
romanização; a luta contra sociedades secretas; a formação moral, intelectual e
cultural da massa católica; e via associações leigas e obras pias. Nesse
processo, Fé e Vitória tornaram-se sinônimos de Política e Poder.
Alguns pontos não foram aprofundados neste trabalho por
desviarem-se do objetivo do mesmo. Alguns sugerimos para uma pesquisa
futura, como foi o caso do grupo maçons. Após o fechamento da Loja Força e
Fraternidade, em 1903, poderia ser investigado o papel desempenhado por
aquele grupo, nas associações das quais fizeram parte. Outro problema a ser
pesquisado e, também mencionado, é a inserção (ou não) do grupo
austríaco, na sociedade local, que, a princípio, foi isolado politica e socialmente.
114
A causa deste isolamento foram as dissidências políticas ou poderiam ter sido
religiosas?
Na área de arquivologia, poderia ser desenvolvido um projeto com
o objetivo de se fazer um levantamento da documentação envolvendo a atuação
da Igreja católica, nas colônias italianas, classificando-a segundo temáticas que
visem ultrapassar a visão de uma História Eclesiástica.
Pela riqueza do tema, são inúmeras as fontes ainda inexploradas,
que poderíamos apontar, levando-nos a pensar que estamos apenas no início
do resgate histórico das relações entre Igreja e política em Caxias do Sul.
115
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120
F o n t e s c o n s u l t a d a s
Arquivo Histórico Municipal de Caxias do Sul
Fontes oficiais e manuscritas (séries):
Relatórios da Intendência Municipal de Caxias do Sul.
Atas da Comissão Municipal.
Atas do Conselho Municipal de Caxias do Sul.
Atas da Comissão Eleitoral.
Lei Orgânica Municipal de Caxias do Sul.
Demonstrativo dos funcionários municipais.
Livros de registro de impostos de indústrias e profissões.
Fontes impressas formadas por periódicos da época:
O Caxiense ( 1897 a 1898);
Il Colono Italiano (1898);
O Cosmopolita ( 1902 a 1908);
O 14 de Julho ( 1902 a 1904);
Gazeta Colonial (1905 a 1909);
Cidade de Caxias (1911 a 1912);
Cittá di Caxias (1913 a 1923);
O Evolucionista (1915 a 1916;
A Resistência (1922 a ...);
O Democrata (1922 a 1923);
O Regional (1926 a 1928);
121
O Popular (1928 a 1930);
Caxias (1927 a 1932).
Almanaques italianos e brasileiros (1894 a 1928):
Almanaque Editores João Mayer Jr. & Comp.
Almanacco Novissimo - Remo Sandron Editore.
Almanach da Estrella do Sul - Edição do Centro da Boa Imprensa do R.
G. do Sul.
Fontes formadas por coleções especiais:
A candidatura do Cônego D. João Meneguzzi para o cargo de Intendente
A vida espiritual do colonos.
Sacerdotes italianos.
Padres Salesianos.
Missionários de S. Carlos.
Padres S. José.
Arquivo Jornal Correio Riograndense
Fonte periódicos católicos no período de 1909 a 1928:
Jornal La Libertà (1909 a 1910) - Ordem dos Capuchinhos.
Il Colono Italiano (1910 a 1917).
La Staffetta Riograndense (1917 a 1941), o período de análise foi de
1917 a 1928.
Arquivo Paróquia Santa Teresa
Livro Tombo nº 1.
Arquivo Pio Sodalício Damas de Caridade
Livro de Atas da Associação Damas de Caridade.
Biblioteca Pública de Caxias do Sul
Publicações bibliográficas de temas locais
122
Fontes complementares:
Entrevista com o Sr. Hermes Dip.
Entrevista com a Srª Sueli Bascù.
Entrevista com a Srª Paulina Moretto.
Livros Grátis
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