Cuiabá envolta em um crepe mortuário: a epidemia de varíola 55
Deus, que irado com os pecados da população, teria resolvido vingar-se, e para acalmá-
lo era preciso fazer penitências
152
.
Outras análises
153
concluíram que, na impossibilidade de explicar a causa das
epidemias, e na busca de um culpado, a resposta encontrada pelo europeu medieval foi a
acusação do estrangeiro, identificado como inimigo e portador de doenças, o que tornou
os portos verdadeiros locais de controle
154
. No Brasil, vários estudos analisam também
os portos como alvo de uma legislação e vigilância que visa impedir a entrada do
inimigo, geralmente estrangeiro, portador das doenças
155
.
Responder à pergunta, de quem é a culpa, como geralmente acontece nas epidemias, fez
parte das indagações dos homens que viveram a de 1867 em Mato Grosso,
afinal....Encontrar as causas de um mal é recriar um quadro tranquilizador, reconstruir
uma coerência da qual sairá logicamente a indicação dos remédios.
156
As respostas
foram múltiplas, muitas vezes coexistiram, o que mostrou que nenhuma oferecia
absoluta margem de segurança, ao mesmo tempo que oportuniza a essa análise perceber
o sentido, o significado da resposta para aqueles que a construíram.
O Relatório elaborado pelo comandante do contingente de Vila Maria, João Carlos
Pereira Leite
157
, registrou que a bexiga epidemicamente grassava na força de Cuiabá, e
Moutinho, contemporâneo aos acontecimentos ao relatar o episódio da retomada afirma
que os soldados brasileiros foram contaminados da varíola que grassava n’aquele
ponto com bastante intensidade
158
, ofereceram uma versão que acabou predominando
na historiografia, ao responder que a culpa era do soldado paraguaio.
Embora os relatórios presidenciais analisados anteriormente, em várias oportunidades
afirmassem que a Divina Providência preservava a Província do flagelo das bexigas,
152
DELUMEAU, Jean. Historia do Medo no Ocidente (1300-1800), p.138.
153
Cf. REVEL, Jacques e PETER, Jean-Pierre, op. cit.,, p.148; DUBY, Georges. Ano 1000 ano 2000.
p.80:86, FOUCAULT, Michel. O nascimento da medicina social. In: Microfísica do poder. p.79:98.
154
Cf. REVEL, Jacques, PETER, Jean-Pierre, op. cit.,, p.148; DUBY, Georges. Ano 1000 ano 2000.
p.80:86, FOUCAULT, Michel. O nascimento da medicina social. In: Microfísica do poder. p.79:98.
155
Entre outros: SIQUEIRA, Marcia Terezinha A.D., Saúde e doença na Província do Paraná,
CHALHOUB, Sidney. Cidade Febril: cortiços e epidemias na corte imperial, BERTOLLI FILHO,
Claudio. Epidemia e sociedade: a gripe espanhola no município de São Paulo.
156
DELUMEAU, Jean, op. cit., p. 138.
157
Relatório do Major João Carlos Pereira Leite, Comandante do Contingente Militar de Vila Maria ao
Tenente Coronel Luis Benedicto Pereira Leite, Comandante do Distrito Militar, Vila Maria, s/d.
Documentação avulsa, Lata 1867-C, manuscrito, APMT.
158
MOUTINHO, Joaquim F. op. cit., p. 99.