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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
A CORRENTE DESENVOLVIMENTISTA E O PROJETO
POLÍTICO NO RIO GRANDE DO SUL: 1950/1962
VIVIANA BENETTI
Orientador: Prof. Dr. Marcos Justo Tramontini
Dissertação apresentada como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em História, na área de
História da América Latina.
São Leopoldo, março de 2002.
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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
A CORRENTE DESENVOLVIMENTISTA E O PROJETO
POLÍTICO NO RIO GRANDE DO SUL: 1950/1962
VIVIANA BENETTI
Orientador: Prof. Dr. Marcos Justo Tramontini
Dissertação apresentada como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em História, na área de
História da América Latina.
São Leopoldo, março de 2002.
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A minha avó Santina
(In memorian).
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Marcos Justo Tramontini, orientador, pelas discussões e
sugestões, além da serenidade, incentivo e apoio na elaboração deste trabalho.
À CAPES pelo apoio financeiro.
Aos professores do PPGH, em especial o Prof. Dr. Pedro Ignácio Schmitz e
ao Prof. Dr. Werner Altmann, pelo respeito e consideração.
A Guilherme, pelo amor, pelo apoio e compreensão. Ao Álvaro que esteve
presente nesta caminhada.
À colega Leonice pelo estímulo, pelas discussões e sugestões.
À colega Juliane pelo apoio técnico e incentivo.
Às Irmãs do Pensionato Imaculada Conceição, em Porto Alegre, pela
afetuosa acolhida, em especial à Irmã Milena e à Irmã Santina. Agradeço também à
Sylvia e ao Felipe pela acolhida na fase inicial do Mestrado.
Aos colegas do Mestrado por partilharem as angústias e expectativas do
Curso.
Aos funcionários do PPGH, em especial à Janaína da antiga biblioteca
setorial.
SUMÁRIO
RESUMO...................................................................................................................................7
ABSTRACT ..............................................................................................................................8
INTRODUÇÃO .........................................................................................................................9
1 ALGUMAS ABORDAGENS CONCEITUAIS................................................................15
1.1 História Econômica.....................................................................................................16
1.2 Desenvolvimento Econômico....................................................................................25
1.2 O Desenvolvimento Econômico na América Latina...............................................36
1.2.1 A Teoria do Desenvolvimento Periférico de Prebisch e da CEPAL.......................39
1.2.2 As Correntes do Pensamento Econômico ..............................................................51
2 A POLÍTICA ECONÔMICA BRASILEIRA - ANOS 30-50 ..........................................58
2.1 O Estado Nacionalista................................................................................................68
2.2 A Industrialização e o Mercado Interno...................................................................73
2.3 O Desenvolvimentismo no Brasil..............................................................................81
2.3.1 Comissão Mista Brasil-Estados Unidos (1951/1953).............................................87
2.3.2 Grupo Misto BNDE/CEPAL (1953/1955) ................................................................88
2.3.3 O Governo Jucelino Kubistchek ..............................................................................97
3 O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E OS PROJETOS DE
DESENVOLVIMENTO.......................................................................................................102
3.1 O Desenvolvimentismo no Sul ...............................................................................111
3.2 O CODESUL e o BRDE ..........................................................................................119
3.3 Comissão Interestadual da Bacia Paraná-Uruguai.............................................128
3.3.1 A Melhoria da Infra-estrutura e Comunicações....................................................130
3.3.2 Produção de Energia.............................................................................................132
3.3.3 A Industrialização e a Produção Industrial ...........................................................134
6
3.3.4 O Mercado de Crédito ...........................................................................................136
3.4 O Primeiro Plano de Obras, Serviços e Equipamentos (1953) ........................ 138
3.5 O Segundo Plano de Obras, Serviços e Equipamentos (1959/62)..................141
CONCLUSÃO......................................................................................................................152
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...............................................................................161
Fonte Documental...........................................................................................................169
RESUMO
Neste estudo focalizamos, como tema principal, a participação do Poder
Executivo do estado do Rio Grande do Sul no planejamento do desenvolvimento
econômico, no período de 1950/62. Para tal, foi significativa uma abordagem a partir
da perspectiva latino-americana e brasileira, como espaços econômicos regionais.
Nosso instrumental analítico foi centrado em instrumentos da História
Econômica Regional. Valemo-nos, como principal foco de análise do pensamento
econômico da Comissão Econômica para o Desenvolvimento da América Latina
(CEPAL) e do conceito de desenvolvimento.
Servimo-nos da análise do discurso político da época, que enfocava a
importância dos diagnósticos e projetos propostos na superação dos problemas
sociais, fixando relações entre as dimensões política, econômica e social.
Assim como, examinamos a política de industrialização do Estado Nacional e
Regional e suas relações com a dinâmica da acumulação capitalista, em que o
planejamento estadual teve fundamental importância para assegurar o peso da
economia gaúcha na economia nacional.
ABSTRACT
In this study, it was focused, as main theme, the participation of Rio Grande
do Sul Executive Power in the economy development planning fron 1950 to 1962.
For this, it was important the approach from the latin-america and brazilian
perpective, as regional economic spaces.
Our analytic instrumental was centralized from Regional Economic History
instruments. It was take advantage, as principal analysis focus, CEPAL economic
understanding and development concept.
It was made use of politics speech from the epoch, that focused the importanc
of diagnoses and projects proposed to social problems overcoming, fixing relations
among politics, ecconomic and social dimensions.
As well as, it was examined the politics of Nacional and Regional State
industrialization and its relations with the dynamics capitalist accumulation, in what
the state planning had fundamental importance to assure the “gaúcha” economy
weight in the nacional economy.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho apresenta o contexto histórico da política econômica brasileira e
da influência da corrente desenvolvimentista cepalina
1
, a qual constituiu o marco teórico dos
anos 50 na América Latina, servindo de base para este estudo.
Pretendemos abordar as propostas políticas de desenvolvimento atreladas a projetos
que visavam à industrialização e à superação da condição periférica dos países latino-
americanos. Focalizaremos, neste universo, o caso brasileiro e as relações com o estado
2
do Rio Grande do Sul, fazendo, dentro do possível, uma aproximação dos interesses
envolvidos.
Nesse sentido, buscamos inserir no estudo de caso do desenvolvimento do Rio
Grande do Sul os discursos levados a cabo pela Comissão Econômica para o
Desenvolvimento da América Latina (CEPAL).
1
A denominação cepalina deriva do pensamento da Comissão Econômica para o Desenvolvimento
da América Latina (CEPAL), que constituiu o marco teórico, nos anos 50, na elaboração de teses
sobre questões voltadas para o desenvolvimento e subdesenvolvimento, nos países Latino-
americanos. Dentre os teóricos que fizeram parte do pensamento social e econômico desta
Comissão, destaca-se Raul Prebisch, Celso Furtado e Maria da Conceição Tavares, entre outros. O
Desenvolvimentismo foi uma ideologia que caracterizou, particularmente o governo de Kubitscheck e
identificou o fenômeno do desenvolvimento a um processo de industrialização, crescimento da renda
por habitante e da taxa de crescimento. Este termo é utilizado por Miriam L.Cardoso, Celso Furtado,
Guido Mantega, Roberto Campos, R. Simonsen, entre outros.
2
No sentido de esclarecer o leitor, informamos que ao utilizar o termo estado, nos referimos aos
estados membros, e Estado à União.
10
O objetivo é demonstrar a preocupação política e econômica que esteve
presente nessas regiões, caracterizadas por sua condição periférica. A controvérsia
encontrada sobre o desenvolvimento econômico centrava-se em duas correntes: de
um lado a corrente Liberal, partidários da redução da intervenção do Estado na
economia, sem propor medidas de suporte ao projeto de industrialização; de outro, a
corrente desenvolvimentista, que defendia a intervenção do Estado na economia
para que a industrialização se implementasse.
Basicamente, tratamos das concepções teóricas de Raúl Prebisch, o mentor
das principais propostas cepalinas para o desenvolvimento latino-americano. Esse
autor deixa clara a sua preocupação com as desigualdades sociais, acreditando que
o progresso técnico promoveria a sua superação. Essa condição poderia ser atingida
através de uma reforma agrária, de uma distribuição de renda e de um planejamento
econômico sistemático e rigoroso.
Em relação ao Brasil, as idéias de Celso Furtado ajudaram a interpretar e
elaborar o processo de industrialização, destacando-se a transição da economia
cafeeira para a acumulação industrial. Celso Furtado, além de elaborar propostas,
assumiu cargos públicos que contribuíram para a implantação desses projetos no
país. Esse autor, assim como Prebisch, adotou alguns pressupostos teóricos de
Keynes para diagnosticar e propor as estratégias desenvolvimentistas.
Foi através das políticas do Estado Nacional que as propostas
desenvolvimentistas ganharam relevância no Rio Grande do Sul, embora a união
tenha despendido poucos esforços para efetivar essas práticas junto aos Estados
11
Membros. Encontrando-se numa condição secundária, e sentido-se excluído do
processo desenvolvimentista, o Rio Grande do Sul passou a buscar, através do
planejamento do Estado Regional, uma saída para a situação periférica em relação
ao centro dinâmico do país, maior beneficiário dos projetos nacionais.
Nosso referencial pauta-se em dois tipos de documentos: os documentos
oficiais de governadores e as fontes bibliográficas. Referimo-nos que os documentos
oficiais, mensagens ou discursos, objetivavam criar a idéia da eficácia dos projetos
de desenvolvimento. Não nos propomos a com parar fontes de outra natureza que
não a oficial, para analisar o êxito desses projetos. O tratamento despendido aos
relatos teve apenas o intuito de viabilizar a compreensão e o entendimento histórico
em que os mesmos estavam sendo produzidos.
As fontes bibliográficas formam a essência do nosso referencial,
principalmente, por buscarmos elementos de análise em outras áreas, como das
ciências sociais e, fundamentalmente, da economia, que nos serviu para melhor
explicitar o tema e o contexto que o envolvia.
A aproximação da história com a economia se impôs a partir do momento que
pretendíamos identificar os projetos políticos de desenvolvimento do Estado,
considerado como periférico.
Utilizamos o instrumental analítico da história regional, bem como conceitos
afins, especialmente o conceito de região, numa perspectiva histórica (Rio Grande
do Sul) e econômica que entende a América Latina também como uma região.
12
O trabalho está distribuído em três capítulos. No primeiro capítulo, abordamos
os conceitos de história econômica, desenvolvimento e constituição da CEPAL. A
análise sobre as teorias da CEPAL ficarão restritas apenas à década de 50. Não
tratamos das discussões que surgiram após a implantação de suas propostas, que
atingem até os dias de hoje.
Neste mesmo capítulo faremos a aproximação com a economia, para melhor
explicitarmos os objetos de interesse e da própria terminologia utilizada.
Entendemos que a história econômica é de suma importância para a
compreensão das sociedades, quando percebemos que há inquestionável ligação
entre o aspecto econômico e o social. Nosso interesse em utilizar elementos da
economia justifica-se na tentativa de demonstrar o comportamento dos grupos
sociais que se pretende analisar.
Uma das noções mais importantes que potencializaram a análise social e que
integra tanto o campo de estudo da história como o da economia é a estrutura. No
diálogo das duas áreas de interesse, reafirma-se o caráter dinâmico desta estrutura.
Outro conceito, tratado pelo viés econômico e integrado pelas esferas
políticas e sociais, é o de desenvolvimento, considerando as diferenças entre
crescimento e desenvolvimento econômico.
A proposta cepalina de desenvolvimento de países latino-americanos pautou-
se a partir da industrialização, que demandou decisões políticas do Estado para que
13
se concretizasse e, ao mesmo tempo, se mantivesse dentro de um padrão de
equilíbrio econômico e social. Outra discussão que desenvolvemos também neste
capítulo, apresenta o progresso técnico proposto por Prebisch e as correntes do
pensamento econômico que dominaram o cenário político-econômico daquele
período.
No segundo capítulo, abordamos o contexto histórico do Brasil, destacando o
cenário nacional e internacional no qual estava inserido, bem como as medidas
políticas apresentadas para o desenvolvimento.
A discussão está fundamentada na construção do Estado Nacional, que
conduziu a industrialização no país, dentro das propostas do desenvolvimentismo
como principal alternativa para os países periféricos superarem seu atraso
econômico em relação aos países centrais.
Também é evidenciado o modelo desenvolvimentista adotado no país,
juntamente com a formação de comissões e grupos que influenciaram no todo do
pensamento econômico e político brasileiro.
No terceiro capítulo, examinamos os projetos políticos voltados à criação da
infra-estrutura necessária para atingir o desenvolvimento do estado do Rio Grande
do Sul, juntamente com a discussão referente a sua condição periférica frente ao
centro do país. Não teremos a pretensão de avaliar seus resultados, preocupando-
nos apenas com o planejamento das atividades entendidas como viabilizadoras do
desenvolvimento.
14
Na conclusão, pretendemos evidenciar as singularidades do
desenvolvimentismo do Rio Grande do Sul, uma vez que o estado rio-grandense é
parte constituinte de um planejamento nacional, assim como a condição periférica do
mesmo, o qual apresenta feições diferenciadas no que diz respeito a sua infra-
estrutura.
1 ALGUMAS ABORDAGENS CONCEITUAIS
"Ao economista, o autor talvez pareça um peregrino fora de seu setor,
e ao historiador pareça um amador intruso. Desse perigo e de seu
próprio preparo imperfeito, o autor tem ciência, mas ainda assim foi
levado a perseverar, pela crença obstinada de que a análise econômica
só faz sentido e pode dar frutos quando ligada a um estudo do
desenvolvimento histórico." (Maurice Dobb
3
)
O uso do conceito, como elemento básico para a construção do
conhecimento, é essencial para a história e demais ciências sociais. Buscando
instrumentos que potencializem seu estudo, a história, com freqüência, se apropria
de conceitos de outros campos, tais como, sociologia, política e economia. Muitas
vezes, esses conceitos tomados de empréstimos podem adquirir significados
diversos quando são apresentados em sistemas diferentes, o que significa que esta
operação oferece algumas dificuldades. Assim, cientes de que os mesmos se
estruturam no interior de construções lógicas maiores
4
, acreditamos que sua
utilização por outras áreas de conhecimento que não a original pode enriquecer a
compreensão da realidade, no entanto ainda que exponha o usuário a riscos de
utilização, sabemos que este exercício é inevitável. Estas ponderações se fazem
necessárias, pois, no presente trabalho, nos valemos de conceitos da economia.
3
DOBB, Maurice. A Evolução do Capitalismo. 7.ed. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1987. (p. 07).
4
MENDONÇA, Nadir Domingues. O Uso dos Conceitos. 2.ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1985.
16
Um aspecto importante no uso de conceitos pelas ciências sociais está no
fato deles, raramente, serem definidos e, quando o são, é em função, quase que
exclusivamente, do contexto trabalhado. Para Marc BLOCH
5
, constitui-se um grave
erro “considerar supérfluo esse cuidado”, no qual o cientista social não tem “outro
guia que não seja o seu instinto pessoal”, resguardando o direito de ampliar,
restringir e deformar “despoticamente as significações sem avisar o leitor”. Ao
mesmo tempo, remete-nos para as dificuldades de se obter o consenso no uso dos
conceitos históricos. Desta forma, fica fortalecida a necessidade de se proceder a
análise conceitual.
1.1 História Econômica
Dentre os conceitos estabelecidos originalmente na ciência econômica e que
são utilizados neste trabalho, destacamos o de desenvolvimento. Para abordá-lo
dentro de uma concepção histórica, faremos algumas considerações sobre os
caminhos percorridos pela história econômica.
No decorrer do século XX, as teorias que se estabelecem no conjunto das
ciências sociais tornam-se cada vez mais inter-relacionadas. Nesse sentido,
contrapondo-se às antigas vertentes humanistas/individualistas que tanto marcaram
as interpretações históricas, afirmam -se correntes explicativas que enfatizam
também os aspectos globais (sociais e econômicos). Torna-se, cada vez mais difícil
excluir os elos que ligam as instâncias econômicas às sociais, políticas e culturais na
análise histórica.
5
BLOCH, Marc. Introdução à História. S/L: Ed. Francisco Lyon de Castro, 1976. (p. 151).
17
Neste processo de construção do conhecimento histórico, marco fundamental
estabelece-se na Escola dos Annales, principalmente por sua aspiração por uma
“história total”. Para tanto, propunha que se superasse dicotomias, como as
existentes entre a história social e a história econômica
6
, apresentando uma nova
abordagem interdisciplinar da história.
Em seus primeiros números, a revista dos Annales privilegiou produções dos
historiadores econômicos. De acordo com o grupo de editores, logo na primeira
edição, sentiram a necessidade de um maior intercâmbio intelectual entre as
ciências e os próprios cientistas. A partir de então, promoveram, particularmente, os
estudos da história econômica, em especial pelo predomínio da orientação marxista
nos quadros da Escola dos Annales naquele momento.
Por outro lado, sabe-se que o vínculo entre a história social e a história
econômica na tradição marxista é significativo. Para HOBSBAWM
7
, o que
interessava aos historiadores desta corrente, fundamentalmente a partir do início do
século XX, era a crescente utilização da economia como instrumental para a
compreensão das mudanças sociais, destacando-se aí as relações entre os grupos.
Desta importância atribuída à instância econômica na compreensão dos
processos históricos que levou muitas vezes à afirmação da preponderância do
econômico sobre o social, decorria uma visão da própria teoria econômica
8
, que se
6
BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989): A Revolução Francesa da Historiografia. São
Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997.
7
HOBSBAWM, Eric. Sobre a História. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
8
A Teoria Econômica compreende a sistematização conceitual dos processos e fenômenos
econômicos ou reconstrução abstrata da realidade econômica, fazendo uso das categorias de um
método de investigação. A teoria econômica procurar encontra as determinações essenciais dos
18
recusava a isolar elementos econômicos dos elementos sociais. Nesse sentido, o
campo especializado da história econômica é mais amplo que o próprio campo
convencional da economia.
HOBSBAWM acredita que nenhum historiador econômico
“pode evitar questões fundamentais da evolução social e econômica
da humanidade até o presente, por que algumas sociedades
parecem ter se detido em certo ponto desse processo e outras não;
por que a trajetória inteira até a sociedade moderna industrial foi
constituída em apenas uma parte do mundo; e quais os mecanismos
dessas mudanças, endógenas e/ou induzidas, existiram ou
existem?”
9
Pretende-se, afirma o autor, com este raciocínio, demarcar a inclusão da
história no campo das ciências sociais. Assim, a economia política
10
, como
sustentava MARX, se constituiria (em sua acepção) na anatomia da sociedade civil,
ultrapassando o campo da economia-padrão, conforme usualmente definido.
É certo que nem todos os modelos estabelecidos pela economia e/ou pela
economia política precisam, necessariamente, serão utilizados. O historiador é que
deverá definir quais conceitos e/ou modelos mais apropriados em sua análise.
fenômenos econômicos, separando o acessório do fundamental, com isso estabelecendo
formulações universais num trabalho de síntese. É por meio da teoria que a economia se entrelaça
com a história, a sociologia, a antropologia e outras ciências afins. Seu papel é também o ponto de
partida para a formulação de respostas aos problemas econômicos surgidos em cada etapa do
desenvolvimento social. In: SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia. São Paulo: Ed. Best
Sellers, 1994. (p.348).
9
HOBSBAWM, 1998, p.123.
10
Economia Política é a ciência que estuda as relações sociais de produção, circulação e distribuição
de bens materiais, definindo as leis que regem tais relações. Procura analisar o caráter das leis
econômicas, sua especificidade, sua natureza e suas relações mútuas. Nesse sentido é uma ciência
fundamentalmente teórica, valendo-se dos dados fornecidos pela economia descritiva e pela história
econômica. In: SANDRONI, 1994, p.109-110.
19
A história econômica, que tanto na tradição marxista como na Escola dos
Annales, durante boa parte do século XX, constituiu-se no principal instrumento
metodológico para a construção do conhecimento histórico (e que não perdeu força),
manifestou-se de maneira explícita na modificação de todos os campos, imprimindo-
lhes uma ótica econômica.
No desenvolvimento dos estudos de história econômica, fundamental foi a
contribuição de BRAUDEL
11
na articulação do conceito de estrutura com a
perspectiva da longa duração. Isso facilitou a compreensão da complexa interação
entre meio, economia, sociedade, política, cultura e acontecimentos, considerados
nos quadros da longa duração. Isso significaria a história total e, a partir disto, não
poderíamos perceber a história sem aceitar o todo.
Para BRAUDEL (1992), temos durações ou tempos diferentes, sintetizados na
fórmula: curta (fato), média (conjuntura) e longa duração (estrutura). Essa última,
está presente nos movimentos das economias, das civilizações, das formas
políticas, das realidades históricas e das idéias. A longa duração é mais do que o
processo pelo qual passamos pela curta e média duração.
Por sua vez, o historiador que pretende observar a massa inteira da história,
que a longa duração lhe impõe, geralmente o faz ao preço de um corte (tempo
espacial), que consiste em destacá-lo do conjunto. De acordo com BRAUDEL, qual é
o estudo histórico que não acaba aceitando este jogo e que não isola um pedaço da
história para melhor mostrá-lo? A história da longa duração é, portanto, uma
11
BRAUDEL, Fernand. Reflexões sobre a História. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
20
maneira de observar o passado suprimindo uma parte enorme da história vivida.
12
Para ele, isto equivale a eliminar o que é individual, o que é simples.
A história apresentada por BRAUDEL como estrutural atua sob o signo da
longa duração. Para o historiador, a estrutura resiste ao tempo, escapa das
vicissitudes. Ela não é imóvel, só parece imóvel em relação a tudo o que está a volta
dela. Mesmo assim, se move e evolui com relativa rapidez.
De acordo com a Escola dos Annales apresentada por BURKE, a estrutura “é
tudo o que numa sociedade, ou numa economia, tem uma duração suficientemente
longa em sua modificação para escapar ao observador comum.”
13
Nessa tentativa de melhor explicitarmos a história econômica e dentro da
análise do caminho percorrido pela história, sintetizado acima, passamos a abordar
os conceitos fundamentais elaborados pela teoria econômica. Eles são
imprescindíveis para a análise dos mecanismos e do funcionamento da sociedade
capitalista e essenciais ao historiador da economia.
Sendo assim, destacamos a noção de estrutura que, para a história
econômica, não pode ser analisada como algo estático. Em história, assim como em
outras ciências humanas, a mudança e o movimento são essenciais e inseparáveis
das estruturas. Advoga-se que a história, como ciência em mutação, pode ter
12
BRAUDEL, 1992, p.356.
13
BURKE, 1997, p.130. O conceito de estrutura para os economistas corresponde à relação entre os
três grandes setores de atividades, o primário, secundário e o terciário. O crescimento destes setores
não ocorre de forma harmônica, mas desigual, e essa defasagem setorial é um elemento básico para
avaliar se a estrutura corresponde ao grau de desenvolvimento de uma economia. O conceito
marxista de estrutura econômica liga-se ao conceito mais amplo de totalidade social. Assim, a
estrutura representa a base econômica da sociedade, sobre a qual se ergue a superestrutura
(relações jurídicas, políticas e demais formas de consciência social). In: SANDRONI, 1994, p.130.
21
relações frutíferas com a estrutura, uma vez que ambas são dinâmicas. Essa linha
de raciocínio leva LE GOFF a afirmar que se deve aplicar os métodos estruturalistas
ao estudo de seus documentos históricos no sentido amplo.
14
Para exemplificar um modelo explicativo sobre a estrutura econômica no
campo da história, apresentamos uma análise de CARDOSO & BRIGNOLII
15
.
Segundo os autores, a estrutura econômica do Antigo Regime, durante o século
XVIII na França e a estrutura do capitalismo industrial levaram a situações extremas.
Em primeiro lugar, direcionaram para o predomínio de uma agricultura com graves
problemas de subsistência e com baixa produtividade. Essa baixa produtividade era
o resultado da falta de desenvolvimento técnico. A elevação do preço dos cereais
resultava na fome do povo. E em, segundo, a indústria era de bens de consumo e
sua técnica era dominada pelo artesanato e trabalho manual. Logo, a demanda dos
bens industriais dependia da prosperidade ou da crise da agricultura. Esta análise
demonstra que os fenômenos conjunturais, como a crise de subsistência, vêm a tona
e se explicam pelas contradições da estrutura econômica.
Assim, o modelo analisado na Europa do século XVIII, exposto sinteticamente
acima, aproxima-nos de aspectos da estrutura econômica da América Latina dos
anos 50. Aos elementos diagnosticados da incapacidade francesa de superar o
modelo agrário/manufatureiro pelo industrial (de caráter endógeno), acrescenta-se,
na busca de compreensão da situação latino-americana, um dado exógeno, isto é, a
relação centro-periferia como determinante de sua estrutura econômica.
14
LE GOFF, Jacques. História e Memória. 2.ed. Campinas: Editora UNICAMP, 1992.
15
CARDOSO, Ciro Flamarion & BRIGNOLI, Hector Pérez. Os Métodos da História. 3.ed. Rio de
Janeiro: Edições Graal, 1983.
22
Nesse sentido, ao analisar a relação dos países centrais com os países
periféricos, a partir da teoria de Prebisch, GRESPAN também indica a estrutura
como dinâmica. Segundo ele, “a estrutura articulada por essa ‘disparidade’ não é
estática, mas em permanente constituição e reconstituição.”
16
Isto reforça a análise
das estruturas sociais, interligadas e em movimento, descartando a possibilidade da
estrutura ser algo estático dentro da história.
Na análise de GRESPAN (2001), a estrutura é o elemento fundamental do
pensamento cepalino, definido aí como estruturalista. Para Ricardo
BIELSCHOWSKY
17
, o enfoque histórico-estruturalista cepalino abriga um método de
produção de conhecimento atento ao comportamento dos agentes sociais e da
trajetória das instituições.
Retomamos aqui aspectos do desenvolvimento da história econômica que,
desde os anos 30 até os anos 80, foram alguns dos gêneros mais cultivados, tanto
por questões teóricas como por preocupações práticas. Destacamos, entre as
razões teóricas, o intenso debate em torno das idéias marxistas que sustentam a
influência dos fatores econômicos na totalidade histórica
18
. Entre as práticas, no
caso latino-americano, destacamos o incremento do debate político sobre as formas
de promoção da riqueza e superação do atraso.
16
GRESPAN, Jorge. O Estruturalismo da CEPAL na obra de Raúl Prebisch. História Unisinos, São
Leopoldo, v.5, n.3, p.105-125, jan./jun. 2001. [Centro de Ciências Humanas da UNISINOS]. (p.112).
17
BIELSCHOWSKY, Ricardo. (Org.) Cinqüenta anos de pensamento na CEPAL. Rio de Janeiro:
Record, 2000. [Volumes I e II].
18
Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é o seu ser social que, inversamente,
determina a sua consciência.” MARX, Karl. Contribuição à crítica da economia política. 2.ed. São
Paulo: Martins Fontes, 1983. (p. 24).
23
A análise sobre a história econômica, a partir da teoria de MARX, constituiu o
marco desse período. Aceitando ou recusando as interpretações feitas por esse
autor, é ponto pacífico o seu caráter estimulador nos estudos da história econômica
como indispensáveis para a compreensão do desenvolvimento das sociedades. Isso
obrigou os historiadores a se preocuparem com as lutas de classes e os fatos
econômicos nas reconstruções das sociedades.
19
Na Europa, a história econômica predominou, durante os anos de 1929 a
1945 sob a influência de Lucien FEBVRE e Marc BLOCH e teve um pequeno
declínio no período de 1946 a 1969 sob a influência de BRAUDEL.
20
No Brasil, ela toma impulso a partir dos anos 70, o que, de acordo com
CARDOSO & VAINFAS (1997), deve-se à disseminação dos programas
institucionais de pós graduação. No final dos anos 70 e início dos anos 80, as
publicações sobre a história econômica atingem os maiores índices, no entanto, a
partir da segunda metade dos anos 80, evidencia-se que as investigações desse tipo
ocupam cada vez menos o interesse dos pesquisadores. O recuo desses últimos
anos deve-se ao aparecimento de críticas mais contundentes ao tipo de reflexão na
qual era produzida a história econômica
21
. Questionava-se os dois principais
paradigmas explicativos, sobre os quais, a investigação de história se sustentava
durante os anos 50 e 60: a Escola dos Annales e a historiografia marxista. A
19
RODRIGUES, José Honório. Teoria da História do Brasil: Introdução Metodológica. 5.ed. São
Paulo: Ed. Nacional / Brasília: INL, 1978.
20
CARDOSO, Ciro Flamarion & VAINFAS, Ronaldo (Orgs.) Domínios da História: Ensaios de teoria
e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
21
CARDOSO & VAINFAS, 1997, p.29.
24
preocupação das duas correntes estava associada à longa duração e à ênfase nas
estruturas econômico-sociais que foram duramente atacadas.
Tanto a preocupação referente à quantificação e à seriação, como o
demasiado uso de termos e técnicas ligadas a explicações econômicas, chamou a
atenção dos críticos da história econômica. Para eles, estava-se caindo num
economicismo. Mesmo dentro da tradição marxista, destaca-se a voz de
THOMPSON, que chama a atenção ao reducionismo econômico e a indiferença
frente ao estudo da história social. As críticas por ele manifestadas, no que se refere
aos estudos sobre as curvas de preços e salários, relacionam -se a um reducionismo
econômico, que pouco contribui para explicar os movimentos sociais. Para o autor, o
economicismo exclui a complexa relação com as reações sociais e os fatores
culturais, elementos que informam a conduta dos agentes envolvidos.
22
As críticas à história econômica não reduzem sua importância para a análise
histórica. É inegável a importância da análise econômica para a compreensão dos
processos históricos. Vale acrescentar aqui a análise de HOBSBAWM (1998) sobre
a relação entre os historiadores e os economistas: o autor discute as duas ciências e
seus agentes, afirmando que o historiador pode se utilizar da teoria econômica
apenas como um suporte, no intuito de melhor aproximar-se da realidade social em
estudo. O que significa que, por exemplo, não deve incorporar imediatamente
modelos que enfatizam a maior produtividade de um sistema econômico,
desprezando as especificidades do caso analisado.
22
THOMPSON (1979) apud CARDOSO & VAINFAS, 1997, p.30.
25
Desta forma, a escolha de modelos teóricos da economia para análise de
realidades sociais e históricas é possível, senão recomendável ou inevitável,
conforme o objeto em estudo. Do mesmo modo, quando, por exemplo, ocorre uma
expropriação de populações camponesas, a força histórica dessa pressão não pode
ser ignorada. As mudanças da agricultura e do crescimento econômico, assim como
fatores não econômicos, não podem ficar desvinculados do econômico. Separá -los
seria abandonar a análise histórica, isto é, recusar o aprofundamento do estudo da
dinâmica social.
1.2 Desenvolvimento Econômico
O estudo sobre o conceito de desenvolvimento econômico insere-se numa
polêmica acadêmica aberta nos anos 50 e, integra as esferas políticas e sociais a
uma análise econômica.
Neste momento, objetivamos na análise do discurso
23
desenvolvimentista,
chegar a uma compreensão histórica abrangente do pensamento cepalino e das
políticas econômicas dos anos 50.
É sabido que estas discussões sobre o desenvolvimento econômico se
intensificaram no decorrer da década de 60. Entre os teóricos deste conceito, está
23
É importante mencionar que utilizamos a denominação Análise do Discurso, não no sentido da
linguagem cotidiana, e sim valendo-nos da conceituação da lingüística enfatizando a orientação da
Escola Francesa que concebe a Análise do Discurso observando o contexto em que o mesmo foi
produzido, devendo levar em conta os elementos de natureza histórica, sociológica, política.
Considera-se, pois as Condições de Produção do Discurso e as Condições da Recepção do Discurso.
In: ORLANDI, Eni P. Texto e Discurso. Porto Alegre: Organon, 1995.
26
presente Hélio JAGUARIBE. Numa primeira discussão sobre o desenvolvimento,
esse autor o revela como “um processo social global, só por facilidade metodológica
ou em sentido parcial, se podendo falar de desenvolvimento econômico, político,
cultural e social.”
24
Nessa definição, o autor apresenta o desenvolvimento como um
processo global e nele, todo um conjunto de processos sociais independentes que
se correlacionam estruturalmente. Por exemplo, o econômico, o social, o político e o
cultural são fatores que se desdobram com relativa autonomia.
Como uma segunda discussão do autor, o desenvolvimento aparece
“como idéia, se distingue e de certo modo se opõe à idéia ilustrada
de progresso (...) em termos conceituais, é a explicitação de
virtualização preexistente no processo histórico-social. (...) o
processo do desenvolvimento, em termos reais, é um processo
histórico-social mesmo enquanto se encaminhe para sua crescente
racionalização.”
25
A racionalização colocada pelo autor persiste no fato do desenvolvimento ser
espontâneo ou programado.
No desenvolvimento espontâneo são visados os interesses dos agentes e não
o desenvolvimento como tal. Um exemplo clássico de desenvolvimento espontâneo
são os Estados Unidos. Lá, ele ocorreu sem um projeto anterior. No
desenvolvimento programado acontece justamente o contrário, a programação do
desenvolvimento é o centro dos esforços, com vistas aos objetivos que se quer
24
JAGUARIBE, Hélio. Desenvolvimento Econômico e Desenvolvimento Político: Uma abordagem
teórica e um estudo do caso brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1969. (p.13).
25
JAGUARIBE, 1969, p.16.
27
alcançar. Neste caso é necessária a participação do Estado ou de instituições que
intervenham para que se concretize.
O processo de desenvolvimento econômico, seja espontâneo ou programado,
deve ser pensado como um processo de desenvolvimento da sociedade como um
todo.
A programação do desenvolvimento efetuada pela maioria dos países,
principalmente da América Latina, foi concebida a partir de planos econômicos ou
políticos, que deveriam resultar no desenvolvimento social.
Outro autor que analisa este conceito é Celso FURTADO
26
. Ele discute a
dinâmica das economias subdesenvolvidas em contraponto com o funcionamento
das economias capitalistas dos principais países europeus. Apresenta, inicialmente,
a teoria do desenvolvimento na ciência econômica, seus mecanismos e seu
processo histórico.
Nessa teoria, o autor trabalha numa perspectiva macroeconômica,
focalizando as causas e os mecanismos de aumento da produtividade do fator
trabalho e suas repercussões na organização da produção, bem como na forma
como se distribui e se utiliza o produto social.
É necessário que se leve em conta, nessa teoria, duas formulações
apresentadas pelo autor. Primeiro, é preciso compreender a realidade existente e os
26
FURTADO, Celso. Desenvolvimento e Subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Ed. Fundo de
Cultura, 1961.
28
mecanismos do processo de crescimento, para que seja possível formular ou
construir modelos simplificados, de acordo com o nível dos sistemas econômicos
presentes naquela realidade. Segundo, dentro do plano histórico, é preciso um
estudo crítico diante da realidade dada. “Não basta construir um modelo abstrato e
elaborar a explicação do seu funcionamento
27
, ou seja, é importante verificar, sob
todos os aspectos, a eficácia do modelo proposto frente à realidade histórica, à qual
se está propondo o plano de desenvolvimento.
Para que os mecanismos do desenvolvimento possam ser implementados, é
preciso verificar a existência de problemas, caso existam, e procurar soluções que
possibilitem a sua construção.
A teoria do desenvolvimento econômico, de acordo com FURTADO, não cabe
apenas dentro da análise econômica, ela é aceita e discutida em seminários sobre
desenvolvimento, nos quais participam sociólogos, antropólogos, historiadores, ao
lado dos economistas. “A análise econômica não nos pode explicar a dinâmica das
mudanças sociais senão de maneira limitada.”
28
O processo do desenvolvimento acontece a partir de combinações de novas
técnicas com os fatores já existentes. Por exemplo, em uma economia desenvolvida,
a introdução de novas técnicas aumentará ainda mais a produtividade. Por outro
lado, em uma economia subdesenvolvida, o simples acréscimo de novas técnicas
27
FURTADO, 1961, p.19.
28
FURTADO, 1961, p.89.
29
possibilitará um aumento significativo da produtividade, mas não garantirá, por si só,
a superação do atraso.
Segundo FURTADO (1961), em regiões subdesenvolvidas sempre existiu
deficiências na utilização e na combinação dos fatores de produção, dentro dos
padrões das técnicas conhecidas. A deficiência geralmente resulta no desperdício
de um dos fatores. Desperdiça-se a mão-de-obra, por falta de capital, por exemplo.
Dessa forma, a produtividade média de um conjunto de fatores em uma economia
subdesenvolvida será menor se observarmos a utilização destes mesmos fatores em
economias desenvolvidas.
Para o autor, as relações entre o aumento de produtividade e a acumulação
de capital devem ser observadas. Quando a produtividade é muito baixa, a
satisfação das necessidades fundamentais de uma população passa a absorver uma
maior capacidade produtiva. Desta forma, em economias de subsistência, a
população trabalha para satisfazer necessidades imediatas, ficando difícil esperar
um processo de acumulação de capital por ação endógena.
Mesmo com a renda desigualmente distribuída, nas comunidades de baixa
produtividade existiria a procura de bens não agrícolas e de serviços por parte das
minorias abastadas. O que se assinala é que em razão da diversificação do
consumo, a concentração de renda em comunidades de baixa produtividade não
conduzirá a processos cumulativos de crescimento. Levará sim, a situações
30
estáticas de desigualdades entre os padrões de consumo dos grupos sociais
envolvidos.
Quando se trata de promover ações exógenas para se implantar o processo
de desenvolvimento, não se pode esquecer daqueles fatores envolvidos. Por isso, a
dinâmica das mudanças sociais não se pontuam apenas nas análises econômicas,
como foi destacado anteriormente, mas sim, por exemplo, nos padrões de consumo
dos grupos envolvidos, dentre outros fatores.
Na definição dada por FURTADO, com ênfase no ponto de vista econômico, o
desenvolvimento é o “aumento do fluxo de renda real, isto é, incremento da
quantidade de bens e serviços, por unidade de tempo, à disposição de determinada
coletividade.”
29
Trata-se de um conceito relacionado com elementos quantificáveis.
Mas, adverte o autor, seria incompleta no sentido da implementação de políticas de
desenvolvimento, uma vez que, mesmo ignorados por alguns economistas, os
elementos culturais da sociedade são os que condicionam a procura e influenciam
na formação dos preços. Estes fatores estão atrelados à distribuição da renda e às
imperfeições do mercado.
O processo histórico do desenvolvimento econômico sobre as sociedades
pré-industriais, apresentado por FURTADO, caracteriza-se desta forma: existe a
produção, e a seu lado a criação do excedente; do lado da distribuição,
29
FURTADO, 1961, p.115.
31
a apropriação desse excedente por um grupo minoritário; e do lado da acumulação,
a possibilidade de incrementar a produtividade com a incorporação do excedente ao
processo produtivo. Nesse processo, o excedente apropriado pelo grupo minoritário
será transformado em novo capital. “Os pontos estratégicos deste processo são as
possibilidades de incrementar a produtividade e a apropriação por grupos
minoritários do fruto deste incremento.”
30
São estes dois fatores que possibilitam o
crescimento.
O esquema apresentado corresponde a fase inicial de um processo de
desenvolvimento. Em economias mais complexas, os bens adequados a
reincorporarem -se ao processo produtivo tendem a diferenciarem-se dos bens de
consumo corrente. Quando uma determinada economia atinge um certo grau de
desenvolvimento, esse processo torna-se quase automático. Isso acontece quando
a produção apresenta uma estrutura de acumulação significativa e, seu excedente é
reinvestido em novos setores de produção.
Para compreender o processo de crescimento é indispensável formar uma
idéia do tipo de universo econômico em que o mesmo está inserido. Se
considerarmos um país para estudo, veremos que este está ocupado por unidades
econômicas. Estas unidades se encontram em graus diversos de desenvolvimento e
integram o sistema econômico nacional. Desta forma, será encontrado um universo
econômico heterogêneo. Isto significa que o “desenvolvimento econômico é um
processo acentuadamente desigual: surge em uns pontos, propaga-se com menor
30
FURTADO, 1961, p.121.
32
ou maior facilidade a outros. Nem é nem poderia ser um processo uniforme...”
31
,
justamente porque os recursos de cada região são diversos. Esse processo, então,
jamais seria homogêneo.
Vale aqui destacar que existem diferenças entre os conceitos de
desenvolvimento e crescimento, os quais, muitas vezes, são utilizados como
equivalentes.
Para Paul SINGER,
32
o desenvolvimento é apresentado como um processo
que se estendeu por muitas décadas, trazendo em seu bojo transformações de
valor. Isso obrigou os teóricos do desenvolvimento a procurar na história econômica
os elementos para compreender os países de economia colonial que passaram a
substituí-la por outra do tipo industrial.
O autor, ao conceituar desenvolvimento, o dividiu em duas correntes:
desenvolvimento com crescimento econômico e desenvolvimento de crescimento.
Na primeira corrente, segundo ele, para alguns autores, o desenvolvimento é
apenas um outro nome atribuído ao fenômeno do crescimento econômico. E a
ausência desse crescimento econômico caracterizaria o subdesenvolvimento.
Dentro desta corrente, um país subdesenvolvido pode possuir boas
perspectivas para se desenvolver, mas não utiliza integralmente os fatores de
produção de que dispõe. Para induzir o desenvolvimento nesses países que não se
desenvolvem naturalmente, pode-se fazê-lo através do aumento da oferta de capital,
31
FURTADO, 1961, p.123.
32
SINGER, Paul. Desenvolvimento e Crise. 2.ed. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1977.
33
que estimulará o comércio e levará a um acúmulo maior de capital. Esta definição
também é apresentada por Jaguaribe, Furtado e outros teóricos.
Na segunda corrente, o autor apresenta uma distinção entre desenvolvimento
e crescimento. O crescimento é visto como um processo de expansão quantitativo,
enquanto que o desenvolvimento como um processo de transformações qualitativas
dos sistemas econômicos que aparecem nos países subdesenvolvidos.
De qualquer forma, a preocupação na implantação do desenvolvimento
econômico é demonstrado da mesma maneira por todos os teóricos que abordam o
tema. Cabe ressaltar ainda, que existem variáveis para que esse processo possa ser
concretizado. Uma delas é apresentada por SEERS
33
. Consiste no fato de que,
geralmente, o desenvolvimento é tratado como um conceito normativo, quase como
sinônimo de melhoramento. Os governos, através de seus sistemas de planejamento
econômico, utilizam -no dessa forma. Segundo o mesmo autor, tal concepção e as
decorrentes políticas econômicas acabam por tornarem -se obstáculos quando
propõem planos e seguem uma trajetória de países com níveis de desenvolvimento
muito elevados, perseguindo objetivos impossíveis de serem alcançados. Por
exemplo, ao oferecerem padrões habitacionais desejáveis, esquecem -se de
questões como a expansão urbana desordenada, o comércio irregular e a tensão
social.
33
SEERS, Dubley. O Desafio às Teorias e Estratégias Desenvolvimentistas. Revista Brasileira de
Economia, Rio de Janeiro, n.1, ano I, p.5-30, jul./set., 1970.
34
SEERS defende que não há motivos para acreditarem que todos os países
subdesenvolvidos possam repetir a história dos países industrializados. Se nos
planos de um país que pretende se desenvolver não constar metas para a redução
da pobreza, do desemprego e da desigualdade, dificilmente poderá ser denominado
"plano de desenvolvimento".
34
Além disso, não esquecendo a teoria de FURTADO (1961) apresentada
anteriormente, na qual o desenvolvimento econômico deve ser tratado a partir da
estrutura existente em cada país e do estágio de desenvolvimento dos seus fatores
de produção.
A análise sociológica feita por Fernando Henrique CARDOSO e Enzo
FALETTO indica que o desenvolvimento é em si mesmo um processo social;
mesmo seus aspectos puramente econômicos deixam transparecer a trama de
relações sociais subjacentes.”
35
É necessário, portanto, que se faça uma análise
global do desenvolvimento, destacando as condições históricas e particulares,
agregando os aspectos econômicos e sociais, tanto no plano nacional como
internacional. A partir dessa análise global, pode-se considerar o desenvolvimento
como resultado da interação de grupos e classes sociais que têm um modo de
relações próprias. Para CARDOSO & FALETTO, as estruturas sociais e econômicas
modificam -se na medida em que diferentes classes e grupos sociais conseguem
impor seus interesses, força e dominação ao conjunto da sociedade.
34
SEERS, 1970, p.10. [Grifo do autor].
35
CARDOSO, Fernando Henrique & FALETTO, Enzo. Dependência e Desenvolvimento na
América Latina. 3.ed. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1975. (p.16).
35
Para FURTADO (1977), uma teoria do desenvolvimento deve ter por base
uma explicação do processo de acumulação de capital. O desenvolvimento
econômico entende-se, pois, “como um processo histórico, impossível de ser
esgotado pela capacidade explicativa das categorias puramente econômicas, e
nessa medida a própria ciência econômica não terá sido capaz de oferecer um ponto
de partida para uma teoria de desenvolvimento”.
36
A partir dos anos 70, o conceito de desenvolvimento é reavaliado pelo grupo
de teóricos da CEPAL
37
como desenvolvimento integral, juntamente com as
diferenças existentes entre um fenômeno de crescimento econômico e o fenômeno
de desenvolvimento propriamente dito.
O desenvolvimento integral seria obtido através do avanço conjunto de todos
os aspectos e não apenas mediante esforços de alguns setores da economia ou do
sistema social. De acordo com a CEPAL, seria muito difícil realizar uma avaliação do
processo de desenvolvimento assim definido, pois dever-se-ia avaliar o conjunto de
todos os setores.
O crescimento experimentado nas variáveis econômicas não daria lugar para
mudanças qualitativas de importância equivalente no bem -estar humano e na justiça
social.
36
FURTADO, 1977, p.XVIII.
37
CEPAL. Avaliação de Quito. Cadernos da CEPAL, Santiago do Chile, n.2, 1975. Artigo publicado
In: BIELSCHOWSKY, Ricardo. Cinqüenta anos de Pensamento na CEPAL. Rio de Janeiro: Record,
2000. [v.2, p.651-684].
36
Para que o desenvolvimento propriamente dito ocorresse, seria necessário
que mudanças estruturais transcorressem, não apenas quantitativas, ou seja, no
crescimento econômico, mas principalmente no cumprimento de estratégias, tais
como o controle e a utilização soberana dos recursos naturais e a modificação dos
sistemas de apropriação da terra, para que se pudesse promover a justiça social,
entre outras.
Estes conceitos foram formulados nos anos 70, quando os projetos cepalinos
já haviam sido implantados e os seus resultados estavam sendo reavaliados. Estas
seriam algumas proposições fundamentais para a elucidação deste estudo, referente
a planos e modelos de desenvolvimento. Eles se inserem no processo teórico mais
amplo sobre a totalidade da história nacional ou regional.
A partir deste momento, passamos a tratar do desenvolvimento econômico na
perspectiva da CEPAL e de sua contribuição à história das idéias econômicas.
1.2 O Desenvolvimento Econômico na América Latina
Para o estudo da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) e de
sua atuação, são dados básicos a análise dos diagnósticos e das propostas
elaboradas pela equipe responsável, que constituíram a espinha dorsal do
desenvolvimentismo.
Num rápido panorama dos antecedentes mundiais do desenvolvimentismo,
faz -se necessário remeter para a reconstrução dos países europeus devastados
37
pela II Guerra Mundial, apoiada por organismos de abrangência mundial. Para tanto,
foram criados o Banco Mundial (BID) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) em
1946. Esses organismos possuíam políticas objetivas, que visavam a atender os
interesses dos países europeus. A América Latina, enquanto isso, apresentada
como um continente atrasado, caracterizado pelo insuficiente desenvolvimento de
suas forças produtivas, ficaria, pelo menos inicialmente, à margem da política
dessas instituições.
Tipicamente agrária, a estrutura econômica latino-americana apresentava
uma forte concentração de renda, aliada à pouca diversificação de seus produtos,
juntamente com a insuficiência dos seus mercados consumidores. Isso dificultava
suas possibilidades de crescimento, tornando-se evidente a necessidade de buscar
formas alternativas para superar esse quadro. A América possuía os fatores de
produção, porém eram mal administrados exatamente pela falta de recursos
financeiros.
As dificuldades pelas quais a América Latina estava passando naquele
momento foram discutidas por uma das Comissões Econômicas da Organização das
Nações Unidas (ONU). Criada em 1948, com sede no Chile, a Comissão Econômica
para a América Latina (CEPAL) tornou-se o principal instrumento de análise dos
desequilíbrios econômicos desses países, propondo projetos para a sua superação.
Segundo Guido MANTEGA, a CEPAL “se constituiu no marco teórico decisivo
para a gestação das principais teses sobre o desenvolvimento ou
38
subdesenvolvimento periférico que animaram a discussão teórica latino-americana
do após-guerra.”
38
O corpo técnico da CEPAL era formado por economistas latino-americanos,
destacando-se Raul Prebisch, um argentino de renome internacional, que realizou
um importante estudo sobre a situação econômica da América Latina, foi criador e
dirigente do Banco Central da Argentina por vários anos, demonstrando experiência
em políticas de estabilização econômica. Outros intelectuais e técnicos argentinos,
bolivianos, peruanos e brasileiros, fizeram parte da CEPAL, como, por exemplo,
Celso Furtado mencionado anteriormente.
Na CEPAL, a tarefa desses economistas era justamente fazer um primeiro
diagnóstico da situação econômica da região. A partir da herança histórica desses
países, não seria fácil o trabalho, devido às especificidades, tais como a
colonização, a luta pela independência, a servidão e escravidão negra, as várias
formas de trabalho forçado indígena, as estruturas produtivas, os processos de
urbanização, as atitudes do Estado Nacional e de suas elites, as culturas, entre
outras que marcavam as diferenças entre esses países.
A complexidade deste quadro se fez acompanhar por diferenciações de
caráter teórico entre os próprios analistas cepalinos. Interessa-nos, neste momento,
a corrente conduzida por Prebisch. Segundo BIELSCHOWSKY, O pensamento
cepalino é conhecido principalmente pela tese de Prebisch sobre os termos de
38
MANTEGA, Guido. A Economia Política Brasileira. 4.ed. São Paulo: Ed. Polis/Vozes, 1987.
(p.32).
39
intercâmbio e pela interpretação estruturalista do processo inflacionário.”
39
. Pensamento
este que se confrontava mais acirradamente com as teses liberais, presentes nas
discussões políticas dos países subdesenvolvidos.
Desse modo, as principais questões que envolveram o debate sobre o
desenvolvimento dentro da América Latina nos anos 50, partiram da teoria cepalina,
destacando-se o conceito centro-periferia, o confronto com a corrente liberal e
algumas discussões conceituais sobre desenvolvimento e subdesenvolvimento.
1.2.1 A Teoria do Desenvolvimento Periférico de Prebisch e da CEPAL
Um dos conceitos fundamentais na teoria da CEPAL é a relação centro-
periferia. Esses termos foram empregados para descrever o progresso técnico da
economia mundial e explicar a distribuição desigual de seus ganhos. Segundo
BIELSCHOWSKY (1996), a divisão internacional do trabalho foi que provocou esses
efeitos diferenciados nas economias regionais.
Partiam da idéia de que o progresso técnico se desenvolvia de forma desigual
nos dois pólos (no centro e na periferia). No centro foi mais rápido, pois “elevou
simultaneamente a produtividade de todos os setores das economias centrais,
promovendo um nível técnico mais ou menos homogêneo em toda a extensão dos
seus sistemas produtivos.”
40
Enquanto isso, a periferia tinha por função suprir o
centro com alimentos e matérias-primas a preços baixos. De acordo com o autor, o
39
BIELSCHOWKY, Ricardo. Pensamento Econômico Brasileiro: o ciclo ideológico do
Desenvolvimentismo (1930-1964). 3.ed. Rio de Janeiro: Ed. Contraponto, 1996. (p.12).
40
BIELSCHOWKY, 1996, p.16.
40
progresso técnico só foi introduzido nos setores de exportação, os mais produtivos,
contrastando com o atraso de todo o sistema produtivo restante.
Já no primeiro estudo de PREBISCH, em 1949, sobre a economia latino-
americana, indicava-se que, dentro do esquema da divisão internacional do trabalho,
cabia à América Latina, sendo ela parte da periferia do sistema econômico mundial,
o papel de produzir alimentos e matérias-primas para os grandes centros.
PREBISCH destacava que os benefícios econômicos da divisão internacional
do trabalho, na prática, seriam terminantemente desmentidos. Se assim não o fosse,
segundo ele,
“o fruto do progresso técnico tende a se distribuir de maneira
eqüitativa por toda a coletividade, seja através da queda dos preços,
seja através do aumento correspondente da renda. Mediante o
intercâmbio internacional, os países de produção primária
conseguem sua parte desse fruto. Sendo assim, não precisam
industrializar-se.”
41
Para o autor, a coletividade consistia na participação de todos os países,
industrializados ou não, evidenciando que, na prática, somente os países
industrializados recebiam os benefícios do progresso técnico. Enquanto que as
populações dos países não industrializados ficavam isentos dos benefícios do
desenvolvimento da produtividade.
Daí as acentuadas diferenças nos padrões de vida das massas e de suas
respectivas poupanças, uma vez que o volume da poupança depende do aumento
da produtividade.
41
PREBISCH, Raul. O Desenvolvimento Econômico da América Latina e alguns de seus problemas
principais (1949). In: BIELSCHOWKY, 2000, p. 71.
41
O desequilíbrio desta relação estava claro. Por isso, a importância
fundamental da industrialização desses países. Ela não seria um fim, mas um meio
de que eles dispunham para captar parte do fruto do progresso técnico e elevar
progressivamente o padrão de vida das massas. Porém, quando os benefícios do
progresso técnico atingiram os países periféricos, segundo PREBISCH (2000), foi
mais acentuado na indústria do que na produção primária.
O sistema centro-periferia explica a forma pela qual os países em
desenvolvimento se vinculam economicamente aos desenvolvidos. Para Jacqueline
HAFFNER (1996)
42
,
“no conceito centro-periferia está a idéia de um desenvolvimento
desigual originário, consideram-se centro as economias em que
penetram primeiro as técnicas capitalistas de produção. A periferia
está constituída pelas economias cuja produção permanece
inicialmente atrasada do ponto de vista tecnológico e organizativo.”
43
.
Ou seja, HAFFNER reafirma as considerações de Furtado sobre o
desenvolvimento e as distintas realidades histórico-estruturais dos países latino-
americanos e parte da premissa de que o progresso técnico se propagou a partir da
Grã-Bretanha, seguindo por outros países europeus, atingindo os Estados Unidos
em grandes proporções.
Estes países constituíam os grandes centros industriais em torno dos quais
formou-se uma vasta periferia. Faziam parte desta periferia os países não-
42
HAFFNER, Jacqueline A. Hernández. CEPAL: uma perspectiva de desenvolvimento latino-
americano. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1996.
43
RODRIGUEZ, Octavio (1981) apud HAFFNER, 1996, p.57.
42
industrializados, como os da América Latina. Eles se relacionam com o centro de
forma parcial ou subordinada.
A situação em que se encontravam os países latino-americanos, como
exportadores de produtos primários, os obrigava a aumentar as exportações para
atingir um certo nível de acumulação de capitais, o que geralmente acarretava
problemas ainda maiores, pois aumentava a oferta e os preços decaíam.
Como antigas colônias européias, os países latinos teriam sofrido saques e
explorações primárias, inexistindo historicamente políticas de acumulação interna.
Esse seria um dos fatores determinantes que contribuíram para o
subdesenvolvimento regional.
A relação existente entre o centro e a periferia no momento em que o
progresso se propaga mais rápido a partir dos centros, marca a fase chamada
“desenvolvimento para fora”. Esta relação demonstra claramente o papel específico
da periferia: produzir alimentos e matérias-primas para os grandes centros
industriais. “Sendo assim, o objetivo deste tipo de comércio internacional não é
melhorar o nível de vida da população da periferia, mas permitir que os centros
obtenham, da forma mais econômica possível, as matérias-primas para satisfazer
seu consumo.”
44
Uma segunda idéia fundamental da teoria cepalina, de acordo com
BIELSCHOWSKY (1996), foi a mudança de direção do crescimento periférico. A
44
GURRIERRI, Adolfo (1982) apud HAFFNER, 1996, p.58.
43
partir da depressão pós-30, iniciou-se a fase de crescimento “para dentro”. Esse
novo padrão de desenvolvimento teve um significado histórico, não só para os
países periféricos mas para todo mundo, pois tratava-se de uma nova era na
difusão do progresso técnico.
O principal elemento desta fase foi a industrialização. Esperava-se uma
transformação nas estruturas econômicas dos países periféricos. Inicialmente ela
seria orientada para o mercado interno, produzindo bens mais simples, para depois
chegar a produtos mais complexos.
Nesse contexto, PREBISCH (2000) examina o movimento espontâneo da
industrialização que, para ele, corresponde a uma transformação histórica e
fundamental. Aí, tanto as técnicas quanto os benefícios da produtividade poderiam
ser absorvidos pelas regiões atrasadas. Porém, as perspectivas de um real
desenvolvimento econômico eram muito incertas, devido às características dos
sistemas produtivos das economias periféricas e da forma como elas se
relacionavam com a economia internacional.
Os teóricos da CEPAL sabiam que as bases estruturais das economias
periféricas eram os principais obstáculos para o desenvolvimento econômico e
conseqüentemente para as relações econômicas desses países com o mundo
desenvolvido.
O problema das estruturas econômicas latino-americanas era justamente a
grande concentração de terras e, em virtude disso, a concentração da renda, a qual
derivava da história colonial e debilitava o progresso técnico como propunha
44
PREBISCH, não permitindo que a economia proporcionasse o movimento social
para o progresso e a conseqüente igualdade social.
“Es um hecho conocido que el acaparamiento de la tierra en pocas
manos y la proliferación del minifundio representa en la America
Latina un fenómeno secular que conspira contra el progresso técnico
y el buen aprovechamiento del potencial produtivo del suelo, y es
factor importante de disparidad social.”
45
Havia uma preocupação por parte dos teóricos cepalinos em buscar, através
do planejamento, um caminho próprio para a América Latina. Diante das
desigualdades sociais, era necessário investir na agricultura, aprimorando técnicas
de produção e possibilitando a abertura de mercado de trabalho nessa atividade,
bem como, dentro da atividade industrial.
A agricultura praticada apresentava baixa produtividade. Os grandes
latifúndios, assim como os minifúndios, resistiam às inovações tecnológicas
oferecidas para a agropecuária. Segundo Nali de SOUZA
46
, a estrutura agrária
mostrava-se desfavorável ao desenvolvimento, pois a produção era voltada mais
para a subsistência, portanto não havia interesse em modificar a estrutura agrária e
tampouco em adquirir máquinas e equipamentos para um aumento da produtividade.
Segundo AMARAL FILHO (1993), para a CEPAL essa estrutura era
responsável pela sub-utilização da terra assim como pelo seu baixo nível de
45
PREBISCH, Raul. Trasformación y desarrollo la gran tarea de América Latina. México: Fondo
de Cultura Económica, 1970. (p.204).
46
SOUZA, Nali de Jesus de. Desenvolvimento Econômico. 4.ed. São Paulo: Atlas, 1999. (p. 203).
45
produtividade, e por conseqüência pela geração de um excedente insuficiente e
incapaz de sustentar a acumulação industrial.”
47
A concentração fundiária juntamente com um mercado interno muito reduzido
e uma elevada taxa no crescimento demográfico, foram os principais obstáculos
internos que prejudicaram o crescimento da indústria nos países latino americanos.
O crescimento demográfico na América Latina acentuou-se no período pós
Segunda Guerra devido às medidas sanitárias. No meio rural, esse crescimento
acarretou um aumento no número dos minifúndios e, conseqüentemente, no nível da
pobreza. Segundo DONGHI, a explosão demográfica que ocorreu na América Latina
deveu-se ao progresso sanitário que, ainda limitado, “rompeu um equilíbrio secular;
a natalidade continua, geralmente, em nível fisiológico, ao passo que a mortalidade
diminui rapidamente”.
48
A elevada taxa de crescimento demográfico que ocorreu no meio rural, não
resolveu os problemas internos. Segundo SOUZA (1999), as dificuldades de acesso
a terra eram cada vez maiores, pois os latifúndios não eram divididos,
permanecendo, muitas vezes, como terras ociosas. Essa realidade gerava o
aumento das desigualdades sociais, a fome e a falta de perspectivas, causando o
êxodo rural. Enquanto as migrações rurais se intensificavam, a oferta de alimentos
não aumentava nas mesmas proporções. Por outro lado, a população pobre do meio
47
AMARAL FILHO, Jair de. Cepal: Fonte dos paradigmas do Desenvolvimento da América Latina:
uma postura pós-cepalina e heterodoxa. Texto para Discussão, Ceará, n.81, Mestrado em
Economia: Universidade Federal do Ceará, 1993. (p.11).
48
DONGHI, Halperin. História da América Latina. 3.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975. (p. 217).
46
rural que não emigrou para as cidades, não constituiu mercado consumidor
suficiente para a indústria.
De acordo com PREBISCH, “uma proporção sensível do aumento de
população ativa não se absorve satisfatoriamente no processo produtivo”
49
, pois
permanece à margem do desenvolvimento. Isso ocorreu principalmente nas
populações que se deslocavam do campo para as cidades.
A frustração dessas populações na vida urbana era enorme. Enquanto isso,
no campo, a situação de indigência e ressentimento em relação às cidades era
visível. Nelas vislumbravam a oportunidade de melhorar suas rendas. Na prática,
isso não acontecia. As razões do deslocamento dos camponeses para os centros
urbanos são conhecidas. Segundo PREBISCH (1964), os produtos primários
cresceram em menor escala que os produtos industriais, e esse foi um dos principais
fatores que justificaram o aumento da população ativa nas cidades.
Deve-se ressaltar, dentro do crescimento demográfico, que nem toda a mão-
de-obra provinha da agricultura. Esta poderia ser encontrada nas cidades,
recebendo baixos salários, já que prestava serviços pessoais não qualificados,
desde serviços domésticos, comércio de rua e atividades de artesanato. Para
PREBISCH (1964), toda essa gente estava à margem do progresso técnico, porém,
à medida em que as atividades industriais e as atividades ligadas ao movimento de
bens, como transportes e comércio, cresciam, essas populações passaram a
beneficiar-se das mesmas.
49
PREBISCH, Raul. Dinâmica do Desenvolvimento Latino-Americano. Rio de Janeiro: Fundo de
Cultura, 1964. (p.33).
47
As atividades industriais tendiam a crescer com maior intensidade do que a
renda
50
, promovendo também o crescimento de outras atividades que por sua vez,
proporcionavam o aumento da renda. Porém, a questão principal colocada por
PREBISCH, era que a variedade de serviços que eram oferecidos demandavam de
mão-de-obra qualificada, ou com um mínimo de preparo profissional. Sendo assim,
grande parte da população deslocada da agricultura incorporava-se aos setores em
que a remuneração era inferior, ocupando serviços não qualificados.
A expectativa destas populações era de que, gradualmente, se deslocariam
para atividades industriais ou de serviços, melhorando sua renda. Esse crescimento
seria de forma parcial. Enquanto isso, as atividades marginais também cresceriam
devido à insuficiência dinâmica do sistema que não conseguia alcançar taxas
mínimas de desenvolvimento para possibilitar o acúmulo de capital. A insuficiência
dinâmica, segundo PREBISCH, “reside em grande parte naquele desequilíbrio entre
a produtividade e os investimentos”.
51
A realidade latino-americana era o principal obstáculo ao mercado
consumidor, pois as populações com baixa renda e com possibilidades mínimas de
atingí-la não ajudariam a manter o ciclo de crescimento de uma economia.
Para que a insuficiência dinâmica fosse eliminada, era necessário o aumento
da renda que levaria a maior consumo, proporcionando um certo acúmulo de capital,
50
É necessário que se diferencie Renda Real e Salário. Renda Real é o conjunto de bens e
serviços que a renda monetária pode comprar. Para um indivíduo corresponde tanto ao dinheiro
quanto aos bens que recebe em determinado período de tempo. É determinada não apenas pelo
montante de dinheiro à disposição de um indivíduo, mas pelos preços dos bens que ele deseja
adquirir. Salário é a remuneração recebida pelo trabalhador pela venda de sua força de trabalho.
48
que deveria ser investido em setores produtivos. Para PREBISCH, a insuficiência
dinâmica seria combatida, “de um lado, mediante uma mais intensa acumulação de
capital e a melhor utilização do capital existente. Por outro, com o emprego mais
racional do capital nas aplicações mais vantajosas do ponto de vista da absorção do
potencial humano.
52
A influência da Teoria do Equilíbrio de KEYNES foi uma das explicações
apresentadas pela CEPAL para demonstrar o atraso da América Latina em relação
aos centros e buscar alternativas para superá-lo.
A Teoria de KEYNES
53
indica que o nível de emprego de uma economia
capitalista depende da demanda efetiva
54
, isto é, da proporção da renda que é gasta
em consumo ou investimento. Afirma ainda que “ao contrário da Lei de Say, numa
economia monetária é possível receber sem imediatamente gastar o dinheiro, ou
seja, é possível vender sem comprar”.
55
De acordo com o autor, numa economia capitalista qualquer quantia em
dinheiro é suscetível de ser aplicada lucrativamente, podendo haver vantagens em
retê-lo, ou seja, entesourá-lo. Quando isso acontece, o volume de vendas supera o
de compras, logo a demanda efetiva por mercadorias cai.
Costuma-se incluir como parte do salário, vestimentas e calçados especiais, alimentação e transporte
que a empresa coloca a disposição do empregado. (SANDRONI, 1994, p.299 e 315).
51
PREBISCH, 1964, p.38.
52
PREBISCH, 1964. p.42.
53
KEYNES, John Maynard. Inflação e deflação. São Paulo: Abril Cultural, 1978. [Os Pensadores].
54
Segundo consta no Dicionário de Economia, demanda efetiva é a demanda de bens e serviço
para os quais existe capacidade de pagamento uma vez que na economia de mercado a demanda
efetiva é a única que conta, embora seja inferior àquela decorrente das necessidades do conjunto da
população. (SANDRONI, 1994, p.90).
55
KEYNES, 1978, p.X.
49
Segundo SOUZA (1999), Keynes havia centrado sua análise na abordagem
macroeconômica do pleno emprego, em fatores do crescimento do investimento e
nos seus impactos sobre a renda e o emprego. Em sua obra, Teoria Geral (1936),
KEYNES critica os postulados da economia clássica, combatendo a Lei de Say
56
, a
Lei dos Mercados, a qual estabelece que a oferta cria sua própria demanda,
dificultando a crise da superprodução.
Conforme FONSECA
57
, as análises realizadas recentemente sobre a teoria
keynesiana e as idéias da CEPAL demonstram que existe uma aproximação no
aspecto das construções teóricas e, ao mesmo tempo, uma resistência entre
reconhecer e atribuir a influência de KEYNES às idéias cepalinas.
As diferenças entre as idéias de Keynes e da CEPAL são colocadas por
FO NSECA (1998) a partir do marco teórico de Keynes, o qual é caracterizado pelo
equilíbrio de curto prazo, através do princípio da demanda efetiva
58
. Para o autor, a
partir da teoria keynesiana não podemos considerar capacidade produtiva e
tecnologia como var iáveis
59
em economias subdesenvolvidas.
56
A Lei de Say, também conhecida como a Lei dos Mercados, foi elaborada pelo economista francês
Jean-Baptiste Say. Estabelece que a oferta cria sua própria demanda, impossibilitando uma crise
geral de superprodução. (SANDRONI, 1994, p.190-191).
57
FONSECA, Pedro Cezar Dutra. As Origens do Pensamento Cepalino e a influência de Keynes.
Revista Sociedade Brasileira Economia Política, Rio de Janeiro, n.2, p 72-95, jun.1998.
58
Demanda Efetiva, num sentido amplo, é a demanda de bens e serviços para os quais existe
capacidade de pagamento, uma vez que na economia de mercado a demanda efetiva é a única que
conta. (SANDRONI, 1994, p.90).
59
Variável, segundo Dicionário de Economia, é uma quantidade algébrica cujo valor pode mudar. Se
tomarmos a variável "X", que pode assumir os valores x1, x2, x3, ...xn e se a cada um desses valores
estiver associado a uma probabilidade p1, p2, ...pn, então X será uma variável aleatória. (SANDRONI,
1994, p.368).
50
As idéias cepalinas de Prebisch e Furtado consideravam a tecnologia como
variável indispensável para explicar os principais dilemas das economias latino-
americanas e sua posição subordinada na divisão internacional do trabalho.
FONSECA menciona que
“estas diferenças de visão de sistema econômico entre Prebish e
Keynes não são detalhes, nem secundárias; por sua relevância,
definem diferentes visões de economia e de sua lógica de
funcionamento. Tudo sugere que, mesmo que haja pontos comuns
entre ambos, também há pontos substantivos em que não existe
convergência. A semelhança é muitas vezes formal ou aparente:
ambos defendem o intervencionismo, mas por razões completamente
diferentes e através de instrumentos não coincidentes; ambos
mencionam o desemprego e até o tem como centro da análise, mas
o desemprego estrutural de um pouco tem a ver com o desemprego
involuntário do outro, já que o primeiro ocorre por falta de capacidade
produtiva e o segundo justamente por seu excesso frente à demanda
efetiva. E daí decorrem ações concretas diferentes: o primeiro exige
crescimento acelerado e acumulação de capital, dependentes da
poupança; o segundo transforma exatamente a excessiva
acumulação de capital em vilã, e recorre a argumentos do mercado
de trabalho, como a ilusão monetária por parte da oferta de
trabalho.
60
Dando seqüência as proposições acima, na teoria de KEYNES a propensão a
consumir representa a relação entre o consumo e a renda total de cada indivíduo, e
não a relação entre o investimento e o consumo. Para KEYNES a demanda
61
tende
a tornar-se insuficiente nos países capitalistas desenvolvidos, devido à queda na
propensão a consumir porque uma vez atingido um certo nível de renda, os
indivíduos destinam parcelas decrescentes de seus ganhos para o consumo e
aumentam suas poupanças. Para ele isso é válido nos países de primeiro mundo,
mas para os países subdesenvolvidos, em que a renda é menor e o consumo tende
60
FONSECA, 1998, p. 76.
61
Demanda, segundo Dicionário de Economia, dentro da teoria micro-econômica, é a quantidade de
um bem ou serviço que um consumidor deseja e está disposto a adquirir por determinado preço e em
determinado momento. (SANDRONI, 1994, p.89).
51
a ser maior, indivíduos gastam mais do que ganham devido à oferta de crédito
existente no mercado
62
.
Não pretendemos aqui concluir esta polêmica, apenas apresentar diferentes
posições sobre a questão demanda/consumo na teoria cepalina. Outra questão
chave deste pensamento coloca-se no processo de industrialização, dentro da
realidade latino-americana, da relação centro-periferia. Elemento fundamental para
sua estratégia desenvolvimentista seria a necessária postura ativa do Estado nesses
países, para viabilizar as condições de infra-estrutura e de implementação das
indústrias básicas.
Estes seriam alguns dos aspectos apresentados pelos teóricos cepalinos
sobre os principais obstáculos da economia da América Latina que bloqueavam, de
certa forma, o desenvolvimento econômico.
1.2.2 As Correntes do Pensamento Econômico
Dentre as correntes do pensamento econômico na América Latina, destacam-
se a Corrente Desenvolvimentista, a Liberal e a Socialista.
A primeira, Desenvolvimentista, pregava a superação do subdesenvolvimento
atacando os pontos de estrangulamento verificados, pr incipalmente, nos setores
primário e secundário, com o decidido controle do Estado, portanto, intervencionista.
62
Segundo MANTEGA (1987), os problemas de demanda surgem quando, diante da queda da
propensão em consumir, uma parte da renda, que agora está sob forma de poupança, deixa de ser
investida. Neste caso, a preferência pelas aplicações financeiras irão causar queda dos
investimentos, diminuir a demanda e criar uma possível recessão econômica.
52
Subdividia-se em: a) desenvolvimentista do setor público (não nacionalista) - seu
projeto econômico básico era a industrialização em ritmo compatível com equilíbrio,
com intensa participação do capital estrangeiro e planejamento parcial; b)
desenvolvimentista do setor privado defendia a industrialização com proteção
estatal ao capital industrial nacional; c) desenvolvimentista do setor público
(nacionalista) - corrente preponderante no núcleo da CEPAL e no BNDE (Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico), tendo no economista Celso Furtado um
destacado defensor. Seu projeto econômico básico era a industrialização planificada
e fortemente apoiado por empreendimentos estatais.
63
A segunda, Liberal, defendia a prioridade da livre movimentação das forças
do mercado como meio de atingir a eficiência econômica. Caracterizava-se pela
oposição às idéias do desenvolvimentismo, acreditava que era necessária alguma
diversificação industrial. Sua proposta era estabelecer as condições do equilíbrio
monetário e financeiro, o que seria indispensável para a eficiência dos mecanismos
de mercado. Aceitava uma pequena intervenção estatal, quando necessária, para
amenizar alguns desajustes.
A terceira corrente, a Socialista, aproximava-se dos desenvolvimentistas, pois
também defendia a industrialização e a intervenção estatal. Seu projeto básico não
era a industrialização, mas a transição para o socialismo. A industrialização
correspondia, na visão desta corrente, ao desenvolvimento das forças produtivas
necessárias ao processo de transição para o socialismo.
63
BIELSCHOWSKY, 1996.
53
O foco principal de nosso estudo é a Corrente Desenvolvimentista,
considerando que alguns de seus aspectos já vêm sendo apresentados no decorrer
deste trabalho.
A preocupação fundamental da CEPAL era explicar o atraso da América
Latina em relação aos chamados centros desenvolvidos e encontrar formas de
superá-lo. Para ela, os países periféricos latino-americanos estavam amarrados pela
falta de dinamismo de suas estruturas produtivas, baseadas num número restrito de
produtos primários com pouco desenvolvimento industrial e tecnológico, guiados
pelo mercado externo.
A saída para essa situação residia na implementação de uma política
deliberada de desenvolvimento industrial que, segundo MANTEGA (1987), “promova
uma reforma agrária, melhore a alocação dos recursos produtivos e impeça a
evasão da produtividade
64
. Trata-se, portanto, de reverter o eixo básico da
economia, até então voltada “para fora”, para o desenvolvimento voltado “para
dentro”, baseado na industrialização para o mercado interno.
A industrialização era vista como o meio mais eficiente de se conseguir o
aumento da renda nacional e da produtividade, sendo necessário, para isso a
participação do Estado. Segundo MANTEGA, visando transformá-las em economias
nacionais sólidas e autônomas, a CEPAL sugeriu: a decidida participação do
64
MANTEGA, 1987, p.39.
54
Estado na economia, enquanto principal promotor do desenvolvimento e
responsável pelo planejamento das modificações que se faziam necessárias”
65
Cientes de que as medidas intervencionistas não agradariam os adeptos do
liberalismo econômico dos países centrais, os desenvolvimentistas defendem que
para as economias periféricas, a intervenção do estado e o planejamento
significavam o fortalecimento das economias locais, pois passariam a ter um poder
de barganha maior diante dos banqueiros internacionais.
PREBISCH explicita-nos os motivos pelos quais o Estado deveria intervir,
baseado em dois pontos fundamentais:
“a) o Estado tem que intervir, por que o mercado nem sempre dá
condições que promovam o emprego mais econômico dos recursos
disponíveis, e b) também tem de o fazer porque as indicações dadas
pelas forças do mercado só concernem a uma parte das decisões
dos indivíduos, e não a todas, e especialmente a algumas que tem
importância considerável no desenvolvimento. A intervenção do
Estado é essencial para guiar a atividade privada, para levá-la sem
compulsão alguma ao cumprimento de certos objetivos do
desenvolvimento.”
66
Nesse sentido, a doutrina da CEPAL passa a ter um evidente tom
nacionalista, orientada para promover a acumulação capitalista em bases locais e
com uma certa hostilidade ao imperialismo. De acordo com MANTEGA (1987), era
um nacionalismo que não hostilizava por completo o capital estrangeiro, ocupava-se
apenas em criticar o imperialismo ligado às atividades agroexportadoras.
65
MANTEGA, 1987, p.39.
66
PREBISCH, 1964, p.78.
55
A participação do capital estrangeiro na promoção do desenvolvimento da
indústria nos países periféricos não fazia parte do objetivo central da CEPAL, mas
diante das características estruturais destes países, o projeto de desenvolvimento
nacional por ela proposto aparece agora com um caráter ambíguo. As economias
internas apresentavam ainda uma dependência dos mercados externos, muito
embora o nacionalismo se demonstrasse vibrante, não escondia a simpatia e a
necessidade da participação de empresas estrangeiras em setores importantes,
como transporte ferroviário, energia, e outros setores de serviços públicos.
O capital estrangeiro que foi investido na indústria de transformação, sem
dúvida, impulsionou a acumulação do capital nos países latinos. Esses
investimentos ocasionaram o aumento da concentração de renda e das
desigualdades sociais durante a década de 50. Isso fez com que a CEPAL viesse,
mais tarde, a repensar suas teses, particularmente no que se referia aos problemas
sociais e políticos desses países.
A Corrente Liberal fazia oposição à Corrente Desenvolvimentista (Cepalina).
Ela defendia o sistema de livre mercado que, segundo ela, era fundamental para a
eficiência econômica. Alguns economistas liberais acreditavam que era necessária a
intervenção mínima do Estado, mas apenas para sanear algumas imperfeições do
mercado.
Pelo menos até a crise de 1930, as doutrinas liberais eram praticadas em
vários países latino-americanos. E, na sua maior parte, funcionavam muito bem
56
dentro do universo de interesses das elites. Segundo SKIDMORE
67
, essas doutrinas
liberais defendiam que o modelo de crescimento baseado na exportação-
-importação oferecia meios funcionais e proveitosos para a integração da América
Latina no sistema global do capitalismo, evidenciando que essas políticas
asseguravam a hegemonia das elites nacionais e reforçavam que a política
econômica liberal estava intrinsecamente ligada ao quadro de desigualdades sociais
que marca a região.
O liberalismo adotado na América Latina possuía vínculos intrínsecos com os
interesses de determinados grupos sociais, destacando-se os interesses
agroexportadores. Conforme SKIDMORE, ao mesmo tempo que implementavam as
regras do liberalismo clássico europeu, os latino-americanos perceberam que sua
realidade não se prestava a simples aplicação daquela doutrina, “no supieran
entender que, en su origen, el liberalismo europeo fue la ideologia de una clase
social en alza, cuyo poder económico emergente le proporcionó los medios para
llevarla a la prática.”
68
A Corrente Liberal mostrava-se contrária à industrialização subsidiada pelo
governo, denunciando os custos elevados e a baixa produtividade. Esta acreditava
no crescimento equilibrado através das forças do mercado. Para BIELSCHOWSKY
(1996) essa corrente diagnosticava que o crescimento negativo devia-se às políticas
econômicas equivocadas, o que levaria a um crescimento desequilibrado e
ineficiente.
67
SKIDMORE, Thomas E. & SMITH, Peter H. História Contemporánea de América Latina.
Barcelona: Critica, 1996.
68
SKIDMORE, 1996. p. 61-62.
57
De acordo com a análise de BIELSCHOWSKY (1996), os países latino
americanos, principalmente México, Argentina e Brasil, que passavam por um
aumento demográfico significativo, em função do êxodo rural, por problemas de
saneamento urbano, por dificuldades na mão-de-obra não qualificada, por
desemprego e falta de infraestrutura, aceitaram mais prontamente as regras
propostas pela CEPAL, visando alcançar o desenvolvimento.
Nos anos 50, as doutrinas cepalinas apresentavam-se como um caminho
viável para sanar o subdesenvolvimento e proporcionar a transição de uma
sociedade tradicional, agroexportadora, para uma sociedade moderna, industrial.
Segundo FURTADO (1977)
69
, admitia-se que o desenvolvimento só seria
possível enquanto meta planejada. Daí, a tarefa do Estado de assumir o
planejamento, estimulando o processo de formação de capital e orientando os
investimentos.
No Brasil, as propostas desenvolvimentistas foram colocadas em prática no
início dos anos 50, no Governo de Getúlio Vargas. Celso Furtado, um dos principais
teóricos cepalinos, foi quem implantou esses projetos, processo que analisamos no
capitulo seguinte.
69
FURTADO, Celso. Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico. 6.ed. São Paulo: Editora
Nacional, 1977.
2 A POLÍTICA ECONÔMICA BRASILEIRA - ANOS 30-50
Neste capítulo propomo-nos a apresentar alguns aspectos da política
econômica brasileira a partir da década de 30, para melhor explicitar o processo de
desenvolvimento e industrialização que ocorreu com mais força durante os anos 50.
Propomos, como corte temporal inicial, o período entre 1930 e 1954,
fundamental para a compreensão desta proposta, pois nele se estabeleceram as
condições para a construção do aparelho econômico estatal centralizado e as
políticas econômicas, que levaram à adoção de um determinado modelo de
desenvolvimento capitalista a partir da década de 50 no Brasil. É através das
propostas do modelo nacional-desenvolvimentista que identificamos esse
planejamento político e econômico, suas preocupações com o social e com as
desigualdades regionais, explicitando o aspecto ideológico presente no programa de
um capitalismo nacional.
Após a crise da Bolsa de Nova Iorque em 1929, a economia dos países
dependentes do mercado externo, como o Brasil, passaram a administrar suas
crises internas, buscando modelos econômicos baseados na intervenção do Estado.
59
Naquele momento, a participação do poder público para solucionar a crise dos
mercados internos tornava-se imprescindível.
Dentro do contexto histórico da Revolução de 1930 e a crise de 29-33,
criaram-se as precondições para as rupturas políticas e econômicas que marcam
nosso período de estudo. A depressão econômica mundial desempenhou um papel
decisivo na constituição da sociedade brasileira, em especial pelos efeitos causados
à cafeicultura, e por conseqüência, no sistema político-econômico nacional.
De acordo com IANNI
70
, “a partir deste momento, os grupos políticos no poder
começaram a modificar os órgãos governamentais e a inovar na esfera política
econômico-financeira.” Os novos governantes tiveram que acomodar antigos
interesses econômicos e políticos dos cafeicultores, contrariados com os efeitos das
crises antes mencionadas.
Apesar da crise e das dificuldades de toda ordem, durante o período de
desarticulação da economia internacional, ocorrido durante a depressão de 30, a
produção brasileira de consumo interno cresceu tanto no setor agrícola como no
setor industrial. As novas diretrizes do Governo de Getúlio Vargas, a partir de 1931,
proporcionaram e estimularam o crescimento do mercado interno.
Para Caio PRADO JR
71
, este momento se caracterizou pelo processo de
nacionalização da economia do país: “A grave crise que sofria seu sistema
70
IANNI, Octavio. Estado e Planejamento Econômico no Brasil. 6.ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1996. (p.31).
71
PRADO JR, Caio. História Econômica do Brasil. 43.ed. São Paulo: Brasiliense, 1998.
60
tradicional fornecedor de matéria-prima e gêneros tropicais, resultava no progresso
de sua nova economia voltada para necessidades próprias.”
72
Logo, a indústria
nacional, progressivamente, substituiu com seus produtos as importações por
artigos de consumo imediato.
Enquanto isso, os novos governantes passaram a acomodar, por um
momento, os interesses econômicos e políticos ligados ao grupo dos cafeicultores
que, até então, detinham o controle hegemônico do aparelho estatal.
Nesse quadro, gestaram-se as condições para que o país deixasse de ser
essencialmente agrícola para tornar-se agrário-industrial. Sua economia, até então,
com base agrária, passou a dividir espaço com a indústria nascente. Embora essa
nova situação tenha interferido substancialmente no setor agrário, esse continuou
recebendo incentivos e proteção por parte do governo.
Entre 1930/45, podemos dizer que não houve um planejamento estratégico e
econômico preestabelecido, pois as medidas econômicas ocorriam ao passo em que
os problemas apareciam e de acordo com os interesses dos grupos internos e dos
setores externos, conforme suas demandas específicas. Esse período caracterizou-
se pelo lançamento das bases para a expansão industrial, que se integrava ao
processo de adoção de uma política econômica intervencionista e nacionalista.
72
PRADO JR, 1996, p.292.
61
Para compreender a direção política que definiu os contornos assumidos pela
industrialização capitalista no Brasil, é relevante demonstrar as alternativas de
desenvolvimento que se abriram a partir da crise de 1929.
De acordo com DRAIBE, o desenvolvimento mercantil-exportador criou uma
determinada divisão social do trabalho que girava em torno de setores tradicionais
que a autora descreveu como “histórico-fundamentais: burguesia mercantil-
exportadora, a burguesia industrial e o proletariado.
73
Esses grupos definem-se
como fundamentais porque eram capazes de ordenar-se a partir de interesses
estratégicos e objetivos no conjunto da sociedade.
A ação do poder público, diante dos diferentes grupos e classes sociais
envolvidos na crise, foi a de reformular e redimensionar os órgãos governamentais,
ou até mesmo criar novos. Segundo IANNI, o governo federal criou Comissões,
Conselhos, Departamentos, Institutos (...) incentivou debates sobre problemas
econômicos (...). As medidas adotadas pelo governo alcançaram praticamente todas
as esferas da sociedades nacional”.
74
É importante destacar a estrutura social existente no âmbito da economia
cafeeira, pois foi através dela que se estabeleceu, dentro do setor exportador, um
sistema capaz de definir o dinamismo e uma diferenciação econômica interna que
não existia nos outros estados do país.
73
DRAIBE, Sonia Miriam. Rumos e Metamorfoses: um estudo sobre a constituição do Estado e as
alternativas da industrialização no Brasil (19301960). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. (p.28).
74
IANNI, 1996, p.34.
62
De acordo com João Manuel CARDOSO DE MELLO
75
, o capital cafeeiro
abrigou diferentes formas, tais como capital produtivo, comercial e bancário; era
capital empregado no campo (na produção e beneficiamento do café) e na cidade
(em atividades comerciais, de importação, serviços financeiros e de transportes).
A economia cafeeira agregava um conjunto de relações que dominavam
diferentes setores produtivos e influenciavam as relações políticas do país. As
alternativas estruturais de desenvolvimento de outras regiões, em relação ao
acúmulo de capital no setor exportador, eram inferiores aos da região cafeeira. Isto
não significava, porém, que o papel das oligarquias regionais não cafeeiras, dentro
do movimento político, fossem menos importantes, apenas sua realidade concreta
demonstrava a impossibilidade de constituir uma base de interesses a partir da
estrutura social existente e de buscar e implementar alternativas de
desenvolvimento.
Assim, a economia cafeeira no Brasil foi o principal motor de
desenvolvimento, impulsionando a divisão do trabalho, principalmente na sua
dimensão urbana, através do crescimento das atividades comerciais atacadistas,
varejistas, bancárias e serviços de utilidade pública
76
. Possibilitou, igualmente, a
centralização financeira e mercantil em São Paulo, diferenciando--se dos demais
estados do país.
75
CARDOSO DE MELLO, João Manuel. Capitalismo Tardio. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1975.
76
Existem muitos trabalhos que tratam da diferenciação e das características da atividade urbana no
Brasil, dentre os quais destacamos: FURTADO, Celso. Formação Econômica no Brasil. 22.ed. São
Paulo: Ed. Nacional, 1987.
63
A economia mercantil exportadora, no momento em que desenvolveu uma
divisão social do trabalho, constituiu uma estrutura social peculiar, dominada pela
burguesia mercantil-cafeeira, que estava atrelada aos setores comercial e financeiro.
De acordo com DRAIBE (1985), o crescimento da indústria deu origem a uma
burguesia industrial e a um proletariado urbano. Desenvolveram-se também outras
atividades que davam suporte à economia exportadora, como comércio, transportes
e bancos. Esses setores permitiram o aparecimento de uma pequena burguesia e
uma classe média.
Além disso, desenvolveu-se um setor de assalariados urbanos não
diretamente proletários, aos quais Décio SAES (1984)
77
se refere como conjunto de
trabalhadores improdutivos
78
, profissionais liberais e demais trabalhadores
assalariados urbanos. Esses, se agrupam no setor terciário e alguns no setor
secundário, porém, segundo o autor, dentro da tradição marxista, eles não
participavam diretamente na produção de mercadorias, criando-se assim, uma
estrutura social diferenciada e heterogênea, tanto nas classes dominantes quanto
nas classes e frações subalternas.
Para SAES, “a industrialização capitalista exigiu, portanto, a expansão do
aparelho urbano de serviços; o nascimento das classes sociais antagônicas
burguesia industrial e a classe operária - foi seguido, deste modo, pela multiplicação
77
SAES, Décio. Classe Média e o Sistema Político no Brasil. São Paulo: T.A .Queiroz, 1984.
78
SAES, 1984, p.8. [Grifo do autor].
64
de outros grupos sociais.”
79
Apesar disso, o setor agro-exportador neste momento,
continuou sendo o principal agente econômico e político.
Desse modo, a crise da economia cafeeira, que atingiu seu auge na
depressão dos anos 30, possibilitou alteração do modelo de inserção do Brasil na
economia mundial capitalista.
O estabelecimento do capital industrial, como um novo eixo de acumulação
capitalista, possibilitou, diante do colapso da economia agro-exportadora, novas
alternativas para o desenvolvimento do mercado interno. Assim, pode-se afirmar que
a primeira fase de industrialização no Brasil teve início a partir da década de 30
80
.
Segundo FURTADO (1987), pode-se qualificar como um erro a compra do
excedente da produção do café pelo governo brasileiro, retirando do mercado parte
da produção para equilibrar os níveis de oferta e de procura, evitando maiores
prejuízos para os produtores. Esse procedimento fez com que os estoques
acumulados não fossem utilizados economicamente dentro de um curto prazo, o
que prejudicou as próximas safras. Para o autor, essa foi uma política de
desestímulo que acabou sendo prejudicial, a médio prazo, para os produtores de
café, que não se sentiram motivados a reinvestir os lucros em novas lavouras.
De qualquer forma, era necessário investir no mercado interno para dinamizá-
lo, sendo que, apesar das dificuldades em adquirir equipamentos, o setor industrial
conseguiu aumentar sua produtividade. Nessa lenta revitalização, os cafeicultores
79
SAES, 1984, p.8.
80
Não estamos ignorando o processo de implantação de uma indústria de bens de consumo anterior
a este período. A especificidade aqui concentra-se no que chamamos “processo de industrialização”.
65
passaram a aproveitar mais intensivamente a capacidade já instalada, possibilitando
uma maior rentabilidade e criando fundos para novos investimentos. O setor agrícola
destinou um volume maior de sua produtividade para o consumo interno.
Na obra clássica de FURTADO, Formação Econômica do Brasil (1987),
encontra-se muito bem ilustrado esse período, que apresenta o crescimento da
procura de bens de capital, reflexo da expansão da produção para o mercado
interno, e a forte elevação dos preços de importação desses bens, (...) [criando-se]
condições propícias à instalação no país de uma indústria de bens de capital.’
81
Todos os setores, assim, voltaram-se para o mercado interno como resultado da
crise externa e das políticas adotadas pelo governo brasileiro.
Diante da estrutura capitalista que se vislumbrava no País, Paul SINGER
82
destacou esse período como a primeira etapa de substituição de importações.
Datam dessa época os acordos com empresas de veículos que chegavam ao Brasil
desmontados. Esse novo ramo de indústria caracteriza, segundo o autor, o início do
capitalismo brasileiro, que passou a ser dominado por subsidiárias dos fabricantes
estrangeiros.
DRAIBE (1985) afirma que, diante desse quadro, independente das
considerações de viabilidade, nenhuma das duas alternativas, a industrial e a
agrícola, apresentava-se, a priori, como uma solução para o futuro. O que dependia,
81
FURTADO, 1987, p.199.
82
SINGER, Paul. Interpretação do Brasil: uma Experiência Histórica de Desenvolvimento. In:
FAUSTO, Boris. O Brasil Republicano: Economia e Cultura (1930-19640). 3.ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 1995.
66
sem dúvida, de novas políticas no interior do Estado, ou até mesmo uma
transformação do próprio Estado.
A direção política do Estado após o golpe de 30 e a orientação (agrária e/ou
industrial) que tomaria, torna-se crucial para solucionar a crise econômica, como
também os antagonismos sociais. Ao mesmo tempo, a autora assegura que “a crise
de 1930 criou as condições, no plano econômico e político, para a emergência de
aparelhos regulatórios específicos de sustentação dos setores agroexportadores,
assim como de outros setores econômicos afetados...”
83
Foi a partir da crise de 1929
e do golpe de 30 que o Estado brasileiro avançou no seu processo de constituição
de Estado Nacional e capitalista. Logo, o processo de industrialização que ocorreu
"via substituição de importação", constituiu-se como atividade fundamental do
modelo de desenvolvimento econômico que começava a se implantar.
A tese da substituição de importações como um processo dinâmico somente
chegou a ser elaborada alguns anos depois por TAVARES (1964), embora sua
versão estivesse baseada nos textos da CEPAL do início dos anos 50. Numa
primeira fase, a substituição de importações promoveu a expansão do mercado
interno, visto que a industrialização acontecia nos setores de bens de consumo
corrente, de alguns intermediários e de capital, com base numa tecnologia com
pouca densidade de capital. Numa segunda etapa, a industrialização brasileira
passou para a fase de substituição dos produtos de consumo duráveis,
intermediários e de capital. Para TAVARES
84
, é neste momento que começa a
83
DRAIBE, 1985, p.83.
84
TAVARES, Maria da Conceição. Da Substituição de Importações ao Capitalismo Financeiro.
Rio de Janeiro: Zahar editores, 1972.
67
evidenciar-se a insuficiência do mercado consumidor, já que os novos ramos
industriais implantavam -se com base em uma tecnologia mais avançada, implicando
numa menor absorção de mão-de-obra. Voltaremos a fazer referência sobre esta
temática no decorrer do trabalho.
Os analistas indicam que, nesse momento da história brasileira, ocorreu a
opção por um modelo específico de desenvolvimento econômico que, voltado para o
mercado interno, implicava no desenvolvimento da indústria nacional, aproveitando a
matéria-prima e mão-de-obra locais, e tendo por base a produção de bens de
consumo imediato. A partir dos anos 50, passou-se à produção de bens de consumo
duráveis, mantendo o centro das decisões econômicas sob o controle do Estado
Nacional.
A partir da análise da estrutura social gestada pela economia brasileira,
surgiram os setores fundamentais, já citados por DRAIBE (1985), quais sejam: a
burguesia mercantil -exportadora, a burguesia industrial e o proletariado. Cada um
desses setores constituiu uma base de interesses capaz de ordenar as questões do
desenvolvimento capitalista e, a partir daí, buscar propostas para as vias
desenvolvimentistas.
A articulação dos interesses dos setores sociais antes citados é que viabilizou
esse modelo. Esses setores estavam dispostos a empreender, sob a coordenação
do Estado, um projeto de desenvolvimento nacional com substantiva autonomia,
recebendo suportes do capital estrangeiro, esse porém mantido sob controle.
68
As condições para tal articulação de interesses estavam atreladas a alguns
fatores, tais como: alguns setores ligados ao modelo agro-exportador reconheciam a
necessidade de buscar fontes de investimentos para poder subsistir,
fundamentalmente, no Estado; setores da industria nacional, em função de sua
incapacidade de assumirem sozinhos o ônus financeiro e político, precisavam do
Estado para complementar os investimentos em algumas áreas de produção; os
setores médios (militares, burocracia estatal, setores da intelectualidade) viam nesse
projeto a possibilidade de executar seu ideal de desenvolvimento, pois identificavam-
se com o nacionalismo; e, por fim, o setores populares, que viam na legislação
recém-criada pelo Estado proteção e apoio às suas muitas reivindicações, confiando
nas medidas do Estado e, com isso, endossando sua política nacionalista.
2.1 O Estado Nacionalista
Partindo das considerações de JAGUARIBE (1969)
85
, que tiveram grande
importância na época na construção da argumentação nacionalista, os Estados
Contemporâneos, como organização política, são Estados Nacionais, ou seja, são
Nações
86
as comunidades que se encontram politicamente organizadas sob a forma
de Estados. Igualmente, considera o fato de que essas comunidades pretendem se
desenvolver através de um planejamento, se afirmando como tal.
85
JAGUARIBE, Hélio. Desenvolvimento Econômico e Desenvolvimento Político: Uma abordagem
teórica de um estudo de caso brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1969.
86
O conceito Nação, de acordo com BOBBIO, é concebido como um grupo de pessoas unidas por
laços naturais e se torna a base necessária para a organização do poder sob a forma do Estado
Nacional. As dificuldades se apresentam quando se busca definir a natureza destes laços, ou, pelo
menos, identificar critérios que permitam delimitar as diversas individualidades nacionais. Outra
análise que se discute, é que a Nação é a ideologia de um determinado tipo de Estado, visto que a
função da idéia de Nação é a de criar e manter o comportamento de fidelidade dos cidadãos em
relação ao Estado. Este conceito é objeto de freqüente debate na área da Ciência Política quanto na
História. BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola & PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política.
5.ed. Brasília: Imprensa Oficial UNB, 2000. (p.796).
69
É fundamental delinear, neste momento, os motivos que indicam a
importância da Nação como indispensável para a constituição de um projeto de
desenvolvimento. Segundo JAGUARIBE (1969), o primeiro motivo decorre da
natureza das nacionalidades. Este modelo é uma forma particular da sociedade,
caracterizada pela solidariedade objetiva, que o vincula a seus membros. Esse
apresenta características e interesses comuns, além de uma solidariedade subjetiva
que uniria os indivíduos ao mesmo projeto de Nação.
O segundo motivo da preservação dos Estados Nacionais como indispensável
ao desenvolvimento decorre do primeiro: O Nacionalismo dos outros Estados é
importante, uma vez que
“numa sociedade em que todas as comunidades politicamente
organizadas e dotadas de autodeterminação são Estados Nacionais;
as comunidades que não se organizarem como Estados Nacionais
não proporcionariam a seus membros proteção contra o
nacionalismo alheio e acabariam sofrendo, no seu próprio território e
no âmbito de sua jurisdição Política, a discriminação contra seus
membros e a favor dos membros de outras nacionalidades...”
87
Essa é uma definição histórica, calcada na linha do desenvolvimento
econômico.
A partir da década de 50 a corrente desenvolvimentista de maior influência foi
a nacionalista. A tese central do nacionalismo apoia-se na possibilidade de
desenvolvimento independente. No Brasil esse projeto estaria sintetizado na
industrialização comandada pela burguesia e capital nacional. Para melhor
fundamentar esta idéia citamos RODRIGUES, que destaca: no processo de
87
JAGUARIBE, 1969, p 49.
70
industrialização, as elites dirigentes do País seriam substituídas por uma liderança
burguesa nacional que atenderia aos interesses do povo brasileiro.”
88
Sabe-se que
os nacionalistas defendiam o desenvolvimento baseado na industrialização,
enfatizando a necessidade de criar um sistema econômico autônomo, independente
do sistema capitalista internacional.
O Estado devia ser o mediador e garantir, através de investimentos, a
industrialização. Segundo FAUSTO
89
.
“Isto significava dar ao Estado um papel importante como regulador
da economia e como investidor em áreas estratégicas petróleo,
siderurgia, transporte, comunicações. Sem recusar o capital
estrangeiro, os nacionalistas o encaravam com muitas restrições,
seja por razões econômicas, seja porque acreditavam que o
investimento de capital estrangeiro em áreas estratégicas poria em
risco a soberania nacional.”
O Nacionalismo, enquanto representação social fundada nas noções de povo
e de Nação, foi uma manifestação típica das camadas médias. Para SAES (1985),
no contexto do desenvolvimento capitalista brasileiro, eram as camadas médias que
se encarregariam de dar uma forma concreta ao Estado Nacional. Sendo assim:
“... a ideologia nacionalista, ao contrário do nacionalismo
espontâneo, não dispõe de uma infra-estrutura propriamente dita, se
isso equivale a motivações sócio-econômicas coletivas que
determinariam imperiosamente sua emergência. O movimento é do
alto para baixo, a ideologia procura plasmar suas raízes. Embora ela
não seja a invenção maquiavélica de alguns agitadores decididos a
88
RODRIGUES, Marly. A década de 50 populismos e metas desenvolvimentistas no Brasil. Rio
de Janeiro: Ática, 1992. (p.21).
89
FAUSTO, Boris. História Concisa do Brasil. São Paulo, Ed. da Universidade de São Paulo, 2001.
(p.225).
71
perturbar a paz da ‘família brasileira’, é preciso reconhecer que ela é
em grande parte artificial.”
90
A eficácia social do nacionalismo dependia da vontade política de afirmação
da Nação e da burguesia nacional para consoli-lo.
Entendendo o Estado Nacional como aquele que promove a industrialização,
como desenvolvimento pleno das características do povo/nação, a política do Estado
brasileiro era ambígua, pois, ao mesmo tempo que adotava políticas que
beneficiavam o setor industrial, o Estado continuava compromissado com os setores
tradicionais da economia, não se definindo, em nenhum momento, como um anti-
industrialista, afinal eram desses setores agroexportadores que adviriam os recursos
capazes de financiar o projeto desenvolvimentista. A política do Estado abarcava,
portanto, os interesses de ambos os setores como condição necessária para
formalizar um projeto industrializante imprescindível e para financiar a reestruturação
do próprio Estado.
Para MENDONÇA
91
, a visão da indústria como alternativa para o
desenvolvimento dentro do período de 1930/40, criou órgãos e instituições que
passaram a atender os diversos interesses sociais em jogo, metamorfoseados em
interesses nacionais.”
92
Esses órgãos, durante a ditadura do Estado Novo, 1937,
passam a neutralizar os regionalismos políticos, alterando práticas de concessões
de recursos e benefícios e facilitando a centralização do poder.
90
DEBRUN apud SAES, 1984, p.118.
91
MENDONÇA, Sônia Regina de. As Bases do Desenvolvimento Capitalista Dependente: da
industrialização restringida à internacionalização. In: LINHARES, Maria Yeda (Org.) História Geral do
Brasil. 5.ed. Rio de Janeiro: Campus, 1990.
92
Grifo da Autora. (MENDONÇA, 1990, p.269).
72
Faz-se necessário, diante do período histórico de que tratamos,
mencionarmos a importância do fenômeno do populismo presente em nossa análise.
As práticas Populistas
93
surgiram a partir da década de 30, fundamentalmente
quando o setor político passou a utilizar-se das classes populares para assegurar o
poder. Essa estratégia prevaleceu até o golpe militar de 1964. Para IANNI, o
populismo parecia corresponder a uma etapa específica na evolução das
contradições entre a sociedade nacional e a economia dependente. “A natureza do
governo populista está na busca de uma nova combinação entre as tendências do
sistema social e as determinações da dependência econômica.”
94
Para ele, o
populismo e o nacionalismo desenvolvimentista eram desdobramentos das políticas
inseridas na reformulação das instituições políticas, econômicas, educacionais, bem
como de políticas externas. Essas políticas respondiam aos interesses das
burguesias nacionais ascendentes, dos setores da classe média, do proletariado
nascente e de grupos que compõem as profissões liberais.
Na verdade, essas relações viabilizaram a articulação de interesses de
diferentes classes sociais com participação desigual no poder, nas quais o Estado
93
Trata-se de um tema polêmico, cuja controvérsia se concentra no caráter ideológico e de classes
do populismo. A definição de um conceito sobre o populismo é algo complexo. Para WEFFORT,
populismo se define como uma ideologia pequeno-burguesa capaz de impor-se à classe operária em
constituição (WEFFORT, Francisco. Política de Massas. In: IANNI, Octávio et al. Política e
Revolução Social no Brasil . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964.). Para IANNI, o Populismo
é um movimento político com forte apoio popular, com a participação de setores de classes não
operárias com importante influência no partido e que sustenta uma ideologia anti -status quo. Torcuato
S. DI TELLA apud IANNI, Octávio. Para uma política latino-americana . Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1969. (p. 86).
94
IANNI, Octavio. A formação do Estado Populista na América Latina. São Paulo: Ática, 1989. (p.9).
73
desempenhou um papel aparentemente supraclassista. SAES
95
, coloca a relação
entre as classes do setor agro-exportador e a burguesia industrial como “pacto
político”, pois não existia um setor exclusivo como representante da sociedade;
houve sim, a ausência de uma classe com um projeto capaz de se apresentar como
hegemônica.
Dessa forma, o Estado assim constituído desenvolveu uma política que
favoreceu o setor agro-exportador, mantendo às relações tradicionais de produção e
de acumulação, ao mesmo tempo que estimulava a burguesia industrial nascente,
bem como tratava de atender às reivindicações dos trabalhadores, melhorando suas
condições de trabalho e oferecendo-lhes a proteção social, conquistando desta
forma sua confiança para mantê-los sob controle.
2.2 A Industrialização e o Mercado Interno
No período de 1930/45 intensificou-se a participação do Estado na economia,
tanto no cenário nacional quanto no internacional, não apenas definindo suas
diretrizes, mas financiando o desenvolvimento de algumas áreas e, em outras,
assumindo total responsabilidade, dando origem, inclusive, a monopólios estatais.
Durante esse período, houve um crescimento industrial elevado.
No processo de formação, o Estado capitalista brasileiro movimentou-se com
um acentuado grau de centralização, o qual condensava o poder e reforçava o
aparelho econômico central. Para DRAIBE (1985), o período do Estado Novo
95
SAES, 1984, p.95.
74
pretendeu levar a cabo a industri alização pesada, sendo que o Estado brasileiro
deixava claro, independente do regime, que a industrialização no Brasil possuía
controles e formas de intervenção muito próprias.
Com a derrubada do Governo de Vargas em 1945, afirmou-se a
democratização política, assim como a implantação de uma política econômica
liberal, muito diferente daquela que se desenvolvera até então. Esta priorizava dois
aspectos: diminuir a participação do Estado na economia e proporcionar uma maior
participação de empresas estrangeiras na economia do Brasil.
A retirada de Vargas do poder central rompeu com a estrutura de um regime
autoritário que expressava os extremos de um processo de personificação do poder.
A partir daí, adotou-se um contorno mais liberal e menos intervencionista. Porém, as
forças internas que combateram a industrialização acelerada (a burguesia agro-
exportadora) e o intervencionismo econômico do Estado (a burguesia industrial),
passaram a defender uma participação moderada deste na economia.
Torna-se imprescindível reconhecer que o Estado Liberal foi um produto
histórico, que só adquiriu condições para desenvolver-se depois que as bases do
capitalismo estavam plenamente criadas e sob a forma concorrencial.
De um modo geral, contudo, o setor industrial foi o grande beneficiário das
transformações ocorridas naquele período, pois formou-se um mercado seguro
inclusive para os produtos de áreas mais complexas, como a indústria mecânica e a
metalúrgica, e não apenas para as áreas de bens de consumo final, sendo que
75
ambas passaram a produzir em larga escala. De acordo com COHN “em 1940, os
bens de produção representavam 38% do total produzido pela indústria. Até mesmo
as exportações de manufaturados se expandiram.”
96
A década de 40 refletiu, diante da crescente organização interna do setor
industrial, o nível de complexificação da sociedade brasileira. A organização do setor
empresarial, suas propostas e programas marcaram muito bem as suas relações
com o Estado. Segundo COHN (1974), os programas que se formulavam nos
congressos empresariais serviam, não apenas para as aspirações e potencialidades
deste setor, como também para deixar claro os problemas de uma industrialização
coerente que abarcasse os diversos setores produtivos através de um planejamento
conjunto com o Estado.
Segundo CARDOSO & FALETTO
97
, durante o período de formação do
mercado interno, na década de 50, o impulso para uma política de industrialização
foi sustentado, em certos casos, pelas relações estáveis entre o nacionalismo e
populismo. O período de diferenciação da economia capitalista, baseada na
formação do setor de bens de capital e no fortalecimento dos grupos empresariais,
foi marcado pela crise do populismo e da organização política representativa dos
grupos dominantes, nos meados da década de 60. Nesse período, percebe-se
também os primeiros esforços para ordenar o sistema político e social sobre bases
que vinculavam o setor produtivo orientado para o mercado interno e para as
economias externas que há muito tempo dominavam.
96
COHN, Gabriel. Problemas da Industrialização no Século XX. In: MOTTA, Carlos Guilherme. Brasil
em Perspectiva. 5.ed. São Paulo: Difel, 1974. (p.303).
97
CARDOSO & FALETTO, 1975.
76
A direção política do período de 46-50 estabeleceu-se sobre um novo
equilíbrio de forças, pois o processo de industrialização impôs condições mínimas de
permanência para a ação do Estado, juntamente com forças sociais identificadas
com esse fenômeno que expressavam, dentro e fora do aparelho do Estado, suas
necessidades.
De acordo com DRAIBE (1985), essa nova política não contemplou o projeto
de industrialização, ou seja, a implantação de indústrias como um bloco
complementar de investimentos nos setores de bens de produção e em infra-
estrutura. Para a autora, o Estado continuou intervencionista e regulador das ações
econômicas, aumentando as diferentes ações políticas e ações de regulamentação
ligadas ao comércio externo, bem como as relativas aos gastos públicos.
No Governo de Eurico Gaspar Dutra (1946/51), as empresas estatais como a
Companhia Siderúrgica Nacional e a Hidrelétrica de São Francisco, inauguradas
naquele período, receberam recursos suficientes apenas para seu término. “As
empresas públicas não constituíram um núcleo estratégico nos planos econômicos
governamentais. É verdade que não foram desmobilizadas e privatizadas, mas
também é certo que a política governamental não ultrapassou o nível mínimo de
seus requerimentos
98
.
No entendimento da autora, houve, no Brasil, no período de 46-50, um Estado
com características intervencionistas, destituído de um organismo mais geral de
98
DRAIBE, 1985, p.169.
77
planificação e de mecanismos de efetivo controle democrático, no qual o papel do
presidente para a continuidade desta política econômica foi crucial. Exemplo disso
foi a total ausência de sentido nos projetos de Reforma Bancária e Reforma Agrária,
as quais estavam, de certa forma, desvinculadas da coordenação da máquina
administrativa, sob o sentido e a direção econômica do governo centrado no
presidente. Aquelas medidas expressavam apenas respostas a questões pontuais a
demandas e pressões momentâneas.
É importante mencionar COHN (1974), que apresenta outro aspecto deste
período, na medida em que destaca a fase crítica das contas públicas e da dívida
externa resultantes do pós-guerra.
Já em 1947 verificava-se que as maciças importações, ao lado da rigidez dos
saldos no exterior, levavam a um rápido esgotamento dos recursos disponíveis, pois
esses estavam atrelados a áreas de importação de bens de consumo. Essa relação
era dificultada pelo setor empresarial que estava interessado apenas na expansão
de seus empreendimentos, formados por exportadores e importadores com uma
mentalidade de consumo, não preocupados em investir em setores produtivos.
Diante dessa situação e preocupado com a dívida externa, o governo passou
a tomar medidas que passaram a controlar as importações, permitindo apenas as de
produtos considerados essenciais, incluindo maquinarias, além de controlar muitos
produtos de bens de consumo. As licenças para a exportação e importação eram
78
obtidas através do órgão encarregado, a CEXIM (Carteira de Exportação e
Importação do Banco do Brasil).
De acordo com SAES (1985), a política econômica do período de 46-47
constituiu uma das manifestações mais típicas da versão periférica e agrária do
liberalismo econômico. Mas o desejo de combater a inflação e a crença na "vocação
agrária" do país combinaram-se numa política simultaneamente ortodoxa e liberal,
centrada no relaxam ento do controle sobre as divisas e na liberação total das
importações.
Ao término do Governo Dutra, restaram algumas incoerências diante da forma
democrática referente ao Estado, principalmente na montagem da política
econômica. O projeto de desenvolvimento econômico se definia lentamente,
limitando a modernização da infra-estrutura, bem como não contemplando o avanço
nas políticas de interesses sociais, pois priorizava os interesses dos grupos
econômicos dominantes nacionais e estrangeiros.
Segundo IANNI
99
, a transição do Governo Dutra para o segundo Governo de
Vargas correspondeu a uma reorientação das relações entre o Estado e a economia.
Com Vargas, o poder público passou a desempenhar funções mais ativas e
diferentes no sistema econômico financeiro do país.
Com a volta de Vargas em 1951, retomou-se a aspiração à industrialização,
como condição para o progresso social e também para a autonomia nacional. Esse
79
período marcava um novo projeto político-econômico de desenvolvimento do
capitalismo no Brasil e não uma retomada do processo político estadonovista, pois
agora as bases sociais eram bem distintas. A estrutura política das classes e grupos
sociais, bem como o funcionamento de partidos, haviam tornado mais complexo o
sistema político do país.
O governo adotou uma política de desenvolvimento econômico destinada,
principalmente, a garantir as condições de funcionamento e prosperidade do setor
privado nacional e estrangeiro.
A década de 50 marcou um ponto de inflexão no processo de industrialização
no Brasil. Para COHN,
“em primeiro lugar, é esse o período em que chegou ao seu limite o
processo de substituição de importações que definira o perfil do
crescimento industrial do país durante um quarto de século: atingiu-
se um grau de capacidade de absorção 'passiva' de um mercado
originalmente tornado disponível pela contração da oferta de
produtos importados.”
100
A continuidade da expansão industrial ficava na dependência de uma
dinamização do mercado interno dentro de um modelo autônomo e não mais referido
a problemas de relacionamento com o exterior.
A expansão industrial interna dependia de suas relações com os produtos
externos, ao mesmo tempo, aumentava o grau de organização e do complexo
99
IANNI, 1996.
100
COHN, 1974, p.307.
80
tecnológico, ocasionando o declínio da incorporação de mão-de-obra no setor. O
aumento da produtividade proporcionada pela modernização implicou em uma
diminuição da participação dos assalariados no produto.
Por outro lado, as transformações estruturais generalizadas em todos os
setores da sociedade levaram ao processo acelerado de urbanização: o índice do
crescimento da população urbana correspondia ao dobro da população nacional,
juntamente com o crescimento vegetativo que agora se acelerava devido aos baixos
índices de mortalidade. Paralelamente, acentuavam -se os movimentos migratórios
internos, agravando os desequilíbrios regionais.
A área mais industrializada do Brasil era o Centro-Sul, que se desenvolvia
mais rapidamente que o resto do país, muitas vezes, às custas das outras regiões.
De acordo com COHN (1974), a concentração industrial e os desníveis regionais
ocorreram devido à organização da rede bancária e à facilidade de mercado, de
mão-de-obra, de matérias-primas e de energia centralizadas nesta região.
O autor discute os efeitos agravantes dos desníveis regionais dentro do
processo de industrialização e como eles se efetuaram durante esse período. As
transformações estruturais da sociedade aceleravam -se, o processo de urbanização
incrementava-se com a mobilidade de mão-de-obra, acentuando os movimentos
migr atórios, e com isso, agravavam-se os desequilíbrios regionais. Uma vez que a
área mais industrializada era a Centro-Sul, essa crescia em detrimento das outras
regiões. A tendência à concentração regional de indústrias deveu-se ao fato de que
novas empresas instalaram-se onde havia facilidade de mercado, mão-de-obra,
81
matérias-primas e energia. Além de fatores como organização da rede bancária, e a
relação de preços entre produtos primários e os manufaturados.
Um dos efeitos agravantes sobre os desníveis regionais que o processo de
industrialização exerceu, foi o favorecimento por parte do Estado que priorizara o
centro em suas políticas de planejamento. Os marcos dessas medidas estão na
década de 50, em que ocorreu o aprofundamento da ação do Estado na área
econômica com o objetivo de incrementar o processo de industrialização.
Os desníveis regionais foram um dos principais problemas enfrentados pelos
estados membros em suas lutas para implementar projetos de desenvolvimento. É
o caso do Rio Grande do Sul, que enfocaremos oportunamente.
2.3 O Desenvolvimentismo no Brasil
A proposta desenvolvimentista foi a que mais influenciou a economia política
brasileira na década de 50, assim como todo o pensamento latino-americano.
Antes de falarmos sobre o desenvolvimentismo no Brasil, é necessário
fazermos algumas considerações a partir da análise de CARDOSO
101
sobre a
ideologia do desenvolvimento. A autora cita ALTHUSSER, destacando a função
ideológica de reprodução das relações de produção e indicando a ideologia como
101
CARDOSO, Mirian Limoeiro. Ideologia do Desenvolvimento Brasil: JK-JQ. 2.ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1978.
82
suporte destinado a assegurar a exploração econômica e a dominação de uma
classe sobre as outras.
De acordo com Mirian CARDOSO (1978), não seria correto pensar o
desenvolvimento apenas como um conjunto articulado de determinadas idéias, como
se elas nã o pudessem agrupar-se de maneira semelhante em outro tempo qualquer.
É preciso, nesse caso, que o mesmo seja visto como parte de uma ideologia mais
ampla, ou seja, do sistema capitalista nas regiões subdesenvolvidas num momento
específico deste crescimento quando o desenvolvimento espontâneo já não
parece mais possível.
A ideologia dominante contém os fundamentos e os objetivos da sua
manutenção e da expansão do seu domínio sem evidenciar a dominação
claramente. “As idéias que interferem na formação das ideologias, sendo parte do
sistema de idéias constitutivos da ideologia dominante, dão acesso à realidade que
existe para a classe dominante ao passo que contrariam ou barram o acesso à
realidade das classes dominadas.”
102
Como dominação, a ideologia é a forma de
conhecer bem, ou de desconhecer as classes.
Para investigar a sociedade brasileira na década de 50, pretende-se
compreender a articulação das forças sociais que a constituíram. Pressupondo que
as articulações sociais são determinadas, em última instância, pela estrutura
econômica juntamente com a produção ideológica, pode-se correr o risco de
subestimar a capacidade determinante da ideologia a ponto de explicar tudo pelo
83
econômico, ou de ser levado a não sair do domínio da própria ideologia, mantendo o
dualismo economia/ideologia e caindo no ideologismo.
Para CARDOSO, o desenvolvimento capitalista se faz
“por meio da produção econômica e da produção ideológica. Nesta, o
principal papel cabe ao poder do Estado, voltado primordialmente
para o crescimento e o fortalecimento da economia. A estrutura
ideológica capitalista é montada sob a dominância do seu campo
ideológico político, a partir dos aparelhos de Estado, e neste campo a
dominância cabe à ideologia econômica, com a formulação de
políticas destinadas a permitir e a garantir a expansão econômica,
com a qual a forma do Estado é condizente. Todos os demais
campos ideológicos, - o religioso, o filosófico, o artístico, o científico,
etc. se constroem sob esta dominância e são marcados por ela.
103
Para essa autora, o Estado não se apresenta neutro dentro da sociedade,
pois ele representa sempre o grupo que domina política e/ou economicamente.
A proposta Nacional-Desenvolvimentista e a política econômica brasileira
propunham-se a analisar os problemas dos países periféricos, em sua maioria agro-
-exportadores, e a possibilidade de transformá-los em nações desenvolvidas e com
maior autonomia. Para isso, seria preciso incrementar a participação do Estado na
economia por meio do planejamento de forma a facilitar a industrialização.
O Nacional-Desenvolvimentismo, elaborado ao longo dos anos 50, gestou-se
nos escritórios da Comissão Econômica para a América Latina - CEPAL. A teoria
cepalina formulou um plano de transformação econômica para a região com base
da intervenção do Estado em prol da industrialização e valorização das atividades
102
CARDOSO, 1978, p.84.
84
voltadas para o mercado interno. Essas medidas deveriam modificar a estrutura
econômica da periferia, proporcionando a elevação e a retenção da produtividade,
que resultaria em alterações na estrutura social e política a partir da extensão dos
benefícios do desenvolvimento para a maioria dos grupos sociais.
Na prática, a resposta revelou-se insatisfatória à medida que aumentava a
concentração de renda e as desigualdades sociais dessas populações ao longo dos
anos 50, apesar da industrialização em curso.
Nesse ínterim, ficava claro que a CEPAL deixara de analisar com maior
profundidade a natureza das relações de classes e o modo de produção capitalista
que ela própria receitara para a América Latina.
Ao propor o desenvolvimento capitalista, a CEPAL pressupunha que essa
forma de organização econômica traria benefícios sociais gerais, favorecendo as
mais diversas classes e grupos sociais que se constituíam a maioria da Nação.
No Brasil, esse período constituiu um dos momentos de maior legitimação do
Estado. MANTEGA o descreve como o de maior “legitimação da acumulação de
capital no país, com relativa liberdade política e sindical, sufrágio universal e
eleições diretas para os principais escalões do Executivo.”
104
Isso significava que os
interesses da burguesia estavam travestidos com muita eficácia, com os da própria
Nação e de todo o povo brasileiro, como já apontara a análise de CARDOSO (1978).
103
CARDOSO, 1978, p.88.
104
MANTEGA, 1987, p.63.
85
Torna-se dispensável reproduzir aqui o papel do Nacional-
Desenvolvimentismo na criação dessa situação extremamente favorável para a
acumulação de capital. Acontece que as promessas de melhoria de vida para o
grosso da população, a sua integração no progresso, a elevação dos salários, etc.
não se concretizaram. Ainda, diante da industrialização, as condições de vida da
maioria da população brasileira não sofreram melhoras significativas, conforme
propunha o Nacional-Desenvolvimentismo.
Enquanto proposta, o desenvolvimentismo foi difundido e aceito, porém, na
prática, tornou-se difícil de ser concretizado, tal como pretendia traduzir-se, de fato,
em planos de desenvolvimento econômico.
MANTEGA (1987) enfatiza e defende a tese de que a teoria cepalina e seus
desdobramentos no Nacional-Desenvolvimentismo nortearam os passos dos
governos populistas brasileiros, abrindo caminho, assim, para a implantação plena
do capitalismo monopolista
105
. Isso, evidentemente, pressupondo as contradições
entre os objetivos sociais explicitados pelo Nacional-Desenvolvimentismo e os meios
propostos e disponíveis para alcançá-los.
Durante o período em pauta, introduziu-se o planejamento econômico no
Brasil, com o Estado desempenhando o papel de coordenador econômico e mesmo
de empresário em vários setores da economia, exatamente como prescrevia a
105
Cabe explicitar que o capitalismo monopolista compreende a crescente introdução da automação
na produção, internacionalização e a centralização do capital em conglomerados multinacionais, na
busca de alta lucratividade como principal estímulo de acumulação. Nesta fase, o que o autor quer
evidenciar é que a proposta desenvolvimentista, na prática, estava favorecendo este tipo de capital.
(SANDRONI, 1994, p.42).
86
receita cepalina/isebiana. De acordo com MANTEGA (1987), o ISEB (Instituto
Superior de Estudos Brasileiros) consistia, sobretudo, em conceber o processo
histórico como uma sucessão de fases progressivas, nas quais a fase vigente
anunciaria a fase subseqüente, que constituiria uma etapa mais avançada da
história da comunidade. Dessa forma, imaginava possível antever a próxima fase
da sociedade brasileira, que deveria tomar a forma de capitalismo nacional. “Após
centenas de anos de ingerência externa e de jugo colonial, o país estaria em vias de
se libertar de um período histórico onde os interesses da nação eram submetidos
aos caprichos das metrópoles, resultando na obstrução do desenvolvimento.”
106
O grupo de pensadores do ISEB possuía diferenças teóricas e políticas frente
ao desenvolvimentismo, por isso muitos deles são tratados pelos analistas
separadamente. Apenas para referência lembramos: Cândido Mendes, Álvaro Vieira
Pinto, Ignácio Rangel, Nelson Werneck Sodré, Hélio Jaguaribe, Celso Furtado, entre
outros.
Na política estatal adotada nesse período, devemos ainda considerar as
forças dos preceitos estabelecidos pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos
(1951/53) e pelo Grupo Misto BNDE/CEPAL (1953/55), que forneceram os subsídios
para a elaboração dos planos nacionais de desenvolvimento desta época, a saber:
Plano de Reabilitação da Economia Nacional e Reaparelhamento Industrial (2.º
Governo de Vargas), Plano de Metas (Juscelino Kubistcheck) e o Plano Trienal de
Desenvolvimento (João Goulart).
106
MANTEGA, 1987, p.58.
87
2.3.1 Comissão Mista Brasil-Estados Unidos (1951/1953)
Tratava-se de um grupo de técnicos norte-americanos e brasileiros, que
deveria fazer um levantamento da situação econômica do Brasil voltada para o
desenvolvimento do país. Embora não pertencesse a vertente cepalina, suas
proposições aproximavam-se dessa idéias, especialmente no que se referia à
industrialização. Tinha assim, como principal objetivo a promoção da
industrialização, criando condições para o advento da acumulação de capital em
escala monopolista que, segundo a Comissão Mista, avançava por mais de duas
décadas e, indicava a falta de infra-estrutura como principal problema.
Os esforços deveriam ser concentrados no sentido de incrementar o
fornecimento de energia e na melhora do sistema de transporte. Segundo
MANTEGA, “a proliferação industrial e o forte surto de urbanização dessa época
(anos 50) haviam elevado as necessidades de eletrificação, acentuada pela
implantação de indústria de eletrodomésticos.”
107
Essas demandas representavam
as conseqüências do processo industrial que avançava já há algum tempo.
Além disso, os mercados regionais deveriam ser unificados num grande
mercado nacional através de um sistema de transportes mais eficiente do que
aquele existente no Brasil.
A Comissão Mista elaborou quarenta e um projetos de investimentos, cuja
prioridade, em termos de volume de recursos, recaía, em ordem crescente, no setor
107
MANTEGA, 1987, p.67.
88
de transporte ferroviário, energia elétrica, navegação costeira, portos e estradas de
rodagem. Faltavam, porém, recursos, pois a poupança interna era baixa e a solução,
segundo a Comissão Mista e a CEPAL, era recorrer à poupança externa.
Explicitava-se aqui um dos objetivos básicos da Comissão Mista, que
consistia em elaborar projetos concretos que pudessem atrair os capitais
estrangeiros, sugerindo que se tomassem medidas urgentes para estimular sua
entrada no país.
O governo reconhecia a necessidade de investimentos privados, mas
assegurava a importância dos empréstimos de fundos públicos, que eram
indispensáveis para a prévia eliminação dos pontos de estrangulamento em setores
básicos como o de transportes e energia. Durante a década de 50, o governo
promoveu medidas destinadas a incentivar o desenvolvimento econômico, com
ênfase na industrialização. Dentre as medidas, foi criado o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico (BNDE) em 1952.
2.3.2 Grupo Misto BNDE/CEPAL (1953/1955)
O Grupo Misto BNDE/CEPAL foi formado por técnicos do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e da CEPAL, sob a chefia de Celso Furtado, com o
propósito de complementar os trabalhos da Comissão Mista e elaborar um programa
de desenvolvimento para o período de 55/62.
89
A criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE)
representou um passo decisivo na elaboração de uma política de acumulação
industrial no Brasil. O Banco surgiu como a principal agência financiadora de
investimentos, destinado a viabilizar os projetos voltados para o desenvolvimento por
meio de créditos, avais de financiamentos externos e outros privilégios.
108
Num primeiro momento, os financiamentos do BNDE foram direcionados para
a infra-estrutura, parte mais problemática para a expansão industrial logo a seguir,
durante a segunda metade da década de 50, dedicou-se também a financiar
investimentos privados.
Os programas elaborados pelo Grupo BNDE/CEPAL começaram a se
desenvolver em setores voltados aos interesses do próprio Estado. Segundo o
relatório do Centro de Desenvolvimento Econômico, a partir do Grupo Misto
BNDE/CEPAL foram elaborados
“grandes projetos de infra-estrutura visando a fortalecer o
embasamento econômico do pólo industrial, obra de integração
Nacional que revolucionaram as possibilidades econômicas de
determinados Estados sem estar ditados por seus interesses;
projetos de porte e de interesse nacional que, a luz de vantagens
locacionais, podem ser disputados por alguns estados da
Federação.”
109
De acordo com IANNI (1996), o conjunto das atividades governamentais
durante esses anos revela que o poder público foi levado a criar algumas condições
108
MANTEGA, 1987.
109
CENTRO Desenvolvimento Econômico CEPAL/BNDE. O Pensamento Estadual no Brasil. 1965.
(p.9).
90
de infra-estrutura e instituições para a aceleração do desenvolvimento do país,
afastando a possibilidade de interpretações excessivamente tecnocráticas destas
medidas.
Foram criados novos órgão governamentais com a finalidade específica de
impulsionar a industrialização e a resolução de problemas econômico-financeiros e
administrativos.
O Plano Nacional de Reaparelhamento Econômico, por exemplo, anunciado
em 1951, foi apresentado como um plano qüinqüenal de investimentos em indústria
de base, transporte, energia, frigoríficos e modernização da agricultura. Para a
realização dos investimentos previstos nesse programa, o Congresso Nacional
autorizou, em 1952, a criação de um Fundo de Reaparelhamento Econômico que
seria administrado pelo BNDE. Esses planos correspondiam, sob o Governo de
Vargas, às sugestões e projetos prioritários elaborados pela Comissão Mista Brasil-
Estados Unidos.
Nas proposições de IANNI (1996), os setores políticos mais conservadores e
ligados ao capital estrangeiro pressionavam para que o governo adotasse políticas
de estabilidade financeira e social, enquanto que as oposições do Governo Vargas
falavam em “República Sindicalista”, para classificar negativamente o regime político
que se instalava, com base no trabalhismo getulista. Essa situação amedrontava a
classe média temerosa com a proletarização dos setores populares, a qual chamava
a atenção das Forças Armadas contra a crescente politização das massas e o risco
de subversão da ordem constitucional.
91
Diante disso, Vargas continuava a desenvolver sua política trabalhista e
conseguir o apoio das massas urbanas ao seu governo e a sua política econômica.
Essa orientação política desagradava aos setores conservadores nacionais e
desgostava aos grupos estrangeiros interessados na economia do país. Eles
compreendiam que o apoio das massas urbanas ao Governo Vargas estava
organizado principalmente na direção do nacionalismo econômico e da intervenção
estatal na economia.
Durante os anos 52/53 foram criados o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), a
Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPEVEA), o
Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) e, em 1954, a Petróleo
Brasileiro S.A. (Petrobrás). Nesse ano também foram propostos o Plano Nacional de
Eletrificação e a criação da Empresa Centrais Elétricas Brasileira S.A. (Eletrobrás).
Estava cada vez mais claro que o Estado passara a criar novas condições
para a expansão e diferenciação do sistema econômico brasileiro, e o poder público
tornara-se ainda mais indispensável e decisivo para a transformação da economia
do país.
As contradições e transformações políticas e econômicas que se
desenvolveram no interior da sociedade brasileira, repercutiram no modo de pensar
dos governantes, dos grupos de empresários, militares, intelectuais, políticos,
estudantes universitários e outros grupos sociais. Aí incluímos, como exemplo, as
repercussões da indústria, a expansão do setor terciário, o crescimento dos núcleos
92
urbanos e as migrações do campo para as cidades médias e grandes, que
acentuaram as transformações sociais, econômicas, políticas e culturais pelas quais
passava a sociedade brasileira naquele momento.
No âmbito dessas transformações, alguns segmentos sociais, adquiriram
maior nitidez principalmente o proletariado industrial, a classe média e a burguesia
industrial, seguidos pela burguesia comercial, os grupos financeiros, a burguesia
agrária, os assalariados agrícolas e a classe média rural.
De acordo com IANNI (1996), a pequena burguesia industrial, ligada à
produção de bens de consumo tradicionais, era totalmente dependente dos
mercados locais ou regionais. Esse grupo era nacionalista e apoiava uma espécie
de protecionismo que acentuava o intervencionismo estatal. O nacionalismo dessa
burguesia era muit o mais tático. Por outro lado, a grande burguesia industrial,
vinculada aos setores de serviços e a produção de bens de consumo duráveis,
estava aliada ao capitalismo internacional.
Nessa fase, o proletariado era de formação recente e apresentava uma
composição social e cultural heterogênea. Apesar das diferenças sociais, culturais e
econômicas, o proletariado estava sendo politizado e começava a representar uma
força importante no processo político nacional. Essa classe era favorável à
industrialização, assim como ao protecionismo econômico governamental e às
soluções nacionalistas.
93
Ainda segundo IANNI (1996), a classe média, por ser social e culturalmente
heterogênea, teria, em função disso, dificultadas as suas possibilidades de
politização. Mas, à medida que se politizava, inclinava-se a soluções de tipo
nacionalista e aceitava o intervencionismo desenvolvimentista do Estado. Sendo
que, por temer a proletarização, facilmente se deixava influenciar pelas campanhas
antigetulistas e antipopulistas que ressaltavam o caráter pacífico, cristão e ocidental
da civilização brasileira.
Foi dentro desse contexto histórico-social que se realizou, principalmente no
período de 1946/54, um profundo debate técnico e político sobre as condições e as
perspectivas do desenvolvimento econômico no Brasil. Nesse ambiente,
estruturaram -se perspectivas políticas para a organização e o desenvolvimento da
economia do país.
Uma dessas, conforme IANNI (1996), caracterizava-se como uma estratégia
política destinada a organizar e expandir a economia do país baseada na
associação com o capitalismo mundial. Para os adeptos dessa orientação, o Brasil
deveria modernizar sua organização econômica e desenvolver relações amplas com
as economias mais desenvolvidas.
Uma outra estratégia para a organização e desenvolvimento da economia
brasileira caracterizava-se como socialista. Os adeptos dessa corrente eram adeptos
da socialização dos meios de produção e defendiam a luta pela transição pacífica
para o socialismo.
94
Havia uma terceira corrente, a qual defendia a política de organização e
desenvolvimento da economia brasileira, através de estratégias destinadas a formar
o que poderia ser um capitalismo nacional no Brasil. Os partidários dessa estratégia
eram grupos de classe média, a pequena burguesia industrial, além de setores do
exército, proletariado e intelectuais. Não eram contrários à participação do capital
internacional, desde que houvesse um controle nacional.
As relações que se estabeleceram entre os interesses das empresas
multinacionais e os das empresas nacionais, levaram a alianças que se fortaleciam
cada vez mais, principalmente após a Segunda Guerra Mundial. Isso ocorreu não só
em relação ao capital privado internacional, mas também com os interesses dos
governos dos Estados estrangeiros, como por exemplo, nas relações e projetos da
Comissão Mista Brasil-Estados Unidos. Os interesses das empresas e do governo
dos Estados Unidos no Brasil tornavam -se cada vez mais presentes, dificultando, na
prática, a estratégia de incentivar a formação do capitalismo nacional e autônomo.
Esse processo de internacionalização da produção e acumulação do capital
forçou, de várias maneiras, as fronteiras ideológicas que existiam entre as forças
políticas e econômicas do capitalismo brasileiro, que se encontravam representadas
no Governo de Vargas. Sob esse contexto conflituoso, Vargas saiu do governo em
1954.
O Governo de Café Filho, Vice-Presidente de Vargas, que assumiu após seu
suicídio, caracterizou-se como governo de transição. Um dos seus objetivos era a
estabilização econômica. Para isso, nomeou como ministro da fazenda o economista
95
Eugênio Gudin, um liberal que seguiu uma política antiestatizante e favorável à
abertura do país ao capital estrangeiro, o que despertou sérias criticas por parte dos
nacionalistas.
De acordo com BIELSCHOWSKY (1996), o desenvolvimento econômico, para
Gudin, correspondia a um processo de elevação da produtividade. A diferença entre
a sua visão neoliberal e a da outra corrente, a nacional desenvolvimentista, residia
na concepção a respeito das formas de se promover esse processo. Para os
desenvolvimentistas era imprescindível uma decidida política de industrialização.
Gudin discordava dessa estratégia, pois para ele, o principal instrumento de
desenvolvimento era a livre movimentação das forças de mercado. Salientava que,
para garantir sua operação eficiente, era necessário preservar o equilíbrio monetário
e cambial e evitar a intervenção governamental no mercado de preços. Gudin
admitia a industrialização, desde que progressiva e a longo prazo.
A ênfase, em seus pronunciamentos a respeito do subdesenvolvimento
brasileiro, encontrava-se em idéias conjugadas e constantemente repetidas, como a
de que “o mais grave dos problemas econômicos nacionais é o da baixa
produtividade” e que “a indústria não é sinônimo de prosperidade, como agricultura
não é sinônimo de pobreza... indústria ou agricultura de boa produtividade é que são
sinônimos de prosperidade.”
110
O projeto de desenvolvimento econômico brasileiro de Gudin previa uma
industrialização leve para o futuro. Para o presente, a estratégia consistia numa série
110
GUDIN (1959) apud BIELSCHOWSKY, 1996, p.54.
96
de medidas, visando à elevação da produtividade da estrutura econômica existente:
assistência técnica e crédito seletivo à agricultura, elevação do padrão educacional,
e, sobretudo, políticas de estabilização monetária e de minimização da intervenção
do Estado nos mecanismos de mercado.
Gudin era representante do pensamento econômico conservador. Para ele, as
pressões sindicais e a intervenção do Estado representavam obstáculos à eficiência
garantida ao sistema econômico pelos mecanismos de mercado.
O Governo de Café Filho, criou a Instrução 113 da SUMOC
(Superintendência da Moeda e do Crédito), a qual assegurava uma série de
facilidades e isenções para o capital estrangeiro, o que fez a burguesia nacional se
submeter, sem luta, à associação com o capital internacional. Entretanto, somente
no Governo de Juscelino Kubitschek, houve a implantação efetiva desta Instrução.
Segundo PRADO JR
111
, por esta instrução, a Carteira de Comércio Exterior
do Banco do Brasil era autorizada a emitir licença de importação sem cobertura
cambial (isto é, sem licitação prévia nos leilões de câmbio), de equipamentos
industriais que correspondessem a inversões estrangeiras”
112
. Isso significava, para
os estrangeiros, o direito de trazerem seus equipamentos sem nenhuma despesas
cambial, enquanto a indústria nacional era obrigada a adquirir previamente, com
pagamento à vista, as licenças de importação exigidas para adquirirem no exterior
os equipamentos de que necessitavam, com pagamento à vista .
111
PRADO JR, 1998.
112
PRADO JR, 1998, p.314.
97
O Governo de Café Filho foi limitado em tempo e medidas e, portanto, não há
motivos para analisá-lo profundamente. A posição teórica de Gudin, destacada
acima, é fundamental para ilustrar uma das principais correntes do pensamento
econômico desenvolvimentista brasileiro durante a década de 50. Gudin, com o seu
“Neoliberalismo”, formou uma das correntes do pensamento econômico desta época.
2.3.3 O Governo Jucelino Kubistchek
O contexto histórico do período do Governo de Juscelino Kubitschek (JK)
representa o principal marco temporal de nosso trabalho.
Na campanha presidencial de 1955, Juscelino Kubitschek anunciava que em
seu governo faria cinqüenta anos em cinco. Naquele período, a sociedade brasileira
se encontrava frente aos modelos de desenvolvimento econômico propostos por
projetos políticos embasados em organismos externos como a CEPAL, descritos
anteriormente.
O modelo político econômico que já transcorria desde o Governo de Getúlio
Vargas, juntamente com o planejamento econômico proposto pela Comissão Mista
Brasil-Estados Unidos (51/53) e pelo Grupo Misto BNDE/CEPAL (53/55)
complementado com o Plano de Reabilitação da Economia Nacional e
Reaparelhamento Industrial (2.º Governo Vargas), serviu de suporte para o principal
plano do Governo JK: O PLANO DE METAS.
98
O Plano de Metas foi considerado a primeira experiência de planejamento
estatal efetivamente posta em prática no Brasil, constituindo-se no grande marco da
política de desenvolvimento traçada pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos e
pelo Grupo BNDE-CEPAL.
A sociedade brasileira, principalmente as elites intelectuais, políticas e
empresariais, pareciam perceber a mudança. Naquele momento a proposta
desenvolvimentista incorporava-se à retórica oficial do governo. Havia uma
articulação de forças sociais e políticas em torno dos modelos de desenvolvimento
econômico que se instalavam no Brasil: o modelo de desenvolvimento capitalista,
que associou-se a JK, e o modelo de desenvolvimento capitalista nacional, que
tentava sobreviver com o Vice-presidente João Goulart.
Segundo IANNI (1996), durante o Governo de JK aprofundaram-se as
relações entre o Estado e a economia. O poder público passara a atuar no sistema
econômico do país, utilizando-se de todos os recursos possíveis, o que ajudou a
acelerar o desenvolvimento, particularmente a industrialização, e a impulsionar o
setor privado nacional e estrangeiro. Naquele momento, a industrialização já não era
mais um processo induzido pelo estrangulamento do setor externo. A partir daquela
época a política econômica do governo passou a orientar-se pela determinação do
sistema econômico instalado no país.
Os investimentos governamentais, privados, nacionais e estrangeiros, foram
ditados pelas condições e tendências do sistema econômico preexistente. Tanto os
investimentos no setor industrial, como aqueles realizados na infra-estrutura,
99
formaram-se de acordo com as possibilidades abertas pela estrutura econômica
criada nos anos anteriores.
As metas do programa de Governo de JK abrangeram quatro setores
importantes da economia: energia, transportes, alimentação e indústria de base. Ao
todo, somavam-se trinta metas, incluindo-se o programa de formação de pessoal
técnico.
É inegável que a criação da indústria automobilística representou o
empreendimento que sobrepôs todos os outros, principalmente pelo significado
econômico e o sucesso político. Talvez se possa dizer que e a construção de
Brasília transformaram-se nos símbolos do Governo JK, ao mesmo tempo em que
estas realizações constituíram a prova concreta de que ele estava realizando a
tarefa de “cinqüenta anos em cinco”, conforme o seu lema.
De acordo com MANTEGA (1987), o Plano de Metas confirmava as áreas
prioritárias da economia brasileira a serem contempladas com o maior volume de
recursos do Estado que já haviam sido indicadas pela Comissão Mista Brasil-
-Estados Unidos. O Plano de Metas objetivava remanejar recursos do país de modo
a canalizá-los para o prosseguimento e ampliação da escala de acum ulação
industrial, por meio da atuação do Estado, prioritariamente em duas frentes:
“Na coordenação e integração dos vários setores da economia,
detectando as deficiências de infra-estrutura e as lacunas deixadas
pela chamada iniciativa privada, e procurando solucionar esses
problemas pela ampliação ou criação de empresas estatais; - no
incentivo direto à produção privada por meio da criação de linhas de
crédito, principalmente junto ao BNDE, com longos prazos de
100
restituição e juros negativos, pela concessão de avais estatais a
empréstimos contraídos no exterior, pela facilitação de importação de
máquinas, equipamentos e insumos básicos com a concessão de
taxas cambiais favorecidas, pela concessão de isenções fiscais e
tributárias ...”
113
Desta forma, o Estado não só assumia os setores menos lucrativos da
economia, que demandavam longo período de maturação, como também criava
organismos para estimular o setor privado, facilitando os investimentos e
desenvolvendo cada vez mais as atividades industriais do país.
O que podemos observar, dentro desse breve histórico sobre a política
econômica brasileira dos anos 50, é que o Nacional-Desenvolvimentismo foi um
instrumento importante como referencial teórico para as primeiras análises dos
problemas da economia política do Brasil, como também em sua aplicação prática,
uma vez que seus idealizadores estavam comprometidos com as transformações em
curso do país.
Desenvolveu-se uma veia crítica no país em relação a melhor compreensão
de seu passado, ligado às antigas relaç ões de produção do setor agroexportador,
deslocando a percepção analítica para a dinâmica interna, ligada ao capitalismo
industrial, o que resultou em um ideário social que era praticado e acreditado por
diversas classes e frações da sociedade brasileira.
Entretanto, não significa que o desenvolvimentismo tenha sido uma proposta
homogênea e sustentada por todas as classes sociais. Houve muita polêmica em
113
MANTEGA, 1987, p.73.
101
torno da questão da intervenção do Estado na economia, sobre a questão dos
empréstimos para setor privado e as facilidades concedidas ao capital multinacional,
através das medidas governamentais durante este período.
A maior frustração encontrou-se naqueles que possuíam grandes
expectativas de colher os frutos sociais prometidos pelo desenvolvimentismo. Como
sabemos, os desníveis sociais, ao invés de desaparecerem ou diminuírem,
ampliaram -se. Estava evidente que o principal efeito da industrialização capitalista
foi a valorização do capital e, não exatamente, o progresso e o bem -estar da
coletividade.
Se o objetivo primordial do desenvolvimentismo era a criação e socialização
da riqueza, escolheu o caminho errado. Teria escolhido o caminho certo caso
desejasse ampliar a acumulação ou o enriquecimento da burguesia, inclusive do
capital estrangeiro.
Pode-se concluir que o Nacional-Desenvolvimentismo não atendeu aos
interesses de grande parte da população brasileira, mas sustentou e beneficiou as
frações modernas da burguesia vinculada à acumulação monopolista. Para garantir
essa acumulação, foi necessária a intervenção do Estado na economia e a
elaboração de planos de desenvolvimento, como aqui foi demonstrado.
3 O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E OS PROJETOS DE
DESENVOLVIMENTO
Neste capítulo, analisamos as propostas políticas voltadas para o
desenvolvimento do estado do Rio Grande do Sul durante o período do Nacional-
Desenvolvimentismo brasileiro. Destacamos algumas políticas dos governos
estaduais, que pretendiam amenizar as prováveis desigualdades econômicas locais,
juntamente com a discussão sobre a condição periférica do estado dentro da
economia nacional.
Inicialmente, desenvolvemos uma análise sobre o conceito de região, que é
tratado por diferentes áreas do conhecimento, as quais o identificam conforme seus
objetivos.
A discussão apresentada pelos geógrafos criticava o destaque aos atributos
físicos e climáticos na divisão geopolítica, que os apresentava como muito
importantes. Já a geografia crítica
114
entende que os espaços jamais podem estar
114
Cabe destacar nesta polêmica as idéias de Milton Santos, que nos serviram como referência:
SANTOS, Milton. Natureza do Espaço. São Paulo: Ed. Hucitec, 1997.
103
dissociados do homem e, rejeita a caracterização dos territórios vistos apenas como
fronteiras político-administrativas, quer municipais, estaduais ou nacionais.
115
De acordo com REICHEL & GUTFREIND o espaço geográfico tornou-se
histórico, obra do trabalho e morada do homem. À superfície terrestre, incorporou-se
o capital, (...) O ponto referencial passou a ser a sociedade que é quem organiza tais
espaços (...) A região é trabalhada como uma totalidade.”
116
Foi através desse
enfoque que os teóricos da geografia crítica passaram a afirmar que o
desenvolvimento capitalista da economia mundial fez com que o globo terrestre
aparecesse segmentado em várias regiões interligadas.
Os critérios que delimitam o espaço regional partem do pressuposto que,
sendo a região uma construção de seus agentes, as suas fronteiras variam em
função das circunstâncias em que são delineadas. Segundo VISCARDI (1995), a
região “é formada por um conjunto de valores socialmente aceitos e partilhados
pelos seus agentes, que conferem a ela uma identidade própria, capaz de gerar
comportamentos mobilizados de defesa de interesses.”
117
Essa definição não se
encaixa propriamente dentro de uma divisão geopolítica, pois região pode ser um
espaço que se constitui homogeneamente dentro de uma área geopolítica.
Pelo viés da economia, podemos verificar aproximações no uso desse
conceito. ALONSO
118
classifica seu uso na economia em três classes. A primeira,
115
REICHEL, Heloisa J. & GUTFREIND, Ieda. As Raízes Históricas do Mercosul: a Região Platina
Colonial. São Leopoldo: Ed. UNISINOS, 1996.
116
REICHEL & GUTFREIND, 1996, p.12-13.
117
VISCARDI, Claudia Maria Ribeiro. Elites políticas em Minas Gerais na Primeira República.
Estudos Históricos, São Leopoldo, v.8, n.15, 1995. (p.40).
118
ALONSO, José Antônio Fialho. Evolução das desigualdades inter-regionais de renda interna
no Rio Grande do Sul (1939-70). 2.ed. Porto Alegre: FEE,1986. [Teses, n.9, dez.1986].
104
trata região como homogênea. Isso acontece quando existem unidades espaciais
separadas que podem ser reunidas devido as suas características comuns.
Geralmente, essas características se referem à estrutura de produção, padrões de
consumo, distribuição da força de trabalho, e fatores geográficos como sendo um
determinado recurso natural comum. Torna-se difícil delimitá-la geograficamente.
Para a segunda, a região seria polarizada e sua principal característica se
constituiria na heterogeneidade. Nessa, é dada ênfase na interdependência dos
vários componentes no interior da região e, não nas relações inter-regionais entre
regiões homogêneas. Nesse enfoque, os elem entos da região estão relacionados
uns com os outros, funcionalmente. As conexões que existem entre esses
componentes são visíveis nos fenômenos dos fluxos de população, bens e serviços,
comunicações e tráfego. Também privilegiam os pólos, os quais desviam a atenção
da delimitação das fronteiras regionais para o centro da região (ex. a cidade de São
Paulo).
Um terceiro conceito é o de região de planejamento. Essa, geralmente é
definida por um processo de tomada de decisão. Encontra-se nas mãos do governo,
pois exige a implementação de uma política regional e capacidade de atuação. Este
tipo de região precisa ser definida como jurisdição política de vários tamanhos e
níveis, flexíveis para poder funcionar.
Pode-se considerar significativa, também, a análise sobre o conceito de
região e economia desenvolvida por CANO
119
. O autor indica que já aconteceram
119
CANO, Wilson. Desequilíbrios Regionais e Concentração Industrial no Brasil: 1930-1970. São
Paulo: Global / Campinas: Ed. Da Universidade Estadual de Campinas, 1985.
105
muitos equívocos na utilização desse conceito. Raros seriam os estudos que
apresentaram uma visão integrada do fenômeno regional, inserido na dinâmica
social de toda a Nação.
O regionalismo brasileiro faz parte de nossa história política e social, desde os
movimentos revolucionários regionais do século XIX. Existe uma vasta produção
literária que trata desses movimentos, contudo, o problema ganhou maior destaque
no debate econômico, a partir da década de 50. Até então, a questão regional
estava mais centrada no âmbito do discurso político.
O autor nos remete à questão de âmbito internacional, quando a Escola
Cepalina chamava a atenção para as desigualdades existentes entre os países mais
ricos e os mais pobres, sintetizando assim, a forma como se processava a divisão
internacional do trabalho, através do relacionamento centro-periferia.
CANO destaca que, nesse período, ainda em nível internacional, surgia a
“Ciência Regional”
120
. Para ele, a denominação é imprópria, pois ela seria incapaz
de explicar a relação cepalina centro-periferia. Porém, o tema despertou interesse
entre os teóricos e, a partir daí, ampliaram-se as discussões sobre os problemas e
os desequilíbrios regionais, principalmente em relação à América Latina e ao Brasil.
Para o autor, prevaleceram os fundamentos da Escola Cepalina referentes a
concepção centro-periferia. Mas a aplicação dessa concepção servia à dimensão
120
De acordo com CANO (1985), a chamada “Ciência Regional” fora formulada por escolas
americanas e francesas, durante a década de 50 e se tornaram teoricamente inadequadas à
realidade latino-americana. [Grifo do autor].
106
regional, ou seja, quando aplicada ao relacionamento entre Estado-Nação
politicamente independentes, e não entre regiões de uma mesma Nação. A
diferenciação de fronteiras internas não pode ser formalizada por medidas de política
cambial, tarifárias e outras, a não ser aquelas relacionadas às chamadas políticas de
incentivos regionais. Essa concepção aproxima-se da terceira definição
apresentada por ALONSO (1986), a qual destaca a região de planejamento e a
implementação de políticas regionais.
Cabe ressaltar duas questões importantes. A primeira indica que a
concepção de centro-periferia serve apenas para Estados-Nações independentes,
de acordo com a doutrina da CEPAL. Porém, existem estudos referentes a estados-
membros de um país, que são denominados e tratados como região “periférica”.
Podemos identificar essa relação com o estudo sobre o Rio Grande do Sul,
desenvolvido por Geraldo MÜLLER
121
, que tem como eixo central a definição da
economia gaúcha como periférica.
A outra questão surge quando discorremos sobre regiões de um país a partir
de políticas de incentivo regional. Esse caso também ocorreu no estado do Rio
Grande do Sul, quando políticas regionais e instituições foram criadas para amenizar
suas diferenças em relação à Nação, que se assemelhava com os estudos
propostos pela Escola Cepalina no que se refere aos estados independentes.
121
MÜLLER, Geraldo. A Economia Política Gaúcha dos Anos 30 aos 60. In: DACANAL, José
Hildebrando & GONZAGA, Sérgius. RS: Economia e Política. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1979.
107
Nosso interesse em destacar a discussão sobre a condição periférica e as
políticas regionais, justifica-se por tratar-se de um dos temas centrais de nossa
análise.
Desse modo, acreditamos que a dimensão regional periférica do Brasil como
Estado-Nação é válida, porém, pretendemos demonstrar que os espaços regionais
periféricos internos também o são. Esses guardam diversidades culturais, estruturas
econômicas diferenciadas, além de dinâmicas políticas e sociais distintas e
historicamente determinadas.
Essas discussões foram articuladas por políticas desenvolvimentistas que
levaram em conta as diversidades regionais. Como exemplo, destacamos as
pressões decorrentes das grandes secas do Nordeste, que fizeram com que
medidas para seu combate fossem tomadas, como a criação da Comissão do Vale
do São Francisco (1948); a Companhia Hidrelétrica do São Francisco; a criação do
Banco do Nordeste do Brasil em 1952; e a criação da Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) em 1959.
Além disso, no início dos anos 50, começaram a ser divulgados dados que
permitiam um confronto entre os níveis e ritmos de crescimentos regionais.
122
Essas
informações evidenciaram os maciços investimentos em infra-estrutura e indústria
pesada que se concentravam no Centro-Sul, principalmente em São Paulo, o que
122
CANO, 1985.
108
levou ao desencadeamento de grandes pressões políticas, denunciando aquele
tratamento prioritário.
A criação de organismos institucionais de apoio regional não se limitou
apenas ao Nordeste. Em 1953, foi criada a Superintendência do Plano de
Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), transformada, em 1966, na SUDAM.
Em 1956, formou-se a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da
Região da Fronteira Sudoeste do País (SPVERFSP) transformada, em 1967, na
SUDESUL, que incluía o extremo sul do país. Em 1961, foi a vez da Comissão de
Desenvolvimento do Centro-Oeste (CODECO), transformada na SUDECO em 1967.
Nesse mesmo ano, foi criada também a SUFRAMA, instituindo a Zona Franca de
Manaus.
De acordo com CANO (1985), a questão regional do Nordeste, foi melhor
estudada por ser a mais dramática. Foi criado então, um Grupo de Trabalho para o
Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), do qual Celso Furtado fazia parte. O objetivo
era formular um diagnóstico articulado e uma visão integrada de Política de
Desenvolvimento Regional. Tentava-se, assim, implantar um projeto visando à
problemática da seca e à promoção do desenvolvimento na região. O Grupo chegou
a propor uma política de industrialização, em certa medida orientada pela
substituição regional de importações, visando a criar no Nordeste um centro
autônomo de expansão manufatureira”.
123
123
Presidência da República [Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste, 1967] apud
CANO, 1985.
109
Nesse momento, como decorrência da viabilização desses projetos de
desenvolvimento, abria-se um debate em que a principal questão não residia no
confronto entre propostas de implementação de setores modernos e de dinamização
de setores tradicionais, mas sim no predomínio de uma industrialização comandada
pelo capital estrangeiro ou pelo Estado. Polêmica desdobrada na incapacidade
estatal e/ou na insuficiência da poupança interna para financiar estas políticas.
Na concepção de CANO (1985) seria equivocada essa tentativa de
transplantar para o marco regional, através de dispositivos protecionistas ao
Nordeste, uma política cepalina de substituição de importações referida ao marco
nacional, tentando compensar com incentivos fiscais, a inexistência de fronteiras
políticas regionais.
Outro equívoco, para o autor, foi a falta de atenção do GTDN ao processo de
acumulação de capital, que estava sob o comando de São Paulo, articulando o
mercado nacional. Esse condicionava as economias inter-regionais, ajustando-as às
necessidades de acumulação de capital daquele centro dominante. Tornava-se
inviável, segundo CANO (1985), a criação de um “Centro Autônomo (Regional) de
Expansão Manufatureira”.
Esses fatores são importantes para o melhor entendimento das reivindicações
políticas e da criação de instituições regionais de desenvolvimento no sul do Brasil,
desencadeadas a partir da segunda metade da década de 50.
110
Nesse sentido, ainda dentro da perspectiva centro-periferia, SOUZA (1983)
em sua análise, situa a economia do Rio Grande do Sul como subordinada à
economia brasileira. A tese da subordinaç ão significa que a economia brasileira é
que “determina as posições da indústria, da agricultura, do comércio e das finanças
gaúchas nas suas estruturas produtiva e financeira, de tal modo que o processo de
acumulação impõe funções aos setores regionais no desenvolvimento do capital.”
124
Essa tese reafirma que o dinamismo da economia gaúcha (economia regional)
advém da economia brasileira (economia nacional), ou seja, o seu movimento é
impulsionado pela articulação de fora do Estado Regional e pelos eixos de
acumulação interna. Esses eixos acontecem com a reprodução de certas frações de
capital que ocorrem no espaço da economia regional.
Cabe destacar o conceito de Estado Regional apresentado por SOUZA:
“O Estado Regional corresponde ao setor público estadual, formado
por uma estrutura de poder político e econômico de dominação no
âmbito estadual, sem constituir um sistema submetido ao Estado.
Significa que o Estado Regional concentra uma certa unidade na
economia gaúcha, através de planos, políticas e reivindicações no
plano federal para ordenar as atividades econômicas; mas encontra-
se submetido ao Estado (nacional), que via instrumentos poderosos
institucionais e, sobretudo, de política econômica, impõe uma certa
dissolução da influência do Estado Regional.”
125
De maneira mais analítica, no estudo referente à economia gaúcha, CANO
(1985) caracteriza duas posturas: Um grupo tem por base a economia regional
enquanto espaço generalizado e com grande autonomia, em que as políticas
124
SOUZA, Enéas C. Da Dinâmica do capital à subordinação da economia Gaúcha. Porto Alegre:
FEE, 1983. [Ensaios da FEE, v.4, n.1, p.167-174]. (p.171).
125
SOUZA, Enéas C. Economia Gaúcha: objeto contraditório. Porto Alegre, 1984. [Ensaios FEE, v.4,
n.2, p.165-178]. (p.175).
111
estaduais são propostas com o objetivo de eliminar o atraso, as disparidades
regionais, o desemprego e o subemprego, tendo como meio para isso, a
industrialização. O outro grupo apresenta uma visão integrada do fenômeno
regional, inserindo-se na dinâmica social de toda a Nação. O conceito de economia
nacional perpassa as análises, sem deixar de investigar os fenômenos regionais,
mas subordinando-as a ele.
Exploramos, a seguir, essas diferenças entre a economia nacional e a
economia regional.
3.1 O Desenvolvimentismo no Sul
A economia brasileira, desde a década de 30, sustentava um aumento das
taxas de crescimento, advindas do setor industrial, interrompido brevemente durante
a Segunda Guerra Mundial.
Os três estados meridionais acompanharam esse processo em termos
quantitativos. Mas seu principal problema foi a inexpressiva capitalização e
industrialização no período anterior a 1930, contrariando o que ocorreu na região
Sudeste, particularmente São Paulo, como destaca CANO (1985).
Mesmo que possam ter acompanhado o crescimento da economia brasileira
no pós 30, os estados do Sul estavam inseridos nesse processo com um parque
industrial modesto e com relativo atraso tecnológico.
112
O crescimento desses estados não esconde a base inferior da qual suas
economias decolaram. Desses, apenas o Rio Grande do Sul apresentava um maior
poderio econômico e industrial. Foi também o estado que mais cedo sentiu a
penetração de idéias desenvolvimentistas.
A preocupação dos governadores do Rio Grande do Sul, em relação ao
desenvolvimento econômico, passou a acentuar-se no pós Segunda Guerra, como
veremos Com a posse de Walter Jobim (PSD), em 1947, verificou-se não só a
preocupação com o desenvolvimento, mas a existência de uma concepção de que o
governo deveria ser o responsável para que esse ocorresse. Em suas mensagens à
Assembléia, o governador deixava claro a necessidade do estado incrementar a
economia estadual. Com isso, passou a materializar seus planos, abrangendo as
áreas de eletricidade, rodovias, irrigação, saúde pública, educação e assistência
social. Assim, embora sem um plano uno e integrado, o governo levou adiante boa
parte de suas propostas, destacando-se a da eletrificação. O governo procurava
vencer os pontos de estrangulamento essenciais e as reivindicações das elites
gaúchas, as quais responsabilizavam o governo quanto à falta de infra-estrutura pelo
atraso econômico do estado.
Jobim atribuía, em seus discursos, parte dos problemas do estado ao
empirismo predominante nas atividades e na ausência de requisitos essenciais para
o desenvolvimento industrial, que exige energia, estradas, educação profissional e
elevado nível das populações, vale dizer, fomento do mercado interno”.
126
Nesse
126
Extraído da Mensagem de Jobim, de 1948. In: MÜLLER, 1979, p.373.
113
momento, o núcleo da preocupação do estado já era com a indústria, que deveria
ser impulsionada para fomentar o mercado e, dessa forma, levar o Rio Grande do
Sul rumo a estágios superiores de desenvolvimento do capitalismo.
O Governo de Ernesto Dorneles (1951/55 - PTB) representou a continuidade
do projeto. Em seus discursos à Assembléia Legislativa, reafirmava a preocupação
com as questões ligadas à infra-estrutura, como estradas, vias férreas e energia. E
nessa última incluía o carvão e a eletricidade. Nas suas propostas, não havia
objeções ao capital estrangeiro para levar adiante a modernização do Estado, como
indica seu discurso à Assembléia.
“No ano de 1952 contratou o governo com o ‘International Bank for
Reconstruction and Development’ um empréstimo de 25 milhões de
dólares, que vem sendo aplicado segundo sua destinação específica,
na execução das obras e serviços do Plano de Eletrificação. Essa
operação financeira contou com a garantia da União nos termos da
Lei.”
127
A posição do governo rio-grandense frente ao capital estrangeiro aproximava-
se da do Presidente Getúlio Vargas, ambos do PTB, que pode ser resumida da
seguinte forma: havia uma divisão internacional de trabalho que prejudicava os
países latino-americanos, exportadores de matérias-primas e importadores de
produtos industriais; consolidava-se uma relação de exploração internacional, e a
única saída para solucioná-la era o desenvolvimento econômico, ou seja, a
industrialização.
127
MENSAGEM de Ernesto Dornelles à Assembléia Legislativa. 21 de abril de 1954. AHRGS.
Documentação dos Governantes. Código. A .740, p.9. Porto Alegre.
114
Vargas defendia o desenvolvimento nacionalista, no que fora influenciado por
Furtado
128
e outros teóricos cepalinos. Inicialmente, nenhum deles se mostrava
favorável ao capital estrangeiro. Porém, passaram a entendê-lo como necessário
para romper com a própria ordem vigente. Aceitavam o capital estrangeiro, mas com
controle e desde que não ocupasse os setores de serviços público e mineração.
Ernesto Dorneles compartilhava da mesma posição. Em seus discursos,
enfatizava o caráter social que deveria assumir o desenvolvimentismo. Questões
polêmicas como reforma agrária eram evitadas, mas, problemas como o êxodo rural,
a inexistência de saneamento básico, o analfabetismo e a carê ncia nas áreas da
saúde e educação, vinham à tona.
Um marco do Governo de Ernesto Dornelles foi a elaboração do I Plano de
Obras e Equipamentos, o qual inaugurava, no estado, a idéia de integração do
planejamento em curto, médio e longo prazo, e uma determinação política de
coordenação e unificação dos diversos planos setoriais, o que contribuiria, em muito,
para o desenvolvimento do estado. Retomaremos o Plano de Obras adiante.
No Governo de Meneghetti (1955/59 PSD-UDN) a agricultura passou a ter
maior destaque do que nos governos anteriores. Ao mesmo tempo, o governo
enfatizava os limites de sua esfera de atuação. Em sua Mensagem à Assembléia,
destacava o seguinte:
128
Em sua obra “A Fantasia Organizada”, o autor coloca que em 1951, Getúlio Vargas o recebeu
juntamente com Prebisch e outros, para expor as funções da CEPAL e as propostas de
Industrialização para os países de América Latina. (FURTADO, Celso. A Fantasia Organizada. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1985. [Estudos Brasileiros, n.89]).
115
“A limitação de Competência dos Estados, na ordem econômica, é
fixada pela própria constituição. O campo de ação reservado às
unidades federadas, ficou demasiadamente restrito para que possam
elas influir, (...). Deste modo, as economias regionais se encontram
na estreita dependência da política adotada pelo Governo Federal, o
qual, em virtude da excessiva centralização da República, não deixa
às unidades federativas rendas suficientes nem autonomia, para que
possam elas se responsabilizar pelo bem ou pelo mal que se faça ao
organismo econômico do País. É de ressaltar, outrossim, que
somente à União é facultada a intervenção no domínio econômico,
seja por razões de ordem social, através da fixação de preços
máximos, seja por motivos de natureza econômica mediante
prescrição de preços mínimos. ”
129
As queixas do governador teriam prosseguimento no governo seguinte
(Leonel Brizola). Apesar de ressaltar o caráter agro-pastoril do estado, Meneghetti
não abandonou a proposta de desenvolvimento econômico industrial.
MÜLLER (1979) destacava que o executivo rio-grandense tinha consciência
do processo por que passava o país, como um todo, e do papel secundário do
estado sulino. Na mesma Mensagem de 1957, Meneghetti analisava a diferença do
desenvolvimento do centro em relação ao do sul, enfatizando a Instrução 113, da
SUMOC, a qual assegurava facilidades e isenções para o capital estrangeiro entrar
no país.
“É inegável que de algum tempo a esta parte, o afluxo de
empréstimos e investimentos estrangeiros para o Brasil vem
crescendo de modo excepcional (...) O exame, entretanto, da
participação do RGS na partilha desses investimentos está bem
longe de ser animador para o nosso Estado. Seja relativamente aos
empréstimos do exterior, seja quanto às importações de
equipamentos sem cobertura cambial, nos termos da Instrução 113,
da SUMOC, ao RGS vem cabendo parcela insignificante. Não
podendo ignorar que a nossa posição geográfica, a influência dos
nossos transportes e o fato de não podermos ainda oferecer às
indústrias fartas disponibilidades de energia elétrica, constituem
129
MENSAGEM à Assembléia Legislativa. Governador Ildo Meneghetti. 21 de abril de 1957.
AHRGS. Documentação do Governantes. Cód. A .7.42, p 06. Porto Alegre.
116
elementos negativos, que tudo devemos fazer para superar, a fim de
que o interesse pelo nosso Estado se acentue por parte dos
investidores estrangeiros (...).”
130
Dessa forma, o governo rio-grandense, consciente da situação
secundária/periférica em que se encontrava o estado e, ao mesmo tempo, da
atenção dedicada, por parte do governo central aos Estados da Região Sudeste,
propôs esforço para que algumas mudanças viessem a ocorrer, colocando entre
elas, a aceitação do capital estrangeiro para que o desenvolvimento acontecesse.
Isso estava claro na Mensagem à Assembléia de 1957.
“O Progresso Econômico do Estado exige, de parte do Poder
Público, a realização de um amplo programa de investimentos em
sintonia com o espírito empreendedor da nossa gente. (...) Sempre
declarei, desde o início do meu governo, que muito acreditava na
capacidade da iniciativa privada para ajudar o RS no seu esforço de
realização e prosperidade. Reafirmo hoje essa convicção perante os
ilustres legisladores do Estado, a cujo patriotismo e espírito público
não terá sido estranho o problema dos investimentos estrangeiros
em nosso Estado. Creio recomendável se tomar providências
adequadas em face da realidade que aí está: quando surgem no
Brasil, notadamente em São Paulo, no Distrito Federal, em Minas
Gerais e no Estado do Rio, empreendimentos da mais alta
significação no setor das indústrias básicas ou das indústrias de
equipamentos, verificamos que ao Rio Grande do Sul tem tocado
ínfima parcela.”
131
Nessa perspectiva, no Rio Grande do Sul, assim como nos demais estados
que se encontravam em posição secundária/periférica, a iniciativa privada e o capital
estrangeiro seriam apresentados como solução para o progresso dessas unidades
regionais.
130
MENSAGEM de Meneghetti (1957) apud MÜLLER, 1979, p.391.
131
MENSAGEM de Meneghetti à Assembléia Legislativa. 21 de abril de 1957. AHRGS. Documento
dos Governadores. Cód. A 7.42. p. 08 e 39. Porto Alegre.
117
O Governo de Leonel Brizola (1959/62 - PTB) trouxe à tona e, desta vez com
muita força, a questão das desigualdades regionais, do atraso econômico do estado
e do caráter marginal e subordinado que a economia rio-grandense passaria a ter a
partir do tipo de desenvolvimento imposto à Nação desde o Plano de Metas.
As denúncias não partiam apenas do estado do Rio Grande do Sul, mas
também do Paraná e Santa Catarina.
No Paraná, até os anos 50, a indústria possuía pouca expressão.
Configurava-se como uma economia nova, em que era necessário melhorar o setor
de infra-estrutura, como transportes, comunicações e energia. Em 1949/50, a
população ocupada na agropecuária correspondia a dois terços do total, ao passo
que na indústria apenas 13%.
132
A formação histórica do Paraná é vista como de escassa identidade política.
No entanto, passou a se modificar a partir dos anos 60, acompanhando seu
crescimento econômico. Historicamente, o Paraná sofreu influência tanto do Rio
Grande do Sul como de São Paulo, formando, dentro de si, regiões econômicas e
políticamente diversas.
Com a vitória de Ney Braga, no Paraná, em 1960, foram impulsionadas
propostas de desenvolvimento naquele estado. Além dos problemas estruturais, os
132
FONSECA, Pedro Cezar Dutra. BRDE: da Hegemonia à Crise do Desenvolvimento. Porto Alegre:
BRDE, 1988.
118
problemas conjunturais dificultavam a execução dessas políticas, devendo esses
entraves ser, necessariamente, superados.
O desenvolvimentismo do Paraná apelava para uma construção una e
integrada. Nesse aspecto, diferia do Rio Grande do Sul, onde a noção de economia
estadual era um recurso freqüentemente utilizado pelos governadores.
Quanto a Santa Catarina, pode-se afirmar que a influência das idéias
desenvolvimentistas precederam ao Paraná. A experiência inicial foi o Plano de
Obras e Equipamentos do Governo de Irineu Bornhausen, em 1955. O programa
seria financiado com recursos locais e foi encaminhado à Assembléia através de um
projeto de aumento de 20% nos Impostos de Vendas e Consignações, por um prazo
de 10 anos. Na aplicação das metas, previa-se 45% para as estradas, 35% para
energia elétrica, 10% para a agricultura e outros 10% para educação e saúde.
133
No Governo de Celso Ramos, de 1961/65, a questão do desenvolvimento
ganhou mais força. Nesse governo, a industrialização foi incentivada, pois Ramos
fora presidente da Federação das Indústrias de Santa Catarina. Além disso, o
governo criou um fundo para assegurar o alcance das metas, após terem detectado
os problemas e as necessidades do estado.
Evidencia-se, assim, a penetração das propostas desenvolvimentistas na
região Sul, desde meados da década de 50. Apesar das características específicas
da formação econômica e política de cada um desses três estados, alguns aspectos
definidores do caráter regional foram ressaltados na busca de maior pressão política
133
FONSECA, 1988, p.37.
119
e na defesa de políticas de investimentos na economia regional. Nesse sentido, os
governos locais assumiram a tarefa de formular metas e executar programas
visando ao desenvolvimento econômico.
3.2 O CODESUL e o BRDE
Quando afirmamos que, durante a década de 50, o desenvolvimentismo
penetrou com força nos três estados da região Sul, não poderíamos deixar de
mencionar que foi no Rio Grandedo Sul, ao final daquela década, que sua
repercussão foi mais marcante.
Com a posse de Leonel Brizola, em 31 de janeiro de 1959, surgiu uma
situação de clara convergência entre as propostas políticas e econômicas gaúchas
com as dos governadores dos outros estados - Ney Braga e Celso Ramos. Nesse
processo, formou-se uma equipe governamental com o propósito de buscar medidas
concretas para a industrialização da região, o que é nosso objeto de trabalho.
Destacamos o estilo próprio do governador rio-grandense, marcado pela
determinação política e radicalização verbal, em busca de questões tidas como
prioritárias em sua proposta de governo.
Em sua primeira Mensagem à Assembléia, em 21 de abril de 1960, o
Governador Brizola já enfatizava a necessidade de desenvolvimento e indicava a
situação dos setores sociais, carentes de recursos e à espera de políticas que
produzissem mudanças.
120
“O mandato em que fui investido pela livre decisão dos meus
conterrâneos afirmei que o meu grande compromisso era o de
empenhar com o maior vigor todas as minhas energias na urgente
tarefa de promover o Desenvolvimento Econômico e Social da
Comunidade Riograndense. Vinham de todos os cantos os clamores,
procediam de todos as fontes os protestos, emanavam de todas as
categorias os gestos de impaciência, surgiam de todas as camadas
sociais as manifestações de inquietação e, por vezes, até de revolta
contra o quadro geral com que defrontavam os empregados e os
assalariados, os agricultores e os criadores, os industriais e os
operários, os comerciantes e os comerciários.”
134
A denúncia do processo de marginalização do estado e do descaso por parte
do governo federal em relação à crise econômica da região Sul era divulgada, mais
uma vez, por Brizola na Mensagem de 1960.
“Estávamos sob um Governo Federal que se proclamava executor de
um grande plano de inversões e de uma política de desenvolvimento
anunciada como destinada a transformar a fisionomia do País. (...)
outras regiões brasileiras, igualmente como nós postas à margem do
processo de desenvolvimento implantado e incrementado em apenas
restrita área do território nacional e, o que mais grave, com
inequívoco favorecimento dos grandes grupos econômicos em sua
quase totalidade subsidiárias de grupos estrangeiros.”
135
Esperava-se que, durante o Governo de JK e o Plano de Metas, o processo
de desenvolvimento proposto para o país chegasse a todas regiões, ou, pelo
menos, em sua maior parte. Segundo FONSECA (1988), o Rio Grande de Sul, a
partir de diagnósticos realizados pelo governo, não poderia esperar nada do governo
federal.
Além das críticas ao Governo de JK e dos apelos emocionados do
governador, tem-se presente em seus discursos, conceitos como economia regional,
134
MENSAGEM à Assembléia Legislativa, do Governador Leonel Brizola. 21 de abril de 1960.
AHRGS. Documentação dos Governantes. Cód. A 7.44, p.04. Porto Alegre.
135
MENSAGEM à Assembléia Legislativa, 21 de abril de 1960. AHRGS. Documentação dos
Governantes. Cód. A7.44, p.06-07. Porto Alegre.
121
história regional, colonialismo e imperialismo. O que demonstra a penetraç ão do
discurso desenvolvimentista na esfera política estadual, com relação ao centro do
País, indicando sua situação periférica. Destacando ser fundamental a busca de
alternativas regionais que incrementassem as políticas orientadas para o nacional.
“País de dimensões continentais, sendo uma federação de
economias regionais, o Brasil não pode adotar e ter planos de
desenvolvimento como si (sic) fosse uma Nação da proporção da
Holanda ou da Bélgica. (...) Somos um império somos um
continente. (...) Quando o último governo da República acelerou o
processo de industrialização no centro-sul, não cuidou ele da
distribuição geográfica das unidades de vanguarda, da localização
eqüitativa do parque manufatureiro; nem mesmo de realizar uma
política de tratamento diferenciado de nossa economia que, é por
excelência, uma economia diferenciada. O resultado foi, como não
podia deixar de ser, a concentração industrial numa restrita e limitada
área do centro-sul, destacadamente São Paulo. E como não houve
tratamento diferenciado; e como não houve preocupação na
distribuição de localização geográfica da indústria, e como não se
considerou o país uma federação de economias regionais, o
resultado foi que se fez automaticamente a pré- localização da
indústria no centro-sul. Essa localização surgiu com a força de uma
pré-determinação. As conseqüências desta distorção econômica
começam agora a ameaçar a própria unidade política do país, porque
os Estados da Amazônia, do Meio-Norte ao Nordeste e do Nordeste
ao Centro-Oeste e do Centro- Oeste ao Extremo-Sul não desejam
continuar descendo na escala do empobrecimento reduzidos à
condição de colônias internas e territórios economicamente não-
autônomos. A reação contra esse aviltamento econômico dos
Estados já está provocando uma espécie de sindicalização das
regiões marginalizadas e das áreas espoliadas. Nosso dever,
Senhores Deputados, é evitar que esta reação, em si mesma justa
assuma feição de ato predatório contra a União. Como evita-lo?
Adotando e promovendo uma política assentada no planejamento
regional, a partir da consideração do Brasil como um continente
econômico. Dessa forma, impõe-se o zoneamento do país, sua
divisão, para efeitos de desenvolvimento harmônico, em regiões geo-
econômicas que seriam cinco: Amazônia e Norte, Nordeste, Centro-
Sul, Centro-oeste e Extremo Sul. Apoiada nesse pressuposto básico,
a União estabeleceria uma política diferenciada de favores e
estímulos adequados a cada região, ajustados às suas
conveniências e exigências.”
136
136
MENSAGEM à Assembléia Legislativa. 21 de abril de 1960. AHRGS. Documentação dos
Governantes. Porto Alegre.
122
O discurso de Brizola indica uma questão fundamental, o planejamento
regional, que deve ser entendido dentro de seu campo de aplicação, dos
condicionantes e do raio de manobra da política econômica dos Estados Regionais.
DALMAZO
137
destaca que o planejamento estadual centra-se nos seguintes
aspectos: ataque aos pontos de estrangulamento da industrialização (grandes
projetos de infra-estrutura); incentivos à produção de insumos básicos e
abastecimento urbano; criação de novas oportunidades de investimentos, como
obras de integração nacional e projetos de interesse nacional que tragam vantagens
locais. O planejamento estadual implementa programas e políticas de interesse de
acumulação. “Um plano estadual de desenvolvimento, que é também um plano
político, favorece mais a acumulação de capital, na medida em que implementa
programas e políticas articuladas com o movimento e a dinâmica da industrialização
nacional.”
138
Entretanto, os financiamentos e programas de desenvolvimento da União
estavam atrelados ao Banco do Brasil e BNDE como principais fontes financiadoras.
E as diretrizes dos técnicos e grupos políticos destes órgãos visavam a favorecer os
interesses da Nação, ou seja, a acumulação industrial no Centro-Sul. Dessa forma,
de acordo com FONSECA (1988), existia uma forte restrição ao crédito por parte
dos bancos privados, Banco do Brasil e BNDE, para os projetos de interesses dos
estados regionais, o que agravava-se em função da crise econômica e dos
problemas conjunturais, como a inflação e a alta dos juros que marcavam o final do
anos 50 e o início dos 60. No quadro abaixo, verificamos a diferença entre os
137
DALMAZO, Renato Antônio. Planejamento Estadual e Acumulação no Rio Grande do Sul
(1940-74). Porto Alegre: FEE, n.16, dez. 1992.
138
DALMAZO, 1992, p.25.
123
recursos destinados para o estado do Rio Grande do Sul, e os destinados a São
Paulo, nesse período, conforme uma das fontes financiadora.
139
Quadro n.º 1
Fonte Fianciadora BNDE
Ano Valor (Cr$ Mil) Estado N.º de Projetos
1956
224.000,00 RS 1
1.668.652,00
SP 6
1957
51.500,00 RS 2
1.236.971,00
SP 7
1958
2.056.040,00
RS 4
1.958.726,00
SP 15
1959
140.080,00 RS 1
5.304.714,00
SP 14
1960
0,00 RS 0
597.500,00 SP 6
Fonte: Relatórios das Atividades do BNDE (1960)
As fontes de financiamento tornavam-se escassas, gerando, no interior da
equipe governamental, a idéia de que não se poderia esperar por esses órgãos de
fomento para impulsionar o desenvolvimento industrial do Extremo Sul. Os
governadores começaram a defender a idéia de que a saída seria criar instituições
locais voltadas para o financiamento. A idéia de criar bancos regionais evoluiu para
a criação de um banco para os três estados.
139
Os projetos financiados, foram elaborados pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos.
124
A Mensagem de Brizola à Assembléia reflete as teses difundidas na época.
“(...) lançamos em Santa Catarina, com apoio irrestrito e o aplauso
incondicional e veemente de S. Excia. O Sr Presidente Jânio
Quadros, o projeto de criação de um Conselho Regional de
Desenvolvimento e Coordenação do Extremo Sul e de um Banco
Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul, ambos definidos
como instrumentos de planificação regional a execução de
programas e projetos tendentes a promover a expansão econômica
da nossa região. É este um passo decisivo na luta pela implantação
de uma nova Política Geral de Desenvolvimento, política que,
partindo do Regional, chegue ao Nacional (...)”
140
Estava lançado o plano para a criação do CODESUL e do BRDE. Ao contrário
de JK, que não havia dado importância a tal proposta em 1960, o Presidente Jânio
Quadros avalizava agora sua implantação.
A partir da aceitação pelo Presidente, concentraram-se os esforços para a
elaboração dos projetos e estudos em um prazo mínimo. A 15 de julho de 1961 os
governadores assinaram convênio criando o Conselho de Desenvolvimento do
Extremo Sul (CODESUL) e o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul
(BRDE). Os governadores dos três estados assinaram os Atos Constitutivos do
CODESUL e BRDE. O documento retomava a questão das disparidades regionais e
ponderava que a eliminação desses desequilíbrios constituía-se numa tarefa
desafiante para os homens públicos. O documento pretendia ser técnico,
enfatizando o caráter continental do país, tido como empecilho ao planejamentos
sugerindo um programa nacional flexível que corresse paralelamente aos programas
regionais.
140
MENSAGEM à Assembléia do Governador Leonel Brizola, 21 de abril de 1960. AHRGS.
Documentação dos Governantes. Porto Alegre. (p.10). [Grifo no original].
125
Estabeleceu-se como tarefa do BRDE financiar a industrialização,
entendendo-se que essa não poderia restringir-se ao beneficiamento de matérias-
primas locais.
O convênio assinado pelos governadores estabelecia a competência dos
órgãos recém-criados. Ao CODESUL caberia: a) efetuar o levantamento sócio-
econômico da região, estudar seus problemas, equacionar e propor soluções,
visando, sob a égide da justiça e paz social, aos superiores interesses do país e da
região; b) formular diretrizes da política de desenvolvimento regional, em
consonância com os planos nacionais e em coordenação com os organismos
estaduais de planejamento; e c) zelar, sugerindo medidas adequadas, para que o
intercâmbio econômico, inter-regional e com o exterior, viesse a permitir a justa
retenção e fixação na região dos rendimentos do trabalho por parte das populações
locais, como fato positivo para o desenvolvimento regional.
Estabeleciam-se como áreas preferenciais para o BRDE atender com
financiamento: a) investimentos de infra-estrutura de interesse regional; b) projetos
especiais agropecuários, de colonização e de reforma agrária; c) a exploração de
recursos minerais; d) o desenvolvimento industrial, investimentos na pequena e
média empresas, a expansão e re-equipamento das indústrias existentes, a
instalação de novas indústrias, notadamente as que utilizassem a matéria-prima
local, e outras de caráter pioneiro; e) c construção e ampliação de armazéns, silos,
126
matadouros e frigoríficos; f) constituição e a ampliação de empresas para exploração
de serviços de utilidade pública; e g) serviços de interesse regional.
141
A instalação do BRDE aconteceu em dezembro de 1961, porém o início de
suas operações ocorreu no último trimestre de 1961, pois sua implantação fora em
julho deste mesmo ano. Seu funcionamento foi autorizado pelo Presidente da
República, João Goulart, como sendo uma autarquia interestadual de natureza
econômica, com sede em Porto Alegre e agências em Curitiba e Florianópolis.”
142
A formação da equipe de técnicos foi indicada pelos governadores, ficando
na Direção do Banco Pery Pinto Diniz da Silva, rio-grandense, escolhido pelos três
governadores, que trabalhava na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e
marcara o entrelaçamento entre Universidade e Governo.
O problema maior do banco foi a captação de recursos. Primeiramente foram
expostas à FIERGS as idéias norteadoras do projeto, vistas por alguns empresários
com entusiasmo, enquanto que por outros com descrédito. Outro problema foi a
oposição política, tanto estadual como nacional, em relação ao projeto.
Decidiu-se, durante a fase de implantação do banco (julho de 1961), que o
capital seria integralizado inicialmente pelos estados, em quantia igual de
Cr$120.000,00 (cento e vinte mil cruzeiros), o que era insuficiente. Nesse momento,
o Presidente Jânio Quadros decidira, junto ao Ministério de Fazenda, reservar 1% da
141
BRDE. Convênio dos Governos do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Porto Alegre:
FEE, S/D.
142
BRASIL. Decreto n. 51.617, de 5 de dezembro de 1962.
127
receita tributária anual de cada um dos estados da região Sul, para a constituição do
capital do BRDE, e a União contribuiria com 10% do produtos do Acordo do Trigo.
Constava a ressalva de que tais recursos só poderiam ser aplicados nos estados
originários dos mesmos.
143
O relatório do banco, do ano de 1962, indicava que, das contribuições
regularmente realizadas, apenas o estado do Rio Grande do Sul cumpriu com os
depósitos de 1% de sua receita.
De acordo com FONSECA (1988), a outra fonte de recursos provinha dos
Acordos do Trigo entre Brasil e Estados Unidos. Devido à superprodução de trigo
norte-americano, o governo daquele país comprometeu-se em vender o cereal ao
Brasil em condições vantajosas. O primeiro Acordo aconteceu em 1955, e previa a
compra do trigo dos Estados Unidos, no valor de US$ 41.200.000,00 (quarenta e um
milhões e duzentos mil dólares), dos quais 76% foram emprestados ao governo
brasileiro. Os acordos consistiam em uma espécie de empréstimo (e não doação),
com o qual o governo brasileiro deveria financiar projetos de desenvolvimento. A
criação de uma instituição, a exemplo do BRDE, era fundamental para que a região
Sul pudesse dispor de parte desses recursos. Os Estados Unidos da América
deveriam vinculá-los a projetos específicos, além de garantir que as verbas não
fossem desviadas para outros fins.
A partir de 1960, com o 3º. Acordo do Trigo, previa-se a aquisição de 3.740
mil toneladas de trigo por ano. As autoridades dos estados do Sul argumentavam
que a região Sul deveria ser recompensada, pois era a maior produtora de trigo do
143
FONSECA, 1988, p.55.
128
país, e seu produto seria barateado devido à concorrência. A expectativa de vultosa
quantia gerava pressões de todos os lados. Pressões políticas advindas dos
estados associados e de outros como, Minas Gerais e São Paulo. Os estados do Sul
criaram uma expectativa de que ganhariam grande parte das verbas.
Porém, os recursos provenientes dos Acordos do Trigo só chegariam ao
BRDE após 1964. Somente a partir deste ano BRDE passou a desempenhar as
funções de agente financeiro, beneficiando-se do repasse dos Acordos do Trigo.
3.3 Comissão Interestadual da Bacia Paraná-Uruguai
Assim como as demais comissões criadas na década de 50, a Comissão
Interestadual da Bacia do Paraná-Uruguai deveria diagnosticar, planejar e executar
projetos de interesses econômicos para a região (Centro-Sul) de abrangência.
Criada em 1951, como consta na Mensagem do Governador Meneghetti,
objetivava aglutinar esforços em torno dos sete Estados participantes, para que o
desenvolvimento econômico ocorresse em áreas ainda inexploradas.
“No ano de 1951, reuniram-se em conferência, na Capital do Estado
bandeirante, governadores e representantes de diversos Estados,
para o debate de relevantes problemas econômicos de interesse
comum das regiões compreendidas geograficamente nas Bacias dos
Rios Paraná e Uruguai. Desse conclave e de reuniões posteriores,
em que o Rio Grande do Sul se fez representar, nasceu a Comissão
Interestadual da Bacia Paraná-Uruguai, destinada ao estudo,
planejamento e execução de obras e realizações de fundamental
interesse econômico para as regiões acima referidas, da mesma
participando mediante convênio celebrado, os Estados de SP, PR,
SC, RS, MG, GO e MT. A esse órgão foi dada estrutura jurídica por
lei do Estado de São Paulo, em cujos dispositivos se dispunha sobre
129
a representação e contribuição financeira dos Estados
participantes."
144
A idéia geradora da Comissão não alcançou os objetivos esperados. No ano
de 1957, o Governo do estado do Rio Grande do Sul levou à Assembléia um projeto
dispondo sobre a representação do mesmo na Comissão e sua participação nas
atividades. Propunha que o estado passasse a integrar-se aos estudos sobre o rio
Paraná e sobre as possibilidades de usinas e barragens no mesmo, bem como em
outras bacias, como as do Jacuí-Vacacaí, mediante convênios com o Departamento
Estadual de Portos, Rios e Canais (DEPREC).
Nesse aspecto, a Comissão Interestadual muito pouco contribuiu para os
Estados do Sul, especialmente o Rio Grande do Sul. Entretanto, vale destacar, o
principal diagnóstico realizado pela referida Comissão, apresentado no documento
Necessidades e Possibilidades dos Estados do Rio Grande Sul, Santa Catarina e
Paraná”, publicado em São Paulo no ano de 1958. Não tratamos neste trabalho das
necessidades do estado apresentadas pela Comissão, focalizamos, sim, algumas
das possibilidades levantadas para seu desenvolvimento.
De acordo com os técnicos da Comissão,
“as ‘Potencialidades’ são recursos de qualquer natureza, de que
dispõe a unidade territorial: solo, subsolo, energia, mão-de-
obra,equipamentos disponíveis. E as Possibilidades são as
potencialidades cuja valorização ou utilização correspondem, às
conjunturas atuais dos prazos curtos, médio e longos. As
potencialidades são um dado bruto da capacidade de produção;
incluem condições psicológicas, sociológicas e políticas, como
144
MENSAGEM do Governador Ildo Meneghetti à Assembléia Legislativa . 21 de abril de 1958.
AHRGS. Documentação dos Governantes. Porto Alegre.
130
disponibilidades imediatas e futuras em pessoal competente e em
meios de financiamento.”
145
A partir do diagnóstico apresentado pela Comissão, destacamos algumas da
possibilidades referentes a: 1) A Melhoria da Infra-estrutura e Comunicações; 2)
Produção de Energia; 3) A Industrialização e a Produção Industrial; e 4) O Mercado
de Crédito.
3.3.1 A Melhoria da Infra-estrutura e Comunicações
Um dos aspectos destacados corresponde a infra-estrutura das vias de
comunicação: ferrovias e rodovias. As análises, realizadas em 1956, apresentaram
as deficiências dessas redes, deixando claro que competia ao governo central e aos
governos estaduais realizarem trabalhos de melhoramentos, correções e construção,
tanto das estradas de ferro, quanto das rodovias.
Os planos ferroviários apresentados para o Rio Grande do Sul
corresponderam a um grande projeto que tratava de uma integração entre a Central
do Brasil com Porto Alegre. Utilizariam, a partir do traçado da Sorocabana, via
Ponta Grossa e o cruzamento de Engenheiro Blei, em direção a Lajes, Bento
Gonçalves e Porto Alegre. Esse seria um dos projetos ferroviários que
beneficiariam os estados de abrangência da Comissão Interestadual.
145
COMISSÃO Interestadual da Bacia do Paraná-Uruguai. Problemas de Desenvolvimento.
Necessidades e possibilidades dos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.
v.II, São Paulo, 1958. p.381.
131
Já os projetos rodoviários envolviam grandes estradas que ligavam o Sul ao
Norte. O Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (DAER), criado em
1937, tinha as atribuições de desenvolver as atividades relacionadas com estudo,
planejamento, construção, conservação e melhorias das rodovias, além de fiscalizar
o uso das estradas. O papel do DAER teve influência na criação do Departamento
Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), fundado em 1945, passando, desde
então, a articular-se intensamente para obter recursos federais.
146
O Rio Grande do Sul estava preocupado em completar as ligações, ainda
precárias em todas as zonas de circuito, que ligavam a capital com o interior do
estado e em multiplicar as pontes rodoviárias, que eram indispensáveis à integração
viária. Havia indicação de que conjunto de projetos federais e estaduais responderia
às necessidades do aumento da produção de alimentos, bem como do aumento da
população, que demandaria maior oferta e valorização dos meios de transportes.
Em relação aos portos, o Rio Grande do Sul apresentava apenas três portos
de cabotagem nacional: Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande. Somente o de Porto
Alegre aparecia como porto de função internacional.
As análises sobre o tráfego de exportação para os estados do Brasil
demonstravam, de acordo com o Departamento Estadual de Estatística, que o
Distrito Federal e São Paulo absorviam a maior parte dos carregamentos. Em 1954,
do total de 536.525 toneladas embarcadas para o Brasil, em Porto Alegre, 223.221
146
DALMAZO, 1992.
132
foram destinadas ao Distrito Federal e 146.428 ao estado de São Paulo. Do porto de
Rio Grande, 119.335 toneladas destinavam -se ao Rio de Janeiro, 99.548 para
Santos; de Pelotas, os volumes correspondentes eram de 36.045 e 30.539
toneladas.
147
Enfatizava-se, na argumentação destes projetos, que a partir destes dados, a
economia rio-grandense integrava-se à economia nacional. Os produtos exportados
pelos portos do Rio Grande do Sul exprimiam a necessidade que o Brasil tinha dos
mesmos para a sua alimentação, pois basicamente exportava produtos alimentícios.
À medida que a população brasileira e a produção agrícola aumentavam, crescia o
tráfego portuário. A importância do Estado do Rio Grande do Sul dentro da
economia nacional baseava-se no fornecimento de produtos alimentícios para outras
regiões do país, reforçando, assim, a tese de MÜLLER (1979) e outros, que
referiam -se ao estado como o “celeiro do Brasil”, e justificando a principal questão
discutida pelos governos do Estado, referentes a sua posição periférica e a busca do
desenvolvimento industrial.
3.3.2 Produção de Energia
Na questão que envolvia a produção de energia, segundo o relatório da
Comissão, o Brasil apresentava dificuldades graves. Sendo que, a partir de 1947,
iniciara-se no país uma fase de transformação, como indica o Relatório do Grupo
147
Dados da Comissão Interestadual da Bacia do Paraná-Uruguai, 1958. p. 400
133
Misto BNDE-CEPAL, em prol das políticas desenvolvimentistas que demandavam
uma completa dinamização da infra-estrutura.
Dentro dos programas de eletrificação do Rio Grande do Sul, tornou-se
imprescindível a participação do poder público, dado que, até então, parte da
produção da energia elétrica encontrava-se com a iniciativa privada. Destaca-se que
o desenvolvimento da energia elétrica foi insuficiente e esse atraso repercutiu no
desenvolvimento econômico da região. A falta de energia passava a ser um dos
principais problemas das cidades e especialmente para o desenvolvimento do setor
industrial.
A criação da Comissão Estadual de Energia Elétrica, em 1943, tinha por
finalidade prever e sistematizar o aproveitamento dos potenciais hidrá ulicos em
conexão com as reservas carboníferas.
A potência instalada pela CEEE no estado, até o final de 1955 correspondia a
um total de 24.800 kw nas usinas hidroelétricas e um total de 87.094 kw nas usinas
termoelétricas, totalizando 111.894 kw produzidos pelo estado. Vale destacar que a
encampação, pela Companhia Riograndense de Energia Elétrica, da multinacional
Bond and Share, pelo Governo Brizola, em 1959, transformada em uma autarquia
estadual, a CEEE, mobilizou um grande vulto de capitais, e passou a ter maior
autonomia administrativa e financeira.
134
O panorama da produção de energia elétrica demonstrava que os Estados do
Sul apresentavam uma carência de energia, porém suas possibilidades hidráulicas
eram enormes e deveriam ser a base dos programas de eletrificação.
3.3.3 A Industrialização e a Produção Industrial
Durante o período diagnosticado pela Comissão, o Rio Grande do Sul
apresentava o melhor índice de produtividade industrial dos três estados. Segundo
ela, existiam alguns desníveis explicados pela falta de energia elétrica e pela
distância dos mercados mais importantes do país, tais como São Paulo, Distrito
Federal e Rio de Janeiro. Deve-se levar em conta o fato de que o Rio Grande do Sul,
bem como Santa Catarina, não tinham sido favorecidos por iniciativas industriais
como as que asseguraram o impulso industrial de São Paulo. Isso indicava que
medidas deveriam ser tomadas por parte dos órgãos governamentais.
Em relação ao comércio, apesar de lacunas existentes não permitirem um
diagnóstico elaborado, percebe-se que a balança comercial externa do Rio Grande
do Sul esteve negativa nos anos de 1954 / 55 / 56, porém o saldo foi diminuindo de
ano a ano, passando de 89 milhões de dólares, para 54 milhões e 30 milhões de
dólares, respectivamente.
A análise da estrutura das importações e exportações indicava que a
composição das exportações no Rio Grande do Sul era mais diversificada que a dos
outros estados. Os principais produtos exportados eram: pinho em tábua; lã bruta,
soja, peles e couros, fumo em folha e carne enlatada. Os produtos que o estado
135
importava eram: trigo em grão; gasolina; tratores; óleos combustíveis e lubrificantes.
Isso justificava porque o estado apresentava um déficit na balança comercial:
exportava produtos primários e importava produtos industrializados.
As considerações apresentadas pelos técnicos da Comissão indicavam a
lamentável falta de orientação econômica que os três estados apresentavam. Mas
limitaram-se a algumas considerações gerais, devido à falta de dados, segundo eles,
para uma avaliação mais profunda referente à produção, consumo interno,
importações e exportações.
As medidas mais urgentes, de acordo com a Comissão, deveriam ser: a) a
situação possível e desejável das necessidades cobertas pela importação - o
importante era definir e desenvolver atividades para satisfazer as necessidades
locais e regionais e levando em conta os desequilíbrios entre Rio Grande do Sul,
Santa Catarina, Paraná, deveriam estabelecer fábricas destinadas a satisfazer as
necessidades de cada estado; b) as possibilidades de desenvolver a exportação da
produção local, para outros estados do Brasil, para países da América Latina,
América do Norte, Europa e para outros mercados.
Os principais aspectos focalizados e que deveriam ser retomados para estudo
pelos responsáveis dos estados, segundo a Comissão, eram o consumo, o mercado,
a produtividade e as relações interindustriais e inter-regionais. Alguns deles seriam
realizados imediatamente e outros só a médio prazo.
136
Para os técnicos da Comissão, deveria ser criado um plano conjunto que
permitisse coordenar esses diferentes estudos e apresentar um inventário sobre os
recursos de solo e subsolo, programa energético, plano de transportes,
financiamentos, formação técnica e profissional, o que seria indispensável para que
fossem conhecidas as possibilidades concretas e compreender uma ação eficiente
a longo prazo. A ausência dessas medidas poderia expor os três estados a uma
relativa perda de importância no cenário brasileiro. As condicionantes do
desenvolvimento, nestes estados, deveriam levar em conta a concorrência de
centros industriais e comercias como São Paulo e Distrito Federal.
3.3.4 O Mercado de Crédito
O desenvolvimento dos bancos efetuou-se de acordo com as realidades
locais, a partir de um esquema clássico: um comerciante de uma localidade, por ter
relações contínuas com comerciantes de outras vilas, encarregava-se de pagar e/ou
depositar por contas de terceiros. E, assim, constituir-se-iam, em sua origem, os
primeiros escritórios bancários especializados.
A rede bancária brasileira teria iniciado seu desenvolvimento em 1940 e
expandira-se nos anos seguintes com a dinamização econômica da agricultura e da
indústria.
O Rio Grande do Sul, em 1940, já apresentava uma rede bancária bem
desenvolvida em relação aos outros estados, possuindo então 165
137
estabelecimentos; em 1950, contava com 216; em 1955 com 263, e em 1965 com
410.
De acordo com a Comissão, os três estados do Sul apresentavam uma das
melhores redes bancárias do país. A estrutura dessa rede no do Rio Grande do Sul
era uma das mais antigas e respeitadas. O mais antigo banco rio-grandense, o
Banco da Província do Rio Grande do Sul, fora fundado ainda no tempo do Império,
em 1858. Nos anos 50, apresentava sete bancos e três casas bancárias que
representavam 398 estabelecimentos, dos quais 43 estavam localizados fora do
estado.
A rede bancária do interior do estado dependia, exclusivamente, das matrizes
dos bancos do Rio Grande do Sul e do Banco do Brasil que desempenhava um
papel importante quanto à distribuição dos empréstimos agrícolas e no que se referia
às cooperativas.
Dentro do panorama do mercado de crédito, estavam presentes as
Companhias de Investimentos. Das cinco organizações de investimentos do Rio
Grande do Sul, quatro tinham estrutura jurídica rio-grandense e uma, paulista. Essas
organizações exerciam atividades importantes em âmbito de ações localizadas. A
necessidade de tais organizações se fez sentir na fase de industrialização ativa e em
empresas em vias de crescimento, que solicitavam recursos financeiros para seus
investimentos.
138
Essas seriam algumas considerações, levantadas pela Comissão
Interestadual da Bacia Paraná -Uruguai, para o Rio Grande do Sul.
Retomamos agora o I e o II Plano de Obras, Serviços e Equipamentos que
representaram o planejamento do Estado Regional durante a década de 50 no Rio
Grande do Sul. O I Plano foi criado durante o Governo de Ernesto Dornelles e o II
Plano durante o Governo de Leonel Brizola. Eles serão destac ados por
representarem uma determinação política de coordenação e unificação dos diversos
planos setoriais dentro do Estado, bem como por estarem inseridos na órbita do
Nacional -Desenvolvimentismo brasileiro que estamos apresentando.
3.4 O Primeiro Plano de Obras, Serviços e Equipamentos (1953)
O I Plano de Obras foi elaborado setorialmente por técnicos de diferentes
áreas. Seu objetivo era obter um melhor aproveitamento das possibilidades da
economia gaúcha, através de critérios mais racionais de administração de serviços e
de obras públicas. A idéia de sistematizar os diferentes planos setoriais num
documento permitiria obter uma visão de conjunto das obras planejadas e dos
interesses da sociedade sul rio-grandense.
De acordo com DALMAZO (1992), o Plano deixava claro a deliberação de
realizar obras complementares ou ligadas com o planejamento federal.
O setor dos transportes mereceu especial atenção na determinação dos
recursos, recebendo 46,6%, que foi distribuído entre os sistemas ferroviário,
139
rodoviário, aeroviário, portos e navegação. O sistema ferroviário integrava o Plano
Geral de Reaparelhamento da Rede Ferroviária Nacional, assim como os sistemas
hidroviários e aeroviário foram implementados em convênio com a União. Por sua
vez, o Plano Rodoviário Estadual foi financiado por empréstimos, transferências da
União, Taxas Rodoviárias, criadas em 55, e com contribuições orçamentárias, tendo
como metas o aparelhamento do DAER (criado em 1937); a construção, o
melhoramento e a pavimentação de estradas e a construção de pontes, são
projetos identificados no I Plano.
Para o setor de eletrificação, o I Plano de Obras, Serviços e Equipamentos
definia duas prioridades: uma meta de longo prazo previa a construção de usinas
para a geração de 131.895Kw de potência, com uma segunda fase sob a
responsabilidades do governo federal Usinas de Canastra (42.000Kw), Jacuí
(46.600Kw) e Candiota (20.000Kw) entre outras; a outra meta previa a construção de
pequenas usinas hidroelétricas para a geração de 33.000Kw, e instalação de
pequenas usinas para distribuição nas cidades e vilas do interior, não atingidas pelo
Plano.
O resultado da implementação do Plano representou a aplicação da potência
operada pela CEEE de 127.237Kw, equivalente a 70% da potência instalada no Rio
Grande do Sul em 1956.
Para o setor agrícola, o I Plano determinou a construção de uma rede de silos
e armazéns para cereais ou Plano de Silos e Armazéns. Foram destinados
recursos para a construção de nove silos elevadores, localizados no interior, e duas
140
unidades portuárias ou terminais. A execução desse Plano foi financiada pelo BNDE,
em 1956. Nesse mesmo ano o Ministério da Agricultura transferiu para o patrimônio
da CESA (Comissão Estadual de Silos e Armazéns, criada em 1952) 11 unidades.
Foram previstos, também, a construção, ampliação e o reaparelhamento, nas sedes
municipais, dos serviços de fomento agrícola.
A questão do saneamento urbano permanecia dramática. O Plano destinou
13% dos recursos para a instalação de sistema de água em todas as 56 cidades
sem serviços, para a ampliação das nove redes de água e esgoto a cargo do Estado
Regional e para a construção da rede de esgoto em mais de 10 cidades.
A obra educacional absorveu 5% dos recursos para a construção e
reaparelhamento das escolas em todos os níveis e para programas de assistência
escolar. A prioridade, entretanto, coube às obras para os ensinos técnico-profissional
e primário. Em 1956, o ensino primário contava com 881 unidades escolares; o
ensino normal, com 69 unidades de 1º. e 2º. graus; o ensino rural, com 350 escolas;
o ensino ginasial com 30; o ensino colegial com 6 unidades e o ensino técnico-
profissional com 10 unidades absorvia 3.109 alunos e 390 professores.
148
Por último, a área da saúde recebeu 5% dos recursos para a construção e
reaparelhamento de três centros de saúde, de 12 postos de higiene nos municípios
que não possuíam atendimento médico e para diversos serviços de assistência
social, programas sanitários de combate à doenças de Chagas e outros.
141
O I Plano de Obras, Serviços e Equipamentos representou a unificação do
planejamento setorial e a centralização dos comandos da direção econômica do
Estado Regional. A coordenação do Plano declarava sua determinação na definição
das prioridades, no controle e rac ionalização dos escassos recursos, na articulação
com o planejamento nacional e como instrumento eficiente para pleitear o
financiamento das obras junto aos órgãos federais e aos bancos oficiais.
A grande prioridade foi criar as condições basilares da acumulação industrial,
implementando obras consideradas parte das funções clássicas do Estado Regional,
como o aparelhamento do sistema de transportes, educação profissional,
saneamento urbano, saúde e outros.
3.5 O Segundo Plano de Obras, Serviços e Equipamentos (1959/62)
O II Plano de Obras, Serviços e Equipamentos foi proposto no Governo de
Leonel Brizola, em 1959, juntamente com a criação do Gabinete de Administração e
Planejamento (GAP), ligado diretamente ao governador, e formado por técnicos,
cujos objetivos eram planejar, orientar e acompanhar a execução do mesmo.
Coube ao Gabinete de Administração e Planejamento considerar e orientar as
propostas e planos setoriais, segundo as diretrizes do governo do Rio Grande do Sul
e do Conselho de Desenvolvimento do Estado.
148
MENSAGEM à Assembléia Legislativa do Governador Ildo Meneghetti. 21 de abril de 1957.
AHRGS. Documentação dos Governantes. Porto Alegre.
142
O II Plano não preenchia os requisitos de um projeto formal, pois não existiam
elementos caracterizadores, como a relação de obras e serviços, o custo financeiro
aproximado e a forma de financiamento. Originariamente, o Plano assumiu a forma
de lei (RIO Grande do Sul. Lei 3.601. 1959) antes de ter a forma de um documento-
-síntese. Em Mensagem à Assembléia, o Governador oficializava a instituição do II
Plano e salientava o principal objetivo de seu governo: o desenvolvimento
econômico.
“Entendemos, Senhores Deputados que o desenvolvimento não se
faz senão visando valorizar aquilo que já foi definido como o melhor
capital e a maior riqueza de uma nação: a criatura humana. Por isso
mesmo, o crescimento econômico só alcança sentido quando
também se converte em desenvolvimento social. Nosso
entendimento desta interpretação dos aspectos sociais e econômicos
de toda a política de crescimento e expansão, foi fixado na lei que
instituiu o Segundo Plano de Obras, e nossa concepção de política
social, se tivéssemos de defini-lo diríamos que ela sintetiza no lema
que tem inspirado nossa ação planejadora e executiva.”
149
O planejamento elaborado pelo GAP, em conjunto com o governo,
sistematizou os programas e projetos específicos, distribuídos na seguinte ordem:
1. Educação Popular;
2. Saúde Pública. Abastecimento de água. Saneamento;
3. Política Social. Habitação Popular;
4. Política Agrária e produção agropastoril;
5. Política Econômica. Iniciativa Privada. Cooperativismo. Finanças e
Orçamento;
6. Industrialização. Indústria Básica;
143
7. Energia Elétrica e Carvão;
8. Transporte e Armazenagem;
9. Comunicações;
10. Organização, Planejamento e outras atividades e prestações de serviços.
Políticas Municipalistas. Outras diretrizes de ação e administração do Governo do
Estado.
150
O Governo do estado apresentava como ponto fundamental de sua ação
administrativa o Programa Educacional. O lema de sua campanha fora “Educação
Popular e Desenvolvimento Econômico”.
O II Plano de Obras, Serviços e Equipamentos sintetizava o lema da
Campanha. O programa de investimentos estabeleceu os gastos com a educação
(28,75%), transportes e armazenagem (24,29%), energia e comunicações (22,86%),
programas sociais (8,57%) e de apoio à produção (10,00%).
Entretanto, a mesma falta de recursos que levou o Governador Ernesto
Dornelles (1951/54) a promover uma política de endividamento e tributação
específica para financiar o I Plano de Obras, Serviços e Equipamentos, ocorreu
como o Governador Leonel Brizola, que optou pela mesma alternativa:
endividamento e aumento da tributação, a partir de 1959, para financiar o II Plano de
Obras, Serviços e Equipamentos.
149
MENSAGEM do Governador à Assembléia Legislativa. 21 de abril de 1960. AHRGS.
144
A política de apoio ao capital implantada pelo governo a partir do II Plano,
destinou-se à criação de uma indústria siderúrgica de aços finos que tinha como
meta a produção de ferro-esponja e aços especiais. A produção deste insumo
básico visava a atender às necessidades do desenvolvimento da indústria metal-
mecânica do Sul do país. Segundo DALMAZO (1992), o projeto de Lei n. 4.072, da
constituição a Aços Finos Piratini S/A, foi aprovado pela Assembléia e sancionado
pelo governador em 1960, e teve a participação e financiamento da União que
destinou Cr$1.000.000.000,00 (um bilhão de cruzeiros) do Plano Nacional do
Carvão.
O governo do Rio Grande do Sul lutava pela unificação dos preços do ferro,
aço, combustíveis e energia elétrica, dentro do que previa a política nacional
uniforme para o preço destes insumos, como ocorria com o preço do trigo. Porém, o
estado, assim como os demais, pagava mais caro pelos insumos básicos. A
unificação dos insumos era fundamental para o desenvolvimento do parque
industrial.
A indústria de material elétrico no estado teve também grande expansão nos
anos 50 e início dos anos 60, puxada pelo Plano de Eletrificação Estadual e
planejamento nacional.
A realização do projeto da Refinaria Alberto Pasqualini teve apoio do governo
federal e do Conselho Nacional de Petróleo. O governo do Rio Grande do Sul
Documentação dos Governantes. Porto Alegre.
145
comprometeu-se com a doação do terreno para a instalação da refinaria, iniciando
as obras de infra-estrutura em 1961. A construção desta refinaria repercutiu na
economia gaúcha e da região Sul, e na desejada uniformização do preço dos
combustíveis.
Outros projetos foram implantados durante o II Plano com objetivo de dar
apoio ao capital, entre eles: a implantação da indústria de tratores agrícolas, que
buscava atrair uma fábrica de tratores para o estado; a implantação de indústria de
máquinas agrícolas, que tinha por base a importância do setor agrícola na geração
de renda da economia gaúcha; implantação da indústria de fertilizantes, que se
propunham a elevar a produtividade do estado, repondo nutrientes ao solo; a
implantação de indústria de laticínios, que recebeu crédito especial do Banco do
Estado do Rio Grande do Sul (BANRISUL - criado em 1928); o desenvolvimento da
política de incentivos industriais, que objetivava atrair novos investimentos ao Estado
Regional.
A política de energia elétrica estabeleceu uma meta de 500.000kw até
dezembro de 1962. Os recursos para o financiamento advinham da própria empresa
(CEEE), BNDE, ELETROBRÁS e do próprio estado. No Plano de Eletrificação
contavam os seguintes projetos: Projeto Jacuí (70.000kw); Projeto Candiota
(20.000kw); Projeto Charqueadas I e II (72.000kw ); Projeto da Usina de Passo
Fundo (220.000kw); Projeto Fronteira Oeste (66.000kw).
150
MENSAGEM a Assembléia Legislativa. 21 de abril de 1960, em que o Governador indicava as
principais metas do II Plano de Obras, Serviços e Equipamentos. AHRGS. Documentação dos
Governantes. Porto Alegre.
146
O plano de expansão dos serviços de comunicações estabeleceu metas para
satisfazer as demandas da época, modernizar e expandir os futuros serviços de
telecomunicações. A precariedade dos serviços de telecomunicações induziram à
intervenção do Estado Regional, a partir de 1953, com a criação da Comissão
Estadual de Comunicações. Com serviços deficitários e elevado custo de
operacionalização, juntamente com o desinteresse do capital privado em ampliar os
serviços, o Estado Regional avançou para a estatização deste setor.
A política de estatização e planejamento dessa atividade produtiva,
desinteressante naquele momento para o capital privado, representou o inicio da
superação dos entraves na prestação dos serviços das telecomunicações e a sua
modernização.
O programa de silos e armazéns procurou ampliar sua capacidade de
estocagem e conservação de produtos agrícolas, sob o controle da Comissão
Estadual de Silos e Armazéns (autarquia estadual). A intervenção do Estado nas
atividades produtivas de ensilagem e armazenagem era de interesse para a
acumulação nacional e do estado e foi financiada com recursos do BNDE.
A criação do Conselho de Desenvolvimento do Extremo Sul (CODESUL) e do
BRDE, visava a uma união de forças para influenciar projetos de industrialização,
política de crédito e investimentos em favor do desenvolvimento regional. A criação
da Caixa Econômica Estadual, como fonte captadora de poupança, inseria-se na
estratégia da industrialização da economia gaúcha. Criada em 1960, a Caixa
147
Econômica Estadual tinha o objetivo de reter recursos que estavam sendo levados
para outras regiões.
Os programas de apoio à produção agropecuária estabeleciam a continuação
de certos programas existentes e a implementação de novos para atender aos
interesses do setor.
A política de saúde estabeleceu a assistência médica e sanitária às
populações carentes, controle da higiene, da alimentação e do apoio aos serviços de
saúde. O Estado manteve maior parte do serviços de saúde e de assistência social,
contando com recursos da União, Ministério da Saúde e das campanhas de saúde
pública.
A política educacional, que constituiu a prioridade do Estado Regional,
orientou o ensino primário no sentido de superar o déficit escolar de
aproximadamente 300.000 crianças sem escola e de eliminar o analfabetismo. Essa
meta foi equacionada em 1961, através da construção de escolas, contratação de
professores e cooperação administrativa dos municípios e comunidades locais. Em
Mensagem à Assembléia, o Governador Brizola indica os números deste projeto:
“EDUCAÇÃO POPULAR: O atual governo considera ter alcançado o
mais completo êxito em seu esforço em prol da Educação, ponto n.º
1 de seu programa. Particularmente cuidou-se do Ensino Primário e
Ensino técnico. Realizações: 4.500 nova escola, 420 mil novas
matriculas, 20 mil novos professores e 33 mil novas bolsas de
148
estudo. Este governo foi o que mais colaborou e subvencionou o
ensino particular do Estado.”
151
Do mesmo modo, o estado declarava que o ensino técnico assegurava
matrícula para todos os candidatos aprovados nos exames seletivos, nos ramos de
ensino técnico-industrial, agrícola e comercial. O Estado realizou convênios com o
Ministério da Agricultura, com o SENAI (1942) e o SENAC (1946), para a instalação
das escolas técnicas.
A política educacional teve o amplo apoio do Estado Regional, que financiou a
expansão do ensino primário, em colaboração com os municípios e comunidades
locais, e o ensino técnic o, que era de grande interesses da economia e da
sociedade rio-grandense, contou com o apoio do governo federal.
De acordo com BORDIN (1985)
152
, o financiamento do II Plano de Obras foi
concretizado com a utilização de vultosas operações de crédito. Estas operações,
durante o período de 1959/63, atingiram o percentual de 18,4% da receita total do
estado. Verificou-se uma expansão do nível de endividamento em no qual a dívida
total superou a receita de impostos.
Apesar do esforço governamental, contratando operações de crédito para a
realização de investimentos regionais de infra-estrutura, a industrialização obteve
151
MENSAGEM à Assembléia Legislativa do Governador Leonel Brizola. 21 de abril de 1962.
AHRGS. Documentação dos Governantes. Cód. A 7.50, v. I e II, p.13. Porto Alegre.
149
uma lenta expansão em relação ao centro do país. A União sempre voltou suas
atenções para aquela região, onde ocorriam as principais transformações
econômicas, ficando o Rio Grande do Sul à margem dos planos de aplicação de
recursos do poder central.
Dessa forma, o Rio Grande do Sul tomou a seu encargo a realização de
investimentos que, na maioria dos estados, foram efetuados com os recursos da
União (energia, comunicações, pavimentação de estradas), enfatizando a
importância do desenvolvimento destes setores, para manter uma autonomia quanto
aos planos de expansão e oferta da infra-estrutura local e fazer frente à
concentração de investimentos de recursos da União na Região Sudeste. Para isso
tudo, o estado desenvolveu um esforço próprio a custo de um elevado
endividamento.
Podemos dizer que o planejamento estadual marcou a gestão política e a
orientação do Estado Regional para a dinamização da industrialização dentro de um
contexto em que a autonomia política e financeira era muito limitada.
Apesar dos Planos de Obras, Serviços e Equipamentos instituídos no estado,
não foi alcançado, em curto prazo, o desenvolvimento que tanto se buscava. Porém,
a implantação de cada um dos projetos e as áreas as quais foram destinados,
certamente aproveitaram as possibilidades existentes e proporcionaram um
152
BORDIN, Luis Carlos Vitali. A dívida Pública do Rio Grande do Sul: Administração Direta (1951-84).
p. 135-152. In: RIO Grande do Sul 150 anos de Finanças Públicas. Porto Alegre: FEE, set. 1985.
150
crescimento econômico e o acúmulo de capitais, que foram atingidos somente na
década de 70.
Todos os levantamentos de dados, as diretrizes políticas, as análises e
possibilidades sugeridas pelas comissões estaduais e federais em prol do
desenvolvimento econômico do Rio Grande do Sul foram, de certa forma,
implementados dentro dos projetos apresentados. A questão do
desenvolvimentismo, que dominou as discussões políticas e econômicas durante a
década de 50, começou a implementar seus projetos no final daquela década e
início da seguinte. Somente a partir dos anos 70 que a sociedade gaúcha passou a
colher os resultados desses projetos, muitos dos quais até hoje, em andamento.
Como o objetivo não fora investigar a concretização de todos esses projetos,
bem como não avaliar seus resultados, cabe-nos destacar, a importância do
processo de industrialização no estado do Rio Grande do Sul, como um dos
principais instrumentos para superar sua condição secundária/periférica frente ao
centro do país.
Com isso, o Poder Executivo do estado buscou implantar a infra-estrutura
necessária para o desenvolvimento, assumindo o financiamento da indústria de
base, privilegiando a educação, num primeiro momento, juntamente com saúde
pública e com habitação, sem perder de vista a potencialidade agrícola do estado.
151
Diferentemente do projeto autônomo do Grupo de Trabalho para o
Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), o qual se identificava totalmente com a
proposta cepalina de desenvolvimento para o Brasil, o Rio Grande do Sul buscava
sua posição frente ao centro do país, bem como maior atenção por parte do Estado
Nacional para sua condição periférica. O estado rio-grandense questionava o
modelo utilizado na região Centro-Sul, pois ficara de fora das prioridades nacionais,
pretendendo reforçar, assim, o seu poder como Estado Regional. A partir do
endividamento buscava recursos que viabiliz assem o desenvolvimento, de maneira
diferenciada do modelo proposto pelo Nordeste.
CONCLUSÃO
No decorrer do trabalho procuramos identificar os principais aspectos que
marcaram a trajetória do processo de desenvolvimento latino-americano,
marcadamente precedido de um planejamento, que é apresentado de uma forma
genérica, destacando-o no plano nacional e enfocando o correspondente do estado
do Rio Grande do Sul.
As experiências desenvolvimentistas latino-americanas, realizadas a partir da
perspectiva das propostas da CEPAL, indicaram que o processo fora árduo, pois os
países não dispunham de uma base estrutural que pudesse garantir o “progresso
técnico” proposto e esperado.
Para os países periféricos atingirem o desenvolvimento econômico seria
fundamental que fossem consideradas as realidades sociais, para que não houvesse
disparidades nesse processo. Assim, caberia ao Estado Nacional a tarefa de superar
o atraso e os estrangulamentos existentes, tentando retirar os estados de sua
condição marginal. Os diagnósticos levantados sobre esses países apresentavam a
industrialização como a principal alternativa para a superação do atraso econômico.
153
Na medida em que o Estado tomava a frente dos projetos de desenvolvimento
programado, confirmava seu caráter intervencionista, adotando as medidas
sugeridas pela CEPAL, o que se chocava com a posição dos liberais, que estavam
preocupados com possíveis restrições ao comércio internacional e com o livre
trânsito do capital financeiro. A intervenção estatal e o planejamento representavam
o fortalecimento das economias locais e o seu poder de barganha com banqueiros
internacionais, que lucravam com a fraqueza e o subdesenvolvimento dos países
periféricos. Esses lucros obtidos pelos grupos externos representavam o aumento
dos desequilíbrios internos, a alta concentração da renda e as desigualdades
sociais.
A proposta idealizada pelos teóricos cepalinos dava ao Estado a função de
programador, empreendedor e modernizador, sendo ele, o principal sujeito do
desenvolvimento ec onômico. Vale dizer que a superação do atraso, da
heterogeneidade estrutural e da especialização destes países era a conseqüência
da industrialização dirigida pelo poder público. A visão do pensamento da CEPAL
sobre o desenvolvimento latino-americano era de um desenvolvimento específico,
em que o progresso técnico e os sistemas de preços estavam subjacentes à teoria
da deterioração dos termos de trocas. Essas relações movimentavam -se por leis
específicas, nas quais o Estado era o técnico desenvolvimentista.
A participação do Estado brasileiro na promoção do desenvolvimento, a partir
do modelo Cepalino, era fundamental.
154
Na medida em que o processo de industrialização estava sendo
implementado, as transformações estruturais se generalizavam em todos os setores
da sociedade, levando a um processo acelerado de urbanização, em que o índice
de crescimento da população urbana passou a corresponder ao dobro do
crescimento da população nacional, juntamente com o crescimento vegetativo que
se acelerava devido aos baixos índices de mortalidade, pois o Estado passara a
preocupar-se com medidas sanitárias. Paralelamente, todas essas transformações
acentuavam os movimentos migratórios internos em direção aos centros urbanos, na
busca de melhores condições de vida, agravando, ainda mais, os desequilíbrios
regionais.
Enquanto isso, os setores políticos mais conservadores ligados ao capital
estrangeiro, pressionavam para que o governo adotasse políticas de estabilidade
financeira e social, classificando as medidas políticas de Vargas (1951/54) como
insatisfatórias, ao mesmo tempo que consideravam negativo o regime político
instalado com base no trabalhismo getulista. Essa situação amedrontava a classe
média, temerosa com a proletarização dos setores populares e chamava a atenção
das Forças Armadas contra a crescente politização das massas e o risco de
subversão da ordem constitucional.
Vargas continuava a desenvolver sua política trabalhista com o apoio das
massas urbanas ao seu governo e levando adiante o projeto político econômico
baseado no nacionalismo desenvolvimentista.
155
Essa orientação política desagradava os setores políticos conservadores
nacionais e desgostava os grupos estrangeiros interessados na economia do país.
Eles compreendiam que o apoio das massas urbanas ao Governo Vargas estava
organizado, principalmente, na direção do nacionalismo econômico e da intervenção
estatal. Os setores conservadores estavam ligados ao liberalismo econômico, os
quais não aceitavam a intervenção do Estado, a não ser quando se aproximava de
seus interesses, concebendo a industrialização como um processo lento e gradual.
O Estado passara a criar novas condições para a expansão e diferenciação
do sistema econômico brasileiro, de modo que o poder público estava tornando-se
ainda m ais indispensável e decisivo para a transformação da economia do país.
A pequena burguesia industrial, ligada à produção de bens de consumo
tradicionais, era totalmente dependente dos mercados locais ou regionais. Esse
grupo, nacionalista, apoiava-se em uma espécie de protecionismo que acentuava o
intervencionismo estatal. O nacionalismo dessa burguesia era estratégico, pois
resguardava totalmente seus interesses. Por outro lado, a grande burguesia
industrial estava vinculada aos setores de serviços e a produção de bens de
consumo duráveis, aliada ao capitalismo internacional. Para esse setor o
intervencionismo estatal, em alguns momentos, era prejudicial, pois não permitia a
liberdade de preços, agravando a deterioração do intercâmbio comercial.
No projeto político do Governo de Juscelino Kubitschek estavam presentes os
modelos de desenvolvimento econômico gestados pela CEPAL, que fundamentaram
o planejamento que buscou implementar seu lema “cinqüenta anos em cinco”. Nesse
156
período a sociedade brasileira se encontrava frente às mudanças econômicas o que,
de alguma forma, levaria às mudanças sociais.
No momento em que a proposta desenvolvimentista incorporou-se na retórica
oficial do Governo de JK, a sociedade brasileira, principalmente as elites intelectuais,
políticas e empresariais, perceberam a necessidade de mudanças. Havia uma
articulação de forças sociais e políticas em torno dos modelos de desenvolvimento
econômico que se instalavam no Brasil: o modelo de desenvolvimento capitalista,
associado de JK, que aceitava a entrada de capitais estrangeiros para acelerar esse
processo; e o modelo de desenvolvimento capitalista nacional, que tentou sobreviver
com o Vice-presidente João Goulart, que procurava dar continuidade ao projeto
desenvolvimentista de Vargas, passando a priorizar questões pontuais, em especial
a reforma agrária e políticas sindicais, entre outras.
As relações entre o Estado e a economia tornaram-se mais profundas no
Governo JK. O poder público passara a atuar no sistema econômico do país,
utilizando-se de todos os recursos possíveis, acelerando o desenvolvimento
econômico a partir da industrialização e impulsionando o setor privado nacional e
estrangeiro. A partir do momento em que a industrialização já não era mais um
processo induzido pelo estrangulamento do setor externo, a política econômica do
governo passou a orientar-se pela determinação do sistema econômico instalado no
país. Progressivamente abandona-se a substituição de importações.
Durante a implantação do processo de desenvolvim ento, os responsáveis
pelo planejamento perceberam que as questões fundamentais, ligadas à distribuição
157
de renda e da heterogeneidade estrutural, apresentaram resultados não esperados,
levando a uma considerável estagnação de todo o processo.
No Rio Grande do Sul o processo de desenvolvimento foi incorporado a partir
do projeto nacional. Porém, percebemos que esse projeto não atingiu igualmente
todas as regiões do país, em função das desigualdades regionais.
A aceleração/diversificação da indústria para o estado sulino, contribuiria para
a superação do seu relativo atraso interno, comparativamente à região Sudeste,
conforme consta nos discursos dos governadores.
O projeto de industrialização atrelado à questão do nacional
desenvolvimentismo, pensado pelo Executivo para o Rio Grande do Sul, evidencia a
convergência com os princípios propostos pela CEPAL, no âmbito latino-americano.
Percebemos claramente a direção tomada pelo estado no financiamento da infra-
estrutura, proporcionando o crescimento da indústria de base, privilegiando a
educação popular, a saúde pública e a habitação, sem perder de vista a
potencialidade agrícola do estado rio-grandense.
Tomando como referência o exemplo nordestino (GTDN), pensado por Celso
Furtado, podemos inferir que o encaminhamento dado à questão do
desenvolvimento do estado do Rio Grande do Sul diverge dos projetos pensados
para o restante do país, que foram muito influenciados pelo entendimento paulista,
desconsiderando as diferenças regionais que acabaram inviabilizando o êxito da
experiência nordestina.
158
Ernesto Dorneles, e mais intensamente Leonel Brizola, parecem ter
percebido, pelas análises dos discursos e documentos oficiais do Poder Executivo, a
necessidade de um planejamento regional fundado numa descrição detalhada da
realidade na qual desejavam intervir.
Pelas leituras feitas acreditamos que, em especial Leonel Brizola, naquele
período já havia percebido, assim como fizera Raul Prebisch, a necessidade de
priorizar as questões sociais, que teoricamente estariam inseridas no processo de
desenvolvimento econômico, pois, sem a preocupação com a mudança da dimensão
social estaríamos diante de um crescimento econômico e não efetivamente de um
desenvolvimento, conforme já demonstrado quando da discussão do conceito de
desenvolvimento.
Celso Furtado e seus seguidores, que tiveram como referência empírica o
caso paulista, acreditavam que a transformação social seria uma decorrência da
dimensão econômica.
O modelo implantado no Rio Grande do Sul fora diferenciado à medida em
que não aplicou na íntegra como ocorrera no Nordeste, o projeto de industrialização
pensado para o Brasil. Os estados membros não dispunham de mecanismos
econômicos financeiros suficientes para controlar/amenizar o endividamento interno
resultante da implementação de um projeto desenvolvimentista.
Na questão do endividamento interno, podemos afirmar que houve uma
relativa simetria entre a política de JK e a de Leonel Brizola, conforme já constatado
159
por CANO (1985). A diferença refere-se ao fato de que a União, ao contrário do
estado, dispunha de meios para suportar seu endividamento.
Pelas leituras dos documentos e bibliografias que fundamentaram esse
estudo não ficou clara a postura efetiva do Executivo Estadual, sobre a utilização, ou
não, do capital estrangeiro, uma vez que os bancos de financiamento acessavam
capitais internacionais, quer públicos, quer privados, cujos teóricos eram contrários
ao nacional desenvolvimentismo.
Este "silêncio" certamente decorria da incapacidade de o estado rio-
grandense auto financiar seu projeto de desenvolvimento, especialmente no que diz
respeito a questões infra-estruturais (energia, transporte, entre outros).
Ainda que tenhamos trabalhado especificamente com fontes do Executivo
Estadual, acreditamos ter havido a supremacia da ordem política sobre a ordem
econômica. Os diagnósticos elaborados pelos quadros técnicos contratados pelo
estado, somente foram implementados na medida em que convinham ao Executivo
Estadual que incorporou os elementos técnicos ao seu discurso, justificando assim a
intervenção do Estado na economia.
Mesmo diante das dificuldades de levantamento de documentos, em especial
decorrente da abrangência do recorte de tempo utilizado no presente trabalho, bem
como na incursão em outra área, no caso a economia, quer nacional, quer estadual,
acreditamos ter sido possível dar ao leitor uma idéia efetiva sobre a pertinência da
utilização pelo Executivo rio-grandense de conceitos e modelos de desenvolvimento
160
gestados no cenário latino-americano, ainda que tenhamos verificado a
especificidade da leitura gaúcha do desenvolvimentismo, que buscou adaptar a
realidade regional às propostas nacionais.
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