Teatro de Arena de São Paulo: Trajetória Artística e Representação Política
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A saída de Vianna do Arena, ocorreu em meio às brigas e divergências
ideológicas que até então não haviam sido resolvidas
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. E mesmo ele apresentando uma
visível identificação com os pressupostos estéticos e políticos do grupo, justificou sua
saída atribuindo-a à incapacidade do Arena em atingir as massas populares e em
promover uma arte “popular”:
O Teatro de Arena (...) trazia dentro de sua estrutura um estrangulamento que
aparecia na medida mesmo em que cumprisse a sua tarefa. O Arena era o porta
voz das massas populares num teatro de cento e cinquenta lugares (...) O Arena
não atingia o público popular e, o que é talvez mais importante, não podia
mobilizar um grande número de ativistas para seu trabalho. A urgência de
conscientização, a possibilidade de arregimentação da intelectualidade, dos
estudantes, do próprio povo, a quantidade de público existente estavam em
forte descompasso com o Teatro de Arena enquanto empresa. (...) Nenhum
alfabetização com a metodologia de Paulo Freire (Pedagogia do Oprimido). A expansão desse
movimento, além de atingir outros estados nordestinos, influenciou de forma sistemática a criação de
vários CPCs pelo País. Nos primeiros tempos, as atividades do Centro Popular de Cultura baseavam-se
essencialmente em apresentações teatrais, mas, com a aproximação dos estudantes secundaristas e
universitários, foram organizados setores ligados ao cinema, artes plásticas, literatura e música. Partindo
das experiências práticas dos CPCs espalhados por todo o Brasil, na década de 60, pode-se dizer que esse
segmento destacou-se na realização de uma “cultura popular”, procurando aprofundar a função “social”,
“política” e “revolucionária” da arte. Os cepecistas buscavam o povo em portas de fábricas, favelas,
praças, a fim de despertar sua consciência política e suscitar mobilização frente à realidade nacional.
Vários espetáculos importantes foram produzidos e reproduzidos pelo CPC da Une, entre eles: Os Autos
dos 99%, de Oduvaldo Vianna Filho, Eles Não Usam Black-Tie de Gianfrancesco Guarnieri, e o filme
Cinco Vezes Favela. Depois do Golpe de 64, todos os CPCs e MCP foram colocados na ilegalidade, suas
sedes foram destruídas e seus integrantes perseguidos.
Várias obras referendaram o valor político e artístico do CPC diante na década de 60, algumas levantando
restrições à direção de seus trabalhos frente a uma “cultura popular”. Entre os trabalhos existentes cabe
destacar: MOSTAÇO, Edelcio. CPC, MCP, ARENA,OFICINA: Os Caminhos de uma Arte Popular. In:
___. Teatro e Política : Arena, Oficina e Opinião ( uma interpretação da cultura de esquerda). Op. Cit.
p. 55 a 74. MARTINS, Carlos Estevan. A Questão da Cultura Popular. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1963. PEIXOTO, Fernando. Vianinha no Centro Popular de Cultura. . ___. In: Vianinha:
Teatro-televisão-política. Op. cit p. 81-99.
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As contradições e divergências internas do Arena podem ser amplamente visualizadas em textos do
próprio Vianna, organizados por Fernando Peixoto na obra Vianinha: Teatro – Televisão – Política. Op.
Cit.
Dentre os artigos que compõem a obra, destaca-se um relatório redigido supostamente no momento
efervescente de crise do Arena - Alienação e irresponsabilidade. Nele Vianna tece duras críticas à direção
dos trabalhos da Companhia encaminhada por José Renato: “Ou bem José Renato participa do grupo,
pesquisando com ele a solução e a sua verificação histórica entrando como elemento da equipe – de
maneira nenhuma mantendo a hierarquia econômica que o distingue, que faz com que as principais
decisões ainda caibam a ele, que tem dificultado, e tem mesmo, o aparecimento de um administrador, pois
isso, no seu entender, só viria enfraquecer sua posição, só viria tornar clara a sua participação econômica
no grupo. (...) A clareza me parece que tem que ser total agora. Total. Colocarmos diante de José Renato
as minhas dúvidas quanto a sua participação cultural diante do grupo”.
Segundo Fernando Peixoto, em contato com o texto de Viana, José Renato esclarece o impasse: “para ele,
naquele momento, a questão essencial era a defesa da sobrevivência profissional do grupo. Que sentia
ameaçada inclusive pelo esfacelamento interno, que tendia a agravar-se. Vianinha dava prioridade ao
aspecto ideológico. José Renato alertava inclusive para a falta de significado do desenvolvimento de um
programa mais conseqüente de teatro popular num espaço pequeno e limitado como a sede do Arena.”
As brigas e divergências entre Viana e José Renato, se não resolvidas foram ao menos esquecidas, a
reconciliação entre ambos, ocorreu, quando José Renato dirigiu a peça Alegrum Desbum e a pedido do
próprio Vianna, antes da morte, o seu último texto, Rasga Coração. Op. Cit. P.63-64.