Download PDF
ads:
MIRTES ESTEVES LOPES
O IMIGRANTE PORTUGUÊS EM BELO
HORIZONTE E O CENTRO DA COMUNIDADE
LUSO-BRASILEIRA
(1897 - 1930)
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
PORTO ALEGRE
2003
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
MIRTES ESTEVES LOPES
O IMIGRANTE PORTUGUÊS EM BELO HORIZONTE
E O CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA
(1897 - 1930)
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre em História Ibero-
Americana.
Orientador: Prof. Dr. Charles Monteiro
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
PORTO ALEGRE
2003
ads:
DEDICATÓRIA
À Cleber Lopes de Oliveira, esposo e companheiro,
que muito me entusiasmou e apoiou nos momentos
difíceis desta dissertação.
Aos meus filhos Leonardo Augusto e Renata,
pelo carinho, atenção e ajuda constante.
Às sobrinhas Ana Luíza e Bárbara pelo carinho.
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Dr. Charles Monteiro,
por não ter medido esforços na orientação deste trabalho.
Ao Alexandre
pela especial colaboração no início deste trabalho.
À Professora Márcia Eveline
pelas preciosas formas de ajuda.
À Professora Maria Efigênia
pela ajuda constante nesta pesquisa.
Aos imigrantes portugueses e aos seus descendentes
que concederam parte de seu tempo e partilharam comigo suas
memórias, para que pudesse elaborar esta narrativa.
Em especial, ao Centro Luso-brasileiro,
na pessoa do Sr. João Pereira da Silva e à bibliotecária Edwiges.
"Podem separá-los convicções políticas ou credos
religiosos, nos momentos de calmaria da Pátria,
profundas divergências mesmo, mas, nas grandes horas
em que Portugal vive num triunfo, os seus filhos sofrem
de angústia, todos se unem no mesmo ideal de fé e
patriotismo".
(Álbum da Colônia Portuguesa do Brasil, 1929)
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
RESUMO
ABSTRACT
INTRODUÇÃO...................................................................................... 12
1. IMIGRAÇÃO NO BRASIL ................................................................... 18
1.1 A imigração portuguesa para o Brasil - século XIX ................... 18
2. IMIGRAÇÃO EM MINAS GERAIS E BELO HORIZONTE ........... 29
2.1 Retomada histórica......................................................................... 29
2.2 Imigração e colonização em Minas: italiana, alemã,
portuguesa, espanhola e outras.................................................... 35
2.3 Fracasso da imigração e colonização do interior de Minas
Gerais................................................................................................ 38
2.4 Portugueses: os pioneiros de sempre.......................................... 41
2.5 Minas seduz imigrante na Europa através de propaganda...... 44
3. A IMIGRAÇÃO PORTUGUESA EM BELO HORIZONTE ............. 49
3.1 Belo Horizonte: nascimento da capital......................................... 50
3.2 A presença do português na fundação de Belo Horizonte....... 56
3.3 A formação da cidade, o processo de ocupação do solo e a
moradia do trabalhador (1897-1929)............................................
60
3.4 A cidade das cafuas - o desafio ao modelo................................ 61
3.5 O perfil do imigrante português em Belo Horizonte................... 68
4. O CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA E O
IMIGRANTE PORTUGUÊS EM BELO HORIZONTE..................... 76
4.1 O Centro da Colônia Portuguesa em Belo Horizonte..................... 76
4.2 A Comunidade Luso-Brasileira na formação da cidade de
Belo Horizonte..................................................................................
82
4.3 A questão da identidade portuguesa na cidade de Belo
Horizonte........................................................................................... 88
4.4 O trabalho e a imigração numa perspectiva histórica em
Belo Horizonte.................................................................................. 91
4.5 O trabalho do imigrante português na construção e
desenvolvimento de Belo Horizonte.............................................
96
4.6 O comércio português em Belo Horizonte .................................. 104
4.7 A sociedade belorizontina e o legado do imigrante português 117
5. CONCLUSÃO....................................................................................... 122
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................. 129
LISTA DE FIGURAS
1.
Localização dos núcleos coloniais de imigrantes na região do Estado
de Minas Gerais.............................................................................................
33
2.
Mapa de Belo Horizonte em 1894, distribuído na Europa para
incentivar a imigração...................................................................................
45
3.
Planta cadastral do Arraial de Belo Horizonte - 1894.............................. 51
4.
Cafua da Papuda (1894) - região onde hoje se situa o Palácio da
Liberdade........................................................................................................
61
5.
Hospedaria de Imigrantes no bairro Calafate, Belo Horizonte............... 65
6.
Primeira sede do Centro da Comunidade Luso-brasileira...................... 78
7.
Primeira diretoria do Centro da Comunidade Luso-brasileira................ 79
8.
Bandeira de Portugual (A), do Brasil (B) e do Centro (C)....................... 81
9.
Festa tipicamente portuguesa em comemoração ao dia 1º de
dezembro........................................................................................................ 85
10.
Serraria Souza Pinto, fundada em 1903.................................................... 100
11.
Centro da cidade de Belo Horizonte com vista da Gráfica Oliveira &
Costa................................................................................................................ 103
12.
Cia. Industrial Belo Horizonte (atual Cia. Renascença Industrial)
primeira grande indústria da capital.............................................................. 103
13.
Fachada do Café Brasil na Av. do Contorno - Lagoinha (1912)............... 104
14.
Vista do prédio que abrigava a Livraria e Papelaria Cardoso, à Rua
Rio de Janeiro esquina de Av. Amazonas (1920).................................... 105
15.
Armazém Baptista Júnior & Cia. à Av. do Contorno esquina com Rua
Grão Mogol - no bairro Sion......................................................................... 105
16.
Fachada do Armazém Dragão, à Av. Contagem no bairro Santa Inês 106
17.
Fachada da primeira loja da Drogaria Araújo, na rua dos Caetés, na
década de 1910............................................................................................. 106
18.
Mapa de Belo Horizonte, elaborado em 1922, com destaque para as
áreas de maior concentração do comércio e indústria portuguesa....... 116
19.
Festa junina realizada no Centro da Comunidade Luso-brasileira....... 118
LISTA DE TABELAS
1.
Emigração portuguesa global por regiões.......................................... 22
2.
Distribuição da população portuguesa no Brasil, por estados,
1929........................................................................................................... 23
3.
Entradas de imigrantes portugueses no Brasil – 1872-1939........... 24
4.
População e taxa de crescimento em Belo Horizonte (1890/1920) 62
5.
Idade dos portugueses proprietários de bares e padarias ........... 107
6.
Naturalidade dos portugueses................................................. 108
7.
Nacionalidade da mulher e prole.......................................................... 109
8.
Grau de instrução dos portugueses proprietários de bares e
padarias em Belo Horizonte .................................................................. 110
9.
Aspectos físicos dos prédios que abrigam os bares e padarias..... 112
10.
Participação de familiares na empresa comercial.............................. 113
RESUMO
Procurou-se analisar a participação do imigrante português na
construção da Nova Capital de Minas Gerais, abrangendo o período de 1897 a
1930. Foi realizado um vasto levantamento dos documentos da época bem
como entrevistados portugueses e descendentes aqui residentes que tiveram
participação direta ou indireta na formação de Belo Horizonte. Percebe-se até
hoje a importância da participação do imigrante português e do Centro da
Comunidade Luso Brasileira no desenvolvimento da nova capital.
ABSTRACT
We tried to analyze the participation of the Portuguese immigrant on
the construction of the New Capital of the State of Minas Gerais, from 1897 to
1930. It was carried out a study on documents regarding that period as well as
fulfilled an interview with Portuguese and their descendent who live in Belo
Horizonte and that were involved with the construction of the city. It can be
noticed, till now, the importance of Portuguese participation as well as of
Centro da Comunidade Luso Brasileiro in the development of the new capital.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
INTRODUÇÃO
A pesquisa sobre a questão da imigração portuguesa, em Belo
Horizonte, capital do Estado de Minas Gerais, se originou a partir da
preocupação de se conhecer com rigor a história da imigração dos
portugueses, nesta cidade.
Ao tentar desvendar esse aspecto, faz-se necessário uma
abordagem sistemática e profunda da história. Embora haja uma minoria de
pesquisadores que se dedicaram a este estudo, como Mourão (1945), Monteiro
(1973), Barbosa (1985) e Pereira (2001) há ainda uma escassez sobre o tema,
tanto na produção historiográfica lusa quanto na brasileira.
Entretanto, a questão da imigração portuguesa em Minas Gerais,
especificamente em Belo Horizonte, tem despertado interesse entre os
pesquisadores mineiros. O quotidiano dos portugueses, sua atuação, seu
trabalho, o seu legado cultural são de grande valia aos descendentes e até
mesmo não-descendentes, na cidade. Porém, a dispersão da produção
historiográfica pelas diversas universidades, centros ligados à cultura
portuguesa e outros órgãos, têm dificultado o acesso a essas informações.
Ao abordar o fenômeno imigratório português, no Brasil, verifica-se
que as dificuldades vão além daquelas que, normalmente, os estudiosos
encontram ao privilegiar o estudo de grupos imigrantes de outras
nacionalidades.
Sabe-se, também, que outras razões como os mecanismos de
inserção dos portugueses na sociedade receptora eram diferentes dos
utilizados por outros imigrantes estrangeiros. O fato de dominarem a língua do
país de acolhimento lhes conferia uma certa autonomia e vantagem em relação
aos demais. Além disso, a própria rede informal de solidariedade e amizade
funcionava entre eles. Os integrantes da sociedade de acolhimento mantinham
contatos com aqueles que se dirigiam à nova terra os quais dispunham de
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
auxílio como oportunidades de trabalho e acomodações. Sem contar que os
mesmos optavam por não passar pelos canais normais de acolhimento dos
imigrantes. Enquanto a maioria de outros imigrantes seguia para as fazendas
de café, os portugueses utilizavam os contados com amigos e parentes.
A imigração portuguesa para o Brasil atingiu o seu auge no período
de 1910
a 1914 mas, em conseqüência da primeira guerra mundial, houve uma
drástica redução da imigração em geral. De 1920 em diante, recomeçou o
fluxo imigratório de Portugal para o Brasil.
Em Minas Gerais, especificamente em Belo Horizonte, os
portugueses estiveram presentes desde os tempos da Fazenda do Cercado,
embrião da cidade, já época do Curral Del Rei, quando aconteciam as Entradas
e Bandeiras pelas Minas Gerais até a construção da nova capital, participando
dos trabalhos tanto do ponto de vista operacional como intelectual. O primeiro
cronista da colonização portuguesa foi um português, Alfredo Camarate.
Para este trabalho, a delimitação do tempo da imigração não é
importante. As informações para o desenvolvimento textual e conteudístico do
assunto estão em todo decorrer do processo imigratório, sendo os períodos
compreendidos entre o início da República e a Revolução de 1930 o de maior
significado para a imigração e colonização de Minas Gerais. Nascida sob o
signo de uma nova ordem na estrutura do país, com substituição do trabalho
escravo pelo trabalho livre, a Primeira República está vinculada ao processo
imigratório como solução para a carência de braços para a lavoura cafeeira
esteio da economia bem como o povoamento de áreas de baixa densidade
demográfica. Em Minas Gerais, os dois problemas são encontrados e se
interpenetram, da última década do século XIX à terceira do novo século. A
Revolução de 1930 rompeu com o latifúndio, a monocultura, a oligarquia,
dando nascimento a uma sociedade industrial e urbana.
É de grande proficuidade o estudo do papel dos imigrantes
portugueses em Belo Horizonte. Rever sua importância e sua participação na
construção do espaço central, no comércio e na política da Capital da Alterosa
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
é uma preocupação para a maioria dos historiadores que trabalham a questão
da colonização e imigração em Minas Gerais.
Fez-se, portanto, um recorte temporal (1897-1930) abrangendo
desde a fundação da Nova Capital até o processo de firmação e coesão dos
imigrantes portugueses com a cooperação do estado mineiro, que abarcará a
inauguração do "Centro da Comunidade Luso-Brasileira" (1912).
É importante frisar que foi escolhido esse período devido à
importância dos fatos históricos que marcaram com maior ênfase a imigração
estrangeira, sobretudo européia, para os países como o Brasil. Estes fatos
foram: Lei Áurea – 1888; Proclamação da República – 1889; Inauguração de
Belo Horizonte – 1897; Primeira Guerra Mundial – 1914; Quedada Bolsa de
Nova iorque – 1929 e Revoluçã de 1930 entre outros
Metodologia
Para recuperar a trajetória desses imigrantes, no Brasil,
especificamente Minas Gerais / Belo Horizonte, buscou-se informações junto
ao Consulado Português e às famílias de descendência portuguesa. Foram
também consultados dados estatísticos provenientes de publicações
vinculadas aos órgãos oficiais dos governos federal e estadual ligados ao
acolhimento dos imigrantes, bem como os jornais da época, revistas editadas
sobre o assunto e pesquisas em universidades.
A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas semi-
estruturadas
1
com os descendentes de famílias portuguesas, com funcionários
e diretores do Centro da Comunidade Luso-Brasileira, em Belo Horizonte, e
com professores universitários que se dedicam ao assunto. As entrevistas
foram elaboradas a partir de um embasamento histórico, na tentativa de
recuperar todas as informações e dados para a pesquisa. A História Oral, é
1
Entrevista semi-estruturada é aquela em que há liberdade total por parte do entrevistado, que poderá expressar suas
opiniões e sentimentos. A função do entrevistador é de incentivo, levando o informante a falar sobre determinado
assunto, sem, entretanto, forçá-lo a responder.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
constituída por um conjunto sistemático, diversificado e articulado de
depoimentos gravados em torno de um tema. A técnica de gravação de
entrevistas semi-estruturadas foi utilizada, por ser este um método capaz de
assegurar rigor, fidedignidade e riqueza técnica. Este método vem sendo
apontado como legítima fonte, visto que não induz a mais erros quando
comparada a outras fontes documentais e históricas. A amostragem utilizada
foi constituída por nove entrevistados a saber:
a. Entrevistado 1 - J. R. E. - nascido em Portugal;
b. Entrevistado 2 - J. T. A. C. - descendente;
c. Entrevistado 3 - M. A. S. S. - descendente;
d. Entrevistado 4 - J. F. A. - descendente;
e. Entrevistado 5 - A. L. - descendente;
f. Entrevistado 6 - J. M. N. - descendente;
g. Entrevistado 7 - F. A. N. - descendente;
h. Entrevistado 8 - A. M. R. - descendente;
i. Entrevistado 9 - A. N. - descendente.
Essas entrevistas foram conjugadas com o levantamento
bibliográfico além de investigações e pesquisas realizadas no Arquivo Público
Mineiro, Arquivo Municipal de Belo Horizonte, Museu Abílio Barreto,
Associação Comercial de Minas Gerais entre outros.
Problemática
Quanto à proposta deste trabalho, tenta-se mostrar como se deu a
imigração portuguesa em Belo Horizonte. Historiar-se-á o percurso que
conduziu o processo imigratório, fazendo, inicialmente, uma retomada histórica
da colonização, descrevendo e analisando os traços desses colonizadores
como a origem socioeconômica, a tradição político-cultural, as atitudes e
posturas oficiais em relação ao acolhimento de estrangeiros no estado, o
modus-operandi dos portugueses quanto à questão de sua sobrevivência e
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
adaptação na cidade, o legado cultural deixado por eles (culinária, folclore,
posturas européias) e a relação de trabalho em Belo Horizonte.
Justificativa
Sabe-se que a estreita e histórica ligação entre Portugal e o Brasil foi
construída numa relação política e econômica desigual entre a metrópole e a
colônia, e, mais tarde, entre os estados independentes. Alguns aspectos dessa
coexistência não são muito claros, entre eles, o da imigração.
Resgatar a história e o papel do Centro da Comunidade Luso-
brasileira, fundado em 1912, é o mesmo que resgatar a história dos imigrantes
lusitanos em Belo Horizonte, incorporando à pesquisa as suas atuações junto à
formação política, cultural e econômica da cidade planejada, assim como as
intenções do estado mineiro em manter a política imigrantista.
Objetivos
Objetivo geral
Analisar a formação institucional dos imigrantes portugueses em Belo
Horizonte, representados pelo Centro da Comunidade Luso-brasileira, no
período de 1897 -1930.
Objetivos específicos
a. Situar o processo histórico do período de 1897-1930, na trajetória da
colônia portuguesa em Belo Horizonte.
b. Investigar as mais importantes ações da instituição portuguesa, assim
como as trajetórias dos imigrantes que contribuíram na formação e
desenvolvimento da Nova Capital.
c. Contribuir para um maior entendimento da diversidade cultural
belorizontina, particularmente a referente aos imigrantes portugueses e
seus descendentes.
CAPÍTULO 1
IMIGRAÇÃO NO BRASIL
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
CAPÍTULO 1
IMIGRAÇÃO NO BRASIL
1.1 A emigração portuguesa para o Brasil – século XIX
Segundo Rodrigues (1999), o movimento imigratório de portugueses
para o Brasil foi o de mais longa duração, entre todas as nacionalidades que
para cá se dirigiam.
Os portugueses deixavam sua terra natal, fugindo das dificuldades e
privações decorrentes da conjuntura socioeconômica e da situação política de
Portugal, em alguns momentos de sua história.
As transformações econômicas e sociais sofridas por Portugal a
partir da segunda metade do século XIX, alterando as formas de produção e,
conseqüentemente, as relações de trabalho, contribuíram para este
movimento. A introdução de máquinas mais modernas no campo, afastando os
camponeses das terras mais férteis, o baixo nível tecnológico, o aumento do
custo de vida e dos preços dos alimentos, empobrecendo ainda mais a
população, e a obrigatoriedade do serviço militar, foram alguns dos motivos
que levaram os portugueses a emigrar, principalmente para o Brasil.
Foi em vão a política contrária à emigração feita pelo governo de
Portugal, pois ainda assim a emigração continuava a crescer até as vésperas
da Segunda Guerra Mundial.
Visando obter mão-de-obra para as diversas fases do processo de
desenvolvimento do país, no decorrer do século XIX, o Brasil estabeleceu uma
política imigratória que facilitava e estimulava a entrada de imigrantes,
principalmente portugueses. Era uma imigração tipicamente urbana.
Por volta de 1830, o café começava a substituir o açúcar, como o
principal produto brasileiro de exportação. Os Estados de São Paulo e do Rio
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
de Janeiro eram os principais centros produtores, utilizando-se da mão-de-
obra escrava para o trabalho nas lavouras.
O mercado internacional do café continua a crescer. A
Europa e os Estados Unidos compravam cada vez mais.
Com a sensível diminuição do número de escravos,
promovida pelas leis abolicionistas, era necessário
aumentar o numero de trabalhadores para garantir a
produção” (Rodrigues, 1999, p.11)
A partir de 1880 o regime escravista caminhava para o fim. Nas
regiões produtoras de café a pressão dos movimentos abolicionistas e as
fugas em massa, organizadas pelos próprios escravos, ameaçavam
desestruturar completamente a produção das fazendas. Tornava-se
fundamental trazer aquelas famílias que estavam deixando a Europa (Carnier
Júnior, 1999, p.19).
A adoção do trabalho livre e assalariado, após a abolição da
escravidão (1888), o pagamento das despesas de viagem pelo governo
brasileiro, a possibilidade de poupar e comprar terras, atraíram imigrantes de
diversas nacionalidades: italianos, alemães, espanhóis e principalmente os
portugueses. Porém, os imigrantes portugueses, que vieram nesse período
denominado “a grande imigração” ou ”imigração para as lavouras”, foram os
que menos utilizaram dessas facilidades. Somente se beneficiaram dessas
condições as famílias mais pobres, sem dinheiro para a viagem. Grande parte
se transferiu às suas próprias custas.
A riqueza gerada pelo café acelera o processo de industrialização e
urbanização nas regiões produtoras: São Paulo e Rio de Janeiro,
principalmente. Com a chegada dos imigrantes de várias nacionalidades,
aumentam a população e as necessidades de consumo. Com o aumento das
atividades comerciais e financeiras amplia-se o mercado de trabalho.
No Brasil, os imigrantes tinham ofertas de trabalho nas lavouras de
café e no comércio varejista, nas maiores cidades do país. Poderiam, ainda,
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
estabelecer-se nas colônias ou nos núcleos coloniais, como pequenos
proprietários de lotes.
Outros fatores influenciavam os portugueses a optar pelo Brasil
quando decidiam emigrar. A vantagem da mesma língua facilitava a
comunicação, o que permitia encontrar trabalho tão logo chegassem,
principalmente em profissões que exigiam contato com o público: vendedores,
condutores, sapateiros, caixeiros, negociantes. Afinal, a sociedade local era
fortemente dominada por portugueses. A religião, o catolicismo, comum aos
dois países, era outro determinante, pois, era sinal de que não haveria conflito
religioso. Havia o chamado de parentes e amigos aqui estabelecidos.
O mito do enriquecimento fácil no país, no começo do seu
desenvolvimento, foi na realidade um dos principais atrativos, não apenas para
os portugueses, mas para imigrantes de todas as nacionalidades.
Na procura de uma vida melhor, eles deixavam sua terra natal
dispostos a enfrentar toda sorte de obstáculos: os riscos da travessia
oceânica; as péssimas acomodações nos navios; os abusos nos preços das
passagens (quando vinham pôr conta própria); a má fé dos agentes da
companhia de emigração; as condições dos contratos de trabalho oferecidos e
as dificuldades de cumprimento desses contratos (Lobo, 1994, p.19).
Da segunda metade do século XVI até o começo do século XX, o
Brasil foi o principal centro de atração dos portugueses. Vindo desde o
descobrimento como colonizadores, após a Independência, foram os
portugueses que forneceram um dos maiores contingentes de imigrantes para
o Brasil, superando em certas épocas os italianos. Na década de 1930,
quando o Brasil impôs restrições a imigração, com cotas limites para
imigrantes de outros países, os portugueses foram liberados para entrar e sair
livremente do país (Oliveira, 2001).
Embora tenha sido a maior corrente imigratória para o Brasil no
período colonial, nos primeiros anos após a Independência (1822), o fluxo de
portugueses para o Brasil diminuiu. Recomeçaram a vir em maior número a
partir de 1853.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
A saída constante de grande contingente de pessoas chegou a
preocupar as autoridades portuguesas que, nesta época, como já acontecera
anteriormente, temiam o despovoamento do país. Em algumas ocasiões,
chegou a impor restrições legais à emigração. Se, por um lado, a saída de
grande número de pessoas transformou o Norte de Portugal em terras “de
homens que partem e mulheres que ficam”, por outro, este movimento também
beneficiou a economia de Portugal, em virtude da remessa de poupança dos
portugueses que aqui já estavam (Bardi, 1980, p.44).
Da época da mineração até meados do século XIX, a maioria dos
imigrantes portugueses que vieram para o Brasil era da província do Minho, na
região Norte de Portugal. Posteriormente começaram a vir imigrantes de
outras províncias: Trás-os-Montes, Douro, Beira Alta, Beira Litoral, dos distritos
do Porto, Braga, Viana do Castelo, Vila Real, Vizeu, Bragança, Leiria, Aveiro,
Coimbra, conforme mostra a TAB. 1 (Rodrigues, 1999, p.15).
Segundo Leite (1999, p.187), é possível distinguir três grupos
principais de imigrantes portugueses: os que emigravam com a finalidade de
obter uma carreira profissional, os que emigravam para adquirir uma poupança
e os que emigravam para fugir de uma situação de crise.
O primeiro grupo, o mais persistente, atravessando várias épocas
do fluxo da imigração portuguesa, compunha-se de jovens do sexo masculino,
alfabetizados, já com contatos previamente estabelecidos por familiares e
amigos. Eram, geralmente oriundos do Norte, especialmente da região do
Minho.
O segundo grupo era constituído de artesãos, indivíduos adultos,
por vezes casados e com experiência em alguma profissão. Trabalhavam no
Brasil e depois regressavam para Portugal. O terceiro era constituído por
emigrantes que vinham em grupos familiares, impelidos por uma situação
econômica difícil.
Havia também pessoas que, nas épocas de quebra de produção e
falta de empregos, emigravam, precipitadamente, sem garantias, entregando-
se nas mãos dos comandantes dos navios. Nos portos brasileiros ficavam
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
retidos até que algum patrão pagasse sua passagem, em troca de um contrato
em que o imigrante se comprometia a trabalhar durante um certo tempo, para
ressarcir as despesas (Rodrigues, 1999, p.15).
TABELA 1
Emigração portuguesa global por regiões
Ano
Localidades 1871 - 1880 1882-1886 1896-1898 1911-1913
Porto 2.471 2.867 3.845 6.198
Aveiro 1.027 959 2.509 5.992
Braga 973 1.128 1.497 4.123
Viana 390 693 947 2.560
Vizeu 390 1.474 2.699 10.156
Vila Real 344 791 1.936 6.658
Coimbra 189 1.162 2.172 6.213
Bragança - - 939 8.675
Faro - - - 1.087
Guarda - - 1.194 6.190
Leiria - - 799 4.229
Fonte: Lobo, 1994, p.21.
Os imigrantes portugueses fixaram-se, especialmente, em Minas
Gerais, Bahia, Pernambuco, Pará, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Em
menor número, foram para outros estados. O maior contingente, no entanto,
dirigiu-se para a cidade de São Paulo e para o Rio de Janeiro. Exerceram
profissões como: carregadores no porto, vendedores ambulantes, sapateiros,
trabalhadores em padarias, pescadores, motoristas, carvoeiros, leiteiros.
Alguns vieram para trabalhar em lojas ou armazéns de comerciantes
portugueses já estabelecidos (TAB. 2).
Tenderam menos aos trabalhos agrícolas do que os imigrantes
italianos, espanhóis e alemães.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Embora houvesse um número menos importante deles
empregados na lavoura, a maioria, pelo menos em São
Paulo, dedicou-se aos trabalhos nas ferrovias, às
atividades artesanais e manufaturarias (especializadas ou
não) aos serviços e ao comércio em geral” (Bassanezi,
s.d., p.16).
O Rio de Janeiro atraiu grande número de portugueses e foi onde
se concentrou o maior número deles, no Brasil. Entre 1903 e 1905,
correspondia a um terço da população da cidade (Diegues Jr., 1964, p.5).
TABELA 2
Distribuição da população portuguesa no Brasil, por estados, 1929
Estado População Estado População
Rio de Janeiro 303.865 Sergipe 137
São Paulo 281.418 Alagoas 260
Mato Grosso 1.572 Pernambuco 5.289
Goiás 334 Paraíba 144
Minas Gerais 20.050 Rio Grande do Norte 89
Santa Catarina 556 Ceará 325
Paraná 1.998 Piauí 72
Espírito Santo 1.900 Maranhão 587
Bahia 3.679 Pará 15.631
Amazonas 8.376
Fonte: Lobo, 1994, p.38.
Devido a problemas políticos em Portugal, ocasionados pela queda
da monarquia, em 1910, alguns portugueses de boa situação financeira
emigram para o Brasil, aplicando seu capital na compra de imóveis, no
estabelecimento de bares, restaurantes e padarias e na implantação de
indústrias.
A imigração portuguesa para o Brasil atingiu o seu auge no período
de 1910 a 1914. Em conseqüência da Primeira Guerra Mundial, houve uma
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
drástica redução da imigração em geral. De 1920 em diante, recomeçou o
fluxo imigratório de portugueses para o Brasil.
Em 1920, a população brasileira era de 30 milhões de habitantes,
sendo 1.565.961 estrangeiros, dos quais 433.567 eram portugueses,
distribuídos por cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Belém, Manaus e
Recife, entre outras (TAB. 3).
Em conseqüência da crise econômica mundial de 1929, o Brasil
restringiu a imigração. Nesse período diminuiu o número de imigrantes
europeus, inclusive de portugueses.
TABELA 3
Entradas de imigrantes portugueses no Brasil – 1872-1939
Período Número de pessoas
1872-1879 55.027
1880-1889 104.690
1890-1899 219.353
1900-1909 195.585
1910-1919 318.481
1920-1929 301.915
1930-1939 102.743
Total 1.297.794
Fonte: Bassanezi, s.d., p.7.
Em geral, os imigrantes portugueses partiam dos portos
portugueses da cidade de Lisboa, de Leixões, no distrito do Porto e de
Funchal, na Ilha da Madeira. Por volta de 1850, o transporte era feito por
navios à vela. Na década de 1870, a viagem já começa a ser feita em navios a
vapor.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Os veleiros levavam, em média, 48 dias para chegar ao Brasil; já os
vapores de 1870 conseguiam reduzir a viagem para 24 dias. Sem escalas, de
Lisboa ao Rio de Janeiro, chegavam a fazer em 15 dias.
A companhia marítima, conhecida em Portugal e no Brasil como a
Mala Real Britânica, foi a primeira a estabelecer uma relação regular com a
América do Sul e manteve a primazia até a Primeira Guerra Mundial. Embora
outras companhias tenham participado no transporte de passageiros
(francesas, belgas, alemãs), a Mala Real Britânica e a Companhia de
Navegação do Paciífico, também inglesa, foram as duas companhias que mais
transportaram emigrantes portugueses para o Brasil (Imagens..., 1992).
As embarcações tinham apenas três classes. A terceira classe era
conhecida como “a classe imigrante”. De 1920 em diante, muitos navios
passaram a trafegar com quatro categorias: primeira, segunda e terceira
classes com cabines e, a quarta, reservada aos imigrantes. Na “classe
imigrante” vinham amontoados, em porões adaptados, abafados, mal
iluminados e geralmente superlotados, onde reinavam más condições de
higiene que, não raro, acarretavam doenças. Com as constantes denúncias
das péssimas condições de viagem oferecidas aos imigrantes, aos poucos, as
companhias marítimas foram melhorando as instalações dos navios (Scott,
2001).
No final do século XIX, os principais portos de desembarque no
Brasil eram os portos do Rio de Janeiro e o de Santos, no Estado de São
Paulo. Os imigrantes que entravam no país pelo Rio de Janeiro eram alojados
na Hospedaria da Ilha das Flores e Horta Barbosa em Juiz de Fora/MG.
Além do Rio de Janeiro, o Estado de São Paulo tornou-se também
centro de atração para onde se dirigiu grande contingente de imigrantes
portugueses. O pagamento das despesas de viagem pelo governo e a
promessa de pagamento de salários contribuíram para aumentar o número de
emigrantes que vinham para as fazendas de café do interior paulista.
O grande movimento imigratório de portugueses em São Paulo deu-
se entre os anos de 1884 e 1936. Desembarcados no porto de Santos muitos
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
se dirigiam para a cidade do Rio de Janeiro. Outros, em menor quantidade,
deram entrada na Hospedaria de Imigrantes, localizada no Brás, em São
Paulo, indo em seguida para o interior do estado, fixando-se em cidades,
como: Piracicaba, São José do Rio Preto, Jaboticabal, Araraquara, Monte Mor,
Mogi-Guaçu, Campinas, Santa Bárbara d’Oeste, Amparo, entre outras. Muitos
se estabeleceram em Santos e São Vicente, no litoral ou ficaram na capital do
estado para trabalhar em atividades ligadas ao comércio. Formaram colônias
como, por exemplo, Nova Louzã, situada a poucos quilômetros da capital ou
foram para núcleos coloniais no interior do estado (Imagens..., 1992).
Muitos dos portugueses que vieram para a cidade de São Paulo, na
década de 1930, dedicaram-se ao trabalho em padarias e em bares, como
proprietários ou empregados, motorneiros de bonde, motoristas de táxi,
jardineiros, tirador de areia do Rio Tietê e comerciários. Muitas das mulheres,
vindas sozinhas, empregavam-se nas fábricas, tornavam-se domésticas ou
lavadeiras.
Por volta de 1930, a cidade de São Paulo, concentrava a maioria
dos portugueses no país. Com pouco mais de 1.000.000 de habitantes, perto
de 80.000 eram portugueses, distribuídos nos mais variados ramos de
atividades. Na década de 30, cerca de 40% do total da população de São
Paulo eram portugueses. Santo André e Guarulhos, neste mesmo período,
recebeu também um número significante de portugueses (Scott, 2001).
No século XIX, foi expressiva a presença de portugueses na
economia brasileira, na qual sempre ocupavam uma posição destacada na
indústria, no comércio e na área financeira. Mesmo no comércio de café, eles
se sobressaíam. Distinguiam-se como proprietários de agências exportadoras
e como ensacadores.
Os portugueses ainda investiram no ramo de importação /
exportação, comércio varejista de secos e molhados, vestuário, peças de ferro,
louça, jóias, fabricação de vinhos e construção civil. Eram proprietários de
farmácias, padarias, confeitarias, pastelarias, bares e gráficas, lavanderias,
hotéis, restaurantes, açougues, mercearias, lojas de roupas.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Em 1903, o imigrante português Albino de Souza Cruz
fundou, no Rio de Janeiro, a fábrica de cigarros Souza
Cruz. Mais tarde, o controle acionário foi adquirido por
uma firma inglesa, mas, seu fundador continuou como
presidente” (Diegues Jr, 1964, p. 11).
Finalmente, o Brasil abriga hoje uma das maiores comunidades
lusitanas fora de Portugal. Considerando-se imigrantes e descendentes, são
mais de um milhão de portugueses espalhados por todos os estados
brasileiros. As maiores concentrações, no entanto, estão nas cidades de São
Paulo e Rio de Janeiro.
CAPÍTULO 2
IMIGRAÇÃO EM MINAS GERAIS
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
CAPÍTULO 2
IMIGRAÇÃO EM MINAS GERAIS E BELO HORIZONTE
2.1 Retomada histórica
Com o início da transição da economia pecuarista para a economia
agrícola no século XVIII, que só se efetiva verdadeiramente nos primórdios do
século XIX, Minas Gerais, refletindo a política do Governo do Império, volta-se
para o povoamento de seu solo, por meio da criação de núcleos coloniais
(Minas Gerais, 2002).
Ao contrário de outras províncias do País, o problema da mão-de-
obra, no século XIX, não foi tão grave. Possuindo a maior população escrava
2
,
foi fácil seu desvio da mineração decadente para a agricultura, principalmente
para a lavoura cafeeira da Zona da Mata e do Sul.
O meio rural reagiu à introdução do trabalhador livre. Mais do que
nunca, passou-se a acreditar que o braço escravo era o único capaz de se
adaptar à lavoura do café. Raros foram os fazendeiros que imitaram o exemplo
paulista, atraindo trabalhadores livres, estrangeiros para suas propriedades.
Enquanto, São Paulo, com a economia cafeeira, investiu na introdução do
imigrante, em Minas, predominou o escravo, com uma alta concentração de
população escrava nas áreas cafeeiras.
A política de colonização do Governo Provincial mineiro iniciou-se
com a Lei Imperial n
o
514, de 28 de outubro de 1848. Ela determinava a
concessão, a cada Província do Império, de seis léguas em quadra de terras
devolutas para a colonização. A concessão tinha como objetivo atender à
realidade de cada Província, criando condições de se obter indiretamente mão-
de-obra para suprir a lavoura, ameaçada com a abolição do tráfico negreiro.
2
Pelo censo de 1872, Minas Gerais possuía 370.459 escravos. Mesmo com a abolição, ainda havia, na
Província, um grande número deles. Xavier da Veiga, no livro Efemérides Minas, confirma este censo.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Para atingir seu objetivo, contava o Império com o imigrante europeu (Minas
Gerais, 2002).
Na Europa, em 1848, aumentaram as correntes imigratórias,
passando o Brasil a receber elementos, principalmente de origem alemã.
A colonização se dava a partir da colaboração do Governo Imperial,
Provincial e particulares. Foram construídas sociedades ou companhias de
colonização para a entrada de imigrantes e a criação de núcleos coloniais
localizados, principalmente, às margens de ferrovias e estradas de rodagem
em construção. Esses, além da prestação de serviço nas obras por meio do
trabalho assalariado, tinham o direito do acesso à terra, tornando-se pequenos
proprietários. Eram os objetivos do governo de Minas Gerais obter a mão-de-
obra disponível e povoar a província, por meio da contribuição estrangeira
(Minas Gerais, 2002).
Em 1856, a Companhia de Navegação e Comércio do Mucuri e a
Companhia União e Indústria de Juiz de Fora iniciaram, para a construção de
estradas em seus municípios, a introdução de famílias de imigrantes, em sua
maioria de nacionalidade alemã e portuguesa (Timmers, 1969, p.73).
Na sua obra colonizadora, a província de Minas Gerais estabeleceu
um núcleo colonial, em 1867, às margens do Rio das Velhas, para 63
imigrantes norte-americanos, descontentes com a guerra civil que assolava o
Sul de seu país. Não houve sucesso. Esses se dispersaram, em 1869, pois o
governo não cuidara de realizar a demarcação de terras (Monteiro, 1973, p.71).
A autora relata, ainda, que embora houvesse preocupação do
governo provincial com a política de povoamento em Minas, por meio de
colônias, os resultados desse empreendimento foram muito modestos. A falta
de recursos financeiros, o desinteresse dos particulares reduziu a política
colonizadora aos núcleos D. Pedro II, Mucuri e Urucu, que, mesmo com muitas
dificuldades, conseguiram progredir. Contudo, foram emancipadas as colônias
de Mucuri e de Urucu pelo decreto Imperial n
o
6.368.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Segundo Norma Goes Monteiro, além das colônias, o que havia
eram pequenos contingentes de portugueses, um ou outro italiano, espalhados
nos centros urbanos, ligados às atividades do comércio. As grandes tentativas
de formação de colônias verificam-se na década de 80, quando a escravatura
caminha para seu fim.
As razões que impediram a verdadeira concretização da colonização
em Minas foram: a falta de mercado consumidor o país era dominado por
uma economia voltada para a exportação, estruturada no latifúndio; a
monopolização das melhores terras cafeeiras, deixando para os imigrantes os
lugares distantes e pouco produtivos.
Ao mesmo tempo que estabelecia a obrigatoriedade de
aquisição de terras devolutas pela compra, legitimava
todas as posses verificadas sem cogitar de sua extensão,
desde que se achassem realmente cultivadas, ou com
princípio de cultura ou morada habitual” (Lima, 1954, p.47).
Não obstante tudo isso, Minas, ao iniciar a década dos oitenta, tenta
encaminhar imigrantes para as fazendas de café. Com a Lei Provincial nº
2.819, de 24 de outubro de 1881, foram concedidos aos proprietários agrícolas
a título de auxílio, uma subvenção correspondente à metade das despesas de
transporte de cada colono estrangeiro para que os mesmos se engajassem
para o custeio e cultivo de suas lavouras. Porém, até agosto de 1883, apenas
203 imigrantes tinham sido introduzidos, resultando numa revogação do
contrato, sob a alegação de que isso era bastante oneroso e improdutivo
(Minas Gerais, 2002).
Após a promulgação da Lei dos Sexagenários, em 1875, o Governo
Provincial, com o propósito de desenvolver, com maior rigor, a imigração e
colonização, sancionou algumas leis, sistematizando a introdução e localização
do imigrante. Assim, o Serviço de Imigração e Colonização foi objeto da Lei
Provincial n
o
3.417, de 26 de agosto de 1887, que fala do auxílio financeiro do
governo aos imigrantes da Europa, Ilha dos Açores, Canárias e Tenerife, que
se estabelecessem na província como proprietários ou locadores de serviços.
Foram criados também núcleos coloniais às margens das Estradas de Ferro
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Minas e Rio, Mogiana, Oeste de Minas, Leopoldina, Bahia e Minas, e também,
às margens do Rio das Velhas. Decreta a construção de uma hospedaria em
Juiz de Fora para recebimento gratuito de imigrantes, durante dez dias (Silva,
2002, p.90).
Propunha, ainda, a publicação de uma notícia sobre Minas, ainda
parte da promoção da propaganda na Europa. Logo em seguida, a Assembléia
Legislativa Provincial votava lei autorizando o Poder Público a despender a
quantia de 1:000:000$000 com a introdução de estrangeiros (Silva, 2002, p.91).
A inauguração da nova política se deu com a fundação, em Juiz de
Fora, da Associação Promotora de Imigração, para incrementar a vinda de
imigrantes europeus para Província de Minas. "Era uma sociedade particular,
constituída por elementos representativos dos interesses econômicos da Zona
da Mata” (Silva, 2002, p. 91).
Com a Lei Provincial nº 3.598, de 6 de dezembro de 1888, outro
contrato era celebrado pelo governo, com os engenheiros Joaquim Machado
Fagundes Melo e Manuel Caetano da Silva Lara, por intermédio da Companhia
de Imigração e Colonização Mineira. Fica estabelecida a entrada e localização
de vinte e cinco mil imigrantes no Sul da Província, a principiar em julho de
1889. Era a expansão da lavoura cafeeira do Sul de Minas, necessitando de
mão-de-obra. Foram criados, nos municípios de Mar de Espanha e São João
Nepomuceno, o Centro Municipal de Imigração e o Centro Mineiro de
Imigração, respectivamente, considerados típicas hospedarias (Jornal Minas
Gerais, 1925).
A Hospedaria de Juiz de Fora criada pela lei n. 3.417 foi a mais
importante devido à sua localização era o principal centro da Zona da Mata e
tornar-se-ia fácil a distribuição dos imigrantes pelos vários municípios da região
(FIG. 1). Vale lembrar que, para maior controle, foi criada a Inspetoria-Geral de
Imigração em Juiz de Fora. Ela estabelecia normas para o funcionamento da
hospedaria de imigrantes e para a criação de núcleos coloniais oficiais e
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
particulares – Regulamento n
o
108 de 1888, Governo Provincial (Silva, 2002,
p.91).
FIGURA 1 - Localização dos núcleos coloniais de imigrantes na região do
Estado de Minas Gerais (1923)
Fonte: Imagem cedida pelo Arquivo Público Mineiro (Acervo)
Além disso, fixava os direitos que seriam concedidos aos imigrantes
colonos como: hospedagem por dez dias na Hospedaria, passagem para todos
os membros da família mais os fretes para bagagem. Também seria oferecido
um auxilio em dinheiro de 90$000 a cada um dos imigrantes, maiores de doze
anos que trabalhassem na lavoura ou, então, em estabelecimentos industriais
de capital superior a 70.000$000, 90 dias depois do seu estabelecimento na
província. Todo núcleo criado era obrigado a manter uma escola de ensino
primário; o regulamento também estabelecia que o imigrante que fosse
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
trabalhar em núcleos particulares receberia 20$000 do governo como auxilio. O
trabalhador nacional ficava fora das vantagens oferecidas pelo governo ao
imigrante estrangeiro, pois a vinda deles é o que realmente interessava às
autoridades. A discriminação contra o trabalhador nacional estava também no
número de lotes vendidos a eles que não podia exceder a 15%, do total de
cada núcleo criado (Jornal Minas Gerais, 1925).
Mesmo depois de 1885 e com a Lei n
o
3.270, a entrada de
imigrantes na Província era bastante modesta. Nos anos de 1886 a 1887, de
um total de 77.276 entradas pelo Porto do Rio de Janeiro, somente uma cota
inexpressiva de 2,9% entrava em Minas. Alegava-se que havia certa
repugnância por parte da lavoura, na aceitação dos novos trabalhadores. Em
Minas, foi criada a sociedade beneficente que controlava esses desacertos
(Silva, 2002, p. 93).
Em Leopoldina, havia a Sociedade Portuguesa
Beneficente, fundada a 2 de dezembro de 1888. Era
constituída por número ilimitado de sócios, de ambos os
sexos. Tinham por fim socorrer seus sócios quando
enfermos ou inválidos; concorrer para o transporte dos
que provassem necessidade de se ausentarem por se
encontrarem enfermos, para fora ou dentro do País,
prestar auxílio para funeral dos que morriam ou dar uma
pensão à família destes. Por outro lado, a Sociedade
propunha-se a defendê-los de acusações injustas,
arbitrárias, perante a Justiça do País” (Minas Gerais, 1988).
Por não haver uma entrada significante de imigrantes, em 22 de
outubro de 1889, o Governo de Minas Gerais rescindiu o contrato com a
companhia de Imigração e Colonização Mineira. Logo após a Proclamação da
República, a Inspetoria Geral de Imigração foi suspensa, alterando a corrente
imigratória em Minas, sob a alegação de que a mesma não alcançava
resultados mínimos, no sentido do povoamento do solo e auxílio à agricultura.
Considerava que não havia razão para a existência desse órgão, e foram
determinados auxílios à construção de casas para as famílias de colonos,
devido à supressão da Inspetoria-Geral de Colonização (Minas Gerais, 1934).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Com a Constituição Federal, em 24 de fevereiro de 1891, o
problema imigratório toma novo aspecto. Dentro dos princípios federalistas de
descentralização administrativa, a imigração passa a ser promovida e
incrementada pelos governos estaduais. Minas Gerais é beneficiada pelas
diversas leis que surgiram para essa política criação da Companhia
Metropolitana, que estabelecia o número total de imigrantes, cabendo a ele
iniciar sua própria política (Jornal Minas Gerais, 1899).
2.2 Imigração e colonização em Minas Gerais: italiana, alemã,
portuguesa, espanhola e outras
Uma das principais fontes de pesquisa com relação à questão da
imigração no Estado é a tese transformada em livro de Norma Góes Monteiro
“Imigração e colonização em Minas”, que trata aspectos fundamentais ao tema.
Segundo a mesma, o problema imigratório em Minas teve início,
modestamente, no ultimo quarto do século XIX, tendo a idéia surgida em
decorrência da necessidade da província em povoar algumas áreas. Os
resultados, porém, não foram favoráveis. Posteriormente, passou a haver uma
preocupação por parte de alguns fazendeiros rurais de incrementar, como em
São Paulo, a vinda de imigrantes, principalmente para atender a zona de Juiz
de Fora (Monteiro, 1973).
Com a implantação do regime republicano, o governo provisório
tentou estimular uma legislação favorável à entrada e à permanência de
estrangeiros no Brasil, com vistas ao desenvolvimento das forcas produtivas e
aumento demográfico. A falta de uma linha de ação resultou apenas em uma
improvisação desta política. Em um segundo momento, cabe ao Congresso
Nacional as despesas com a imigração, mas este tinha como prioridade a nova
constituição, assim como o governo central e o provisório estadual estavam
mais preocupados em organizarem-se do que resolver o problema da mão-de-
obra e povoamento (Jornal Minas Gerais, 1997).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Com a adoção da forma federalista de governo, através da
Constituição de 1891, os estados assumiram, entre outras competências, a de
legislar sobre imigração, colonização e terras devolutas, o que se estende até
1930. O processo tem duas formas bem distintas: a primeira se estende de
1892 até1907: especificamente, a política de imigração visa atender a força de
trabalho, fornecendo braços para as lavouras do café, necessidade provocada
pelo êxodo do escravo para outras áreas do estado. O café era a prioridade.
Para estimular a vinda do estrangeiro, o governo de Minas organiza, na Itália,
uma superintendência para arregimentar imigrantes, dividindo o estado em
distritos imigratórios. Reestimula-se a Hospedaria Horta Barbosa, de Juiz de
Fora, para os que chegam do porto do Rio de Janeiro e o governo mineiro,
além das passagens, promete facilidades para adquirir terras, seja no estado,
seja nos núcleos coloniais, seja nos lotes resultantes da divisão das
propriedades particulares formando as colônias agrícolas. Esta fase foi a de
incrementação da imigração e colonização em Minas. A atuação da
superintendência, através de David Campista, (Secretário de Estado dos
Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, em 1894) foi muito
eficiente: na Itália, ele fazia a propaganda de Minas, além da seleção de
pessoal, controle de transporte e das passagens. De 1894 a 1907, a
Hospedaria Horta Barbosa aponta a entrada de 52.582 estrangeiros,
localizados nas lavouras de café da zona da Mata e sul (Jornal Minas Gerais,
1925).
A construção de Belo Horizonte está incluída nesta primeira fase: a
nova capital necessitava de operários especializados para sua construção,
como mestres, pedreiros, artífices, marmoristas, etc. Em torno dela vão
aparecer os seguintes núcleos suburbanos: o de Carlos Prates e o Américo
Werneck. Depois o do Córrego do Leitão, o do Acaba Mundo e o do Cardoso
que recebe os nomes de Colônia Afonso Pena, Bias Fortes e Adalberto Ferraz.
Segundo Monteiro (1973), até 1907, a imigração, com exceção de Belo
Horizonte, veio atender a falta de braços, no mesmo sincronismo de São Paulo:
cafeicultura x imigração.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
A autora relata que a segunda fase, entre 1907 e 1930, vai estar
condicionada ao povoamento do território por meio de criação de núcleos
coloniais e com cessão de terras devolutas. Nesse período, 14 núcleos foram
instalados no estado, mas a deflagração da primeira guerra diminuiu o fluxo de
imigração. Na década de 20, mais oito núcleos são implantados. Com o
objetivo de tornar o povoamento mais atraente, o governo tomou a iniciativa de
facilitar a aquisição de pequenas propriedades nos núcleos. Em um período de
23 anos, foram instalados 30 núcleos e o número de imigrantes atingiu pouco
mais de 10 mil considerando um resultado bastante modesto. O povoamento
por terras devolutas não aconteceu: a concessão gratuita de terra oferecia
tantas dificuldades e pré-requisitos que o imigrante desanimava de fixar-se em
Minas. Isso porque as terras devolutas significavam fonte de renda e poder
político para o estado. Ao invés de tomar a iniciativa, o governo estimulava
empresas particulares a criar núcleos coloniais. Em resumo: ele não aproveitou
as terras devolutas usadas racionalmente em beneficio do povoamento por
apego as terras dos políticos, senhores das terras, exceto os núcleos criados
em torno da capital e outros, junto das estradas de ferro Oeste de Minas
Paracatu, Central do Brasil, Vitória Minas, Bahia Minas, e os localizados na
zona da Mata e sul, onde o governo, por não possuir terras devolutas, as
adquiriu pelo preço de interesse político.
Industrialmente, a participação do imigrante foi insignificante para
Minas se levar em conta que pelo senso de 20, 68% das industrias paulistas
pertenciam a italianos e em Minas os dados acusavam 7%. O italiano foi, sem
dúvida, o imigrante mais importante, o que mais se fixou no Brasil e em Minas
Gerais. Sua contribuição pode ser percebida no sul introduzindo uma cultura de
vinho, com alguma expressão econômica em Barbacena com a introdução da
conhecida seda de Barbacena, através do cultivo da amoreira no núcleo
colonial Rodrigo Silva. Também no sul, a área de laticínios sofreu algumas
introduções tecnológicas. Isto sem contar a contribuição dos homens
dedicados à construção que renovaram a fisionomia urbana, com os novos
estilos, construindo edifícios e casas com vantagens estéticas e ecológicas.
Uma outra característica interessante: os núcleos coloniais não se
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
transformaram em cidades, como no sul do Brasil, pois, edificados em locais
próximos aos centros consumidores, foram absorvidos pela área urbana, como
aconteceu em Belo Horizonte com os bairros Carlos Prates, Lagoinha, Horto,
Santa Efigênia; os mais distantes integraram áreas suburbanas como o bairro
do Barreiro (Minas Gerais, 2002).
2.3 Fracasso da imigração e colonização do interior de Minas
Gerais
“O Brasil é um paraíso! E por causa dessa mentira nos
chegamos aqui” O relato é de uma imigrante da
Alemanha, um dos primeiros países a abrir a corrente
imigratória em Minas, em 1856, no vale do Mucuri, Leste
de Minas, núcleo pioneiro de ocupação estrangeira, numa
epopéia que mistura drama, mortes e guerra entre índios
e brancos em uma terra sem lei” (Fundação João
Pinheiro, 1993, p.45).
Segundo Monteiro (1973), o imigrante aponta para o verdadeiro
fracasso da política de imigração e de colonização do Governo de Minas, que
durou de 1892 - antes já existiam colônias expressivas de alemães, italianos e
portugueses - até meados da República, em 1930.
O problema na época estava relacionado com a própria
política do Governo. Em situação contraditória, o Estado
tinha grandes áreas de terras devolutas, mas não fez
absolutamente nada. Oferecia a terra aos governantes
como moeda política. Forte também era o encontro dos
interesses do Estado com os do latifúndio” (Monteiro,
1973, p.76).
O desinteresse do governo e dos proprietários em trazerem
imigrantes tinha um motivo muito forte, antes e um pouco depois de 1888, ano
da Abolição da Escravatura, Minas tinha o maior contingente negro e escravo
do país, enquanto São Paulo já estava em pleno desenvolvimento econômico,
com a mão-de-obra estrangeira operando em larga escala.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
A não coexistência do trabalho livre com o escravo foi a
grande responsável pelo afastamento do imigrante, no
momento em que Minas mais precisava. Depois do
período do ouro e dos diamantes, entrou em um processo
de economia interna, de sustentação da corte” (Monteiro,
1973, p.73).
A batelada de leis, decretos e regulamentos não cumpridos
”maquiava”, durante a ação do governo na imigração, o verdadeiro obstáculo
para deslanchar o processo imigratório em Minas.
Havia pouca administração e muita política. Minas
liderava a política nacional, mas empobrecia. Faltou ao
Governo iniciativa e coragem para usar os recursos para
o desenvolvimento econômico do Estado. E por outro
lado, o apego à propriedade por parte do políticos, em
geral senhores de terra, foram obstáculos ao crescimento
econômico” (Monteiro, 1973, p.74).
Os fazendeiros mineiros, ao contrário dos paulistas, não ficaram
empolgados com a possibilidade de “importar” trabalhadores europeus. Os
motivos são os mais diversos: abundância de mão-de-obra livre (Minas no
século XIX tinha a maior população do país) e defasagem salarial entre os
fazendeiros de café dos dois estados (que provocou uma forte evasão de
Minas para São Paulo).
De 1892, quando começa a política de imigração em
Minas, até a revolução de 1930, não houve nenhuma
mudança nas ações de migração pelo governo de Minas,
só muitas leis não cumpridas” (Monteiro, 1973, p.83).
Em 1904, o sistema de migração, em Minas, chega ao fundo do
poço. Por falta de investimentos, são fechadas as hospedarias para os
estrangeiros que chegam, acaba o Serviço de Imigração e a recém-criada
Superintendência na Europa, com sede na Itália e depois em Portugal.
Durante todo o tempo de política pública de controle e acesso do
imigrante (1892-1907) em Minas Gerais, segundo Monteiro (1973), o estado
teve apenas três áreas de relativo desenvolvimento: Belo Horizonte – que
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
acabava de ser inaugurada - Sul de Minas e Zona da Mata, que teve
urbanização precoce com a presença de imigrantes alemães e pela
proximidade com o Governo Central, no Rio de Janeiro.
Em 1907, depois da crise do café, o crescimento da imigração em
Minas estava restrito aos núcleos coloniais, que de 1879 até 1930 foram 29.
“Depois disso a imigração se deu de forma residual. Até
porque o momento dos imigrantes já tinha passado, com
o fim da escravidão e início do trabalho livre e de
ocupação urbana. Tinha chegado a hora de dar emprego
e salário para os trabalhadores nacionais, que já viviam
em intensa migração pelo próprio país, alguns até
substituindo a mão-de-obra escrava e estrangeira
(Monteiro, 1973, p.94).
Segundo a autora, a colaboração dos imigrantes estrangeiros no
meio rural em Minas, como assalariado ou colono, “teve algum significado”. Já
no processo de industrialização tardia de Minas Gerais, “foi insignificante”. Para
se ter uma idéia, só em 1921, instala-se em Sabará, o primeiro
empreendimento de grande porte em Minas, a Companhia Siderúrgica Belgo
Mineira, iniciativa de franceses, belgas e luxemburguenses.
Esse empreendimento é o primeiro que se fez de grande vulto no
país, instaurando a indústria pesada, até então inexistente. Minas vive seu
grande momento, na superação das pequenas fábricas ou simples forjas, que
tiveram seu desenvolvimento a partir do Decreto n. 1.516 de 2 de maio de
1902, logo após a inauguração da capital mineira
A política imigratória e colonizadora é bem um reflexo da
mentalidade oficial; tímida e sem qualquer ousadia. Faltava ao quadro dirigente
a compreensão da política no sentido largo, com sensibilidade para o social e o
econômico. Os governos mineiros entregues quase só ao jogo político no que
ele tem de imediato e superficial, não alargaram seu horizonte para a
industrialização, como Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul. Em
1920, Minas, no processo industrial brasileiro, aparece num modesto sexto
lugar comparado a esses estados e ao Distrito Federal e Paraná.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Neste período, há em Minas Gerais 1.060 fábricas, quase todas de
acanhado alcance: 77 de tecidos, 97 curtumes, 128 olarias de tijolos, 141
cerâmicas, 541 de alimentos e 76 metalúrgicas.
Minas Gerais é um estado político, há algum crescimento no setor
têxtil, mas, segundo o censo de 1920, o estado ainda não consegue oferecer
oportunidade de trabalho a todos os mineiros que iniciam uma interminável
imigração rumo a São Paulo e Paraná.
Na contramão dos emigrantes mineiros, entram, no estado 2.016
imigrantes europeus, a maioria portugueses movidos pelo sonho da
prosperidade da nova capital mineira, Belo Horizonte, implantando nesta
algumas indústrias, como a Serraria Souza Pinto, fundada pelos portugueses
Antônio Garcia de Paiva e Augusto de Souza Pinto que fizeram grandes
empreendimentos na capital.
2.4 Portugueses: os pioneiros sempre
Apesar da importância econômica, social e política da emigração
portuguesa para o Brasil, em particular do movimento de massa que ocorreu de
fins do século XIX à terceira década do séc. XX, a literatura sobre este tema é
escassa se comparada à relativa à emigração de italianos, alemães e de outras
nacionalidades. Monteiro (1973) destaca o papel do português, na sua
coragem em desbravar junto com alemães, italianos e espanhóis, o sertão
mineiro.
Com intuito de aumentar a corrente já tão bem encaminhada de
emigração italiana para Minas, e ao mesmo tempo, de evitar o exclusivismo de
uma nacionalidade, o governo do estado, em meados de 1896, autorizava a
Superintendência a estabelecer agências em diversos países, a fim de
promover a vinda de pessoas de várias procedências. O café encontrava-se no
apogeu, necessitando de mão-de-obra em abundância. A Superintendência se
dirigiu, primeiramente, para os países mediterrâneos. Os países do Norte
Europeu, acostumados a fornecer emigrantes para fundação de núcleos
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
coloniais, não viam com bons olhos a saída de seus filhos para trabalhar em
terras alheias. Daí o número reduzido dos que se dirigiram a Minas.
Constituindo Portugal força expressiva como país emigrantista e de
maiores afinidades culturais com o Brasil, foi para lá que se voltou David
Campista. O serviço encontrava-se em situação difícil. Além da impossibilidade
do Sr. Sanches cumprir o contrato efetuado com o estado a 19 de agosto de
1895, para a vinda de 2000 portugueses, havia também contra ele violenta
campanha na imprensa, com sérias acusações. É bem possível que esta
situação fosse reflexo da campanha nacionalista contra os portugueses,
verificada, principalmente, no Rio de Janeiro, durante o Segundo Governo da
República. Foi, porém, com a declaração de caducidade do contrato pelo
governo mineiro, que se tornou possível transplantar para Portugal o sistema
adotado na península itálica. Uma Agência Fiscal, subordinada à
Superintendência, foi instalada, em Lisboa, encarregada diretamente dos
trabalhos de propaganda e expedições de emigrantes. A agência teve, no
início, algumas dificuldades: o governo português se opôs a que exercesse
suas funções sob pretexto de que não se podia considerar o Estado de Minas
Gerais como governo estrangeiro constituindo entidade jurídica nas suas
relações internacionais. Somente com a explicação da embaixada do Brasil e
do próprio governo brasileiro tornou-se possível a permanência do
comissariado em Lisboa (Monteiro, 1973).
Se na Itália não foi difícil à Superintendência conseguir a redução no
preço da passagem, tal não se verificou com sua Agência em Lisboa.
Possuindo número relativamente pequeno de emigrantes, restava a Portugal
subordinar-se aos interesses das companhias estrangeiras que tocavam em
seus portos. Foi somente com o rompimento do acordo celebrado entre as
companhias de navegação, em fevereiro de 1898, que começaram a diminuir
consideravelmente os preços das passagens de 3
a
classe, chegando à razão
de 100 francos, pagos no Rio.
Quanto à propaganda, Portugal antecipara-se, com a publicação, em
Lisboa, em 1894, sob orientação do Senhor Sanches, de um “Guia do
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Emigrante Português para o Estado de Minas”. Constava do guia rápida
descrição do Brasil e resumo de sua Constituição, descrição do Estado de
Minas Gerais com seu clima, terrenos, estradas de ferro, instrução pública,
indústrias e agricultura, não faltando também referências à construção de Belo
Horizonte. Não obstante ao interesse do Comissariado e da Superintendência,
foi reduzida a emigração portuguesa para Minas. Se em 1895 entraram 24
imigrantes, em 1897, ano que a imigração italiana chegava a 17.153, foram
introduzidos apenas 10 portugueses para atingirem o número máximo, em
1898, com 106 (Monteiro, 1973).
Segundo Silva (2002), a presença espanhola no Brasil e em Minas
Gerais é muito antiga e pouco estudada. Os imigrantes espanhóis que vieram
para o Brasil provinham de regiões pobres e eram, na maioria dos casos, semi-
analfabetos ou analfabetos.
Por não haver por parte do proprietário mineiro nenhum interesse
pelo imigrante espanhol, considerado excessivamente agressivo, pouco fez a
Superintendência em relação à emigração espanhola. Sua atuação consistiu
em fornecer passagens gratuitas àqueles que manifestassem desejo de
localizar-se em território mineiro. Daí a limitação à imigração espanhola em
Minas, nesse período.
Ainda em 1896, entrava a Superintendência em contato com o
Cônsul-Geral do Brasil em Stokolmo para introdução de imigrantes suecos.
Porém, as leis suecas impondo pesados ônus sobre agentes de emigração,
impediram a realização de qualquer acordo. Era arriscado ensaiar um serviço
de resultados ainda duvidosos.
Em 1897, eram introduzidos em Minas, a titulo de experiência,
imigrantes austríacos. Por não aceitarem o trabalho assalariado, de vital
importância para a economia cafeeira, e exigirem colocação em núcleos
colônias, era suspensa a emigração austríaca, pela Superintendência, a título
provisório.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Apesar da imigração alemã ser bem aceita e reconhecida como
muito boa para Minas, diante dos resultados obtidos anteriormente, nada pôde
fazer a Superintendência. A legislação alemã, o Von Heydt, não admitia
propaganda franca a favor de emigração em seu território. Em 1895, o governo
de Minas já aproveitara a intervenção oficiosa de um antigo colono daquela
origem – próspero e abastado fazendeiro em Minas – que se achava na
Alemanha, e o incumbira de fazer a propaganda em favor do estado e de
remover as dificuldades opostas à imigração de seus patrícios para o Brasil. A
tentativa foi em vão. No período compreendido entre 1894 e 1901, apenas 14
imigrantes de nacionalidade alemã foram registrados na Hospedaria Horta
Barbosa (Timmers, 1969, p.119).
Em 1898, eram as levas italianas que sofriam seus primeiros cortes.
A emigração sarda, aberta exclusivamente para o Estado, era fechada pela
Superintendência, porque o governo de Minas, entrando num processo de
retração financeira, apelava para a limitação de expedições. Continuando a ser
o imigrante do Norte da Itália ainda o mais solicitado, a Superintendência achou
de melhor alvitre suspender a vinda de trabalhadores sardos. Com o
agravamento da situação, a emigração era reduzida somente aos elementos
chamados por suas famílias, que aqui já se encontravam instaladas. O
imigrante português foi o mais beneficiado. Vinham para cá com garantias de
emprego por meio das cartas de contratos. Hospedavam-se em casa de
parentes e amigos
A política de imigração em Minas chegou na República com um
decréscimo que impressionou líderes políticos da época, até mesmo o
presidente Francisco Sales.
2.5 Minas seduz Imigrante na Europa através de propaganda
Minas Gerais foi o primeiro estado brasileiro a abrir um escritório no
exterior para cuidar de seu interesse imigratório (FIG. 2). Na Itália, e depois em
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Portugal, a Superintendência para a Europa do Serviço de Imigração estava
sob a coordenação de David Campista. Foi o ápice das ações do Governo de
Minas, mas ao mesmo tempo foi uma forma de fazer uma triagem dos
elementos estrangeiros. David enviava, junto com os documentos do imigrante,
um dossiê político de cada cidadão que tinha ligações com as ideologias
dominantes da época: o socialismo, o comunismo e o anarquismo. “Embora a
lei houvesse criado uma superintendência na Ásia, sua instalação não foi
cogitada. A própria legislação se encarrega de afastar as correntes asiáticas de
Minas” (Monteiro, 1973, p.108).
FIGURA 2 - Mapa de Belo Horizonte em 1894, distribuído na Europa para
incentivar a imigração
Fonte: Romano, 1997, p.35
Na Itália, a centenária máfia já mostrava suas garras. O aliciamento
e expedição de emigrantes para o Brasil, qualquer que fosse o intermediário
dos contratos, eram executados pelas próprias companhias de navegação e
armadores. David Campista relata ao governo brasileiro, em 1896, as
dificuldades em atuar oficialmente, por causa das tristes descrições que os
escritores italianos faziam do Brasil.
Com dificuldades em arrebanhar italianos, o escritório de imigração
se muda para Portugal. A imprensa fazia campanha contra, com denúncias de
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
toda ordem. “É bem possível que esta situação fosse reflexo da campanha
nacionalista contra os portugueses, verificada principalmente no Rio de
Janeiro” (Monteiro, 1973, p. 131).
Na virada do século, em 1900, devido ao “costume” dos empresários
e fazendeiros em lidar com a mão-de-obra escrava, o relacionamento com a
força de trabalho paga dos imigrantes era uma batalha. “A permanência nas
fazendas era sempre de caráter precário. Acostumado com o regime de
escravidão, o proprietário mineiro não agiu com muita lisura junto aos
trabalhadores livres” (Monteiro, 1973, p.132).
A remuneração do imigrante era de um salário fixo – no entanto não
havia vinculo empregatício – e o sistema de parceria por contrato (não podendo
o imigrante romper qualquer cláusula). Foi um tempo de muitos conflitos nas
fazendas, gerado por rescisão de contratos. “O regime de propriedade de terra
e o sistema rural constituem duas forcas de oposição à permanência dos
imigrantes em território mineiro” (Monteiro, 1973, p.117).
A insatisfação do imigrante é percebida através de memórias de um
colono mineiro na região do Vale do Mucuri. Segue-se o relato:
A imigração transformou-se em problema vital para
população pobre de muitos países europeus. Se entre
numerosas pessoas dessa categoria ganhou visto a
opinião de que nas atuais circunstâncias, onde tudo
parece transpirar para engrandecer os poderosos e
amesquinhar a existência dos humildes, já é impossível a
estes permanecerem em sua velha pátria, não faltaram
razões que a tanto os induzisse. Muitos ousaram dar o
passo decisivo, buscando melhores dias em terras
distantes, ultramarinas. E o resultado é que aquela
opinião tão generalizada, por justificável que fosse até
certo ponto, acabou esvaindo-se como um sonho.
Lindas descrições, relatos atraentes dos países que a
imaginação entreviu, quadros pintados de modo parcial e
inexado, em que a realidade é por vezes deliberadamente
falseada, cartas ou informes sedutores e fascinantes de
amigos, de parentes, a eficácia de tantos prospectos de
propaganda, e, também, sobre tudo, a atividade
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
infatigável dos agentes de emigração, mais empenhados
em rechear os próprios bolsos do que em suavizar a
existência do pobre... – Tudo isso, mais alguma coisa,
contribuiu para que a questão da emigração atingisse um
grau verdadeiramente doentio, tornando-se uma legitima
febre de emigração que já contaminou muita gente. E
assim, como na febre física dissipa-se a reflexão
tranqüila, o juízo claro, coisa parecida ocorre nas febres
de emigração. Aquele a quem ela contagiou sonha com o
país idealizado durante o sono e durante a vigília, no
trabalho e no descanso, agarra-se a prospectos e folhetos
que trata do seu tema favorito, dando-lhes o maior credito
(em regra porem quando afagam as suas aspirações). No
mesmo passo, no entanto, desprezam geralmente as
advertências e conselhos dos homens sensatos e logo
que se ofereça oportunidade, decidem-se com freqüência
a realizar os seus projetos, até o dia, em que – quantas
vezes: nada restará senão confessar o triste engano: “Fui
ludibriado”: ou “Arrependo-me amargamente o dia, em
que resolvi embarcar, mas agora é suportar tudo em
silencio”: “... Fulano avisou-me em tempo, mas é tarde
confessar-lhe o erro. Desta vez estou perdido”! O mais
triste é quando se chega a descobrir isso, quando
percebemos que uma nova escravidão nos submergiu e
que dessa escravidão é mais difícil escapar do que à
tradicional que a longa desta jungiu os negros
africanos...” (Timmers, 1969, p.235).
CAPÍTULO 3
A IMIGRAÇÃO PORTUGUESA EM BELO
HORIZONTE
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
CAPÍTULO 3
A IMIGRAÇÃO PORTUGUESA EM BELO HORIZONTE
Nosso país, muito cedo imobilizado entre Castela, o Islã e o
mar, sempre emigrou. Talvez não estejam totalmente errados
aqueles que vêem nas Descobertas, apenas a conseqüência
gloriosa do fenômeno mais profundo e ininterrupto da
Emigração e que, não sei por que, obstina-se, talvez para
enobrecê-la, em chamar Diáspora” (Lourenço, 1994, p.176).
A participação do elemento português na vida cultural, social e
econômica belorizontina é bastante complexa. É verdade que os portugueses
são personagens que estão aqui e parece que sempre estiveram participando
da vida belorizontina. Produziram histórias, deixaram marcas na paisagem da
cidade, criaram suas trajetórias históricas, reconstruíram suas identidades fora
de seu espaço-lugar original, porém, estudar essa participação numa cidade
com seu conjunto de particularismos e particularidades, entender cada peça
desse seu mosaico urbano, mesmo consciente de seu processo histórico, é
confrontar sempre com o provisório, o incompleto, o seletivo e o limitado.
Apesar disso, tenta-se reconstruir sua história com a recuperação de sua
memória individual e coletiva, no sentido da individualidade étnica portuguesa
para mostrar sua colaboração no processo de formação da cidade (Jornal
Estado de Minas, 1992).
Poucas são as pesquisas relativas à imigração portuguesa em Belo
Horizonte, podendo-se citar como principais:”Belo Horizonte, uma cidade de
acolhimento: a identidade de sobrevivência na emigração Portuguesa em 1975-
1990”, de Elizabeth Guerra P. B. Pereira, em 2001; “O Bairro Santa Tereza –
Memória histórica nos 100 anos de Belo Horizonte”, de Luíz Góes em 1987,
que destaca no seu livro a importância do elemento português na formação e
influência de alguns bairros em Belo Horizonte; e “Sol de maio lua de jasmim
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
(BH para jovens e adultos), produzidos pela CAPE
3
que relata depoimentos de
imigrantes aqui na capital, especialmente da família Souza. Busca-se contribuir
para a compreensão dessa participação portuguesa na formação da cidade
pois sua presença histórica é cheia de lacunas, mas, pelo menos, tenta-se
suprir uma parte desse lapso.
Ao trabalhar o tema da imigração portuguesa, nesta cidade, é
preciso, primeiramente, apresentar as condições históricas da formação da
capital de Minas Gerais, o imigrante português em Belo Horizonte, o papel do
Centro Cultural da Colônia Portuguesa
4
até o final do período proposto para
análise do tema (1930).
3.1 Belo Horizonte: nascimento da capital
Em fins do século XIX, os ideais de progresso e modernidade,
exacerbados pelo movimento republicano dão conta da pretensão do Governo
Mineiro em transpor a Capital do Estado da clássica Ouro Preto para a
depressão periférica da antiga Curral de Del Rey (Arraial de Belo Horizonte). O
arraial, existente desde 1707, era assim denominado por exercer a função de
cercado para o gado, proveniente da Bahia e da região da bacia do São
Francisco que era contado no registro das Abóboras, junto ao riacho
Contagem. O adensamento populacional se deu, então, de forma gradual por
migrantes atraídos do interior mineiro e de outras regiões, além estado, pelas
lavras de ouro incrustadas às margens, sobretudo do Rio das Velhas (Mourão,
1945).
Sem a aceitação da maioria ouropretense
5
e de alguns defensores
do monarquismo, a promulgação da lei de transposição da Capital mineira se
dá em 17 de Dezembro de 1893, pelo Congresso Mineiro, na cidade de
Barbacena. A comissão construtora, chefiada pelo engenheiro Aarão Reis, a
3
CAPE - Centro de Aperfeiçoamento de Pedagogos em Educação
4
Atual Centro da Comunidade Luso-brasileira
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
convite do então Presidente do Estado, Afonso Pena teria um tempo hábil de
quatro anos para o término do empreendimento. A embrionária cidade começa
a se impor após a demolição dos antigos casebres do Arraial Belo Horizonte e
se tornaria um verdadeiro parque de obras, fato que atrairia profissionais
ligados à edificação de várias partes do país (FIG. 3).
FIGURA 3 - Planta cadastral do Arraial de Belo Horizonte - 1894
Fonte: Barreto, 1950, p.80.
Oficialmente, inaugura-se Belo Horizonte, em 17 de Dezembro de
1897, com um pretensioso planejamento arquitetônico embasado na ordem
positivista, filho dos desdobramentos do iluminismo e, sobretudo, sob a
influência da Belle Èpóque parisiense
6
e do modernismo urbano de
Washington.
É notório que as ações planejativas e políticas do Governo mineiro
seguissem em direção à onda progressista e modernista que o mundo, e
principalmente a Europa perpassava, reflexo óbvio do legado Republicano e do
5
Tentou-se, em 15 de fevereiro de 1894, uma Ação Judicial Anulatória da lei de transposição da Capital de Minas
Gerais intentada pelo Agente Executivo da Câmara Municipal de Ouro Preto, Diogo de Vasconcellos.
6
Nota-se a presença marcante do paisagista francês Paul Villon, convidado a trabalhar no projeto paisagístico e
arquitetônico do Parque Municipal, que tentaria, nesta época, uma funcionalidade elitizante.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
recente movimento de avanço na produção industrial originada na Inglaterra,
em 1850 (Mourão, 1945).
Verifica-se essa intenção na própria localização geográfica central
da cidade que almejava o contato com as demais regiões do estado e que,
segundo Barreto (1936, p.14), "facilitaria a irradiação do progresso pelas
nossas diversas zonas". Nessa mesma perspectiva de centralidade
administrativa, escreve Vasco Azevedo a Luiz Cassiano, em 23 de Dezembro
de 1893: "dos pontos estudados, Belo Horizonte era o que mais atendia ao
espírito que presidiu a mudança: a criação de uma cidade importante e ao
mesmo tempo central" (Barreto, 1936, p.17).
Barreto relata que a idéia de que a centralidade geográfica, em
termos de localização, seria fator preponderante para um maior
desenvolvimento e, conseqüentemente, um maior progresso regional, constitui-
se como apanágio das principais correntes do pensamento geográfico da
época, originadas nas Escolas alemã e francesa, no final do século XIX.
Segundo o autor, a ideologia da ordem e progresso foi expressa na
sua configuração urbana, nas linhas e esquinas retas, rigidamente delimitadas,
mais adaptadas ao estilo barroco de tradição ibérica e do modismo francês do
que às condições específicas da natureza e do terreno onde se implantava.
Nesse sentido, foi a expressão barroca que se impôs: uma grande e majestosa
avenida liga dois elementos centrais da paisagem natural: a Serra do curral ao
Ribeirão Arrudas.
O espaço citadino se formava, então, sob a égide de uma política
governamental que incentivaria a instalação dos novos habitantes, vindos de
regiões interioranas do estado e do país e, principalmente, de imigrantes
oriundos de várias partes da Europa. Os primeiros registros populacionais da
capital tinham, em sua grande maioria, formação profissional em edificação e,
sem dúvida, serviriam às necessidades primárias de mão-de-obra. A
disposição físico-urbana inicial de Belo Horizonte, com pretensão inicial de
abrigar uma população de 200.000 habitantes, contava com uma estrutura de
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
serviços limitada à Avenida do Contorno. A gradual e imprevista expansão
urbana que ultrapassaria os limites desta importante avenida regeria, no início
do século XX, a formação dos primeiros bairros periurbanos que abrigaria um
crescente contingente de mão-de-obra (Barreto, 1936).
As ações governamentais de cunho planejativo que designariam
Belo Horizonte como cidade modelo permeava a intencionalidade de originá-la
como um centro administrativo e político do estado, daí o seu posicionamento
geográfico central, em relação ao território. Contudo, é necessário frisar que à
Capital não caberia a funcionalidade econômica já que a cidade de Juiz de
Fora a superava em termos comerciais e se fazia um pólo mercadológico de
estreitas relações com o Estado do Rio de Janeiro. Portanto, economicamente,
tal centralidade geográfica não apresentava benefícios até porque essa não
seria a principal intenção do governo estadual e, sobretudo, da elite política
para com a Capital (Barreto, 1936).
O Estado de Minas contava, de meados do século XIX ao início do
século XX, com uma economia baseada na agropecuária, com um maior
direcionamento à subsistência. Em 1903, por iniciativa do estado, realizar-se-ia
em Belo Horizonte o Congresso Agrícola, Industrial e Comercial, que teria
como principal diretriz a tentativa de tomada de consciência da elite econômica
e política mineira para os problemas relacionados à estratégia econômica
futura. Apesar de toda euforia liberal, as discussões mostraram uma certa
sobrepujência em ignorar atividades que porventura pudessem se destacar
haja vista a tendência mundial como é o caso da exploração do subsolo e
indústria de transformação. Segundo Monteiro (1973, p.158), "a mentalidade
dominante é a agrícola", a transformação industrial só se restringia à produção
agrícola”.
É bem verdade, no entanto, que após essa rodada de discussões, o
Estado toma um novo impulso nas pretensões desenvolvimentistas, apesar da
superação econômica de São Paulo e do sucesso mineiro nas exportações de
café que, de fato, proporcionaria uma maior expansão econômica. Assim,
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
mesmo em expansão, a economia mineira apresentava deficiências como
renda per capita baixa; sistema de transportes insuficientes; baixa
produtividade e falta de unidade econômica entre as diversas regiões do
Estado.
Esta situação seria, portanto, reflexo da primeira crise que a nova
capital perpassava frente ao signo da industrialização que sua elite tanto
desejava. As crises econômicas da virada do século, as lutas políticas, as
alianças entre interesses antagônicos face ao controle sobre a capital e as
dificuldades em resolver questões regionais e urbanas, retardaram a
maturação industrial de Belo Horizonte (Monteiro, 1973).
Mesmo assim, já na primeira década do século XX, a Capital
aparecia como o segundo pólo industrial têxtil da província, estimulando
também o desenvolvimento industrial ao longo do vale do Rio das Velhas e da
Bacia do São Francisco Santa Luzia, Sete Lagoas e Curvelo. No entanto, há
de se ressaltar que a indústria se forma mais por necessidades e
circunstâncias do que pela força de um projeto idealizado para a região.
Minas Gerais possuía a maior população do Brasil, mas serviços
públicos como educação, saúde, saneamento e demais obras públicas eram
pessimamente organizados devido à ineficiência do sistema de cobrança de
impostos e tributos. A força pública mineira era forte, mas bem inferior à de São
Paulo e Rio Grande do Sul. Possuindo o maior colégio eleitoral e a maior
bancada de deputados federais, o partido republicano mineiro era dominado
por um grupo de chefes políticos regionais advogados e outros profissionais
liberais ligados aos interesses agrários, já que o Estado era essencialmente
rural. O estado tinha uma estreita ligação com o Governo Federal, já que seus
políticos ocupavam cargos importantes comissão do Congresso, Ministérios,
Presidência da Loteria Federal, agências de correios e telégrafos juntamente
com a bancada paulista (Monteiro, 1973).
Vê-se marcante a presença do ideário de modernidade liberal e,
principalmente, a de um relativo eufemismo nas análises econômicas que
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
instituições ligadas ao estado mineiro tentavam passar à opinião pública em
fins da década de 20, se referindo à situação de crise com que perpassava a
Capital na década de 10:
“... e, poucos annos depois, de 12 de Dezembro de 1897,
ao installar-se a cidade, podia esta apresentar-se
dignamente já com números e elegantes edifícios públicos
e particulares, e um centro social e mercantil activo e
emprehendedor. Esse movimento de ascensão e de
progresso teve algumas phases intermittentes de
estacionamento, culminando na crise econômica
esboçada em 1912 e que se prolongou até 1916,
aggravada nos últimos annos pela situação creada pela
guerra européia. Mas as soluções de continuidade
serviram para cimentar, com bases mais sólidas, as
condições locaes de progresso e desenvolvimento.
Reencentada a marcha evolutiva, vae o município
desdobrando, nestes últimos annos, o campo de suas
actividades em conquistas de elevado alcance economico
e social” (Minas Gerais, 1927).
A esta fase denominada "intermitente de estacionamento", denotada
pela insipiente industrialização (e que porventura não tenha tido força de
competição para com a já instalada indústria paulista) e pelo ranço agrário que
fazia parte do pensamento da elite belorizontina, percebe-se a presença de
movimentos de cunho ideário ligados ao anarquismo e ao socialismo
7
com forte
atividade em prol de uma afirmação pública dos trabalhadores da cidade e que
vem contrapor a tentativa do estado em barrar tais movimentos através da
criação, em 1907, da Confederação Auxiliadora dos Operários do Estado de
Minas Gerais. A culminância desses esforços é representada pelo primeiro
grande movimento de greve
8
instaurado de 6 a 14 de maio de 1912, no qual
ficaram paralisados cerca de 2000 trabalhadores (40% do total dos
trabalhadores de Belo Horizonte) ligados ao comércio, funcionários públicos
ligados à Prefeitura, operários ligados à indústria de transformação mineral
(Mourão, 1945).
7
Funda-se em 1900 a Liga Operária de tendência anarquista, com aproximadamente 700 integrantes e a notada
presença do elemento italiano.
8
Dentre as diversas reivindicações da frente grevista destacam-se o pedido de redução de jornada de trabalho para
oito horas diárias e nivelamento salarial.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
É portanto, nesta fase, que a expressão Sindicatos designaria os
movimentos de organização trabalhista e uma nova perspectiva nas questões
relacionadas aos movimentos sociais em escala local, regional e nacional com
uma participação significativa de elementos portugueses. Vale lembrar que a
organização trabalhista fora influenciada pelos europeus, entre eles os
portugueses. O Centro Luso-Brasileiro teve um grande papel na formação
sindical embora de forma rudimentar, dos trabalhadores portugueses aqui,
conforme depoimento dos associados.
Durante os anos 20 ocorreram greves de reação às péssimas
condições de trabalho, caracterizadas por uma brutal exploração da mão-de-
obra. Esses movimentos também representaram um protesto contra a carestia
de alimentos e sofreram influência da onda revolucionaria desencadeada nos
últimos anos da Primeira Guerra Mundial.
Nesses movimentos sociais contrários ao ideário burguês, nota-se a
formação de organizações institucionais que lidavam com problemas relativos
aos operários mas que, diretamente, eram ligados ideologicamente à igreja e
ao próprio estado, como é o caso da "Confederação Catholica dos
Trabalhadores”, criada na década de 1920 e que, de certa forma, rechaçava e
impedia a proliferação das organizações trabalhistas ligadas aos ideais
socialistas e anarquistas que, até então, apresentavam-se como subversivas
aos olhos da elite política e econômica da Capital (Pereira & Faria, 2001).
Belo Horizonte, portanto, não deixa de se apresentar como palco de
importantes movimentos sociais, impulsionados por uma diversidade verificada
no âmbito de sua sociedade, reflexo incontestável das tendências político-
ideológicas mundiais e que, sem dúvida, têm na figura do imigrante grande
representatividade.
3.2 A presença do português na fundação de Belo Horizonte
Sob a vigência da lei de 1892, Aarão Reis estabeleceu a primeira
colônia agrícola situada a 18 quilômetros a sudeste da zona urbana,
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
desapropriada em agosto de 1895, juntamente com todos os demais imóveis
existentes no antigo arraial de Curral de el-Rey. O governo pagou 75.000.000
reis de indenização ao seu antigo proprietário e as terras foram divididas em 78
lotes, dos quais 48 foram vendidos por 20.000 reis o hectare a 91 colonos
italianos e a outros 107 de outras nacionalidades. Uma área de 200 hectares
foi mantida como reserva florestal, protegendo as abundantes nascentes e
cursos d'água que ali existiam. Esta primeira colônia teria sido a única a
alcançar o objetivo proposto, produzindo hortaliças, feijão, batata, milho e
legumes. Apesar disto, foi extinta pelo governo em outubro de 1899 e grande
parte dos colonos que ali trabalhavam, não tendo obtido os títulos definitivos de
propriedade, foram definitivamente afastados em 1903 (Corrêa, 1970, p.22).
Em 13 de julho de 1904, a prefeitura transferiu ao estado as terras
do núcleo colonial correspondentes à antiga fazenda. Em 1907, nesta área e
em outras das redondezas, chamadas então de "jatobá", foi fundado um novo
núcleo com o nome de "Vargem Grande", que foi destinado a imigrantes
portugueses e italianos.
Uma lei posterior, de julho de 1896 e o regulamento de fevereiro de
1899, tratavam novamente a organização dos núcleos, propondo mudanças
mais significativas. Previa o oferecimento de vantagens aos fazendeiros que
dividissem seus latifúndios para a formação de colônias, além de diversos
incentivos aos colonos, ou seja, dava um prazo maior para o pagamento dos
lotes, de oito anos, sem nenhuma majoração. Os lotes seriam vendidos com
uma casa construída no valor de 800.000 reis e o colono receberia
gratuitamente as primeiras sementes, além de subsídios em dinheiro e
assistência médica (Corrêa, 1970, p.26).
Em 6 de agosto de 1898 surgiram, na zona que fora denominada
suburbana de Belo Horizonte, os núcleos "Carlos Prates" e "Córrego da Matta",
cujos limites podem ser identificados na planta elaborada em dezembro do
mesmo ano, que demarcava os terrenos para a fundação de Belo Horizonte. O
Córrego da Matta foi posteriormente denominado "Américo Werneck", e
situava-se na seção VII daquela zona, próximo da estrada de ferro. Tinha
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
superfície de 144 hectares, dividida em 75 lotes, e sua população era
constituída, em 1907, de 180 indivíduos entre brasileiros, italianos, portugueses
e espanhóis, que cultivavam batatas, milho e hortaliças. O núcleo "Carlos
Prates", a oeste da zona urbana da capital, compreendia uma área de 266
hectares, dividida em 154 lotes de dois hectares cada um, com uma população
de 133 pessoas em 1907. A maior parte era constituída de italianos e
brasileiros, entre portugueses, alemães e franceses. A produção do núcleo era
também de batatas, milho e hortaliças (Jornal Diário de Minas, 1899; Barreto,
1936, p.95; Minas Gerais, 2002).
Em abril de 1899, outros três núcleos foram fundados nas
redondezas de Belo Horizonte. O núcleo "Afonso Penna" compreendia uma
área de 593 hectares, dividida em 87 lotes, ocupados por uma maioria de
brasileiros, além de muitos italianos e espanhóis num total de 172 colonos
dedicados à produção agrícola. O núcleo "Adalberto Ferraz" possuía área de
155 hectares dividida em 27 lotes. Brasileiros, italianos, portugueses e
espanhóis produziam principalmente verduras e cebolas. O terceiro destes
núcleos era chamado de "Bias Fortes" e englobava uma área de 237 hectares,
com 70 lotes, tendo também em 1907, 156 habitantes, quase todos italianos,
que curiosamente não se dedicavam à agricultura, como atividade principal,
mas à produção de tijolos, uma atividade já bastante comum na região, mesmo
antes do início da construção da capital, e que tenderia somente a crescer,
suprindo as necessidades crescentes da construção civil (Jornal Diário de
Minas, 1899; Barreto, 1936, p.95; Minas Gerais, 2002).
Os cinco núcleos coloniais agrícolas, fundados nos anos de 1898 e
1899, assumiram, com o passar dos anos, outras funções que não aquelas
exclusivas de produtores de gêneros alimentícios. Serviram, antes de tudo,
como atrativo, o meio que permitiu a fixação de uma mão-de-obra composta de
pedreiros, serventes, trabalhadores braçais e outros, que conheciam muito bem
a arte e a técnica da construção, muito necessárias para a realização dos
primeiros exemplares da arquitetura de Belo Horizonte.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Em 1898, quando na capital ainda se percebiam os efeitos da
grande quantidade de italianos que havia entrado no estado nos dois anos
precedentes, os terrenos situados nos núcleos eram vendidos a um preço entre
10 e 30 reais o m². Porém, em 1903, quando, inexoravelmente, a corrente
imigratória italiana tendia para os Estados Unidos e muito poucos chegavam a
Minas, os lotes sofreram uma notável desvalorização, passando a ser
comercializados entre 5 e 10 reis o m² (Jornal Diário de Minas, 1899; Barreto,
1936, p.95; Minas Gerais, 2002).
Estando situados muito próximos da zona urbana, os núcleos se
consolidaram como o local mais favorável ao assentamento dos agricultores e
operários, mesmo depois que deixaram de funcionar como tais e se
incorporaram ao espaço urbano da cidade em expansão. Ali, imigrantes,
operários, agricultores e a maioria daqueles que não tinham maiores recursos
financeiros puderam adquirir seu lote e construir sua morada, enquanto a área
urbana, possuindo melhor infra-estrutura e prevista por Aarão Reis como a
primeira a ser ocupada, permaneceu semi-vazia por muitas décadas. A cidade
oferecia, além de mercado para produtos agrícolas, outras atividades de
trabalho aos agricultores durante os períodos entre safras ou nos intervalos das
atividades, possibilitando ganhos extras e um progressivo convívio com a vida
urbana. Assim, enquanto todos os outros núcleos coloniais fundados em outras
partes de Minas tendiam à estagnação, aqueles de Belo Horizonte cresceram e
adaptaram-se, até fundirem-se completamente com a malha urbana da cidade
que crescia mais na periferia que em sua parte central. A fundação dos núcleos
acabou por servir como eficiente meio de incrementar o processo de ocupação
dos subúrbios (Jornal Diário de Minas, 1899; Barreto, 1936; Minas Gerais,
2002).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
3.3 A formação da cidade: o processo de ocupação do solo e a
moradia do trabalhador
Deixavam que a gente viesse para cá, mandavam-nos
para cá, mas não tinham onde morar.” Joaquim Antônio –
Seu Quinca (ex-morador da Favela da Barroca) (Gazeta
Mercantil, 26 set. 1938, p.5).
A forma como se deu a ocupação do solo, a construção e a
consolidação de Belo Horizonte enquanto cidade-capital o lugar reservado,
nesse processo, à questão da moradia para o trabalhador constituem este item.
Serão analisadas duas fases: a primeira que vai de 1897 a 1919,
quando surge o problema da moradia para os trabalhadores da nova Capital e
são adotadas as primeiras medidas com relação à questão. É a fase da
definição das regras do jogo onde se explicitam a segregação e o elitismo que
vão orientar o processo de ocupação da cidade. A segunda, de 1920 a 1929,
em que se estabelece uma disputa entre a Prefeitura e as classes
trabalhadoras pelo espaço, especialmente em torno da zona urbana. A
ingerência da Prefeitura nos negócios da cidade diminui, há um boom
imobiliário e a questão urbana é acompanhada da perda gradativa de controle
do poder publico sobre o processo de ocupação do solo, especialmente nas
zonas suburbana e rural.
Faz-se necessária uma explicação sobre os tipos característicos de
moradia do trabalhador mencionados na literatura: as cafuas, os barracos são
feitos de tábua, cobertos de capim ou zinco e ambos podem estar localizados
ou não em áreas invadidas. Barracões são construções de alvenaria
levantadas, em geral, nos fundos de outras casas.
Alguns autores, principalmente Barreto (1936, 1950), utilizam
indiscriminadamente a palavra barracões para se referir à construção de tipo
barracos, o que, entretanto, não deve ser confundido com os barracões
propriamente ditos.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
3.4 A cidade das cafuas: o desafio ao modelo
De acordo com a historiografia (Barreto, 1936, 1950; Lemos, 1988)
não eram boas as condições de moradia existentes no lugar escolhido para a
implantação da futura Capital – o arraial de Belo Horizonte (FIG. 4). Havia
diversos tipos de construção, mas predominavam
“...as choupanas e as cafuas [...] e os ranchos e
barracões [...] Junto dessas habitações de baixa
qualidade, destacavam-se algumas casas e sobrados
com quintais arborizados e estilo colonial. Devido a
escassez tanto de material quanto de boas condições
econômicas dos habitantes, o piso das moradias era de
terra vermelha batida e só havia piso de madeira nos
melhores sobrados. O mesmo acontecia com o forro e
janelas de vidro das casas, que também somente existiam
nos grandes sobrados” (Lemos, 1988, p.49).
FIGURA 4 - Cafua da Papuda (1894) - região onde hoje se situa o Palácio
da Liberdade
Fonte: Belo Horizonte, 1996
Decidida a mudança da Capital, começou a chegar a Belo Horizonte
um contingente de pessoas – profissionais liberais, técnicos, comerciantes e,
principalmente, operários – em busca de trabalho e de oportunidade.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Entre 1890-1893, sob o impacto da formação do canteiro de obras, a
população do arraial passou de 600 para 2.650 habitantes, o que representou
uma taxa de crescimento de 64,1% ao ano. Durante a época de construção da
cidade (1893-1897), a população chegou a 12.000 pessoas, mantendo-se
elevada a taxa de crescimento (45,9% ao ano) e diminuindo, vertiginosamente,
no período seguinte (1897-1900) para 3,9%, conforme TAB. 4.
TABELA 4
População e taxa de crescimento em Belo Horizonte (1890/1920)
Ano População Taxa de crescimento anual
1890 600
1893 2.650 64,1%
1897 12.000 45,9%
1900 13.472 3,9%
1905 17.615 5,5%
1910 33.254 13,5%
1912 38.822 8,1%
1920 55.563 4,6%
Fonte: Barreto, 1950, p.61 e 274; PLAMBEL,1979, p.70; IBGE,1938, p.128.
Um dos primeiros desafios enfrentados pela Comissão Construtora
foi quanto à acomodação desses novos habitantes. O número de casas era
insuficiente para todos e a previsão de um lugar para alojar os trabalhadores,
encarregados de construir a cidade, cedo levou à emergência de problemas.
Como parte do processo de construção da cidade, estava prevista a
desapropriação das casas do arraial, dando-se o prazo de um ano para as
famílias se mudarem do local. Parte da população desalojada foi instalar-se na
periferia da zona urbana, “... passando a construir, progressivamente, uma
cidade diferente da cidade oficial, com a vinda de imigrantes do interior do
Estado” (PLAMBEL, 1979, p. 49). A maioria dos ex-proprietários foi indenizada
em espécie, mas alguns preferiam receber lotes na cidade em troca de suas
propriedades.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Havia no arraial e circunjacências nada menos de 320
daquellas casas que, depois das desapropriações, foram
alugadas aos funcionários da Comissão e a outras
pessoas que iam chegando. Mas aquelle número de
habitações era relativamente pequeno, insuficiente para
acommodar a população que em levas consideráveis
affluia para o novo centro de actividade e houve uma seria
crise de habitações...” (Barreto, 1936, p. 571).
Dentre os que chegavam, havia um grande número de imigrantes
estrangeiros, portugueses principalmente, cuja vinda tinha sido patrocinada
pelo governo, dentro da política de imigração que, em Minas, acompanhou a
tendência do país, de acordo com os planos de desenvolvimento do estado e
como uma de suas metas, conforme se pode verificar pela Lei n
o
32, de
18/07/1892 (Minas Gerais, 1892).
Em 1894, chegou a Minas a primeira leva de 292 portugueses,
sendo parte deles alojada na Fazenda do Barreiro, em Belo Horizonte,
desapropriada para tornar-se Núcleo Agrícola. Em 1897 já existiam 31 famílias
morando no local, perfazendo um total de 185 pessoas, das quais 56,8% (105)
eram estrangeiros, portugueses principalmente. Não há dados precisos quanto
ao número e nacionalidade dos imigrantes (Monteiro, 1973).
Segundo a autora, durante os primeiros meses de 1897, 2.500
estrangeiros chegaram a Belo Horizonte, sendo a grande maioria de italianos,
seguidos de espanhóis. Ao final de 1897, havia na cidade cerca de 7.000
trabalhadores, a maior parte deles estrangeiros. Em 1912 eles representavam
11,3% da população.
A política de Núcleos Agrícolas visava não só o povoamento da
área, garantindo a ocupação em torno da futura Capital, como também ao
incremento da produção agrícola para abastece-la. Entretanto, a preocupação
com o povoamento superava a da produção de alimentos, ocasionando a
rápida incorporação dos Núcleos à zona suburbana da cidade e passando a
constituir novos bairros como o de Carlos Prates, a Lagoinha, o Horto e Santa
Efigênia, dentre outros (Monteiro, 1973, p.166). O de Carlos Prates, por
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
exemplo, “... nunca chegou a adquirir as características de Núcleo Agrícola
(PLAMBEL, 1979, p.51).
Cabe aqui chamar atenção para o que foi característico do plano de
Aarão Reis, como se verá mais adiante: a preocupação prioritária com o staff
burocrático do aparato do estado e, secundariamente, com os que a ele
serviam. No caso dos trabalhadores rurais, encarregados do plantio do cinturão
verde que abasteceria a cidade, foi previsto o alojamento das famílias nos
Núcleos Agrícolas, o mesmo, entretanto, não acontecendo com os
trabalhadores urbanos encarregados de construir a cidade. Para esses, a
Comissão Construtora construiu uma hospedaria provisória, concluída em
1896:
construiu-se ahi um grande edifício de madeira, sobre
pilares de tijolos e cobertura de zinco, com as necessárias
condições hygienicas e accommodações separadas para
solteiros e famílias, podendo accomodar cerca de 200
pessoas” (Barreto, 1936, p.395).
Tratava-se, na realidade, de um grande barracão de madeira, sem
conforto, cujos cômodos eram insuficientes para abrigar os trabalhadores.
Tentou-se minimizar o problema atraindo-se apenas os solteiros, mas esse
propósito não deu os resultados esperados: a cada dia aumentava o número
de imigrantes e como esses, em sua maioria, vinham acompanhados das
respectivas famílias, a situação se agravou, gerando críticas e protestos contra
o governo. A construção da hospedaria definitiva somente veio a acontecer
quase 30 anos mais tarde, iniciando-se o seu funcionamento em 1925 (FIG. 5).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
FIGURA 5 - Hospedaria de Imigrantes no bairro Calafate, Belo Horizonte
Fonte: Federação das Indústrias, 1998, p.22.
A falta de acomodações para aqueles que chegavam e a imprevisão
de um lugar para os trabalhadores levaram ao surgimento de cafuas e barracos
para todo lado. A própria Comissão Construtora, diante da impossibilidade de
resolver o problema, abriu mão da proibição de edificações provisórias e
passou ela própria a construir “pequenas casas de pau a pique, cobertas de
zinco, com acomodações para famílias e solteiros, as quais se acham todas
alugadas por módica mensalidade” (Barreto, 1936).
De acordo com relatos do autor, na época de sua construção, a
cidade se assemelhava a um grande acampamento com algumas edificações
destinadas ao pessoal da Comissão e vários barracos espalhados na área
onde moravam os trabalhadores. Em 1895
“... havia três hotéis, de 2
a
ordem apenas, sendo maior o
número de pensões, todas instaladas em casas velhas ou
em barracões cobertos de zinco. Nem uma casa definitiva
havia sido construída, ao passo que se erguiam cafuas e
barracões por toda parte” (Barreto, 1950, p.99).
Dois anos antes da inauguração a cidade já possuía duas áreas de
aglomerados de cafuas – o Córrego do Leitão (no Barro Preto) e a Favela ou
Alto da Estação (em Santa Teresa), ambas na zona urbana.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
É importante lembrar que, durante a gestão de Aarão Reis, houve a
estatização de vários setores e reservas naturais do perímetro da nova Capital,
o que colocou nas mãos do governo, através da Comissão de Construção, a
questão habitacional, pelo menos em relação àqueles setores diretamente
dependentes da Comissão. Mesmo após a liberalização da política, quando
Bicalho assume a chefia, o problema da moradia de grande parte da população
continuou dependente do poder público que se utilizou desta prerrogativa para
distribuir favores e privilégios.
Os privilégios concedidos aos proprietários de cada lote no
perímetro urbano de Ouro Preto foi a forma encontrada pelo governo para
vencer a resistência dos antimudancistas – burocratas, proprietários de
imóveis e comerciantes da antiga capital – ao mesmo tempo em que
incentivava sua vinda para Belo Horizonte.
O funcionário público recebia inicialmente um lote, através de sorteio
mas com facilidades de compra de lotes contíguos aos primeiros, por preços
módicos e com facilidades de pagamento. Ao mesmo tempo, o sistema de
construção das residências era patrocinado pelo estado que estipulava seis
tipos de moradias, variando, naturalmente, com os níveis salariais.
Dado o interesse em construir o mais depressa possível as
residências do funcionalismo, foram dadas também facilidades de pagamento
através do desconto em folha – “o bairro dos funcionários em uma cidadezinha
risonha em meio de uma movimentação cyclopica” (Barreto, 1936, p.515).
O aglomerado que se compõe de 200 casas em 1897, transforma-se
rapidamente em suntuoso bairro. A aquisição de lotes contíguos aos recebidos
por sorteio inicial permitiu a concentração e acumulação de propriedade
privada do solo urbano e, conseqüentemente, a especulação imobiliária,
induzindo para o local grupo identificado social e economicamente ao
funcionalismo.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Foi estabelecido pela Lei nº 3, de 17 de dezembro de 1893 que os
proprietários de Ouro Preto receberiam lotes de terreno na Nova Capital a título
de compensação. Não houve, contudo, interesse pela posse dos 711 lotes
doados, talvez por descrença em relação à concretização da transferência.
Não faltou nesse momento o espírito especulador de alguns
negocistas que adquiriram, a preços extremamente baixos, esses lotes e os
venderam posteriormente aos que ocorriam à zona urbana. Cita-se como
exemplo o Sr. José Francisco Macedo que por adquirir com essa finalidade um
considerável número daqueles lotes, recebeu o cognome popular de “José dos
Lotes” (Barreto, 1936, p.413).
Foi, portanto, resultado da ação do estado, a introdução em Belo
Horizonte das leis do mercado imobiliário. A desapropriação iniciada pelo
Estado e conseqüentemente, a apropriação pelo mesmo de extensas áreas,
significou o lançamento do solo urbano no mercado. A concentração da terra
nas mãos da “população oficial” da nova capital e do próprio estado (alienáveis
só depois de 10 anos) confirma esta hipótese. A desapropriação inicial não
considerou o espaço urbano como bem coletivo, mas comercializável.
Incentivou, assim, a apropriação e o comércio de terras urbanas.
A administração Municipal percebeu bem cedo, o problema. Ao
discorrer, em 1902, sobre a força motriz necessária à instalação de novos
estabelecimentos industriais, diz o Prefeito Bernardo Pinto Monteiro:
Assunto de igual relevância é o preço dos terrenos
urbanos ainda alto de forma a afugentar os que
demandam a cidade para a zona suburbana, cujos lotes
tem sido vendidos com facilidades, dispersando assim as
construções e ampliando o Centro em cujas proporções
aliás, alguns enxergam um novo erro (da Comissão
Construtora) não se lembrando talvez de que, são marcos
da futura cidade que a comissão assentou, convencida
como eu, de que um dia ela atingirá a plenitude desejada
(Monteiro, 1902).
Cinco anos depois da inauguração da cidade planejada e realizada
pelo Poder Público, já se queixa o Prefeito do preço dos lotes que expulsa para
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
a área suburbana, os candidatos a morar no centro da capital. O crescimento
extensivo das zonas periféricas e o vazio do centro são conseqüências
naturais.
3.5 O perfil do imigrante português em Belo Horizonte
De acordo com Oliveira (1945, p.26), entre os estrangeiros que
vieram viver no Brasil ao longo dos 500 anos de sua história, os portugueses
que aqui chegaram, após a independência, desfrutaram de situação singular.
São muito próximos dos brasileiros, irmãos mesmo, e ao mesmo tempo são
distintos. Essa relação tão próxima e delicada entre brasileiros e portugueses
se faz presente inclusive nas anedotas que marcam tradição humorística dos
brasileiros. Os portugueses são relativamente pouco estudados, predominando
uma imagem de fraternidade entre os dois povos, separados pelo oceano e
unidos pela língua e pelo contínuo fluxo migratório. É certo que os portugueses
foram os colonizadores, representaram a presença européia, a civilização,
numa terra de índios para a qual trouxeram negros e da qual fizeram um país
de mestiços. Enfrentaram ondas de aceitação e de rejeição, pelo menos desde
que os já nascidos na terra desenvolveram o projeto de autonomia frente à
metrópole. Para alguns, a independência em 1822, não foi feita contra os
portugueses, mas com os portugueses. O fato de a independência brasileira ter
sido realizada sob o controle da dinastia portuguesa acrescentou traços
peculiares ao Brasil, como a manutenção do regime monárquico durante o
século XIX, quando as demais ex-colônias espanholas se tornaram repúblicas.
Os portugueses vinham para a Colônia e viravam portugueses do
Brasil, independente de terem nascidos lá ou cá. O Brasil era apenas uma
região do Império Colonial. É no século XIX que se inicia a definição de uma
nação independente, mas sempre com fronteiras muito fluidas entre Brasil e
Portugal. Como relata Fiuza (1984, 1999), esse foi um processo longo: o de
transformar os portugueses de Portugal em simplesmente portugueses e os
portugueses do Brasil em brasileiros. Muitos vinham ganhar a vida no Brasil,
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
fazer fortuna, voltavam para buscar a família e aqui permaneciam, já que
tinham alcançado um padrão de vida superior, se comparado com a pobreza e
falta de perspectivas em Portugal.
Os portugueses que vieram tentar a vida, especificamente em Belo
Horizonte, no final do século de XIX e início de XX se concentraram em
atividades urbanas. Faziam parte de um enorme contingente que, fugindo das
condições de penúria da Europa, veio “fazer a América” no Brasil, favorecido
pelo translado realizado por barcos a vapor que reduzia o tempo e o custo das
viagens marítimas. Portugueses, espanhóis e italianos, por serem brancos,
católicos e falantes de línguas próximas, podiam ser assimilados mais
rapidamente e, como já mencionado, correspondiam ao perfil do imigrante
desejado. Sua chegada foi bem-vinda num momento em que a sociedade
belorizontina enfrentava ao mesmo tempo a carência de mão-de-obra e o
desafio de se tornar uma sociedade moderna.
A imigração em massa na virada do século coincidiu com
transformações econômicas e políticas no Brasil, com a abolição e a
proclamação da República. Essa leva de imigrantes trouxe para Belo Horizonte
pessoas pobres originárias do norte e nordeste de Portugal, vindas
principalmente do Minho, de Douro e de Trás-os Montes. Enquanto os italianos
espalharam-se pela lavoura cafeeira, os portugueses concentraram suas
atividades no pequeno comércio urbano ou ingressaram nas fileiras da massa
operária que se formava aqui.
Os imigrantes europeus, longe de corresponderem à visão
idealizada de branco superior, tinham pouco conhecimento dos códigos
urbanos, precária qualificação profissional e laços de família enfraquecidos, e
vieram engrossar a população pobre que se reunia em Belo Horizonte. A
cidade estava vivendo um processo de transformação que envolvia a
modernização urbana, a abertura de novas vias, e fazia parte do projeto de
suas elites afastar os pobres e a população de cor que se acumulava nos
cortiços do centro da cidade.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
A história dos processos de expulsão permite acompanhar o que
estava acontecendo com muitos dos estrangeiros que aqui chegavam. Entre os
indivíduos pobres que chegavam à Belo Horizonte, destacam-se os
portugueses que se somavam aos “indesejáveis”, aqueles que só com sua
presença ameaçavam a ordem. Alguns tornam-se anarquistas, mas a maioria
chegava à pobreza pela falta de qualquer perspectiva de vida. Os anarquistas,
os militantes operários, ou os vadios, ladrões, vigaristas, jogadores, bêbados e
mendigos compunham a massa urbana da capital, e eram vistos pelo discurso
oficial como perigosos e capazes de contaminar o tecido social, levando à
desordem urbana. A participação dos imigrantes estrangeiros, entre eles os
portugueses, nos conflitos urbanos leva à aplicação da legislação criada
especialmente para permitir o banimento de agitadores estrangeiros que
“contaminam” o proletariado brasileiro (PLAMBEL, 1979, p. 63).
Entre os portugueses que aqui chegaram constituiu-se uma
categoria comum à época: os caixeirinhos portugueses que, jovens, chegavam
à cidade e, sem laços familiares, passavam a trabalhar, dormir, viver nos locais
de trabalho. Diante das condições adversas de vida, tornam-se agregados.
Quando perdiam o emprego, perdiam tudo. Nesse caso passavam a se somar
à massa de jovens fora da lei. São mais conhecidos os casos de sucesso do
imigrante, como o dos fundadores da Confeitaria Colombo, mas os casos de
fracassos são pouco estudados.
Os portugueses pobres que chegavam a Minas Gerais, Belo
Horizonte, por serem brancos e europeus, eram preferidos aos trabalhadores
nacionais, negros e mulatos. O discurso da irmandade entre portugueses
brasileiros facilitou esse intercâmbio, ao mesmo tempo em que os portugueses
puderam se integrar na discriminação à chamada população de “cor”. Eram
trabalhadores que se opunham aos nacionais, considerados preguiçosos.
Tinham sido os exploradores, agora eram também explorados. Os preconceitos
iam sendo construídos: eram vistos como sovinas, que atrapalhavam o
progresso pela maneira tradicional, familiar, com que lidavam com seus
negócios e seus empregados nascidos aqui (Barbosa, 1985).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Durante o século XIX, muitos portugueses que chegaram no Brasil
se ocuparam em manter a identidade cultural e defender os interesses de toda
a colônia. Isso levou uma elite a organizar associações, clubes e sociedades
de assistência, fundar jornais e patrocinar obras literárias que defendessem o
ponto de vista da colônia. Entre as instituições fundadas e sustentadas pelos
portugueses bem financeiramente estão o Real Gabinete Português de
Literatura (1837), a Beneficência Portuguesa (1840), a Caixa de Socorros de
Dom Pedro V (1963) e o Liceu Literário Português (Oliveira, 2001, p.32).
Os movimentos nacionalistas e contra estrangeiros que se
desenvolvem após a Primeira Guerra Mundial acentuam os estereótipos do
português como bronco, analfabeto e adulterador de pesos e medidas. Isto se
acentua especialmente nos momentos de crise social no Brasil. O controle
sobre atividades comerciais o faz ser também identificado como imigrante
indesejável, já que, em vez de se dirigir para o campo e cultivar a terra, ficava
nas cidades especulando com gêneros alimentícios, alugando habitações a
preços exorbitantes e praticando a agiotagem. Como imagem positiva
contraposta encontra-se a de ser trabalhador, obediente, respeitador das
autoridades (Mourão,1945, p.62).
Assim, os portugueses sofreram toda sorte de preconceito,
principalmente aquele que se dirigia contra o imigrante pobre. Nos dias de hoje
ainda encontramos uma presença maciça de descendentes de portugueses
como donos de padaria em Belo Horizonte. Seus empregados e balconistas
são, em sua maioria, gente com pouca instrução que vieram substituir o
imigrante pobre nessa atividade de baixo status.
Foi no espaço doméstico que se preservaram muitas das raízes
portuguesas – a imagem de Nossa Senhora de Fátima, o galo de Barcelos, a
aldeia lembrada em quadros ou em pratos de parede. O imigrante bem-
sucedido vai introduzir melhoramentos em sua aldeia mas, ao voltar à terra, é
chamado de “brasileiro”. A proximidade de língua, de religião, de tipo físico e
até de nomes facilita a integração dos portugueses no Brasil, ainda que laços
culturais com Portugal se mantenham. Constituem o caso mais nítido de duplo
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
pertencimento na geração que imigrou: em São Paulo são “brasileiros”, no
Brasil são ainda “portugueses”.
Vale lembrar que aqui, em Belo Horizonte, muitas são as figuras de
“Brasileiros’’ célebres, os “Brasileiros de Torna Viagem”, que deixaram
vestígios de seu sucesso nos vistos palacetes, nas obras sociais e de
benemerência que foram erigidas pelo dinheiro amealhado no Brasil, com mais
ou menos sacrifício e trabalho, e algumas vezes também com astúcia. Um
grande número de figuras emblemáticas de “brasileiros” serviram de exemplo e
incentivo a outros milhares de portugueses que almejavam alcançar
semelhante estado social e econômico, além de todo o efeito simbólico, de
reconhecimento e projeção na terra natal, que lhe era inerente (Mourão, 1945,
p.61).
A recente produção bibliográfica portuguesa dá bem conta destes
percursos ressaltando a importância da emigração no contexto socioeconômico
do Norte de Portugal. A própria Comissão dos Descobrimentos Portugueses
organizou recentemente uma grande exposição sobre “Os Brasileiros de Torna-
Viagem no Noroeste Português”, acompanhada pela publicação de um
belíssimo livro em forma de catálogo que contou com a contribuição de
eminentes investigadores portugueses. Afinal o Noroeste foi tradicionalmente o
maior “exportador” de emigrantes para o Brasil (Oliveira, 2001, p.34).
O reconhecimento do papel destes “brasileiros”, originários de Minho
e do Norte de Portugal, em geral, e que estiveram por períodos mais ou menos
longos no Brasil, é uma constante mesmo entre os seus contemporâneos.
Com o objetivo de preservar a cultura e prestar assistência aos
imigrantes portugueses começam a surgir, no Brasil, as entidades voltadas
para a comunidade portuguesa que apresentaram maior crescimento após a
independência do Brasil.
A primeira instituição cultural portuguesa, fundada no Brasil, foi o
Real Gabinete Português de Leitura, em 14 de maio de 1837, no Rio de
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Janeiro, iniciativa do exilado político, Coelho Lousada, vindo na década de
1830, com um grupo de intelectuais fugidos das perseguições do governo
português (Carinhas et al., 1929).
Deve-se também, a esse grupo de intelectuais a fundação da
Beneficência Portuguesa do Rio de Janeiro, em 1840, a primeira desse tipo no
Brasil.
Em 23 de dezembro, de 1892 foi fundada o Real Centro da Colônia
Portuguesa sendo acolhidas, por acordo, as coletividades, Associação
Protetora Portuguesa e Centro da Colônia Portuguesa com os seguintes fins:
socorrer os seus associados quando enfermos ou inválidos; ampará-los moral
e materialmente, quando coagidos em sua liberdade civil; auxiliar o transporte
daqueles que, por motivo de moléstia, forem obrigados a retirar-se para o
interior ou exterior do Brasil; concorrer para o funeral dos que falecerem e
prestar auxílio às suas famílias; distribuir anualmente donativos aos órfãos;
manter uma caixa de caridade para os sócios necessitados; e finalmente,
empregar esforços junto às autoridades portuguesas e brasileiras quando
preciso, em favor dos portugueses residentes no Brasil. Também foi fundada a
Real e Benemérita Caixa de Socorro D. Pedro V, com o fim de socorrer todos
os sócios pobres, bem como todos os portugueses não sócios que pelo seu
estado de pobreza e indigência recorriam à associação em busca de auxílio e
benefícios que seriam igualmente extensivos às pessoas pobres e indigentes
de qualquer nacionalidade sempre que os recursos lhes permitirem.
Os autores relatam que no final do século XIX, já havia dezoito
unidades espalhadas por praticamente todo o território nacional como: Real
Associação Beneficente Condes de São Salvador de Matosinhos e São Cosmo
do Vale, Real Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezesseis de Setembro,
Centro Português D. Afonso Costa, Grêmio Beneficente à Memória de Camilo
Castelo Branco, Sociedade Beneficente em homenagem a Azevedo Coutinho,
Centro Beneficente dos Monarquistas Portugueses, Fraternidade dos Filhos da
Lusitânia, Congregação dos Artistas Portugueses, Centro Beneficente
Homenagem ao Conselheiro Augusto de Castilho, Centro Beneficente Dona
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Amélia Rainha de Portugal, Associação Beneficente Memória a D. Afonso
Henrique e a Serpa Pinto, Sociedade Beneficente de Niterói. Sociedade
Portuguesa de Beneficência de São Paulo, Centro Republicano Português de
Santos, Centro Português Primeiro de Dezembro Rio Grande do Sul; todas
essas com as mesmas finalidades já descritas anteriormente.
No campo da saúde e da assistência os Portugueses implantaram
as Santas Casas de Misericórdia, o objetivo inicial da fundação dessas casas
de assistência foi atender imigrantes portugueses que, em grande parte,
estavam desempregados e em situação de miséria na época.
“Hoje são quase 204 instituições em todo o Brasil, que
desenvolvem projetos culturais, sociais e de saúde,
onde a maior preocupação é dar apoio aos
portugueses e seus descendentes” (Carinhas et al.,
929, p.240).
Com o objetivo de defender e promover o desenvolvimento das
relações comerciais entre Portugal e o Brasil, em 1912 era inaugurada a
Câmara Portuguesa de Comércio de São Paulo, importante instituição
portuguesa no país, coincidindo com a fundação do Centro da Colônia
Portuguesa em Belo Horizonte, hoje Centro da Comunidade Luso-Brasileira.
CAPÍTULO 4
O CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-
BRASILEIRA E O IMIGRANTE PORTUGUÊS
EM BELO HORIZONTE
CAPÍTULO 4
CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA E O IMIGRANTE
PORTUGUÊS EM BELO HORIZONTE
"A cidade é constituída por diferentes tipos de homens:
pessoas iguais não podem fazê-la existir" (Aristóteles
citado por Sennett, 1973, p.13).
4.1 O Centro da Colônia Portuguesa em Belo Horizonte
9
A exemplo de outras comunidades de imigrantes, a saudade da terra
natal, o desejo de preservar a cultura e dar assistência aos imigrantes
portugueses necessitados motivaram o surgimento de entidades voltadas à
comunidade portuguesa. Foi após a Independência do Brasil, que surgiram as
maiores instituições de portugueses, no país, quer cultural, quer de
beneficência e assistência.
O que se depreende dessas aglutinações é que há uma relativa
confluência de propósitos dentro dessas instituições. Além do caráter
assistencial há a questão da preservação da imagem de Portugal.
Dessa forma, Portugal não se fecha mais num território
espacialmente contínuo e definido. Portugal é um lugar imagem, que se
prolonga numa vastidão de lugares espalhados por todos os continentes. A
política das instituições procura reintegrar o que estava disperso no espaço.
... se trata de dar um passo muito significativo no
reconhecimento e no assumir de uma realidade
demasiadas vezes esquecida na sociedade portuguesa: a
da dimensão especial que lhe é conferida pela existência
de um tão grande número de compatriotas nossos que
9
Hoje, Centro da Comunidade Luso-Brasileira.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
vivem e trabalham fora das fronteiras [...]. Comunidades
em que vamos encontrar vivas, estimadas e actuantes,
formas culturais e padrões de comportamento que fazem
parte, desde há séculos, do patrimônio lusíada” (Aguiar,
1986, p. 81).
Segundo Todorov (1999) citado por Pereira (2001, p.44), "o homem
desenraizado, arrancado de seu meio de seu país, sofre em um primeiro
momento: é muito mais agradável viver entre os seus" a idéia de viver a difícil
situação de ser e não ser social, condição que só pode ser temporária, pois
somos seres do espaço-lugar e de pertencimento gregário, faz com que o
imigrante, coletivamente, trace o seu caminho de reconstrução identitária.
As instituições têm o papel de relocalizar os imigrantes física, social
e culturalmente. Em Belo Horizonte, a aspiração de se criar um centro que
permitisse essa reconstrução identitária se deu com a fundação da Colônia
Portuguesa, relembrando a pátria distante e, ao mesmo tempo, as glórias
maiores, as datas históricas e a vida simples das cidades, enfim, tudo que se
relacionasse a Portugal.
Daí nasceu a iniciativa do "Centro da Colônia Portuguesa",
satisfazendo-se assim o velho desejo que veio com os primeiros portugueses
que chegaram ao antigo Curral Del Rei por ocasião do início da construção da
nova capital mineira.
Em 1897, um grupo de portugueses fundou a Sociedade Portuguesa
de Beneficência de Belo Horizonte, que não passou de sessões preparatórias e
da sessão solene de instalação. Outras tentativas se fizeram depois, até que,
em 1912, uma comissão composta por Joaquim Guilherme Batista, então vice-
cônsul interino, Albino Anelhe, Manuel J. Guedes e outros, convocou uma
reunião da Colônia que se realizou no dia 15 de setembro daquele ano, na
sede da Associação dos Empregados no Comércio de Minas Gerais e na qual
ficou definitivamente fundado o Centro da Colônia Portuguesa, uma associação
genuinamente portuguesa, com a finalidade de prestar beneficiência a seus
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
associados (FIG. 6). Presidiu a essa sessão Abílio Nunes de Figueiredo, que
conseguiu vencer as muitas dificuldades que então surgiram (CCLB, 1912a).
FIGURA 6 - Primeira sede do Centro da Comunidade Luso-brasileira
Fonte: Imagem cedida pelo Centro da Comunidade Luso-brasileira
A primeira diretoria eleita (FIG. 7) foi composta pelos Srs. Abílio
Nunes de Figueiredo, Adolfo Braga, Manuel J. Guedes, Albino José Anelhe,
Antônio do Val Gomes, Alfredo Pereira da Rocha, Antônio da Mota Pais,
Antônio da Costa e Antônio da Costa Cristina (CCLB, 1912b). Logo, no
decorrer do segundo ano de vida do centro foram iniciadas, perante as
autoridades do Estado, as tentativas para obtenção gratuita de um terreno
onde se construísse um hospital para os portugueses. Com a publicação da lei
do Conselho Deliberativo da Capital, de 17 de outubro de 1916, foi concedido
ao centro o terreno necessário à construção do referido hospital.
O Centro da Colônia Portuguesa tinha múltiplas finalidades, como a
de auxiliar os imigrantes portugueses atingidos por moléstias ou por invalidez e
prestar socorros aos necessitados; dar assistência médica gratuita e facilitar a
aquisição de medicamentos aos excluídos; financiar repatriamentos; manter
uma biblioteca e comemorar as datas cívicas dos dois países.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
FIGURA 7 - Primeira diretoria do Centro da Comunidade Luso-brasileira
Fonte: Imagem cedida pelo Centro da Comunidade Luso-brasileira
Na ata da reunião de fundação, verifica-se que, depois da idéia ser
aprovada por todos os presentes, inclusive pelo Sr. Vice-cônsul de Portugal,
que também participava da assembléia, entrou-se na discussão sobre o nome
que deveria ser dado à nova instituição. João José Ribeiro Fernandes,
português membro do Centro, sugeriu que se chamasse "Centro da Colônia
Portuguesa". Foi quando um dos presentes se levantou, que não é identificado
na ata, e pediu a palavra para contrapor sugerindo "Centro Republicano
Português". A Proclamação da República, em 5 de outubro de 1910, ainda
produzia efeitos no seio da colônia. Por isso justificava-se, até certo ponto, a
pretensão de evocar no título do "Centro" o novo regime de Portugal conforme
consta da Acta de 15 de setembro de 1912:
“... que se expurgasse do seio da colônia qualquer credo
político para daí resultar a união de todos. Cada um que
professasse o seu ideal político, mas na instituição que se
cuidasse apenas de venerar a Pátria e de promover o
auxílio e a benemerência aos associados. Foi a diretriz
que prevaleceu e, por unanimidade, sublinhe-se que até
mesmo os republicanos votaram a favor, foi decidido que
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
a instituição se chamasse "Centro da Colônia Portuguesa"
e não "Centro Republicano Português" (CCLB, 1912a,
p.2).
Desde a sua gênese o objetivo do Centro era unir os portugueses
em torno da idéia de Pátria e de solidariedade cristã.
De acordo com a Acta da sessão de 15 de setembro de 1912 (livro
1, p.2), houve momentos de divergências em que, por vezes, alguns
ameaçaram quebrar essa unidade: estes porque eram monárquicos e aqueles,
republicanos; uns porque eram a favor do Estado Novo e outros porque
contrários ao regime de Salazar; uns porque queriam aberturas e outros porque
eram refratários aos ventos da História. Mas o certo é que, depois dessas
disputas a "colônia" impôs o timbre da união e colocou acima das
idiossincrasias e dos governos o seu dever maior para com a Pátria de origem
e para com a Pátria de acolhimento. Antes de ser republicanos ou
monárquicos; de ser crentes ou agnósticos; de ser sociais-democratas ou
liberais; de ser minhotos ou alentejanos eram portugueses, e Portugal estava
acima dos regimes, dos partidos, dos governos ou dos grupos (CCLB, 1912a).
Pode-se perceber que, embora houvesse a divisão monárquicos e
republicanos dentro da instituição, os associados seguiam as normas do
Estatuto do Centro Luso-Brasileiro que, no seu artigo 80, referente às
disposições gerais transitórias reza que "fica vetado a qualquer sócio tratar,
dentro da sede social, de assuntos políticos e religiosos" (CCLB, 1986).
Para o Centro Português, os portugueses imigrantes deviam
promover a sua unidade, estabelecendo contatos sociais, culturais que
pudessem manter valores comuns próprios de sua origem. Os integrantes das
comunidades de cultura portuguesa deveriam seguir critérios para que
gozassem de boa aceitação local e integração com o próprio Centro.
Era importante que se mantivessem os nomes familiares, que se
cultuassem a bandeira (FIG. 8), que houvesse um convívio inter-familiar com
um certo sentimento gregário, que, com freqüência, toma relevo dentro das
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
características individualistas dos portugueses, com maior força no estrangeiro
do que no próprio território nacional (Figueiredo, 2000).
FIGURA 8 - Bandeira de Portugual (A), do Brasil (B) e do Centro (C)
Fonte: Imagem cedida pelo Centro da Comunidade Luso-brasileira
Ser português para a associação era manter a convivência, sempre
voltada com profundo apego à sua terra natal. É sempre melhorar a sua
posição social no domínio das relações com outras comunidades, pois o
português sentia-se inferiorizado social, cultural e religiosamente em relação às
comunidades com que conviviam. Manter o culto à língua portuguesa de
Portugal era uma questão imprescindível (CCLB, 1932, Figueiredo, 2000).
Fazia parte das resoluções que definiam o estatuto da associação a
promoção, junto aos meios culturais, do aprendizado da História de Portugal
pelos filhos dos imigrantes, a criação de Centros de Cultura, criação de
bibliotecas, a publicação de obras clássicas portuguesas, da criação de
instituições de assistência médico-social, entre outros (CCLB, 1986).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Várias iniciativas patrióticas foram realizadas no Centro da Colônia,
foco irradiador do mais entusiástico patriotismo. Dentre elas deve-se citar a que
iniciou o grande movimento "Pró-Pátria", que promoveu sessões cívicas,
festas, espetáculos, bandos precatórios etc, com o intuito de angariar donativos
que foram enviados à Cruz Vermelha Portuguesa, Cruzada das Mulheres
Portuguesa, obra Benemérita dos Órfãos de Guerra (CCLB, 1914).
Vale lembrar que o sentido de "Pátria", neste contexto, engloba, fora
às questões do credo e dos partidos, a necessidade de demonstrar o
envolvimento da instituição nas questões sociais, com o intuito de promovê-la
junto à opinião pública. Tratava-se do período da Primeira Guerra Mundial
(CCLB, 1916).
4.2 A comunidade luso-brasileira na formação da cidade de Belo
Horizonte
O Centro da Comunidade Luso-brasileira de Belo Horizonte, desde
sua fundação, sempre foi integrado por dirigentes e associados das mais
diversas linhas de pensamento, das mais variadas atividades, mas todos
voltados para uma causa comum, cultivar a imagem de Portugal e suas
tradições.
Desde sua fundação oficial, em 15 de setembro de 1912, até os dias
de hoje, o Centro empenha-se em difundir a cultura lusitana e manter viva a
herança sócio-cultural portuguesa.
Segundo a fala de Adolfo Braga, um de seus fundadores, a
Comunidade tinha como propósito único reunir portugueses na defesa de seus
interesses culturais e beneficentes, conforme pode ser também comprovado
pela transcrição de um trecho do estatuto.
Considero altamente conveniente a Nova Associação
não cogite de política, mas simplesmente de fins
beneficentes, visto que a Colônia Portuguesa aqui
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
residente era ainda pequena e por isso julgo mais
acertado que se expurguem do seu seio todo credo
político, resultando d'ahi a União da mesma Colônia, que
assim se tornaria forte e cohesa para consecução de seus
fins” (SIC) (CCLB, 1915).
2- O Centro tem duração e número de sócios ilimitados,
só podendo fazer parte dele portugueses e brasileiros.
3- O Centro tem caráter beneficente, cívico, social, cultural,
desportivo e recreativo, competindo-lhe especialmente:
a. prestar aos associados, ou não, o apoio e benefícios
morais e materiais indicados nestes Estatutos;
b. auxiliar, na medida do possível, o repatriamento ou
mudança de localidade dentro do país, aos que,
comprovadamente, carecerem de qualquer dessas
providências;
c. auxiliar, a critério da Diretoria, as pessoas
necessitadas, sem distinção de nacionalidade;
d. prestar aos associados assistências médica e
odontológica, nas condições regulamentadas pela
Diretoria e comunicadas aos associados;
e. manter uma Biblioteca Pública, cujo funcionamento
será indicado em regulamento próprio;
f. manter e desenvolver o Grupo Folclórico "Gil Vicente";
g. comemorar as principais datas do calendário cívico,
nomeadamente:
22 de abril - Descoberta do Brasil e Dia das
Comunidades Luso brasileiras
10 de junho - Dia de Camões e de Portugal
h. realizar reuniões sociais, culturais e desportivas, a fim
de estreitar as relações de amizade e harmonia entre
os membros da Comunidade Luso-Brasileira;
i. promover, o mais rapidamente possível, a criação
de um ginásio e centro desportivo, em local de fácil
acesso, que possa ser freqüentado pela juventude,
mantendo vivo o seu interesse pela continuidade de
nossa Associação;
i. promover, logo que possível, a criação de uma sede
campestre para expansão das atividades sociais,
desportivas e recreativas da Comunidade Luso-
Brasileira de Belo Horizonte, sendo a sua constituição
e funcionamento regulamentados, oportunamente,
pela Diretoria, com observância dos estatutos sociais.
j. fundar, quando as condições financeiras o permitirem,
a Beneficiência Portuguesa para tratamento dos
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
sócios e suas famílias, especialmente dedicada a
pessoas carentes, e uma Aldeia Lar, como meio de
ajudar a solução de problema do menor e idoso
desamparados.
§ Único - O Centro da Comunidade Luso-Brasileia não
tem caráter político ou religioso” (CCLB, 1986, p.1-2).
“Eram todos portugueses os que aqui se achavam e não
obstante os diversos ideais políticos que reafirmavam,
não se devia cogitar d'elles, mas sim e tão somente de,
tendo bem nítida a idéia da Pátria, primeiro a
beneficiência dos seus associados em particular e a todos
os portugueses que ashqui aportem, em geral” (SIC)
(CCLB, 1916).
O Dia Nacional de Portugal e das Comunidades Portuguesas,
comemorado em 10 de junho, é uma oportunidade em que os portugueses, em
todas as partes do mundo, rememoram com orgulho a bravura e a coragem
desse valoroso povo que, permanentemente, lutou para se afirmar, construiu
um belíssimo e melodioso idioma que se difundiu pelo mundo no tempo das
grandes navegações e reverencia a memória do seu maior poeta - Camões -
cuja vida e principal obra estão ligadas, de forma indissociável aos feitos
portugueses.
Acredita-se que só o Brasil dispõe de um documento certificando o
local, dia e hora de seu “nascimento”, como se encontra registrado na carta de
Pero Vaz de Caminha, o escrivão da esquadra comandada por Pedro Álvares
Cabral que veio dar às águas da Bahia, em Porto Seguro, em 22 de abril de
1500, por volta das três horas da tarde. Dessa forma, com data e hora, o Brasil
nasceu na costa da Bahia.
Embora as falas referentes aos fins da instituição não revelassem as
divisões políticas, pode-se perceber que essas existiam de forma camuflada,
em nome do puro amor à pátria. O próprio fato de haver posições monárquicas
e republicanas confirma essas divisões.
Com o passar dos tempos, a Comunidade Luso-Brasileira de Belo
Horizonte foi ampliando seus objetivos, estabelecendo seus novos Estatutos,
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
de 1969 até os dias de hoje, a comunidade tem caráter beneficente, cívico,
social, cultural, desportivo e recreativo (CCLB, 1969).
Entre os vários objetivos da Comunidade estava o entrosamento de
portugueses com a população local. Havia um interesse muito grande, segundo
as atas que brasileiros participassem das atividades promovidas pelo Centro,
como festas juninas, grêmios recreativos, festas comemorativas (22 de abril -
dia da comunidade portuguesa, dia 01 de dezembro - Restauração de Portugal
e 10 de junho - dia de Camões), lançamentos de trabalhos literários, entre
outras (FIG. 9) (CCLB, 1986).
FIGURA 9 - Festa tipicamente portuguesa em comemoração ao dia 1º de
dezembro
Fonte: Imagem cedida pelo Centro da Comunidade Luso-brasileira
Quanto à mobilidade e o padrão de vida que muitos portugueses
alcançaram aqui, verificou-se que houve uma inserção rápida na nova
sociedade; a adaptação à cidade se deu através do comércio. Com esse
intuito, a Comunidade Luso-Brasileira tratou de fazer contatos sociais como as
celebrações de festas religiosas, cívicas, folclóricas e atividades de cunho
intelectual. Como foi dito acima, isso chamava a atenção dos brasileiros.
Apesar da endogamia inicial, os portugueses ficaram mais propensos a se
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
misturar com outros grupos da população local. Possivelmente, por esse fator,
o papel da Comunidade se manteve, cada vez mais sólido e abrangente, em
todos os aspectos: religioso, cultural, econômico e político. Com sua influência
e apoio, por exemplo, houve um índice muito grande de portugueses e
descendentes mestiços ou não que ingressaram e tiveram êxito no comércio
armazéns secos e molhados, na indústria, serralheria, construção civil, têxtil.
Cabe ressaltar aqui famílias que tiveram seus nomes reconhecidos
no cenário belorizontino: na jurisdição: Felício dos Santos, Perdigão Malheiros,
Cândido de Oliveira, Levindo Lopes; na Medicina: Vieira de Andrade, Lucas de
Oliveira, Cata Preta; historiadores: Cônego José Marinho, Diogo de
Vasconcelos, Lúcio dos Santos; escritores, poetas e romancistas: Afonso
Arinos, Bernardo Guimarães, Aureliano Lessa, entre outros (Fiúza, 1984,
1999).
Do ponto de vista cultural, a contribuição primordial está voltada para
o idioma e as questões literárias. O conhecimento da formação histórica da
língua, aliado ao pensamento português, contribuiu na formação intelectual da
elite belorizontina. Assim, vigora até hoje, nas escolas, o ensino da Literatura
Brasileira paralela ao ensino da Literatura Portuguesa. A primeira deve ser
estudada nas suas raízes com a segunda e dentro do aspecto da cultura
ocidental de onde provém. Essa postura nasceu, primeiramente, dentro da
Comunidade Portuguesa. Houve a preocupação dos associados na
manutenção do estudo da língua com trabalhos de investigação, pesquisas e
cursos de aperfeiçoamento, suporte bibliográfico, materiais didáticos,
intercâmbios, sempre voltados para a questão da solidez da língua, da cultura
e da tradição portuguesas (Figueiredo, 2000).
Na esfera político-cultural, a influência portuguesa se fazia notar,
não apenas pela vitalidade e amplitude, pois incluía desde a vinda das
companhias teatrais, de artistas e músicos, bem como a intensa atuação no
mercado editorial, mas sobretudo pelo peso que nunca deixou de exercer na
formação universitária dos bacharéis na cidade de Belo Horizonte. Sobre dois
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
eixos opostos, o da xenofobia nacionalista e o da continuidade cultural dos
luso-brasilianismo, é que se debatem os escritores e bacharéis (1897-1930), no
afã de conquistar a autonomia do pensamento (CCLB, 1957).
Sobre a questão da contribuição da Comunidade na esfera do
trabalho, verificou-se que o crescimento de Belo Horizonte levou ao
desenvolvimento de uma infra-estrutura comercial, de serviços e industrial,
abrindo espaço para novas profissões. Os portugueses, pelo recenseamento
de 1920, trabalhavam, na sua maioria, como colonos agrícolas, nas minas e
estradas de ferro democratizando a estrutura social e permitindo mais espaço
para a ascensão social (Monteiro, 1973, p. 168). Nesse novo quadro, os
portugueses e seus descendentes ocuparam novos espaços sociais com a
ajuda da Comunidade Portuguesa.
Cabia à colônia portuguesa fiscalizar e possibilitar a entrada dos
portugueses e, até mesmo, dos belorizontinos, nessa nova ordem de trabalho.
Havia a preocupação de atender, indicar e subsidiar empregos, além de policiar
os contratos, seus direitos, a burla de troca dos trabalhos até mesmo de seus
destinos, atuando sempre na defesa dos interesses de seus membros (da
Comunidade) e dos integrados a ela (CCLB, 1986).
Vale dizer que o papel da Comunidade Portuguesa na formação da
cidade belorizontina, em princípio, tinha o propósito de revigorar os
sentimentos patrióticos portugueses. Os grupos dominantes brasileiros e de
grandes proprietários de terra deram preferência à imigração branca, católica e
européia, em contraposição aos libertos e trabalhadores sob as nacionais. Os
portugueses preenchiam esses pré-requisitos e ainda falavam a mesma língua
portuguesa.
Porém, de acordo com a autora, o fenômeno da imigração
portuguesa, em qualquer ponto do país, tem vantagens sobre as demais. O
autor sustenta que a valorização da imigração portuguesa sobre a alemã no sul
e a italiana em São Paulo, se deve à língua e aos costumes que eram
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
considerados fatores de identificação espontânea, o que facilitaria a
manutenção da hegemonia cultural das elites tradicionais.
4.3 A questão da identidade portuguesa na cidade de Belo
Horizonte
Belo Horizonte, que se forma a partir de um projeto novo da
República, encomendado a Aarão Reis em 1894, caracteriza-se pela
pluralidade e diversidade de seus habitantes, migrantes e imigrantes, buscando
esboçar a sua própria identidade como espaço urbano eminentemente
multicultural e permeável às várias influências. Na análise das memórias,
percebe-se o papel dos portugueses na construção da cidade de Belo
Horizonte compondo as pequenas peças que constituem esse mosaico, que é
Belo Horizonte.
Na coincidência da ampliação dos estudos sobre cidades nos seus
mais diversos aspectos, Belo Horizonte transformou-se, nos últimos anos, em
foco de atenção para os pesquisadores das Ciências Sociais e Humanas,
oferecendo uma gama muito variada de temas que, juntos, poderiam compor
um cenário de representações dinâmicas (e, portanto, provisórias e
contingentes) e fragmentárias.
“... a cidade de Belo Horizonte é um espaço de história e
de cultura, edificado não só pela vontade política de seus
governantes, mas também pela escolha de seus
moradores, pela diversidade das experiências e das
práticas sociais dos que nela habitam, pelos atos
cotidianos de seus cidadãos, pelas tradições e valores
históricos sedimentados em meio a vivências urbanas de
longa maturação” (Mourão, 1945, p.15).
A presença dessa diversidade étnico-cultural e social tem sido uma
das abordagens na análise dos espaços urbanos. Os estudos sobre as
cidades, hoje, apontam para isso e na grande maioria deles não se pretende
uma pesquisa de grande abrangência temática, fechando-se quase sempre
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
num recorte preciso (com cortes temáticos e cronológicos bastante concisos), o
que permite o ganho em profundidade. Qualquer pretensão de se analisar o
papel do imigrante português aqui, será limitada a essa diversidade e
complexidade de espaços urbanos e micro-identidades concentradas em uma
unidade territorial.
Fundada no final do século XIX, sobre o que era o Curral Del Rei,
Belo Horizonte surge dos desejos e necessidades de uma parcela significativa
da elite mineira, empenhada em recolocar Minas Gerais em importante lugar no
âmbito da economia nacional, uma cidade que nasce com um destino pré-
traçado no plano político e urbanístico. Situação que a história tratará, em
parte, de cumprir e de subverter. A subversão se dará, principalmente, pela
vivência de desenraizamento de seus habitantes, migrantes que vieram de
outros lugares de Minas e do Brasil e de imigrantes de outros países em levas
diferentes no tempo, no espaço e na cultura; todos eles compondo uma cidade,
que resiste a qualquer tentativa de homogeneização.
Na medida em que Belo Horizonte extrapola os limites estabelecidos
pelo projeto urbanístico original, ampliando a imagem de capital administrativa
e ganhando a dimensão de metrópole
10
, a composição de sua população se
diversifica mais, desdobrando-se em micro-identidades que, no conjunto,
esculpem o seu espaço urbano caleidoscópico.
“A emergência das grandes metrópoles e seu vórtice de
efeitos desorientadores, suas múltiplas faces
incongruentes, seus ritmos desconexos, sua escala extra-
humana e seu tempo e espaço fragmentários, sua
concentração de tensões, dissiparam as bases de uma
cultura de referências estáveis e contínuas” (Sevcenko,
1992 citado por Pereira, 2001, p.8).
Assim, com a emergência das pesquisas sobre cidades, as
pesquisas sobre Belo Horizonte, nos seus mais variados enfoques,
10
Metrópole periférica que não supera a atração que tanto o Rio de Janeiro como São Paulo exercem sobre as
pessoas de outros estados, incluindo Minas e de outros países.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
multiplicaram-se nos últimos anos, desvendando algumas de suas faces; no
entanto, a sua variada composição populacional (que de resto é a de todas as
cidades brasileiras) é um tema em aberto, que se impõe como um objeto de
estudo necessário.
Na produção histórica de Belo Horizonte, tem-se pesquisado sobre a
participação de outros grupos étnicos que a compõem, mas ressaltando
sobretudo a relação desses grupos com a constituição da classe trabalhadora,
mais especificamente os italianos, no princípio do século XX. Alguns dos
trabalhos sobre o assunto é o de Faria (1979); Góes (1987, 2001); Gurgel
(2001) e de Silva (2001) que não abordam a questão do Centro Comunidade
Luso-Brasileira. Sobre a presença portuguesa observam-se várias lacunas. Em
primeiro lugar, porque a aproximação histórico-étnico e cultural não permite
entendê-los como o outro, na medida em que termo "étnico" sempre foi
utilizado para designar pessoas "diferentes de nós mesmos" e na medida em
que somos todos diferentes de outras pessoas ou porque a resposta talvez
esteja na relação colonizador-colonizado, que permeia todo o sentido histórico
do povo brasileiro, que oblitera nossa vontade de buscá-lo ou de entendê-lo na
especificidade de seu ethos cultural e que intimida a aproximação. Apesar
disso, essas reflexões são motivadoras para se buscar a história dessas
personagens, história que se constrói na recuperação da memória individual e
coletiva e no sentido, principalmente, do papel na reconstrução da cidade.
Em Belo Horizonte, a formação sócio-demográfica, ainda em
processo, dificulta a construção da identidade de seus habitantes e dos grupos
que a compõem. Afinal, quem são os belorizontinos da primeira metade do
século XX? Uma mescla de ascendências, representadas por antigos grupos
de origem rural-mineira, ou mesmo urbana com traços coloniais; composta por
imigrantes italianos, que chegaram nos alicerces da cidade nova, ou por
imigrantes do Oriente Médio, sírios e libaneses, concentrados nas atividades
comerciais, principalmente e, finalmente, por outros grupos de menor vulto em
termos numéricos, mas, também, de importante contribuição cultural. Poucas,
ainda, foram as pesquisas relativas à imigração em Belo Horizonte, o que
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
dificulta o processo de investigação e análise sobre o assunto; mas, ao mesmo
tempo, parece um campo de pesquisa emergente e promissor. Assim, numa
soma de pequenos históricos de identidades étnicas é possível delinear, pelo
menos provisoriamente, as contribuições de elementos diversos na formação
de Belo Horizonte. Nesse conjunto estão os portugueses. Sobre a sua
presença histórica na cidade, tem-se uma lacuna, como já foi revelado
anteriormente. Pretende-se, pelo menos, suprir uma parte desse lapso,
retomando o papel que os mesmos tiveram na construção desta cidade.
4.4 O trabalho e a imigração numa perspectiva histórica em Belo
Horizonte
No processo de urbanização e industrialização da década de 1910,
destacou-se a atuação do operariado que contava com um seguimento
altamente mobilizado em torno do anarco-sindicalismo. Os anos 20 foram
marcados por manifestações intelectuais e artísticas importantes, mas também
por tensões sociais. Na sociedade brasileira da época caracterizada como
agrária, voltada para o mercado externo e dele dependente começava a se
processar a mudança para uma economia urbano-industrial, que também
levava em consideração o mercado interno. O poder político se conserva ainda
nas mãos das oligarquias rurais, mas agora exigindo rearticulações e
definições.
Os produtores de café de São Paulo e Minas Gerais eram os
representantes desta oligarquia que estruturava a famosa política do "café com
leite". A despeito de juridicamente liberal, o regime político a partir de 1891,
efetivamente funcionava como um pacto político entre oligarquias estaduais.
Essas re-acomodações das camadas dominantes apareceram no contexto de
pressões e maiores exigências das camadas populares (notadamente do
proletariado urbano). Nesse contexto é que começou a mudar o papel
desempenhado pelos trabalhadores e pelas camadas médias. Os movimentos
operários muito comuns à época são vistos com desconfiança e sempre
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
com desagrado pela grande imprensa do período, para o qual a Revolução
Russa de 1917 apresenta-se ameaçadoramente próxima e de memória
recente. Belo Horizonte não assistiu, nos anos 20, as grandes movimentações
operárias como se deram, por exemplo, em Juiz de Fora. Isto se deveu à
grande influência exercida pela Igreja Católica nas organizações operárias da
cidade (Monteiro, 1973, p.153).
Com um caráter preventivo, a imprensa belo-horizontina,
insistentemente falava de greves, de anarquismo e da influência "nefasta" dos
imigrantes. O fluxo imigratório, no Brasil, durante a Primeira República, como
vem sendo demonstrado por vários estudos, foi grande e, como não poderia
deixar de ser, um fator importante de transformação da sociedade brasileira em
todos os seus aspectos. O braço imigrante substituiu, à época, o trabalhador
nativo em quase todas as ocupações. A época foi também marcada pelas
greves operárias, as "paredes" como eram chamadas as paralisações de
trabalhadores. Por atribuírem ao imigrante, sobretudo ao anarquista, a
responsabilidade principal pelos movimentos grevistas, ele é visto de forma
contraditória no período: de um lado, considerava-se indispensável o seu braço
para o trabalho tanto na lavoura quanto na indústria; por outro, ele era
considerado o "arauto das idéias anarquistas".
Do ponto de vista político, o Centro da Comunidade Luso-Brasileira,
de acordo com seus estatutos, se manteve distante, limitando-se a se
posicionar como uma instituição meramente voltada para a assistência,
benemerência e promotora de atividades culturais que promovessem a imagem
de Portugal.
Minas Gerais não ficou totalmente imune a esse surto e à influência
exercida pelos grupos imigrantes. No entanto, as tentativas de atrair o grande
fluxo do braço imigrante para Belo Horizonte foram limitadas (Monteiro, 1973,
p.174). A constatação é ainda mais evidente se for comparado o movimento
imigratório para Minas com o de outros estados como São Paulo e Rio de
Janeiro. Mesmo assim, a imigração, a discussão sobre os seus benefícios e
danos, o imigrante no quadro dos nacionalismos da época são temas de
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
circulação na sociedade mineira, como atestam as matérias publicadas pela
imprensa de Belo Horizonte na década de 20 (Monteiro, 1973, p.174). Nos
primeiros anos da década, os jornais foram pródigos em artigos enfatizando a
necessidade de uma política imigratória mais articulada que atraísse ondas
maiores e mais qualificadas de imigrantes para o trabalho no Brasil. Quase
sempre é feita a ressalva de que a vinda e distribuição dos imigrantes deviam
ser controladas para se evitar o perigo da desnacionalização ou dos enclaves
estrangeiros dentro do país. É comumente criticada, em nome do nacionalismo,
a ajuda ao elemento estrangeiro, às vezes com uma postura xenófoba.
As duas tendências contraditórias a favor e contra a imigração
respondem à oscilação dos interesses das classes dominantes. No Diário de
Minas, jornal do Partido Republicano Mineiro, representante da oligarquia no
poder, o imigrante português é geralmente elogiado como inteligente, laborioso,
ordeiro, assimilável com facilidade (Diário de Minas, 1923, p. 10 - Caderno 3).
O português era bem aceito, num certo sentido, porque era ele que
cultivava as granjas que à época, abasteciam de frutas e legumes a cidade
embora o maior elogio da imprensa fosse reservado ao imigrante alemão:
"ordeiro, laborioso, honesto como os que mais o sejam" (Diário de Minas, 1923,
p.10 - Caderno 3).
Na década de 20 também aparecem nos jornais da capital mineira,
alguns artigos específicos sobre a imigração japonesa que levantou muitas
questões nas discussões sobre o elemento estrangeiro no Brasil. Desde o final
do século XIX, discutia-se a questão da entrada em Minas do elemento
nipônico para o trabalho de mineração. O assunto vem à baila com maior
evidência, no entanto, nos dois primeiros decênios do século XX, como assunto
que divide as opiniões. Os pró-japoneses elogiam-lhes a pertinácia e a
capacidade de trabalho, a frugalidade e economia da vida. Os contra apontam
o perigo da miscigenação com uma raça considerada inferior (Diário de Minas,
1923, p.10, Caderno 3).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
O xenofobismo e o racismo, expressos por exemplo em alguns
artigos do Diário de Minas, não representam postura original, uma vez que a
imigração e colonização no Brasil, ao menos secundariamente, respondiam
também a objetivos de aprimoramento e branqueamento da raça. Entretanto, a
mais freqüente ligação que se faz no Diário de Minas quando se trata do
elemento estrangeiro é com o anarquismo. Esta ligação, de resto, era feita em
geral pela grande imprensa da época, interessada na manutenção do status
quo e contra o operariado que, com diversos movimentos grevistas, ocupou
espaço nas ruas das grandes cidades brasileiras. Assim, no discurso
dominante, condensavam-se nacionalismo e o ataque ao operário e ao
imigrante. O português era sempre um alvo. Por outro lado, como enfatiza o
jornalista do Diário de Minas, Paulo Sérgio Pinheiro, muitos dos chamados
"agitadores estrangeiros" eram brasileiros de nascimento ou haviam chegado
ainda crianças no Brasil (Diário de Minas, 1923, p.10, Caderno 3).
Além disso, atribuir somente à liderança anarquista, à simples
importação de idéias alienígenas a explicação para os movimentos grevistas
brasileiros significava desprezar toda uma realidade concreta de opressão e
miséria, de péssimas condições de trabalho sofridas pelo proletariado brasileiro
da época. E é isso o que faz o Diário de Minas ao tratar do problema: aponta
para o perigo anarquista, "punhal oculto" nas levas de imigrantes, elogia a
deportação de operários para a Europa, critica a imprensa operária.
De um modo ou de outro, sempre que se posiciona com relação às
greves operárias, a imprensa belo-horizontina, principalmente nos editoriais,
toma partido dos empregadores e do governo (a questão social é mesmo
questão de polícia) atribuindo ao imigrante anarquista a culpa dos chamados
movimentos "paredistas".
Pode-se afirmar que o nacionalismo junta-se à ressalva de que não
se quer a xenofobia. É compreensível o cuidado, uma vez que a época foi
pródiga em nacionalismos, muitos dos quais hostis declaradamente ou não
ao elemento estrangeiro. A influência estrangeira demandada é a das
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
"correntes civilizadoras da Europa". Ressalte-se que a influência considerada
salutar se referia, ou se restringia, à esfera cultural e abominava as desordens
internas que abalavam cotidianamente o Brasil.
O antilusitanismo também marcou grandemente algumas das
ideologias nacionalistas do período, muitas delas calcadas no sentimento
popular. Ressalte-se, no entanto, que do imigrante se almeja de qualquer
modo, "o braço trabalhador".
O braço estrangeiro de que dependia o índice de difusão e
saneamento do trabalho produtivo, pelo território nacional inteiro, não era o
chinês, alemão, japonês, espanhol, italiano ou português, mas qualquer que
fosse, uma vez que cooperasse para o crescimento econômico (Monteiro,
1973, p.105).
Assim, dentro de uma ideologia em que se valoriza o trabalho, o
imigrante português seria desejado e aceito. O protótipo de trabalhador seria
construído de forma paulatina e buscado como ideal puro o imigrante que,
acostumado ao trabalho na Europa, trouxesse seu estilo de vida e de bem
trabalhar para o Brasil.
Aqui há a crítica ao nacionalismo xenófobo, ainda que o imigrante
exerça papel de elemento que apenas compõe a paisagem. Note-se também
que, mais uma vez, sua figura é incorporada ao universo do trabalho (Corrêa,
1970).
A posição do grupo modernista mineiro frente aos imigrantes,
principalmente o português, e às políticas imigratórias representou, como se
viu, faceta de uma postura que, inclusive, não se queria somente estética. No
momento histórico vivido pelo grupo, seu pensamento se articulará com o da
elite dominante, de forma não exclusiva e incondicional, é claro, mas
articulando-se ao processo modernizador empreendido por ela (D’Aguiar,
1989).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Rapidamente aqui exposto, o perfil desses "novos" atores delineado
na imprensa da época revela-se importante como classe que, ao menos, passa
a ser considerada. De "questão de polícia" passa a "questão política"
fundamental de resto, para os desdobramentos que ocorreriam, a seguir, com a
Revolução de 30. O ambiente e as condições são preparados na década de 20.
4.5 O trabalho do imigrante português na construção e
desenvolvimento de Belo Horizonte
No conjunto geral dos processos imigratórios, os motivos
impulsionadores da saída são muitos: perseguições políticas, crises
econômicas, lutas religiosas, guerras das mais variadas razões, problemas
familiares ou, até mesmo, o espírito de aventura. No entanto, subjacentes a
todos esses motivos, estão a busca de trabalho, porque ele é a condição
básica de sobrevivência, principalmente em terras estrangeiras, e a ética do
trabalho, que é um valor intercambiável. O imigrante, geralmente, parte de uma
determinada situação de crise, encaminhando-se para onde as condições
políticas ou de trabalho o atraem, geralmente para países e regiões onde há
ritmo de crescimento econômico ou uma demanda demográfica como era o
caso de Minas Gerais e Belo Horizonte, na virada do século XIX e primeira
década do século XX.
Em princípio, havia um contexto bastante apropriado para que a
imigração portuguesa aqui se estabelecesse. Com a construção de
hospedarias para os imigrantes, com a necessidade de povoamento em terras
devolutas, foi garantida a entrada dos portugueses em Belo Horizonte. A
cidade era recém-fundada e demandava um contingente maior de profissionais
como ferreiros, pedreiros, marceneiros, carpinteiros, pintores, bombeiros.
Como já foi dito, esses imigrantes vinham fazer a sua vida, fugindo das
dificuldades de sobrevivência e da pobreza que o arcaísmo das condições
materiais de Portugal lhes impunha.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
Segundo J. R. E. (entrevistado 1), seus avós como também parentes
e outros conhecidos portugueses foram obrigados a vir porque não havia outra
maneira. Eles chegaram aqui sem nada, quer dizer que só tinham a roupa do
corpo. Foi assim que chegaram ao Brasil.
A demanda para a construção de estradas de ferro, para o trabalho
na lavoura e na construção da cidade foram focos de atração de mão-de-obra
imigrante. Esse era tão intenso que era preciso que fossem requisitados
portugueses por meio de editais nos jornais do império:
Edital: S. Excia o Sr. Presidente manda publicar o
seguinte aviso: expedido pela Sec-do Estado dos
Negócios do Império, assim como a nota que o
acompanhou”.
“Império - Ilmo e Excmo Sr. (Presidente da Província de
Minas Gerais), na vigente lei do orçamento, foi o governo
Imperial habilitado para dar impulso a colonização
estrangeira, de que tanto precisa, principalmente a nossa
lavoura na atual progressiva deficiência de braços
africanos que se empreguem nos seus trabalhos,
convindo porém marchar com toda a circunspecção, para
que chegados os colonos se não vejam contrariados por
falta de emprego. Manda S.M. O Imperador remeter a
V.Excia a nota inclusa, assinada pelo oficial maior desta
Secretaria de Estado dos Negócios do Império, o
conselheiro Antônio José de Paiva Guedes de Andrade,
afim de que à vista dela, e detendo os convenientes
esclarecimentos, informe com brevidade e com possível
exatidão que pessoas nessa província desejam tomar
para o seu serviço colonos de que trata, declarando
quantos desses colonos cada uma dessas pessoas quer,
se avulsos ou com familiares, e para que serviços. Deus
guarde a V. Excia. - Palácio do Rio de Janeiro,
25/2/1846”.
11
Dessa forma, embora a participação do imigrante se fizesse em grau
bem menor, em razão do número relativamente pequeno de estrangeiros
portugueses introduzidos, sua colaboração teve algum significado no meio
rural, seja como assalariado, seja como colono.
11
Migração Portuguesa, Livro S.G. 801, 1 a 7 - 16v.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
No processo de industrialização, porém, seu papel foi reduzido.
Havia 2.119 estabelecimentos pertencentes a italianos, de acordo com o Censo
de 1920, 68% estavam localizados em São Paulo; enquanto 7% se achavam
em Minas (Monteiro, 1973, p.169). A discrepância mantém-se em relação às
fábricas portuguesas, alemãs e espanholas.
Além disso, a campanha de nacionalização do comércio teve um
cunho anti-lusitano em Minas Gerais. Essa campanha de nacionalização
dependeria do fim do poder econômico exercido pelos portugueses. Além de
monopolizar o comércio varejista, nas principais cidades brasileiras e de ditar,
através da imprensa, normas de orientação da política bancária e comercial a
colônia portuguesa desviava para o estrangeiro a maior parte dos lucros
obtidos.
Essa tomada de posição acarretou um sério problema para os
imigrantes. Eles, na sua maioria, eram voltados para o trabalho comercial e
tinham pouca experiência com o trabalho agrícola, como relatam os
entrevistados abaixo, sobre a história das famílias.
"Meu avô me contava que foi primeiro a uma casa de
fazendeiro para aprender o ofício da lavoura. Demorou,
mas ele aprendeu a trabalhar com arado para cultivar..."
(J. T. A. C., entrevistado 2).
Referindo-se a essa situação, M. A. S. S. (entrevistada 3) diz que:
"segundo meu bisavô, os imigrantes portugueses, depois
desta medida antilusitana, nunca sabiam como poderiam
viver aqui. Mesmo que eles tenham trazido de Portugal
algum dinheiro, depois de alguns meses, não havia mais
dinheiro para uma refeição completa. Ninguém aqui, no
Brasil, agora, tem idéia do quanto eles sofreram. A
situação dos nossos antepassados portugueses não foi
brincadeira".
Outro descendente, o entrevistado 4 (J. F. A.) diz que sua avó, hoje
com 93 anos, lamenta essa situação em favor do trabalhador brasileiro.
Segundo ele:
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
"A família veio de uma cidade pequena em Portugal,
quase uma aldeia. Lá eles tinham uma vendinha. Lá meu
pai, em carga de cavalo, levava e comprava manteiga,
queijo, essas coisas mais retiradas. Aqui não houve como
trabalhar com nada. Então, eles diziam que era melhor ter
ficado por lá".
A questão do trabalho do imigrante, em Belo Horizonte, foi
prejudicada pelo regime de propriedade da terra, fator que concorreu para
desestimular a permanência do português em outras partes do Estado. As leis
não foram feitas com o espírito de facilitar a concessão gratuita da terra. As
terras devolutas significavam para o governo estadual fonte de renda e de
poder político. Dessa forma, entre 1907 e 1930, a maioria dos imigrantes se
dirigiu às atividades assalariadas, na tentativa de se restabelecerem
novamente (Monteiro, 1973, p. 66).
Dessa forma, a médio e longo prazo, os portugueses foram se
reconstituindo economicamente, aproveitando as oportunidades advindas da
nova Capital. Dentre os que aqui sobressaíram estão, na indústria, a Serraria
Souza Pinto, fundada em 1903 pelos portugueses Antônio Garcia de Paiva e
Augusto de Souza Pinto (FIG. 10). No prédio próprio com 1.200 metros
quadrados, funcionavam as seções de carpintaria e serraria. A empresa
praticava também a exploração de pedreiras, além de comercializar materiais
de construção e atuar na área da construção civil, sendo responsável pelas
obras, em Belo Horizonte: Faculdade de Medicina, Instituto do Radium, Rede
Mineira de Aviação, Companhia Industrial Belo Horizonte, prédios da Praça da
Estação, entre outros, sendo desativada na década de 60. Sua importância
para a história de Belo Horizonte foi reconhecida pelo tombamento de seu
prédio pelo IEPHA-MG, em 1988 (Federação das Indústrias, 1998).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
100
FIGURA 10 - Serraria Souza Pinto, fundada em 1903
Fonte: FIEMG, 1998, p.23.
A Torrefação de Café Brasil, fundada em 1912, em princípio por
João Batista Viana, mais tarde adquirida pelos irmãos Freitas, foi responsável
pelo desenvolvimento no ramo atacadista e varejista de secos e molhados,
além da produção de 800 quilos de café mensais, que tinha grande aceitação
no mercado de Belo Horizonte (Fundação João Pinheiro, 1997).
Na Nova Capital destacaram-se os seguintes portugueses na
construção civil: Manoel José dos Santos Linhares (1922) - construtor; Manoel
da Costa Pereira (1902) - construtor e mestre de obras; Antonio Augusto
Giestal (1913) - construtor e mestre de obras; Antonio de Val Gomes (1909) -
construtor e mestre de obras (trabalhou na construção dos prédios das
Secretarias da Fazenda, da Educação e de Obras Públicas); Francisco Ribeiro
Lopes (1908) - mestre de obras, construtor e desenhista, todos com matrículas
registradas na Diretoria de Obras Públicas da Prefeitura de Belo Horizonte
(Minas Gerais, 1997); Antônio Andrade Botelho veio para Belo Horizonte em
1880 e desenvolveu trabalhos como engenheiro na Cia. Zona da Mata.
Foi também importante a participação de Antonio da Costa Cristiano
(1869), arquiteto, construtor e desenhista em várias obras de Belo Horizonte,
tais como: Hotel Solar (1912), na rua Caetés, 263; Clube Belo Horizonte,
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
101
localizado na Rua da Bahia, esquina com Av. Álvares Cabral (1913), Centro da
Colônia Portuguesa de Belo Horizonte (1914); projeto da Sacristia, consistório
e casa para o vigário e o sacristão da Igreja nossa Senhora da Boa Viagem
(1916/1917) entre outras.
Na construção de prédios da administração municipal são relevantes
as obras de Manuel da Costa Azevedo, construtor, industrial, pintor. Em 1908,
executou trabalhos de pintura no forro da sala de sessões do Senado mineiro,
antiga casa do Secretário de Agricultura, atual Museu Mineiro. Em 1989,
prestou serviços de pintura no Palácio da Liberdade. Colaborou também na
pintura interna da Secretaria do Estado de Obras Pública - antiga Secretaria de
Agricultura; trabalhou na construção do antigo Teatro Municipal (1906-1909, já
demolido) (Minas Gerais, 1997).
Francisco Soucaseaux, artista e construtor, veio para o Brasil ainda
jovem, residindo no Rio de Janeiro e dedicando-se à fabricação de móveis na
Oficina Moreira Santos, depois Marcenaria Brasiléia. Transferiu-se para Belo
Horizonte em 1894, quando dirigiu os serviços de uma grande serraria e
carpintaria a vapor, localizada entre a Av. Afonso Pena e Praça da República
(hoje Praça Afonso Arinos). Com Aurélio Lobo fundou a empresa F.
Soucaseaxu e Cia. Como construtor, foi responsável por obras de diversos
prédios públicos de Belo Horizonte, como a Estação General Carneiro (1895,
demolida), obra executada pela empresa Edwards, Camarate e Soucaseaux;
ponte Davi Campista (1896, serviços de alvenaria); do primeiro teatro da
cidade, de caráter provisório, na Rua da Bahia, conhecido como Teatro
Soucaseaux, inaugurado em dezembro de 1899 e demolido em 1906, cujo local
era destinado ao Teatro Politeama (1898), idealizado pela Comissão
Construtora e que não chegou a ser construído. Sabe-se que a planta do
Politeama foi iniciada por Soucaseaux (Fundação João Pinheiro, 1997).
Clemente Aníbal Branco, industrial e marceneiro começou, aos 14
anos, a trabalhar como aprendiz de marceneiro na cidade de Porto. A convite
do industrial Augusto Souza Pinto imigrou para o Brasil em 1928. Radicando-se
na cidade de Belo Horizonte, trabalhou durante seis anos como marceneiro da
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
102
Serraria Souza Pinto. Em 1937 instalou uma oficina própria no bairro Santa
Efigênia, equipada com novas máquinas. Em fins de 1941, criou a empresa
Móveis Bandeirantes, especializada na confecção e instalação de esquadrias
de madeira e móveis em geral e, em 1945, especializou-se em móveis para
escritório. Encontram-se na cidade várias obras realizadas por ele: confecção
de janelas e corrimãos do Edifício Guimarães; confecção das esquadrias em
madeira do edifício Mariana e tantos outros prédios do centro da cidade (Minas
Gerais, 1997).
Alfredo Camarate, arquiteto, construtor, jornalista e músico. Foi
conservador do Museu Ornamental da Academia Real de Belas Artes de
Lisboa. Por volta de 1872 transferiu-se para o Brasil, onde permaneceu até o
seu falecimento, em 1904. No Rio de Janeiro foi crítico de música do Jornal de
Comércio. Usando diferentes pseudônimos, escreveu para jornais do Rio de
Janeiro, São Paulo, Buenos Aires, Ouro Preto e Sabará. Em 1894, radicando-
se em Belo Horizonte, colaborou com os trabalhos da Comissão Construtora,
sendo encarregado de dar pareceres sobre as plantas de edificações
particulares. Com os pseudônimos de Alfredo Riancho e Alberto Screw, relatou
fatos ligados à edificação de Belo Horizonte, ao clima, às condições de
salubridade, costumes e vida social, publicados nos jornais "Minas Gerais"; O
contemporâneo, A Capital Belo Horizonte, que o tornaram conhecido como
importante cronista da época da construção da cidade. Foi também
organizador da Corporação Musical Carlos Gomes, ainda hoje existente em
Belo Horizonte.
Outras indústrias de descendentes portugueses foram de maior
importância para o desenvolvimento de Belo Horizonte, como: Gráfica Oliveira
& Costa (1886) (FIG. 11), Empório Industrial (1895), Companhia Renascença
Industrial (1906) (FIG. 12), Curtume Santa Helena (1907), Café Brasil (FIG. 13)
(1912) entre outras.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
103
FIGURA 11 - Centro da cidade de Belo Horizonte com vista da Gráfica
Oliveira & Costa (1912)
Fonte: Federação das Indústrias, 1998, p.16
FIGURA 12 - Cia. Industrial Belo Horizonte (atual Cia. Renascença Industrial)
primeira grande indústria da capital (1906)
Fonte: Federação das Indústrias, 1998, p.16
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
104
FIGURA 13 - Fachada do Café Brasil na Av. do Contorno - Lagoinha (1912)
Fonte: Federação das Indústrias, 1998, p.33
4.6 O comércio português em Belo Horizonte
Também contribuiu para o desenvolvimento econômico de Belo
Horizonte o comércio praticado pelo imigrante português. Embora não se possa
recuperar toda a história da cidade nesse aspecto buscou-se reproduzir a
localização do comércio na cidade, destacando algumas casas comerciais que
fizeram história a partir de lembranças individuais de seus habitantes. Dentre
eles estão a Farmácia Abreu, de propriedade de Theodoro Lopes Abreu;
Livraria e Papelaria Cardoso (FIG. 14); Armazém Batista Júnior e Cia. (FIG.
15); Armazém Dragão (FIG. 16); Livraria Francisco Alves, Drogaria Araújo, de
Modesto Araújo (FIG. 17), entre outros.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
105
FIGURA 14 - Vista do prédio que abrigava a Livraria e Papelaria Cardoso,
à Rua de Janeiro esquina de Av. Amazonas (1920)
Fonte: Imagem cedida pelo Arquivo Público de Belo Horizonte
FIGURA 15 - Armazém Baptista Júnior & Cia. à Av. do Contorno esquina
com Rua Grão Mogol - no bairro Sion (1920)
Fonte: Imagem cedida pelo Arquivo Público de Belo Horizonte
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
106
FIGURA 16 - Fachada do Armazém Dragão, à Av. Contagem no bairro
Santa Inês (1920)
Fonte: Imagem cedida pelo Arquivo Público de Belo Horizonte
FIGURA 17 - Fachada da primeira loja da Drogaria Araújo, na rua dos
Caetés, na década de 1910
Fonte: Fundação João Pinheiro, 1997, p.272.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
107
A vocação comercial do português e a sua presença no ramo
comercial, nas mais diversas regiões, foram uma das grandes linhas de força
na imigração portuguesa para o Brasil.
Um arranjo sociológico das empresas comerciais, até certo ponto
etnocêntrico, é uma das explicações plausíveis para a presença lusa no
comércio brasileiro. Os proprietários das casas comerciais reservavam os
lugares de caixeiros a patrícios. Alguns vieram com passagem paga
especialmente para ocupar tais postos de trabalho. Com o tempo, os
empregados estabeleciam-se por conta própria e o sistema se refazia.
Parece, pois, que a oportunidade fornecida pela Secretaria de
Estado da Imigração a todos os integrantes do mundo sócio-cultural português,
em Belo Horizonte, poderá ser bem aproveitada por uma tentativa de
indagação sobre a alocação de portugueses nas pequenas empresas
comerciais, dirigidas em base familiar, que são os bares e padarias (Pereira,
2001, p.119).
Eram numerosos os portugueses estabelecidos no comércio de
bares e padarias na cidade de Belo Horizonte, de acordo com amostragem
retirada nos arquivos da Prefeitura de Belo Horizonte - 1920, 1921, 1923 e
1924, como demonstrado nas TAB. 5 e 6.
TABELA 5
Idade dos portugueses proprietários de bares e padarias
Faixas etárias Bares Padarias Total
20 a 30 anos - 1 1
31 a 40 anos 4 3 7
41 a 50 anos 13 14 27
51 a 60 anos 8 15 23
61 anos e mais 2 1 3
TOTAL 27 34 61
Fonte: Centro da Comunidade Luso-Brasileira, 1992, p.5.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
108
TABELA 6
Naturalidade dos portugueses
Naturalidade Bares Padarias Total
Lisboa 2 4 6
Coimbra 1 1 2
Porto - 1 1
Serafucor de Castanha - Bragança 1 - 1
Macedo de Cavaleiros - Trás-Os-Montes 1 1 2
Moimenta 1 - 1
Guarda 1 - 1
A-Ver-o-Mar - Povoa de Varzim 1 - 1
Anadia - Distrito de Aveiro 1 1 2
Minho 1 1 2
Fátima 1 - 1
Vila Nova de Cevera 1 - 1
Chaves - Trás-os-Montes 1 - 1
Sendim - Porto Vila Real 1 - 1
Bragança 1 2 3
Cepelos 1 - 1
Arouca 1 1 2
Condeixa-a-Nova - 1 1
Bragança-Trás-os-Montes - 1 1
Vila Nova de Cerveira - 1 1
Pinheiro de Bemposta - Avenéis - 1 1
Pombal - 1 1
Vimioso - Trás-os-Montes - 1 1
São Romão - 1 1
Viana do Castelo - 1 1
Vicil - 1 1
Maçãs de Maria (Aldeia) - 1 1
Vila Nova de Gaia - 1 1
Castelo de Paiva - 1 1
Celorico da Beira Mortágua - 1 1
Trás-os-Montes - 1 1
Ilha da Madeira 3 - 3
Angola 1 1 2
Indefinido (declarado "Portugal", sem
especificações
4 6 10
TOTAL 27 34 61
Fonte: Centro da Comunidade Luso-Brasileira, 1992, p.7.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
109
A naturalidade é declarada de modo pouco preciso em muitos casos
e a procedência nem sempre coincide com o local de nascimento. A maioria
dos imigrantes é proveniente das províncias do Minho e Trás-os-Montes, dado
que se compatibiliza com o quadro geral da emigração portuguesa para o
Brasil. Aldeias, vilas e cidades fazem-se representar, indicando uma origem
poli-genética dos portugueses proprietários de bares e padarias em Belo
Horizonte.
Quanto ao estado civil, apresentam-se quase todos casados,
excetuando apenas três solteiros e dois viúvos para os donos de padarias. É
interessante ressaltar que os emigrantes, na maioria, casavam-se em Portugal,
partindo, logo após, para o Brasil, como se pode auferir dos filhos, quase
sempre brasileiros (TAB. 7).
TABELA 7
Nacionalidade da mulher e prole
Portuguesa Brasileira Port. / Bras.
Nacionalidade
Bares Padarias Bares Padarias Bares Padarias
Mulher 20 27 7 7 - -
Prole 2 5 25 25 - 4
Fonte: Centro da Comunidade Luso-Brasileira de Belo Horizonte, 1992, p.9.
As nacionalidades dos filhos foram consideradas para a prole toda.
Na última coluna vão assentados os quadros de proles mistas, isto é, formadas
de alguns filhos nascidos em Portugal e outros no Brasil. Os casamentos
mistos são raros, formando apenas 23% dos casos consultados.
Quanto ao grau de instrução, embora não haja analfabetos, os níveis
são sempre modestos, o que é mostrado na TAB. 8.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
110
TABELA 8
Grau de instrução dos portugueses proprietários de bares e padarias em
Belo Horizonte
Grau de instrução Bares Padarias Total
Nenhum 1 1 2
Primário (completo e incompleto) 18 24 42
Ginásio (completo e incompleto) 7 5 12
Comercial 1 1 2
Técnico agrícola - 1 1
Bacharel em contabilidade - 1 1
Superior - 1 1
TOTAL 27 34 61
Fonte: Centro da Comunidade Luso-Brasileira de Belo Horizonte, 1992, p.10.
Alguns se referiram a 1º grau, como sinonímia de primário; curso
secundário, ginasial, colegial e 2º grau provocaram confusões nos informantes.
Da mesma forma, muitos não esclareceram se os cursos eram completos ou
incompletos. Com ressalvas, pode-se avaliar que os proprietários de bares
apresentam um perfil educacional mais modesto que os donos de padarias.
A religião dos perquiridos é católica. Alguns se declararam,
enfaticamente "catolicíssimos" ou "católicos apostólicos romanos". Há apenas
um proprietário de bar que é protestante.
Vantagens arroladas para a posse de padarias:
a. bons lucros (até 50% do movimento de caixa);
b. fácil adaptabilidade ("costume");
c. todo lucro do trabalho é do proprietário;
d. trabalho que não exige escolaridade elevada;
e. facilidades para o sustento da família (habitação e alimentação
fornecidas pelo próprio estabelecimento comercial);
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
111
f. sociabilidade agradável, permitindo laços intensos e extensos de
amizade;
g. experiência rapidamente adquirível e transmissível aos filhos;
h. garantia de emprego
i. independência pessoal
j. experiência herdada (o pai era do ramo)
k. independência econômica ("pessoa estabelecida") e estabilidade
profissional
l. vocação comercial
m. status social
n. solidificação dos laços familiais ("todos trabalham juntos") (Centro da
Comunidade Luso-Brasileira, 1992, p.12).
Na síntese acima, as vantagens relacionadas a bons lucros, pouca
escolaridade, experiência herdada e solidificação dos laços familiares, apontam
para a relação comércio-tradição-família, que permite a manutenção da coesão
familiar e de grupo enunciadas por donos de padarias, descendentes de
portugueses.
A herança de família é alegada quando os pais ou parentes já se
dedicavam a negócios, em Portugal e à fabricação e venda de pão. De todo
modo, a "vocação" comercial está quase sempre aludida, sendo irrelevantes
aqueles que manifestaram aversão ao ramo.
As vantagens para o sustento da família, expressas pela
solidariedade de moradia e alimentação, são argüidas pelos donos de oito
padarias.
Os bares, estabelecimentos em geral mais módicos do que as
padarias, apresentam uma solução muito comum de agenciamento do espaço:
o andar do rés-do-chão é usado para fins comerciais, enquanto que o superior
destina-se à moradia do proprietário e sua família. São quinze casos
detectados, enquanto que para as panificadoras há apenas três. A mostrar a
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
112
posição econômica mais confortável dos donos de padarias, está também a
existência de cinco estabelecimentos situados em prédios de apartamentos a
ele pertencentes, contra um exemplo notado para os possuidores de bar. O
que reforça a característica familiar da atividade econômica (TAB. 9).
TABELA 9
Aspectos físicos dos prédios que abrigam os bares e padarias
Bares Padarias Total
Térreo 7 8 15
Sobrado 19 21 40
Prédio de apartamentos 1 5 6
Localização em esquina 10 21 31
Fonte: Centro da Comunidade Luso-Brasileira de Belo Horizonte, 1992, p.14.
"... Meu pai veio para Belo Horizonte através da carta de
chamada. O seu irmão já morava aqui e trabalhava numa
padaria. Falou com o seu patrão e logo o meu pai também
estava empregado e poupando montaram o próprio
negócio, uma padaria na periferia da cidade" (Entrevistado
7).
"Meu avô chegou em Belo Horizonte para trabalhar na
construção, era ferreiro. Casou-se com uma portuguesa
que veio com a família e foram morar no Bairro Santa
Tereza. Meu avô mal sabia ler e escrever. Minha avó sabia
um pouco mais,. A gente, os filhos, também não tínhamos
grandes instruções. Resolveram montar uma pequena
padaria. Foi difícil, no princípio, porém compensador"
(Entrevistado 8)
"Meu pai veio para Belo Horizonte ainda moço, para
trabalhar com o tio em um pequeno restaurante no centro
da cidade. Com o tempo comprou seu próprio negócio, um
restaurante que até hoje pertence à família, servindo só
comida portuguesa" (Entrevistado 9).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
113
Além de lanches rápidos, os bares fornecem refeições tipo "prato
feito", chamados popularmente "p.f.", compondo cardápios "do dia": arroz,
feijão, carne de vaca em bifes ou picadinha com batata, ovo frito e uma salada,
consideradas as refeições mais comuns. Os chamados "aperitivos" eram um
dos serviços oferecidos: bebidas alcoólicas, essencialmente aguardente (pinga)
servida pura ou em "caipirinhas" e cerveja, acompanhadas de alimentos
chamados "petiscos" ou "tira-gosto" (peixe frito, torresmos, lingüiça frita,
salame, presunto, mortadela, azeitona, amendoim, batata frita, bolinhos de
carne ou bacalhau). Há diversos bares que complementam suas atividades
com a venda de secos e molhados, o que configura um "mini-mercado".
Quanto às padarias, encontrou-se as maiores fornecendo, além de
pão, leite, café, biscoitos, doces (produtos essenciais do desjejum brasileiro),
carnes conservadas e laticínios variados para lanches. A clientela das padarias
é heterogênea, ressaltados os componentes de segmentos médios e populares
da sociedade.
Mais da metade dos bares e padarias contam com a participação da
família como mão-de-obra permanente ou temporária. Nesta segunda hipótese,
trata-se de filhos estudantes e adolescentes que auxiliam os pais quando as
tarefas escolares assim os permitem. São poucos os filhos associados à
empresa. Quando encontrados, estão sempre nas padarias (TAB. 10).
TABELA 10
Participação de familiares na empresa comercial
Categoria dos funcionários Bares Padarias
Só familiares 6 -
Só estranhos 13 13
Familiares e estranhos 8 21
Fonte: Centro da Comunidade Luso-Brasileira, 1992, p.18.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
114
O estudo da emigração portuguesa no Brasil tem que se debruçar,
inevitavelmente, sobre aspectos sociológicos da adaptação e organização do
espaço dos proprietários de bares e padarias na cidade de Belo Horizonte
comércio de pequeno e médio porte que constitui um dos ramos mais
prestigiados pelos emigrantes lusos e que nos podem fornecer explicações
gerais sobre o universo português.
Os dados recolhidos de uma amostra empírica constituída por
indivíduos residentes em Belo Horizonte, revelam estratégias de sobrevivência
desenvolvidas com grande eficácia por portugueses de modestos recursos. Os
apoios sociais dos quais dispuseram foram fornecidos essencialmente por
laços de solidariedade estabelecidos com parentes e amigos já residentes no
Brasil (CCLB, 1992).
A adaptação ilididas as dificuldades iniciais de estabelecimento em
novo habitat parece ter sido fácil, mas conseguida com muito trabalho.
Trabalho bem sucedido, compensador, mas estafante. Trabalho que deixa
pouco tempo para os lazeres e as alegrias do lar, segundo os depoimentos de
proprietários, descendentes e herdeiros do ramo comercial.
Com muito apego à terra natal, apego eminentemente emocional,
homens e mulheres sentem-se parte de uma nacionalidade ambígua: são
lusitanos e são brasileiros. Luso-brasilidade manifestada pelo amor entranhado
à terra natal e ao apego à segunda pátria, em geral, berço de seus filhos. Não
dupla nacionalidade, mas a mesma nacionalidade desdobrada
12
.
Ainda em relação ao trabalho, percebe-se que esses tiveram
algumas dificuldades nas fases de adaptação e reorganização da vida. Mesmo
seus descendentes, afirmando que seus avós se integraram bem aqui
manifestaram um apego conservador no que diz respeito à questão da
sobrevivência. Alegam que, dentro das famílias há, ainda, um tom de
12
Hoje, os filhos dos emigrantes apresentam o mesmo dinamismo de seus pais, manifestado nos estudos que
prosseguem e nos cargos que começam a guindar nas carreiras universitárias. Eles participam, de modo nuançado,
das imagens que seus pais têm de Portugal. Revelam um grande amor pela terra natal paterna e, aqueles que ainda
não tiveram a possibilidade de viajar à Europa, manifestaram curiosidade em conhecer (ou testar?) as
representações da pátria transmitidas pelos pais.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
115
conservadorismo. Para eles, os portugueses são típicos doutores e professores
e ao chegarem ao Brasil não passam de Josés e Antônios. Além disso, as
entrevistas mostraram que há sempre um destaque do nível de qualificação e o
potencial do trabalho que tinham. Demonstraram que, os que chegavam aqui,
estavam a par da situação de trabalho, mas sempre se achavam mais
profissionais que os trabalhadores brasileiros.
"... é verdade que vieram alguns portugueses sem
nenhuma qualificação, mas também vieram pessoas que
embora soubessem que teriam que começar por debaixo,
com posições subalternas, ainda eram melhores que os
nativos" (Entrevistado 5).
A imagem que os portugueses em Belo Horizonte transmitiam para
seus descendentes é que eles, nesse aspecto, tentavam reorganizar suas
vidas, mas a sociedade mostrou-se preconceituosa e os tratava como
imigrantes, numa relação de estranhamento que se estabelecia, também, no
âmbito do trabalho. Demonstraram, também, ter prestado grande contribuição,
na formação profissional do povo da cidade.
"... tem um país que está precisando que eu trabalhe é
para que eu vou... (..) se pesquisar, não tem português
vagabundo" (Entrevistado 6).
A atuação dos portugueses, nos diversos ramos de atividade, se deu
de forma muito expressiva para a economia da cidade concentrando-se em
algumas regiões da capital conforme destacado na FIG. 18. Porém é preciso
lembrar que o papel do Centro Luso-Brasileiro foi de grande valia para esses
empreendedores.
Coube a ele, conforme o estatuto, apoiar, direcionar, criar condições
financeiras, prestar socorros em casos de falências, medir resultados de seus
associados ligados ao setor empresarial. Havia e há na sede, reuniões
destinadas a discutirem e a proporem soluções para todos aqueles envolvidos
no comércio, na indústria, na construção civil, mantendo atuantes os princípios
de solidariedade, nos seus mais variados aspectos.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
116
FIGURA 18 - Mapa de Belo Horizonte, elaborado em 1922, com
destaque para as áreas de maior concentração do comércio e indústria
portuguesa
Fonte: Imagem cedida pelo Arquivo Público Mineiro
Calafate
Carlos
Prates
Lagoinha
Cachoeirinha
Centro
Santa Inês
Sion
Santa
Efigênia
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
117
Segundo relatórios, entrevistas e atas adquiridas na própria
instituição, a maioria desses empreendedores já ocupou cargos na direção da
mesma.
É preciso lembrar que a direção do Centro sempre esteve nas mãos
de portugueses mais esclarecidos, intelectualizados e bem sucedidos
financeiramente, o que vem comprovar a assistência prestada por eles ao
Centro.
4.7 A sociedade belorizontina e o legado do imigrante português
Belo Horizonte, confrontando duas situações, uma de cidade
moderna para a qual foi construída, de ruptura com o passado colonial e, outra,
por estar inserida no espaço mineiro, sempre lembrado pelo passado colonial,
carregado de conservadorismo e imagens de herança portuguesa, pode
produzir percepções e respostas diferentes por parte dos imigrantes.
O tempo é um dos fatores que se integra nesse processo por ser a
trajetória histórica dos portugueses que optaram em ficar aqui. A reconstrução
do espaço-lugar, mesmo com toques de modernidade, se deu muito mais no
sentido do conservadorismo.
Além da herança lingüística e da religião o catolicismo os
portugueses deixaram traços culturais marcantes na sociedade belorizontina.
Na arquitetura, presenciam-se marcas evidentes das construções de
estilo português - casas com portas e janelas que dão diretamente nas
calçadas, Nas igrejas, as obras em estilo barroco mostram o esmero nos
entalhes, cortes, riscos, rocailes, luxo e fé que a cultura portuguesa aqui
deixou, sempre na tentativa de reconstrução identitária por meio de uma
reconstrução espacial.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
118
Os imigrantes portugueses trouxeram ainda as festas, os cantares,
as músicas ligadas à religião, ao trabalho, quase todas advindas de tradições
medievais.
Em Belo Horizonte, este legado se mostra na dança de rua, do tipo
cateretê, ao som de uma viola, na catira que é uma variante desta, as duas de
influência portuguesa, herdadas da modinha, cantiga popular ibérica.
Das festas e comemorações religiosas que foram trazidas pelos
portugueses para Belo Horizonte podem se destacar as festas juninas (Santo
Antônio, São Pedro e São João, a Festa do Divino, a comemoração de Corpus
Christi, a tradição das romarias, entre outras) (FIG. 19).
FIGURA 19 - Festa junina realizada no Centro da Comunidade Luso-
brasileira
Fonte: Imagem cedida pelo Centro da Comunidade Luso-brasileira
Até hoje, Belo Horizonte mantém todo o ritual destas festas
tradicionais portuguesas como as romarias de Nossa Senhora da Agonia, a
festa de São Gualtério. Há, primeiramente, uma missa, depois um almoço,
seguido de uma procissão à tarde e à noite serenatas, canções e apresentação
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
119
da banda típica das instituições que promovem esses eventos e que procuram
ser fiéis aos costumes herdados dos portugueses.
Entre as inúmeras tradições trazidas pelos portugueses, pode-se
mencionar, também, o costume de pendurar colchas nas janelas e sacadas,
por ocasião de festas, procissões e cortejos.
As brincadeiras infantis foram preservadas, nas escolas, em Belo
Horizonte. Muitas delas fazem parte dos programas da disciplina Educação
Artística. Entre elas estão o Jogo do Caracol, Terezinha, O barco virou, Bufa
gatos, Esconder o lenço, Dedos, Jogo do pião, Jogo de berlindes, Jogo da
Cabra-cega, entre outros.
Na culinária, a maior contribuição dos portugueses na cozinha
belorizontina foram os doces. Utilizando o ovo de galinha nas suas receitas o
ingrediente não era usado pelos índios nem os negros a mulher portuguesa
elaborava diversas iguarias como bolos folheados, pastéis, filhós, sonhos,
enfeitados com erva-doce, cravo da Índia, alecrim e canela. Com as frutas da
terra cajus, figos, maracujás, amendoins, ananases, marmelos, fazia doces e
conservas. Ainda, na culinária belorizontina, pode-se notar o gosto pelo
bacalhau, pela galinha ao molho pardo, pelo cuscuz, pelo cozido à portuguesa,
pelo leitão assado, além da utilização do azeite de oliva. O belorizontino ainda
conserva, também, o hábito típico português de comer "miúdos" de boi como a
dobradinha, rins, coração e tripas. Aqui é famosa a receita de tripas à moda do
Porto.
O artesanato também faz parte do legado cultural deixado aqui pelos
portugueses. Segundo Bardi (1980, p.44):
“... foram os portugueses, naturalmente, os introdutores
das olarias, já no período das capitanias. Têm-se notícias
de mestres que desembarcaram na Bahia em 1549. São
os padres que se servem das produções para a
construção das igrejas e dos colégios”.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
120
Olaria, segundo os dicionários, é um lugar onde se fabricam vasos e
quaisquer louças de barro. No significado mais moderno e ampliado significa
fábrica de manilhas, tijolos e telhas de barro. Os padres jesuítas trouxeram de
Portugal a arte de mexer com o barro para confecção de tijolos e telhas,
vasilhas e figuras do imaginário. Foram eles, também, que introduziram a
cerâmica religiosa, que atualmente, são fabricadas e vendidas em qualquer
feira-livre de Belo Horizonte.
Outra tradição trazida pelos portugueses foi o emprego de azulejos
que, em Portugal, eram utilizados na decoração do interior e nas fachadas dos
edifícios. As composições são as mais variadas: as cenas de vida dos santos,
temas civis, marítimos, cenas da mitologia, episódio da vida doméstica e
outros. Alguns pintores brasileiros usaram azulejos como suporte para suas
pinturas. Em Belo Horizonte, o exemplo mais marcante desse legado é a Igreja
da Pampulha com murais de Cândido Portinari.
Finalmente, pode-se perceber que, ao confrontar as contribuições,
tanto nos aspectos do desenvolvimento, da cultura, da economia, da política,
quanto no aspecto da formação da cidade de Belo Horizonte comprovados nas
atas, depoimentos, entrevistas e na pesquisa, que o elemento português se fez
notar, não de forma aleatória, mas, principalmente, por causa do vínculo que
tinha com o Centro Luso-Brasileiro que, de alguma forma, soube conduzi-lo,
apoiá-lo para que, além de manter suas tradições, seus valores, soubesse
propagá-los.
CONCLUSÃO
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
122
5. CONCLUSÃO
No trabalho desenvolvido, os fios do traçado das lembranças e da
historiografia mostram um mosaico rico e variado pelo qual pôde-se reconstituir
não apenas as histórias individuais dos colonizadores portugueses, mas
recompor de forma coletiva o papel que esses deram à comunidade de Belo
Horizonte. Manipulando a tradição o passado se fez presente, o sistema
simbólico foi renovado e as relações sociais foram reafirmadas.
O movimento imigratório de portugueses para o Brasil foi o mais
longo e de maior duração comparado a outras nacionalidades. Os portugueses
deixavam sua terra natal com a ilusão de encontrar, em terras distantes,
melhores condições de vida. Muitos vinham fugindo da falta de emprego
quando a modernidade atingiu os campos portugueses, expulsando o homem
das áreas agrícolas. Apesar da política contrária à imigração, do governo de
Portugal, ainda assim ela continuava acontecendo às vésperas da Primeira e
da Segunda Guerra Mundial. No decorrer do século XIX o Brasil, necessitando
de mão-de-obra para as lavouras de café, abandonadas pelo escravo após a
abolição, desenvolveu uma política de imigração intensa na Europa. A
propaganda mostrava, ilusoriamente, alguns lugares de algumas regiões do
Brasil, convencendo o imigrante a deixar sua terra natal e aqui se estabelecer.
Aqui o imigrante tinha oferta de trabalho nas lavouras de café e no comércio
varejista, nas maiores cidades do país, bem como doação de terras, recebendo
sementes e insumos para o seu cultivo, com o respectivo desenvolvimento da
agricultura. O mito do enriquecimento, as vantagens da mesma língua, a
religião e a busca por uma vida melhor foram, na realidade, os principais
atrativos para os portugueses deixarem sua terra natal e enfrentarem todo tipo
de obstáculos. Portanto, em meados do século XIX e início do século XX, o
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
123
Brasil foi a principal atração dos portugueses deixando as autoridades
portuguesas preocupadas, temendo o despovoamento do país, principalmente
o norte de Portugal, de onde veio a maior parte dos imigrantes, que se fixaram
especialmente em Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Pará, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul, mas a maior concentração se deu nos estados de São
Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A política imigratória estabelecida pelo
Brasil, além da colonização de várias regiões, contribuiu para o
desenvolvimento nacional especialmente no ramo da indústria e do comércio
onde se destacam os portugueses.
Em Minas Gerias, a colonização não foi diferente dos outros estados
brasileiros, coincidindo com a abolição da escravatura e com a necessidade de
substituir a mão-de-obra escrava. A colonização do estado através da
introdução da raça branca foi a grande preocupação do governo provincial,
promovendo a vinda do imigrante europeu por meio de propaganda, ora com
mapas ilustrativos, ora com boletins contendo instruções aos imigrantes e com
as despesas pagas. O nascimento da nova capital foi um grande atrativo para
a maioria dos imigrantes, principalmente italianos e portugueses, que aqui se
estabeleceram e participaram de sua construção, apesar da saudade da terra
natal. A política imigratória de várias regiões no Estado de Minas Gerais e Belo
Horizonte foi regularizada por leis do governo provincial mineiro.
A participação do elemento português na vida cultural, social e
econômica belorizontina é bastante complexa. Tentou-se reconstruir sua
história com a recuperação de sua memória individual e coletiva, no sentido da
individualidade étnica portuguesa para mostrar sua colaboração no processo
de formação da cidade. A embrionária cidade começava a se impor e se
tornaria um verdadeiro parque de obras, fato que atrairia profissionais ligados à
edificação de várias partes do país. O espaço citadino se formava, então, sob a
égide de uma política governamental que incentivaria a instalação de novos
habitantes, principalmente de imigrantes oriundos de várias partes da Europa.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
124
A contribuição do imigrante português na construção da nova capital
foi fundamental, destacando-se a participação de engenheiros, mestres de
obra, escultores, entre outros. As crises econômicas da virada do século, as
lutas políticas, as alianças entre interesses antagônicos face ao controle sobre
a capital e as dificuldades em resolver questões regionais e urbanas,
retardaram a maturação industrial de Belo Horizonte. É marcante a presença
do ideário de modernidade liberal e, principalmente, a de um relativo
eufemismo nas análises econômicas. Percebe-se a presença de movimentos
de cunho ideário ligado ao anarquismo e ao socialismo. A expressão Sindicatos
passa a designar os movimentos de organização trabalhista e uma nova
perspectiva nas questões relacionadas aos movimentos sociais em escala
local, regional e nacional com uma participação significativa de elementos
portugueses. O surgimento de organizações institucionais que lidavam com
problemas relativos aos operários fez de Belo Horizonte palco de importantes
movimentos sociais, reflexo incontestável das tendências político-ideológicas
mundiais e que, sem dúvida, têm na figura do imigrante grande
representatividade. Com a mudança da Capital, começou a chegar a Belo
Horizonte um contingente de pessoas – profissionais liberais, técnicos,
comerciantes e, principalmente, operários – em busca de trabalho e de
oportunidade. Um dos primeiros desafios enfrentados pela Comissão
Construtora foi quanto à acomodação desses novos habitantes.
A fundação de núcleos acabou por servir como eficiente meio de
incrementar o processo de ocupação da cidade. A política de Núcleos
Agrícolas visava não só o povoamento da área, garantindo a ocupação em
torno da futura Capital, como também ao incremento da produção agrícola para
abastece-la. No caso dos trabalhadores rurais, encarregados do plantio do
cinturão verde que abasteceria a cidade, foi previsto o alojamento das famílias
nos Núcleos Agrícolas, o mesmo, entretanto, não acontecendo com os
trabalhadores urbanos encarregados de construir a cidade. Para esses, a
Comissão Construtora construiu uma hospedaria.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
125
Os portugueses que aqui chegaram, após a independência,
desfrutaram de situação singular. Para alguns, a independência em 1822, não
foi feita contra os portugueses, mas com os portugueses. A imigração em
massa na virada do século coincidiu com transformações econômicas e
políticas no Brasil, com a abolição e a proclamação da República. Os
portugueses concentraram suas atividades no pequeno comércio urbano ou
ingressaram nas fileiras da massa operária que se formava aqui. Os
portugueses pobres que chegavam a Minas Gerais, Belo Horizonte, por serem
brancos e europeus, eram preferidos aos trabalhadores nacionais, negros e
mulatos. Muitos portugueses que chegaram no Brasil se ocuparam em manter
a identidade cultural e defender os interesses de toda a colônia. Isso levou uma
elite a organizar associações, clubes e sociedades de assistência. A primeira
instituição cultural portuguesa, fundada no Brasil, foi o Real Gabinete
Português de Leitura, em 14 de maio de 1837, em 1840 a Beneficência
Portuguesa do Rio de Janeiro e, em 23 de dezembro de 1892 foi fundado o
Real Centro da Colônia Portuguesa, também no Rio de Janeiro.
A saudade da terra natal, o desejo de preservar a cultura e dar
assistência aos imigrantes portugueses que chegavam em Belo Horizonte, por
ocasião da sua construção, incentivou um grupo de portugueses já
estabelecidos aqui a fundarem, no dia 15 de setembro de 1912, o Centro da
Colônia Portuguesa, atual Centro da Comunidade Luso-Brasileira.
O Centro tinha múltiplas finalidades, como a de auxiliar os
imigrantes portugueses atingidos por moléstias ou por invalidez e prestar
socorros aos necessitados; dar assistência médica gratuita e facilitar a
aquisição de medicamentos aos excluídos; financiar repatriamentos; manter
uma biblioteca e comemorar as datas cívicas dos dois países.
Para o Centro Português, os portugueses imigrantes deviam
promover a sua unidade, estabelecendo contatos sociais, culturais que
pudessem manter valores comuns próprios de sua origem. Os integrantes das
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
126
comunidades de cultura portuguesa deveriam seguir critérios para que
gozassem de boa aceitação local e integração com o próprio Centro.
Ser português para a associação era manter a convivência, sempre
voltada com profundo apego à sua terra natal e melhorar a sua posição social
no domínio das relações com outras comunidades, pois o português sentia-se
inferiorizado social, cultural e religiosamente em relação às comunidades com
que conviviam. Manter o culto à língua portuguesa de Portugal era uma
questão imprescindível.
O Centro da Comunidade Luso-brasileira de Belo Horizonte, desde
sua fundação, sempre foi integrado por dirigentes e associados das mais
diversas linhas de pensamento, das mais variadas atividades, mas todos
voltados para uma causa comum, cultivar a imagem de Portugal e suas
tradições sem se envolver com questões políticas e religiosas, empenhando-se
em difundir a cultura lusitana e manter viva a herança sócio-cultural
portuguesa.
Foi significativa a contribuição do Centro na esfera do trabalho, pois
o crescimento de Belo Horizonte levou ao desenvolvimento de uma infra-
estrutura comercial, de serviços e industrial, abrindo espaço para novas
profissões. Cabia à colônia portuguesa fiscalizar e possibilitar a entrada dos
portugueses e, até mesmo, dos belorizontinos, nessa nova ordem de trabalho.
A atuação dos portugueses, nos diversos ramos de atividade, se deu
de forma muito expressiva para a economia da cidade. Porém é preciso
lembrar que o papel do Centro Luso-Brasileiro foi de grande valia para esses
empreendedores. Coube a ele, conforme o estatuto, apoiar, direcionar, criar
condições financeiras, prestar socorros em casos de falências, medir
resultados de seus associados ligados ao setor empresarial. Havia e há na
sede, reuniões destinadas a discutirem e a proporem soluções para todos
aqueles envolvidos no comércio, na indústria, na construção civil, mantendo
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
127
atuantes os princípios de solidariedade, nos seus mais variados aspectos.
Até hoje, Belo Horizonte mantém todo o ritual das festas tradicionais
portuguesas. Do legado cultural deixado aqui pelos portugueses pode-se
destacar as brincadeiras infantis, a culinária e o artesanato.
Pode-se perceber que, ao confrontar as contribuições, tanto nos
aspectos do desenvolvimento, da cultura, da economia, da política, quanto ao
aspecto da formação da cidade de Belo Horizonte, o elemento português se fez
notar, não de forma aleatória, mas, principalmente, por causa do vínculo que
tinha com o Centro Luso-Brasileiro que, de alguma forma, soube conduzi-lo,
apoiá-lo para que, além de manter suas tradições, seus valores, soubesse
propagá-los.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
129
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. BARBOSA, Waldemar de Almeida. A verdade sobre a história de Belo
Horizonte. Belo Horizonte: FINAC, 1985.
2. BARDI, Pietro Maria. Arte cerâmica no Brasil. São Paulo: Banco
Sudameris, 1980 apud RODRIGUES, Ondina Antonio. Imigração
Portuguesa no Brasil. São Paulo. Secretaria de Estado da Cultura.
Departamento de Museus e Arquivos. Série Resumos, n.5. São Paulo,
1999.
3. BARRETO, Abílio. Belo Horizonte: Memória histórica e descriptiva;
historia média. Belo Horizonte: Rex, 1936.
4. BARRETO, Abílio. Resumo histórico de Belo Horizonte (1701- 1947).
Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1950. 342p
5. BARRETO, Abílio. Belo Horizonte: Memória histórica e descriptiva,
planejamento, estudo, construção e inauguração da nova Capital (1893-
1898). Belo Horizonte: Rex, 1936.
6. BASSANEZI, Maria Silva C. Beozzo. Imigrações internacionais um
panorama histórico. Campinas: NEPO/UNICAMP apud RODRIGUES,
Ondina Antonio. Imigração Portuguesa no Brasil. São Paulo. Secretaria
de Estado da Cultura. Departamento de Museus e Arquivos. Série
Resumos, n. 5. São Paulo, 1999.
7. BASTOS, Aureliano; TAVARES, Cândido. Memórias sobre a imigração.
São Paulo: Nacional, 1939.
8. BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal de
Cultura. BH verso e reverso. Belo Horizonte: SEGRAC, 1996. 152p.
9. CARINHAS, Teófilo; MARTINS, Raul; MARTINS, Eugênio Gomes;
CHIANCA, Ruy. Álbum da colônia portuguesa no Brasil. São Paulo:
Oficinas Gráficas e Companhia,1929.
10. CARNIER JÚNIOR, Plínio. Imigrações para São Paulo: a viagem, o
trabalho, as contribuições. São Paulo, [s.n.], 1999 apud RODRIGUES,
Ondina Antonio. Imigração Portuguesa no Brasil. São Paulo. Secretaria
de Estado da Cultura. Departamento de Museus e Arquivos. Série
Resumos, n. 5. São Paulo, 1999.
11. CENTRO COMUNIDADE LUSO BRASILEIRA. Breve história do Centro
da Colônia Portuguesa. 1957. 30p. (Mimeo).
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
130
12. CENTRO COMUNIDADE LUSO BRASILEIRA. Ata da Sessão Ordinária
de 03 de novembro de 1969, livro 8, p. 234.
13. CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA. Acta da Sessão de
Assembléia Geral Extraordinária. 15 de setembro de 1912, Livro 1, p.2,
Belo Horizonte.
14. CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA. Acta da Sessão
de Assembléia Ordinária. 20 de junho de 1915, livro 1, p.58.
15. CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA. Acta da Sessão
Extraordinária do Conselho Administrativo. 02 de abril de 1916, livro 1,
p.73. Belo Horizonte.
16. CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA. Acta da Sessão
Solene - Posse da Diretoria e Comemoração da Restauração de
Portugal. 01 de dezembro de 1912, livro 1, p.6, Belo Horizonte.
17. CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA. Acta da Sessão
Solene. 01 de dezembro de 1916, Livro 1, p. 82. Belo Horizonte.
18. CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA. Boletim de
Atividades. 1912-1992. Belo Horizonte, 1992.
19. CENTRO DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA. Estatutos.
Publicação própria, novembro 1992.
20. CORRÊA, Paulo Kruper. História de Belo Horizonte – 1899 a 1930. Belo
Horizonte: EDITORA, 1970. 79p.
21. COSTA, José Eduardo; NOVATO, Ana Cristina. Os primeiros 100 anos.
Belo Horizonte: Gráfica e Editora 101, 1997. 234p.
22. D'AGUIAR, Antonio Augusto. Belo Horizonte: a cidade revelada. Belo
Horizonte: Fundação Odebrecht, 1989.
23. DECRETO Imperial nº 6.368, 1876. Emancipação de Colônias. Governo
da Província Mineiro. [s.n.t.] apud MONTEIRO, Norma de Góes.
Imigração e colonização em Minas Gerais - 1889 a 1930. Belo
Horizonte: Cooperativa de Cultura da Fundação Cultural de Belo
Horizonte, 1973.
24. DIEGUES JR., Manoel. Imigração urbanização e industrialização. Rio
de Janeiro: Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, 1964 apud
RODRIGUES, Ondina Antonio. Imigração Portuguesa no Brasil. São
Paulo. Secretaria de Estado da Cultura. Departamento de Museus e
Arquivos. Série Resumos, n. 5. São Paulo, 1999.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
131
25. FARIA, Maria Auxiliadora. O processo de desenvolvimento de Belo
Horizonte: 1897 - 1970. 1979. 182f. Dissertação (Mestrado em
Sociologia) - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
26. FEDERAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES PORTUGUESAS E LUSO-
BRASILEIRAS. Lisboa, 1988.
27. FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DE MINAS GERAIS. Cem anos da
Indústria em Belo Horizonte. Belo Horizonte: FIEMG/SESI, 1998.
28. FIGUEIREDO, Francisco. Palestra proferida no Centro da Comunidade
Luso-Brasileira, em 15 de setembro de 2000, em comemoração aos 88
anos da Associação. (Mimeo).
29. FIUZA, Ricardo Arnaldo Malheiros. O 87º aniversário do Centro Luso-
Brasileiro. Belo Horizonte: Sografe, 1999.
30. FIUZA, Ricardo Arnaldo Malheiros. O passarinho de Lisboa. Belo
Horizonte: Rona, 1984.
31. FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO. Belo Horizonte e o comércio - 100 anos
de história. Belo Horizonte: Centro de Estudos Históricos e Culturais,
1997. 336p.
32. FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO. Centro de Estudos Históricos e
Culturais. A colonização alemã no Vale do Mucuri. Belo Horizonte,
1993. Coleção Mineiriana. Série Estudos e Ensaios nº 1.
33. GÓES, Luiz. O Grande Hotel: o apogeu da sociedade e da política em
Belo Horizonte (1897-1957). Belo Horizonte: Luiz Góes, 2001.
34. GÓES, Luiz. Bairro de Santa Tereza: memória história nos 100 anos de
Belo Horizonte, [s.n.t.] 1987.
35. GURGEL, Artur Carvalho do Amaral. A festa acabou: leitura crítica de
textos comemorativos do centenário de Belo Horizonte – 1997. 2001.
Dissertação (Mestrado em História Ibero-Americana) - Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre
36. IBGE - Anuário Estatístico do Brasil, 1938. p.128.
37. IMAGENS da Imigração Portuguesa no Brasil. Santa Bárbara d’Oeste
(1992). Catálogo de exposição apud RODRIGUES, Ondina Antonio.
Imigração Portuguesa no Brasil. São Paulo. Secretaria de Estado da
Cultura. Departamento de Museus e Arquivos. Série Resumos, n. 5.
São Paulo, 1999.JORNAL DIÁRIO DE MINAS. Colonização. Cidade de
Minas, 1899.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
132
38. JORNAL ESTADO DE MINAS. Comemoração dos 100 anos de Belo
Horizonte. Caderno Especial. 08 de Dezembro de 1997.
39. JORNAL MINAS GERAIS. Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Atos
do Secretário. Belo Horizonte, fevereiro de 1899. p.4.
40. JORNAL MINAS GERAIS. Immigração e colonização estrangeira. Belo
Horizonte, fevereiro de 1925. Caderno Especial.
41. LEI dos Sexagenários, de 1875. Governo provincial. [s.n.t.] apud
MONTEIRO, Norma de Góes. Imigração e colonização em Minas Gerais
- 1889 a 1930. Belo Horizonte: Cooperativa de Cultura da Fundação
Cultural de Belo Horizonte, 1973.
42. LEI Imperial nº 514, de 28 de outubro de 1848. Base da política de
Colonização do Governo Provincial Mineiro. [s.n.t.] apud MONTEIRO,
Norma de Góes. Imigração e colonização em Minas Gerais - 1889 a
1930. Belo Horizonte: Cooperativa de Cultura da Fundação Cultural de
Belo Horizonte, 1973.
43. LEI nº 32, de 18 de julho de 1892. Estabelecimento de crédito aberto ao
Governo por conta da instalação de Núcleos Coloniais. Governo da
Província Mineiro. [s.n.t.] apud MONTEIRO, Norma de Góes. Imigração
e colonização em Minas Gerais - 1889 a 1930. Belo Horizonte:
Cooperativa de Cultura da Fundação Cultural de Belo Horizonte, 1973.
44. LEI nº 581, Eusébio de Queiroz que pôs fim ao tráfico de escravos. 4 de
setembro de 1850. Palácio do Rio de Janeiro aos quatro de setembro
de mil oitocentos e cinqüenta, vigésimo da Independência e do Império.
[s.n.t.] apud MONTEIRO, Norma de Góes. Imigração e colonização em
Minas Gerais - 1889 a 1930. Belo Horizonte: Cooperativa de Cultura da
Fundação Cultural de Belo Horizonte, 1973.
45. LEI Provincial 3.598, de 06 de dezembro de 1888. Introdução de
imigrantes pela Companhia de Imigração e Colonização Mineira.
Governo Provincial Mineiro. [s.n.t.] apud MONTEIRO, Norma de Góes.
Imigração e colonização em Minas Gerais - 1889 a 1930. Belo
Horizonte: Cooperativa de Cultura da Fundação Cultural de Belo
Horizonte, 1973.
46. LEI Provincial nº 2.819, de 24 de outubro de 1881. Encaminhamento de
colonos para as fazendas de café pelo Governo Provincial Mineiro.
[s.n.t.] apud MONTEIRO, Norma de Góes. Imigração e colonização em
Minas Gerais - 1889 a 1930. Belo Horizonte: Cooperativa de Cultura da
Fundação Cultural de Belo Horizonte, 1973.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
133
47. Lei Provincial n
o
3.598, de 6 de dezembro de 1888. Introdução de
imigrantes pela Companhia de imigrantes e colonização Mineira.
Governo Provincial Mineiro apud MONTEIRO, Norma de Góes.
Imigração e colonização em Minas Gerais - 1889 a 1930. Belo
Horizonte: Cooperativa de Cultura da Fundação Cultural de Belo
Horizonte, 1973.
48. LEITE, Joaquim Ferreira da Costa. O Brasil e a emigração portuguesa
(1855-1914). In: BORIS FAUSTO (org.). Fazer a América. São Paulo:
Editora da Universidade de São Paulo, 1999.
49. LEMOS, Celina Borges. Determinação do espaço urbano: a evolução
econômica urbanística e simbólica do centro de Belo Horizonte.
Dissertação (Mestrado em Sociologia). 1988. 368f. Departamento de
Sociologia e antropologia, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
50. LIMA, Vasco de Castro. A Estrada de Ferro Sul de Minas; 1884-1934.
São Paulo: COPAG, 1934.
51. LOBO, Eulália L. Portugueses em Brasil el seglo XX. Madrid: Mapfre,
1994 apud RODRIGUES, Ondina Antonio. Imigração Portuguesa no
Brasil. São Paulo. Secretaria de Estado da Cultura. Departamento de
Museus e Arquivos. Série Resumos, n. 5. São Paulo, 1999.
52. MIBIELLE, Fernando Carvalho. Imigração, um problema nacional. Rio
de Janeiro, ano 6, n.1, março 1945.
53. MINAS GERAIS. Decreto n
o
14, de 24 de janeiro de 1890. Coleção dos
Decretos do Governo Provisório do Estado de Minas Gerais expedidos
desde 3 dez 1889 a 31 dez 1890. Belo Horizonte: Imprensa Oficial,
1934, p.16.
54. MINAS GERAIS. Estatutos da Sociedade Portuguesa de Beneficência
da Cidade de Leopoldina, Província de Minas Gerais, Império do Brasil
Leopoldina, 1889.
55. MINAS GERAIS. Secretaria da Agricultura, Comércio e Obras Públicas.
Relatórios referentes aos períodos 1890/1892; 1893/1895; 1896/1899;
1900/1905; 1906/1912. Microfilmes, rolos 1, 2, 3 4 e 5. Acesso em 2002.
56. MINAS GERAIS. Secretaria da Agricultura. Notícia estatística -
chorographica do município de Belo Horizonte. Publicação de 10 de
junho de 1927, p. 6.
57. MONTEIRO, Bernardo Pinto. Relatório apresentado ao Conselho
Deliberativo da Capital pelo Prefeito, em setembro de 1902. Belo
Horizonte, Imprensa Oficial, 1902, p.3.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
134
58. MONTEIRO, Norma de Góes. Imigração e colonização em Minas Gerais
- 1889 a 1930. Belo Horizonte: Cooperativa de Cultura da Fundação
Cultural de Belo Horizonte, 1973.
59. MOURÃO, Paulo Kruger C. História de Bello Horizonte de 1897 a 1930.
Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1945.
60. OBEIZ-DAISE. A imigração mundial: suas causas e efeitos. Boletim das
Nações Unidas, maio 1948. Revista de Imigração e Colonização, Rio de
Janeiro, ano 9, n.2, junho 1948.
61. OLIVEIRA, Lucia Lippi. O Brasil dos imigrantes. Rio de Janeiro: Zahar,
2001
62. PEREIRA, Elizabeth Guerra Parreiras Baptista. Belo Horizonte, uma
cidade de acolhimento: a identidade de sobrevivência na imigração
portuguesa entre 1975 e 1990. 2001. Dissertação (Mestrado em
Ciências Sociais: Gestão das Cidades). Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais, Belo Horizonte.
63. PEREIRA, Lígia Maria Leite; FARIA, Maria Auxiliadora de. Associação
Comercial de Minas: uma história de pioneirismo e desenvolvimento -
1901-2001. Belo Horizonte: Associação Comercial de Minas, 2001.
456p.
64. PLAMBEL. O processo de desenvolvimento de Belo Horizonte – 1897-
1970. Belo Horizonte: Editora, 1979.
65. RODRIGUES, Ondina Antonio. Imigração Portuguesa no Brasil. São
Paulo. Secretaria de Estado da Cultura. Departamento de Museus e
Arquivos. Série Resumos, n. 5. São Paulo, 1999.
66. ROMANO, Olavo. Muito além da cidade planejada. Belo Horizonte:
Magnum Editora, 1997. 160p.
67. SCOTT, Ana Silva Volpi. As duas faces da imigração portuguesa para o
Brasil (década de 1820-1930). Trabalho apresentado ao Congresso de
História Econômica de Zaragoza - 2001.
68. SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole. São Paulo,
sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das
Letras, 1992 apud PEREIRA, Elizabeth; GUERRA, Parreiras Baptista.
Belo Horizonte, uma cidade de acolhimento: a identidade de
sobrevivência na imigração portuguesa entre 1975 e 1990. 2001.
Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais: Gestão das Cidades).
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.
O imigrante português em Belo Horizonte e o Centro da Comunidade Luso-Brasileira
135
69. SILVA, Renato de Assunção. A América Latina e a imigração espanhola
em Belo Horizonte (1890-1930): colonização, urbanização e integração
social. 2002. Dissertação (Mestrado em História Ibero Americana) -
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
70. TIMMERS, O. O Mucuri e o Nordeste mineiro no passado e seu
desenvolvimento. Teófilo Otoni: [s.n.], 1969.
71. TODOROV, Tzvetan. O homem desenraizado. Rio de Janeiro: Record,
1999 apud PEREIRA, Elizabeth; GUERRA, Parreiras Baptista. Belo
Horizonte, uma cidade de acolhimento: a identidade de sobrevivência
na imigração portuguesa entre 1975 e 1990. 2001. Dissertação
(Mestrado em Ciências Sociais: Gestão das Cidades). Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.
FONTES:
Orais:
Entrevistas gentilmente cedidas por portugueses e descendentes à autora.
Ilustrativas:
Imagens cedidas pelo Centro da Comunidade Luso-brasileira, Arquivo Público
Mineiro e Arquivo Público de Belo Horizonte.
Imprensa:
Hemeroteca de Belo Horizonte.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo