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IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP
Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - PADCT
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE
DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
_____________________________________________________________________________________________
CONDICIONANTES SOCIAIS
DA COMPETITIVIDADE
Nota Técnica do Bloco Temático V
O conteúdo deste documento é de
exclusiva responsabilidade da equipe
técnica do Consórcio. Não representa a
opinião do Governo Federal.
Campinas, 1993
A Comissão de Coordenação - formada por Luciano G. Coutinho (IE/UNICAMP), João Carlos Ferraz (IEI/UFRJ), Abílio dos Santos
(FDC) e Pedro da Motta Veiga (FUNCEX) - considera que o conteúdo deste documento está coerente com o Estudo da Competitividade da Indústria
Brasileira (ECIB) e servirá para elaboração do Relatório Final do Estudo.
A Coordenação do ECIB agradece ao consultor Claudio Salm (Professor do Instituto de Economia Industrial/UFRJ) pela elaboração deste
documento e pelos trabalhos de coordenação das Notas Técnicas Temáticas do Bloco "Condicionantes Sociais da Competitividade".
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
CONSÓRCIO
Comissão de Coordenação
INSTITUTO DE ECONOMIA/UNICAMP
INSTITUTO DE ECONOMIA INDUSTRIAL/UFRJ
FUNDAÇÃO DOM CABRAL
FUNDAÇÃO CENTRO DE ESTUDOS DO COMÉRCIO EXTERIOR
Instituições Associadas
SCIENCE POLICY RESEARCH UNIT - SPRU/SUSSEX UNIVERSITY
INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL - IEDI
NÚCLEO DE POLÍTICA E ADMINISTRAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA - NACIT/UFBA
DEPARTAMENTO DE POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA - IG/UNICAMP
INSTITUTO EQUATORIAL DE CULTURA CONTEMPORÂNEA
Instituições Subcontratadas
INSTITUTO BRASILEIRO DE OPINIÃO PÚBLICA E ESTATÍSTICA - IBOPE
ERNST & YOUNG, SOTEC
COOPERS & LYBRAND BIEDERMANN, BORDASCH
Instituição Gestora
FUNDAÇÃO ECONOMIA DE CAMPINAS - FECAMP
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
EQUIPE DE COORDENAÇÃO TÉCNICA
Coordenação Geral: Luciano G. Coutinho (UNICAMP-IE)
João Carlos Ferraz (UFRJ-IEI)
Coordenação Internacional: José Eduardo Cassiolato (SPRU)
Coordenação Executiva: Ana Lucia Gonçalves da Silva (UNICAMP-IE)
Maria Carolina Capistrano (UFRJ-IEI)
Coord. Análise dos Fatores Sistêmicos: Mario Luiz Possas (UNICAMP-IE)
Apoio Coord. Anál. Fatores Sistêmicos: Mariano F. Laplane (UNICAMP-IE)
João E. M. P. Furtado (UNESP; UNICAMP-IE)
Coordenação Análise da Indústria: Lia Haguenauer (UFRJ-IEI)
David Kupfer (UFRJ-IEI)
Apoio Coord. Análise da Indústria: Anibal Wanderley (UFRJ-IEI)
Coordenação de Eventos: Gianna Sagázio (FDC)
Contratado por:
Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP
Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - PADCT
COMISSÃO DE SUPERVISÃO
O Estudo foi supervisionado por uma Comissão formada por:
João Camilo Penna - Presidente Júlio Fusaro Mourão (BNDES)
Lourival Carmo Mônaco (FINEP) - Vice-Presidente Lauro Fiúza Júnior (CIC)
Afonso Carlos Corrêa Fleury (USP) Mauro Marcondes Rodrigues (BNDES)
Aílton Barcelos Fernandes (MICT) Nelson Back (UFSC)
Aldo Sani (RIOCELL) Oskar Klingl (MCT)
Antonio dos Santos Maciel Neto (MICT) Paulo Bastos Tigre (UFRJ)
Eduardo Gondim de Vasconcellos (USP) Paulo Diedrichsen Villares (VILLARES)
Frederico Reis de Araújo (MCT) Paulo de Tarso Paixão (DIEESE)
Guilherme Emrich (BIOBRÁS) Renato Kasinsky (COFAP)
José Paulo Silveira (MCT) Wilson Suzigan (UNICAMP)
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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SUM`RIO
RESUMO EXECUTIVO ........................................ 1
INTRODUÇÃO .............................................. 39
1. RELAÇÕES DE TRABALHO ................................. 43
1.1. Tendências Internacionais ....................... 43
1.2. A Situação Brasileira ........................... 49
1.2.1. O quadro geral ........................... 49
1.2.2. O contrato coletivo ...................... 54
1.2.3. A questão do custo do trabalho ........... 58
1.2.4. Implantação do contrato coletivo no Brasil:
principais proposições ................... 60
- Aspectos gerais ........................ 60
- Implantação no Brasil .................. 62
- Contrato coletivo e direitos sociais ... 63
1.2.5. A proteção social: principais questões ... 65
2. O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL ......................... 68
2.1. Tendências Internacionais ....................... 68
2.2. A Situação Brasileira ........................... 73
3. EDUCAÇÃO E QUALIFICAÇÃO .............................. 82
3.1. Tendências Internacionais ....................... 82
3.2. A Situação Brasileira ........................... 86
3.2.1. A educação geral ......................... 88
- A gestão do sistema educacional ........ 90
3.2.2. A formação profissional .................. 95
- A participação do empresariado ......... 97
- A participação dos trabalhadores ....... 98
4. PROPOSIÇÕES .......................................... 101
4.1. Relações de Trabalho e a Proteção Social ........ 101
4.1.1. Contrato coletivo de trabalho ............ 103
4.1.2. Mecanismos de proteção social ............ 104
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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4.1.3. Recomendações às empresas ................ 105
4.2. Educação e Qualificação ......................... 106
4.2.1. Diretrizes e recomendações ............... 106
4.2.2. Ações prioritárias ....................... 107
- Magistério ............................. 107
- Melhoria do ensino básico .............. 109
- Ensino superior ........................ 111
- Qualificação profissional .............. 112
4.2.3. Papel dos sindicatos ..................... 115
4.2.4. Financiamento do ensino básico ........... 115
4.2.5. Sistema nacional de avaliação ............ 117
5. INDICADORES .......................................... 120
5.1. Relações de Trabalho e Proteção Social .......... 120
5.2. Educação e Qualificação ......................... 120
BIBLIOGRAFIA ............................................ 122
ANEXO - Tabelas 1 a 7 ................................... 126
1
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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RESUMO EXECUTIVO
INTRODU˙ˆO
As novas formas de organização do trabalho representam um
fenômeno central do processo de reestruturação industrial nas
economias avançadas. Suas características mais marcantes são o
envolvimento e a participação dos trabalhadores, especialmente
daqueles que trabalham no "chão de fábrica", em tarefas e
decisões antes adstritas a um reduzido número de funcionários
qualificados.
A flexibilidade hoje requerida subverte as práticas
tradicionais, colocando as relações industriais e a gestão da
mão-de-obra no plano das decisões estratégicas, impondo novas
formas de divisão do trabalho e outro perfil de qualificação.
Assim, os condicionantes sociais da competitividade referem-
se, em grande medida, ao conjunto de fatores que promovam maior
envolvimento dos trabalhadores diretos, com vistas à maior
participação na melhoria de produtividade das empresas.
O tema é particularmente relevante para o caso brasileiro,
na medida em que condensa algumas de nossas principais limitações
para enfrentar os desafios das novas exigências: relações de
trabalho conflituosas, com pouco espaço para a negociação,
estruturas ocupacionais polarizadas e marcadas pelo autoritarismo
das gerências médias, falta de estímulos para uma maior
identificação com os objetivos da empresa e oportunidades
educacionais e de formação profissional fortemente concentradas
nos segmentos superiores.
Se essas condições tiveram alguma funcionalidade na
implantação e rápida difusão dos métodos tayloristas-fordistas,
contribuindo para a criação de um parque industrial moderno e
competitivo em vários setores ao final dos anos 70, nos moldes
das novas técnicas de produção elas constituem sérios entraves
para a capacitação tecnológica da nossa indústria.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
É falacioso argumentar que as formas emergentes de
organização - Sistemas de Trabalho Integrados - se restringem às
poucas "ilhas" de automação flexível e que, tendo o Brasil ainda
um longo caminho a explorar na produção em grande escala de
produtos padronizados, não teria porque atribuir alta prioridade
às mudanças organizacionais e à qualificação dos trabalhadores
diretos.
Mesmo sem descartar a hipótese de sobrevida do fordismo no
Brasil, não se pode concluir daí que a moderna produção em massa
não sofrerá profundas influências das novas técnicas de automação
e das novas formas de organização industrial, associadas a outros
ritmos e padrões de qualidade. Tampouco que a necessidade de
elevar o nível de escolaridade da mão-de-obra seja algo exclusivo
dos processos de automação flexível.
As pesquisas feitas recentemente revelam, invariavelmente,
que as empresas brasileiras engajadas em programas abrangentes de
qualidade e produtividade consideram que o despreparo da mão-de-
obra semiqualificada, bem como o das gerências intermediárias,
estão entre os principais fatores inibidores da introdução de
novas técnicas organizacionais. Os resultados da pesquisa de
campo do Estudo da Competitividade da Indústria Brasileira
apontam na mesma direção.
No fundo, aqueles são argumentos ideológicos para justificar
a manutenção de estruturas ocupacionais estratificadas e para
escamotear o fato de que existem fortes sinergias entre
eficiência e eqüidade. Assim, aceitar a atual distribuição de
oportunidades educacionais é condenar o país a participar da
globalização da economia mundial através das atividades menos
promissoras, oferecendo os baixos salários como nossa principal
vantagem competitiva.
Ganha força entre nós, seja na esteira da onda neoliberal,
seja em decorrência das mazelas dos serviços públicos, a idéia de
que a melhoria das condições sociais dos trabalhadores é assunto
a ser resolvido no âmbito da empresa. Como corolário, combate-se
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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a cobrança dos encargos sociais que incidem sobre a folha de
pagamento que, argumenta-se, ademais de tornarem onerosa a
contratação da mão-de-obra, dificultam a elevação dos salários e
pouco ou nada significam em contrapartida de serviços públicos.
Ocorre, porém, que os trabalhadores da indústria brasileira
não compõem um segmento isolado do mercado global de trabalho. O
Brasil possui problemas de infra-estrutura social que afetam
negativamente sua produtividade sistêmica e que, portanto, inibem
o desenvolvimento de nossas vantagens comparativas e limitam o
alcance do conjunto dos ajustes microeconômicos. As iniciativas
empresariais na área social, ainda que negociadas com os
trabalhadores, por mais importantes que sejam, não substituem as
externalidades que só as políticas públicas podem proporcionar.
Ou seja, a competitividade da empresa depende também da infra-
estrutura física e social do ambiente em que ela se situa.
Por tudo isso, ainda que se reconheça o peso dos argumentos
em favor dos cortes nos encargos sociais que incidem sobre as
folhas de pagamento, qualquer proposta séria neste sentido deve
vir acompanhada de outras que apontem fontes alternativas para
financiar a educação pública e a seguridade social.
Além disso, uma das grandes contradições da nova
organização empresarial é que, se de um lado promove uma radical
diminuição nas hierarquias dentro das empresas, de outro, tende
a provocar um devastador processo de marginalização de todos os
que não estiverem em condições de participar das novas formas de
produção.
Tais constatações implicam reservar ao Estado atribuições
que, por possuírem caráter público, são intransferíveis para os
contratos privados, naturalmente excludentes. Daí a preocupação
do estudo com a clareza na definição de competências, inclusive
nas propostas de parcerias entre o setor público e o privado,
particularmente no que tange aos mecanismos de proteção social e
à formação profissional. São áreas em que, entre nós, sempre
prevaleceram as iniciativas governamentais e que, daqui para a
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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frente, se abrem também para o setor privado, num modelo híbrido,
como será explicitado nas propostas contidas neste estudo.
Embora a busca de maior eqüidade e de eliminação da pobreza
absoluta devam constituir prioridades nacionais em si, o presente
trabalho não tem como preocupação central a situação social do
país, mas sim as conexões entre os fatores sociais e o desempenho
dos trabalhadores no esforço de melhoria da qualidade e da
produtividade, isto é, do fortalecimento da competitividade
industrial.
Esta nota técnica de síntese abarca os tópicos do Bloco
Temático V - relações de trabalho, mecanismos de proteção social,
gestão da mão-de-obra, educação e qualificação. No caso de
Educaªo e Qualificaªo , este documento apresenta um caráter
eminentemente propositivo, visto que já existe um razoável
consenso no país a respeito do diagnóstico da situação. Já quanto
aos demais tópicos a situação é distinta. Vivemos hoje um momento
em que mal se inicia uma discussão entre os atores sociais
interessados, premidos, inclusive, pela iminente revisão
constitucional. O importante nestes tópicos é o mapeamento das
diferentes posições e a análise de suas implicações. O essencial
aqui não é tanto um elenco de proposições - ainda que estejam
presentes - até porque elas só se legitimam quando fruto de um
ambiente de negociações, que constitui, afinal, o principal
desafio para um desenvolvimento que conjugue competitividade e
eqüidade. O que mais precisamos, na área de relações de trabalho,
é substituir os atuais incentivos ao dissídio por mecanismos que
levem os envolvidos a buscar soluções negociadas para os
conflitos.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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2. RELA˙ES DE TRABALHO , GESTˆO DA MˆO-DE-OBRA E MECANISMOS DE
PROTE˙ˆO SOCIAL
2.1. TendŒncias Internacionais
A questão social não é alheia à competitividade. Padrões
atuais e competitivos de produção requerem da força de trabalho
aptidões e atitudes que favoreçam sua maior integração no
processo produtivo. Envolvimento efetivo com os objetivos da
empresa e atuação consciente em direção à produtividade,
entretanto, só podem ser exigidos de um trabalhador que tenha
alcançado graus razoáveis de satisfação material em termos de sua
relação com o trabalho e de condições de vida. Estabilidade no
emprego, remuneração adequada, participação na organização da
produção, segurança face a riscos de invalidez ou incapacidade,
expectativas quanto ao próprio futuro e de seus dependentes,
garantia de renda em situações excepcionais, constituem um
conjunto de condicionantes indispensáveis para que os
trabalhadores se motivem a co-participar dos desafios
tecnológicos e organizacionais da indústria contemporânea.
Os países que mais avançaram na competitividade na última
década foram aqueles nos quais a questão da eqüidade esteve
presente, tanto no que concerne aos modelos de gestão da mão-de-
obra quanto à inclusividade social. Foram países em que a busca
de um crescente envolvimento dos trabalhadores nas tarefas
produtivas democratizou a gestão, reduziu níveis hierárquicos,
ampliando a produtividade e os níveis de rendimento e de bem-
estar. Nos países de tradição social-democrata, a introdução de
novas tecnologias e métodos organizacionais não rompeu com os
princípios básicos de inclusividade social garantido pelo Estado
de Bem-Estar e remeteu as inovações às negociações coletivas
entre capital e trabalho.
Os países de menor tradição social-democrata e que ajustaram
defensivamente suas economias através de uma reestruturação
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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restrita a alguns setores produtores de bens exportáveis,
passaram por intensa desregulamentação dos mercados de trabalho e
dos mecanismos protetivos. Tais ajustes, voltados para a redução
de custos salariais e de déficits fiscais, geraram maior
segmentação e aumento de concentração dos rendimentos. Na América
Latina, o caso mais bem-sucedido de ajuste estrutural foi o do
Chile. Neste, as transformações se deram com elevados custos
sociais e políticos. Inovações formais nas relações capital-
trabalho ocorreram em outros países do continente sem que
traduzissem mudanças substantivas em seu conteúdo tradicional.
2.2. A Situaªo Brasileira
No Brasil, por força do crescimento acelerado na década de
70, houve grande mobilidade ocupacional e redução dos níveis de
miséria a despeito da fragilidade e baixa qualidade dos
mecanismos de proteção social e de relações conflitivas e
autoritárias nas fábricas. Na década de 80, inverteu-se aquela
tendência e registrou-se marcado aumento da pobreza. Por outro
lado, esta década presenciou uma intensa mobilização sindical e
ampliação dos direitos de cidadania. No início dos anos 90, o
país pode ser caracterizado pela presença de grandes
segmentações, relações capital-trabalho atrasadas, baixa
incorporação dos segmentos subalternos, oferta insuficiente de
proteção social e institucionalização precária dos instrumentos
de representação de interesses. Estas dimensões de certo modo
amarram num mesmo tecido social tanto os trabalhadores
incorporados nas empresas modernas quanto aqueles envolvidos em
atividades desestruturadas e informais.
Ressaltando-se as diferentes vias de reestruturação
produtiva, ajuste dos mercados de trabalho e redefinição dos
arranjos públicos-privados, vêm se afirmando internacionalmente
como dominantes as seguintes tendências: descentralização dos
contratos coletivos visando uma maior flexibilização do trabalho;
modificações nas estruturas do Estado de Bem-Estar, com redução
do ritmo de crescimento dos gastos, maior seletividade nas
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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provisões e alargamento do papel do setor privado na oferta de
serviços sociais. Tais objetivos têm sido em maior ou menor grau
condicionados às negociações coletivas, tanto em relação à sua
abrangência quanto ao seu ritmo. Constata-se entre os países
desenvolvidos a expansão do mix público-privado e não um desmonte
do Estado de Bem-Estar. Este permanece ativo na regulação e
fiscalização dos mecanismos de complementaridade.
No Brasil, ainda que defasadamente e de forma específica,
estas tendências vêm se reproduzindo com efeitos concentradores.
A proliferação desordenada de mecanismos privados e a
deteriorização dos mecanismos públicos reforça as desigualdades
sociais básicas ao consolidar privilégios. O desigual poder de
organização e barganha dos sindicatos num contexto marcado por
inflação e desemprego reforça, quanto mais descentralizada for a
negociação, as já amplas segmentações nos mercados de trabalho.
A mobilização dos trabalhadores, as importantes conquistas
do sindicalismo moderno na direção de acordos com as empresas,
ao lado do declínio na qualidade dos serviços públicos, vêm dando
lugar a um questionamento do Estado, cujos mecanismos protetivos
foram formalmente ampliados na Constituição de 1988. Por outro
lado, a atual estrutura sindical e o papel normativo da Justiça
do Trabalho são vistos pela parcela mais moderna dos sindicatos
como obstáculos centrais à renovação das relações capital-
trabalho. Os empresários, por razões distintas, vêm na legislação
trabalhista o entrave principal à flexibilidade almejada, e no
sistema estatal de benefícios sociais, um conjunto de encargos
que onera o custo da produção.
Destas experiências vêm se afirmando como desenho geral de
reforma do sistema previdenciário e das relações de trabalho
propostas centradas na empresa e no indivíduo, com supressão de
mecanismos protetivos legais e reforma da Seguridade Social
segundo critérios exclusivamente privados. A lógica que permeia
estas propostas, referidas aqui como "condominiais", e que busca
alternativas ao status quo, baseia-se numa concepção limitada de
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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modernização centrada nos nichos mais modernos e competitivos do
mercado.
Tais propostas colidem com certos aspectos básicos da
sociedade brasileira. O meio social em que vive a maioria dos
assalariados, inclusive o das grandes empresas modernas, é
marcado por carências básicas que contagiam, de diversos modos, o
ambiente de trabalho. No que diz respeito ao contrato de
trabalho, a remoção dos mecanismos protetivos e a negociação
centrada exclusivamente na empresa, pode ser do interesse de
empresários e até mesmo dos trabalhadores dos setores mais
modernos. Embora se reconheça que uma legislação protetora não
garante de per se os direitos previstos em setores menos
organizados, o que tem sido observado no Brasil é que a nova e
crescente informalidade nos contratos de trabalho leva em conta
os direitos previstos na legislação. Em resumo: a legislação nem
é inócua e nem tem sido inibidora da geração de empregos, ainda
que informais. No que se refere às políticas sociais, a
descentralização e a "privatização" dos benefícios não esgotam a
agenda de atribuições inerentes ao Estado.
Entre as concepções reformistas mais em voga inclui-se a
proposição de que a eliminação dos atuais encargos sociais
poderia reduzir o custo do trabalho e, ainda, permitir um aumento
real de salários. Entretanto, dos atuais encargos, cerca de 50%
constituem rendimento dos trabalhadores (descanso semanal,
férias, 13
º
salário, etc.). Uma redução desta parcela, ou sua
substituição por salário direto, poderia ser objeto de negociação
coletiva. As demais parcelas são vinculadas a ítens (SENAI, SESI,
FGTS, Salário-Educação ...) para os quais teriam que ser
propostas fontes alternativas. Trata-se portanto de um debate
sobre os 20% destinados à Seguridade Social. Verifica-se, assim,
que a proposição de eliminação pura e simples dos encargos
sociais é falaciosa. O mais racional seria fazer incidir o maior
número de encargos "não-salariais" sobre o valor agregado.
Entretanto, a busca de arranjos mais realistas e
promovedores de uma maior eqüidade, reconhecidamente
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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indispensável para a produtividade, não conduz a uma estratégia
baseada na recentralização do Estado no enfrentamento dos
problemas da seguridade e do trabalho. A crise do setor público,
a heterogeneidade produtiva e a diversidade de interesses vão de
encontro e inviabilizam projetos totalizantes e gerais. Impõe-se,
em consonância com as tendências internacionais, maior
focalização dos programas sociais.
A via de inovações mais tópicas, acordos parciais,
combinações de princípios distintos, realismo institucional,
constituem o fundamento das propostas aqui apresentadas.
Complementaridade no plano dos benefícios sociais e
flexibilização do trabalho demandam coexistência e não
substituição do público pelo privado. A instituição do contrato
coletivo como mecanismo definidor das relações capital-trabalho
deve prever mecanismos de transição do atual sistema ao lado de
prover garantias realistas aos segmentos menos estruturados do
mercado. Aproveitar as atuais Câmaras Setoriais como locus de
inovação das relações capital-trabalho, além de políticas de
preços e salários, parece mais fértil que a busca de pactos
globais e acordos nacionais.
10
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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3. PROPOSI˙ES
3.1. Relaıes de Trabalho e a Proteªo Social
A natureza dos tópicos - basicamente objeto de negociações -
não permite seguir de forma rígida as recomendações do Estudo da
Competitividade da Indústria Brasileira sobre a apresentação das
propostas. Neste tema, os agentes são sempre os sindicatos, as
empresas e o governo. As sugestões apresentadas envolvem
necessariamente estes agentes.
As propostas deste documento levam em consideração os
seguintes elementos condicionadores para a mudança, tanto das
relações de trabalho quanto dos programas de bem-estar social:
i) a realidade brasileira atual é marcada por forte
heterogeneidade no mercado de trabalho, com alto peso ainda de
setores desestruturados em que predominam altas taxas de
rotatividade, falta de estímulos à qualificação e à identificação
entre empresas e trabalhadores. A diversidade dos níveis de
produtividade das empresas é também notável;
ii) mesmo nos setores de mais alta produtividade, cujos
mercados de trabalho são mais estáveis, o meio ambiente do qual
se recruta a maior parcela dos empregados é comum ao dos
assalariados dos setores mais desestruturados. Este é marcado por
uma precária oferta de serviços públicos desafiados por uma
demanda crescente e insatisfeita;
iii) a crise econômica e a baixa capacidade fiscal do Estado
resultaram numa deterioração na oferta dos serviços públicos,
levando a uma proliferação caótica de alternativas privadas de
compensações e benefícios que são incapazes de alterar aquelas
deficiências básicas na infra-estrutura social;
11
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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iv) a vida sindical no país, ainda que dinâmica e em
expansão, caracteriza-se por elevada proliferação de sindicatos
que, em sua maioria, estão ausentes dos locais de trabalho;
v) se do lado dos trabalhadores as centrais sindicais se
afirmaram como representantes legítimos com inegável enraizamento
na vida sindical, do lado dos empresários ocorre baixa
representatividade das organizações tipicamente sindicais;
vi) na maioria das empresas predominam hierarquias rígidas e
uma gestão do trabalho exclusivamente centrada na gerência;
vii) há uma tradição e um conjunto de instituições que
impõem uma tutela estatal sobre as relações de trabalho, gerando
um clima em que o apelo à legislação substitui a negociação;
viii) estas duas últimas características vêm sendo
parcialmente alteradas nos setores mais dinâmicos e nas regiões
mais desenvolvidas tendo em vista os desafios impostos pela crise
e a introdução de mudanças organizacionais.
Tendo em mente este quadro, o sentido geral das propostas
rejeita aquelas que remetem à empresa a gestão exclusiva, e
portanto privada, das relações do trabalho e dos programas
sociais.
Propõe-se aqui uma visão de mudanças nas relações de
trabalho e nas políticas sociais de forma mais integrada e
sistêmica. Reconhece-se que o formato do sistema de proteção
social deverá ser híbrido, isto é, combinando políticas públicas,
naquilo que diz respeito às atribuições intransferíveis do
Estado, com políticas privadas.
1
Por outro lado, considera-se que a transição de sistemas
protetivos e de relações de trabalho não será efetuada por atos
1
Esta análise encontra apoio em Zylberstajn para quem existe a possibilidade de criarmos "um
modelo híbrido": "uma parte dos trabalhadores brasileiros e suas respectivas empresas
praticarão relações de trabalho mais avançadas e autônomas. Uma parte, porém, ainda será
protegida por leis e pela Justiça do Trabalho" (Zylberstajn, 1992:107).
12
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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voluntaristas, mas por acúmulos de experiências parciais e
práticas efetivas de negociação.
Neste sentido, no que se refere às relações de trabalho,
propõe-se a seguir um conjunto de encaminhamentos para uma
Comissão Tripartite de Revisão do Sistema de Relações de Trabalho
e para as Câmaras Setoriais. Estas devem ser consideradas um
locus privilegiado para acordos parciais e setoriais entre
trabalhadores, empresários e governo nas questões relativas tanto
a uma política negociada de rendas quanto para questões relativas
à difusão de novas tecnologias e métodos organizacionais. No que
concerne às políticas sociais, as recomendações sugeridas podem e
devem ser encampadas nestes fóruns, mas se dirigem mais
exatamente à instância legislativa, tendo em vista, inclusive, a
proximidade das reformas constitucionais.
3.1.1. Contrato coletivo de trabalho
Objetivos: promoção do contrato coletivo de trabalho como
instrumento básico e definidor das relações capital-trabalho
visando um crescente envolvimento e reciprocidade entre as
partes. Destacadamente, deve incluir os seguintes alvos:
* explicitar e buscar formas de resolução negociada dos
conflitos;
* criar um clima favorável à difusão de novas técnicas de
automação industrial e técnicas organizacionais através de maior
envolvimento dos trabalhadores e maiores perspectivas de
qualificação;
* maior estabilidade no emprego concomitante a uma maior
flexibilidade funcional;
* participação dos trabalhadores nos resultados das
empresas;
* diminuição do leque salarial e das hierarquias.
Requisitos/Instrumentos/Ações:
13
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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- definição de uma legislação de apoio e promovedora da ação
coletiva em todos os níveis;
- articulação de níveis centralizados de negociação - setor,
região - e descentralizados - empresa - visando garantir graus
mínimos e realistas de homogeneidade sem inibir as iniciativas
nas empresas mais modernas e a diversidade de situações;
- transformação da Justiça do Trabalho num instrumento de
arbitragem pública livremente acessado pelas partes;
- definição de legislação que permita transitar do sistema
atual para um sistema de negociações, assegurando em lei
mecanismos protetivos mínimos;
- autonomia dos contratos coletivos para a negociação de
todos os ítens definidores das relações de trabalho, ressalvadas
as garantias mínimas previstas em lei;
- reconhecimento da representação sindical por local de
trabalho;
- gestão tripartite do sistema de formação profissional e
treinamento, bem como das articulações com o sistema educacional
regular ou supletivo.
3.1.2. Mecanismos de proteªo social
Definição das competências públicas e privadas, através de:
- manutenção de um sistema público de seguridade incluindo a
previdência social, o sistema de saúde universal e assistência
social;
- descentralização/municipalização das ações de saúde e
assistência social;
- efetivação de medidas de controle gerencial e fiscalização
do processo de concessão de benefícios previdenciários;
- revisão da aposentadoria por tempo de serviço com a
instituição da exigência de idade mínima cumulativamente ao
número de contribuições;
- redefinição das aposentadorias especiais;
- redução do número de benefícios e maior seletividade na
sua concessão;
14
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
- introdução de mecanismos de seletividade na oferta de
alguns serviços médicos;
- coexistência da previdência pública básica com a
previdência complementar pública ou privada, fechada ou aberta;
- regulamentação de esquemas privados de seguridade:
estabelecimento de regras de funcionamento, de aplicação de
recursos no caso da previdência e do alcance do atendimento no
caso da saúde;
- estabelecimento de laços de complementaridade efetivos
entre previdência pública e privada a partir de negociações
coletivas descentralizadas, guardados os limites estabelecidos
pela negociação;
- redefinição do seguro-desemprego, incorporando-o a um
plano mais abrangente de amparo ao trabalhador com vistas a
formação, treinamento e reciclagem. O FAT, principal fonte de
recursos, deve permanecer no BNDES e da sua gestão devem
continuar a participar os trabalhadores.
3.1.3. Recomendaıes s empresas
- reconhecimento da importância das comissões de
trabalhadores em nível de empresa;
- reconhecimento do direito das comissões e representação
dos sindicatos à livre informação sobre a política das empresas;
- o exercício da gestão participativa deve começar pelos
assuntos referentes à política de benefícios da empresa, e
evoluir para o envolvimento dos trabalhadores na definição de
estratégias de longo prazo sobre gestão e emprego, estabelecendo
mecanismos de negociação sobre critérios de dispensa, admissão,
terceirização;
- participação dos trabalhadores nos fundos de pensão e nos
planos de saúde das empresas;
- redução do níveis hierárquicos e do leque salarial;
- introdução de esquemas de remuneração por resultados
negociados com os empregados da empresa, sem substituir ou
complementar a remuneração salarial devida (nos termos do
Substitutivo Projeto de Lei nº 4580 de 1990);
15
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
- envolvimento de todos segmentos da força de trabalho em
programas de treinamento para a qualidade;
- renovação e reciclagem das gerências intermediárias
visando obter maior colaboração desses segmentos para um
gerenciamento mais participativo.
3.2. Educaªo e Qualificaªo
3.2.1. Diretrizes e recomendaıes
A multiplicidade de questões que decorrem da análise do
panorama educacional brasileiro torna necessária a determinação
de prioridades de ação, que deverão orientar o tratamento da
relação entre Educação e Qualificação Profissional, de acordo com
os novos padrões de competitividade.
A determinação destas prioridades ocorre a partir de seis
recomendações básicas:
i) No que se refere aos recursos humanos, o maior problema
da indústria brasileira, como todas as pesquisas mostram, é a
baixa escolaridade dos trabalhadores, o que resulta em
dificuldades de adaptação aos novos requisitos, mesmo quando se
trata de treinamentos operacionais.
ii) É preciso que se estabeleçam novas formas de articulação
entre o sistema produtivo e o sistema educacional, visando,
simultaneamente, a elevação da escolaridade da população e a
qualificação dos recursos humanos.
iii) Estas novas formas de articulação devem privilegiar a
repartição de responsabilidades entre escola e empresa. O Estado,
através dos sistemas públicos de ensino, deve se dedicar à
universalização da educação básica - ensino de 1
º
e 2
º
Graus de
educação geral, que é a base da qualificação. As empresas devem
assumir a qualificação da mão-de-obra em geral - operários e
16
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
técnicos de nível médio, através de parcerias, de suas
associações setoriais ou regionais e, inclusive, com a
participação de sindicatos de trabalhadores.
iv) A qualificação profissional diz respeito, agora, à posse
de uma escolaridade básica, de educação geral. Nesse sentido, as
empresas, diretamente ou através de suas instituições educativas
(SESI, SESC) e de formação profissional (SENAI e SENAC), devem
oferecer oportunidades de ensino supletivo de educação geral aos
trabalhadores adultos semiqualificados e de pouca escolaridade,
que encontram problemas para o retorno à rotina escolar.
v) Os recursos públicos vinculados por lei à Educação devem
financiar a educação geral (o ensino regular de 1
º
e 2
º
Graus),
enquanto os gastos com a qualificação (incluindo a formação
específica oferecida nos cursos técnicos de 2º Grau) deverão ser
assumidos pelas empresas.
vi) Os sindicatos de trabalhadores devem participar da
gestão dos sistemas públicos de ensino e das instituições de
formação profissional, especialmente no que se refere à
implantação de programas de requalificação da mão-de-obra.
3.2.2. Aıes prioritÆrias
MagistØrio
A melhoria do ensino básico está diretamente relacionada à
qualidade do trabalho pedagógico; embora a questão da qualidade
esteja relacionada a outras variáveis, a ação do professor é
decisiva para o sucesso de qualquer projeto de melhoria do ensino
básico. Neste aspecto, as ações dividem-se em três linhas:
i) Formação de Professores - boa parte do mau desempenho dos
professores deve-se à má qualidade da formação que recebem.
Assim, no que se refere aos cursos de formação para o magistério,
17
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
tanto de nível médio quanto as Licenciaturas oferecidas pelas
Universidades, propomos:
a) extinção dos atuais cursos de Habilitação ao Magistério;
b) recriação das redes estaduais de Escolas Normais;
c) reformulação dos Cursos de Pedagogia, visando a formação
de professores-alfabetizadores e o desenvolvimento de pesquisas
de novos métodos e técnicas pedagógicas para o Ensino
Fundamental;
d) criação de poucas e boas Escolas Normais Superiores, para
a formação e o aperfeiçoamento de professores dos Cursos de
Licenciatura;
e) descentralização dos cursos de Licenciatura, de modo que
cada Instituto ou Faculdade, nas áreas de conhecimento e
disciplinas que compõem o currículo do ensino básico, ofereça a
formação pedagógica ao longo de todo o curso de graduação;
f) apoio, nas Universidades, aos cursos de Ciências Básicas
(Matemática, Física, Química e Biologia) e das Ciências
Humanas/Sociais que oferecem Licenciaturas, visando a melhoria
da formação dos professores do ensino de 1
º
e 2
º
Graus;
g) revalorização da Prática de Ensino nos Colégios de
Aplicação e nos Cursos Normais, com ênfase nos métodos e técnicas
mais adequados às necessidades e características dos segmentos
mais problemáticos da clientela do ensino básico.
ii) Reciclagem de Professores - a média de idade do atual
contingente de professores do ensino básico ainda é bastante
baixa, o que significa a permanência no sistema, por mais uma
década e meia, em média, dos malformados e dos não-qualificados.
No sentido de compensar a má formação recebida e contribuir para
a melhoria do desempenho em sala de aula, devem ser desenvolvidas
as seguintes ações:
a) fortalecimento dos Centros de Formação e Aperfeiçoamento
do Magistério (CEFAMs), para atividades permanentes de
atualização e retreinamento de professores do ensino básico, em
programas vinculados às Universidades públicas;
18
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
b) expansão das atividades de Extensão Universitária
voltadas para a reciclagem de professores do ensino básico, tanto
nos aspectos pedagógicos quanto na atualização dos conteúdos das
disciplinas que lecionam;
c) criação de mecanismos de incentivo à reciclagem e
atualização permanente (bolsas, progressão funcional, etc.).
iii) Revalorização da Carreira - a carreira do magistério
precisa voltar a ser atraente, trazendo para os cursos de
formação os bons alunos dos cursos médio e superior e estimulando
o professor a se manter em regência de classe e permanentemente
atualizado. Para tanto, recomendamos como principais ações:
a) elevação dos salários atuais, mantendo-os em patamares
competitivos em relação ao mercado de trabalho de profissionais
de qualificação semelhante;
b) estruturação de Planos de Carreira, com mecanismos de
progressão funcional vinculados tanto à qualificação, quanto ao
desempenho em sala de aula; e incentivos salariais à permanência
em regência de classe, de modo a desestimular o abandono das
salas de aula, em troca de funções burocráticas;
c) incentivos salariais especiais aos professores do ensino
básico dedicados ao atendimento dos segmentos mais problemáticos;
d) responsabilidade financeira da União na complementação
dos salários dos professores do 1
º
Grau, nas regiões e
localidades que não tenham recursos suficientes para o
financiamento dos novos planos de carreira, desde que o Estado ou
Município em questão já esteja aplicando na Educação a totalidade
dos percentuais exigidos por lei. Lembre-se que, para isto, a
legislação atual, que proíbe a União de realizar tal iniciativa,
precisa ser alterada.
Melhoria do Ensino BÆsico
Além das ações específicas para o Magistério, outras medidas
devem ser tomadas, relativas à estrutura e ao funcionamento do
ensino básico. Estas medidas, que no seu conjunto visam a
revalorização e a melhoria da educação geral, são:
19
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
a) expansão do atendimento ao pré-escolar, para oferecer a
todos as mesmas oportunidades de sucesso e progressão escolar,
desde as primeiras séries. As iniciativas comunitárias
consideradas habilitadas devem ser apoiadas, eximindo o Estado,
neste momento, da construção de uma rede de pré-escolas;
b) aumento da jornada escolar, nos sistemas públicos, nas
quatro primeiras séries do 1
º
Grau, dando prioridade ao
restabelecimento dos dois turnos diurnos; a expansão quantitativa
da rede deverá atender à demanda decorrente da eliminação dos
múltiplos turnos;
c) no ensino de 1
º
Grau, as escolas de tempo integral, com
exceção daquelas que comprovadamente atendam às populações muito
carentes ou com grandes defasagens idade/série, só devem se
expandir na medida em que se cumpra o programa da volta, na rede
de escolas "comuns", aos dois turnos diurnos;
d) nos casos em que seja imprescindível o atendimento em
escolas de tempo integral, pode-se prever incentivos materiais
(bolsas) para compensar a renda não auferida pelo retardamento da
entrada no mercado de trabalho, pelo menos até os 14 anos;
e) revisão dos conteúdos curriculares do ensino de 1
º
e 2
º
Graus, com vistas, no 1
º
Grau, ao atendimento da aquisição de
competências básicas - raciocínio, linguagem, capacidade de
abstração, etc. - fundamentais à participação do indivíduo na
sociedade moderna; no 2
º
Grau, além da continuidade desses
objetivos, acrescente-se o da oferta de uma sólida base de
conhecimentos técnico-científicos (Ciências Exatas, Humanas e
Biológicas), que servirá tanto à posterior aquisição de
habilitação específica de nível médio, quanto ao prosseguimento
dos estudos em nível superior;
f) definição de um padrão nacional mínimo de educação
básica, de aplicação compulsória em todo o sistema educacional
brasileiro;
g) extinção das diferenciações curriculares entre as escolas
de 2
º
Grau de educação geral e aquelas atualmente dedicadas ao
ensino técnico. Tal como no ensino de 1
º
Grau, a escola de nível
médio deve ser única e democrática;
h) na rede pública, a prioridade no ensino médio deve ser
para o 2
º
Grau regular, de educação geral, com ampliação das
20
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
vagas em horário noturno, em locais acessíveis, para atender aos
jovens trabalhadores, cuja demanda por este nível de ensino tem
aumentado muito;
i) na atual rede pública de escolas técnicas, as oficinas e
toda a parte de formação especial devem ser administradas por
convênios com empresas, sindicatos de trabalhadores e associações
dos diferentes setores, abrindo-se ainda a outras clientelas que
demandem as habilitações oferecidas.
Ensino Superior
O ensino superior tem importante papel a desempenhar no
processo brasileiro de reestruturação produtiva, seja na formação
de mais e melhores professores, seja na qualificação de recursos
humanos para o setor produtivo, melhor preparados para os atuais
requisitos da capacitação tecnológica. Para tanto, propomos:
a) reforçar os cursos de Ciências Básicas (Matemática,
Física, Química e Biologia), no sentido de formar profissionais
capazes de atuar eficientemente em sistemas de inovações
tecnológicas;
b) aumentar a oferta de vagas, nas Universidades Federais,
principalmente nas disciplinas mencionadas, buscando atrair,
através da expansão dos cursos noturnos ou da oferta de bolsas de
estudos, os jovens que trabalham em tempo integral;
c) combater a excessiva fragmentação profissional e a
especialização precoce, que conduzem à ênfase no conhecimento
instrumental, cuja utilidade tende a diminuir, e às
regulamentações correspondentes, que funcionam mais como "reserva
de mercado" do que como garantia de bom exercício profissional;
d) com base no item anterior e a exemplo de outros países,
incluir disciplinas das "Humanidades" nos currículos de graduação
das Engenharias, tendo em vista as mudanças organizacionais em
curso e seus reflexos nas funções gerenciais;
e) retomar e implementar de fato a idéia de Ciclo Básico, no
intuito de fornecer uma formação universitária abrangente, não
especializada, no espírito do BA norte-americano, altamente
valorizada hoje em dia no mercado de trabalho;
21
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
f) a pós-graduação deverá se tornar mais flexível nos seus
conteúdos e na sua estrutura, a fim de atender a vocações e
mercados distintos: docentes, pesquisadores e profissionais de
alto nível para atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D)
nas empresas, evitando introduzir diferenças na qualidade e no
status da formação oferecida;
g) esta flexibilidade implica também combinações distintas
de carga horária de aulas, de trabalhos individuais e de
pesquisa, em atenção às várias vocações a serem atendidas;
h) com o mesmo intuito da proposta anterior, abrir a
Universidade, especialmente a pós-graduação, para profissionais
com grande experiência, em condições de contribuir para a geração
de conhecimentos, ainda que não possuam o currículo normalmente
associado à carreira universitária;
i) a pós-graduação deve dar alta prioridade à relevância dos
temas de tese, levando em conta, no tratamento das questões, o
caráter crescentemente interdisciplinar. Isto pode significar
menor rigidez dos departamentos universitários para a avaliação
de teses que interessem pelo seu conteúdo, ainda que ele
ultrapasse os "limites" de suas áreas de conhecimento, ou que o
candidato ao título não possua as credenciais formais daquele
departamento ao qual apresenta o trabalho;
j) a Extensão Universitária deve concentrar esforços na
colaboração com programas de reciclagem profissional em todos os
níveis: professores, trabalhadores qualificados, gerentes,
técnicos e profissionais de alto nível;
k) a autonomia universitária deve vir acompanhada de
práticas de gestão mais profissionais, com vistas à maior
captação de recursos próprios, tanto através de melhor gestão do
patrimônio, como de maior cooperação com o sistema produtivo.
Qualificaªo Profissional
Neste aspecto, as ações podem ser divididas em duas linhas:
i) O Papel das Empresas: Ações Diretas - como assinala o
documento elaborado para a Comissão Empresarial de Produtividade,
"a ação direta dos empresários pode apenas complementar o papel
22
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
das escolas públicas". Entretanto, esta ação complementar não
significa nem a permanência do atual nível de participação do
empresariado na Educação, e muito menos a continuidade da
expectativa de que o Estado, além dos encargos relativos à
Educação Geral, continue a assumir aqueles relativos à
qualificação profissional. Assim, o caráter complementar da ação
empresarial é o de desonerar o Estado nas ações de habilitação
específica e o de com ele colaborar, principalmente nos esforços
para a elevação da escolaridade básica dos trabalhadores
brasileiros. Nesse sentido, consideramos que às empresas e às
associações empresariais compete:
a) incentivar as novas modalidades de cooperação entre o
setor produtivo e as Universidades, incluindo um maior apoio às
pesquisas que se dedicam à busca de métodos e técnicas
pedagógicas mais adequados à clientela da escola básica;
b) participar diretamente no esforço de melhoria do ensino
público de 1
º
e 2
º
Graus, através de convênios de cooperação com
as Secretarias de Educação, para a manutenção das escolas
existentes nas comunidades onde se localizam as empresas;
c) efetivar a abertura de oportunidades educacionais nos
espaços fabris (escolas anexas às fábricas) e criação de
facilidades para que seus empregados menos escolarizados possam
completar sua educação básica, vencendo as resistências e os
problemas que levam a fracassar as iniciativas de ensino
supletivo extra-empresa, pelo esforço adicional que exigem do
trabalhador;
d) a gestão dos programas empresariais de formação
profissional deve contar com a participação de representantes dos
trabalhadores.
ii) O Papel da Empresa: A Formação Profissional - além das
ações realizadas diretamente pelos empresários e no ambiente da
empresa, há um conjunto de medidas que dizem respeito às
instituições educativas administradas por órgãos representativos
das empresas, que se referem à sua adequação aos novos
requisitos de qualificação profissional e à colaboração que
23
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
através delas pode ser dada ao esforço de elevação da
escolaridade básica dos trabalhadores. São elas:
a) utilização da capacidade instalada da rede do SESI -
pela sua menor dimensão e maior disponibilidade de recursos - em
programas de apoio aos sistemas públicos de ensino, para o
desenvolvimento de projetos experimentais, visando a produção de
inovações pedagógicas para posterior difusão na rede pública;
b) utilização dos espaços ociosos do sistema SENAI, em
parceria com toda e qualquer agência capaz de oferecer educação
básica, regular ou supletiva, para a oferta de oportunidades de
educação geral aos jovens e adultos pouco escolarizados;
c) a atual rede de escolas técnicas, na sua parte
profissionalizante, deverá ser transformada numa rede de Centros
de Desenvolvimento Tecnológico, administrados por associações
setoriais da indústria, para atender à formação/atualização de
trabalhadores, técnicos e gerentes. Para a ação destinada aos
trabalhadores e técnicos, é fundamental a participação do SENAI;
para o segmento de nível superior, as empresas deverão se
articular com as Universidades;
d) abertura das instituições de formação profissional aos
menos escolarizados, empregados ou não, em programas de
profissionalização que contemplem também a oferta de educação
geral;
e) reestruturação dos cursos regulares das instituições de
formação profissional, privilegiando o desenvolvimento de uma
"cultura tecnológica", com a substituição das disciplinas
instrumentais por uma base sólida de conteúdos técnico-
científicos amplos;
f) o SENAI deve preservar os recursos provenientes das
contribuições sobre a folha de pagamentos exclusivamente para as
atividades que atendam aos interesses gerais da indústria;
treinamentos do tipo firm specific devem ser financiados
integralmente pelas empresas demandantes;
g) através de seus Centros de Desenvolvimento Tecnológico, o
SENAI deverá colaborar com as empresas também na experimentação e
difusão de novas técnicas de organização do trabalho, com vistas
24
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
a diminuir os riscos e as incertezas inerentes aos programas de
reestruturação.
3.2.3. Papel dos sindicatos
a) O acesso da população em geral a um ensino básico de
qualidade deve ser considerado um item estratégico nas
conversações e negociações entre sindicatos e Governo.
b) A maior oferta de oportunidades de complementação da
escolaridade básica e de formação profissional, inclusive em
programas de requalificação, deve merecer maior atenção dos
sindicatos nas pautas de negociação.
c) As entidades sindicais devem participar da gestão das
instituições de ensino, tanto nas agências de formação
profissional como nas redes públicas.
d) As entidades sindicais devem participar da formulação e
acompanhamento da implementação de planos e políticas de educação
básica regular, nos três níveis da administração pública.
e) Conforme o previsto no projeto da LDB, as entidades
sindicais devem buscar participar, nas instituições de ensino
superior, da definição de ações e projetos que atendam aos
problemas do ensino básico, principalmente no que se refere às
necessidades de atualização e requalificação de trabalhadores.
3.2.4. Financiamento do ensino bÆsico
Os Recursos NecessÆrios ao Ensino BÆsico
O problema dos recursos para o Ensino Básico envolve duas
questões de naturezas distintas: de um lado, o financiamento de
ítens diretamente ligados às atividades pedagógicas propriamente
ditas: salários de docentes, material didático e de apoio, e
espaço físico (conservação, recuperação e ampliação da rede
física); de outro, os gastos assistenciais necessários à
manutenção das crianças na escola.
25
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Nenhum país, e muito menos o Brasil, com seu nível de
pobreza, pode prescindir dos gastos assistenciais, que envolvem
atualmente a merenda escolar e alguma atenção básica em Saúde.
Além dessa assistência, caberia também pensar em alguma
compensação financeira para as famílias muito carentes que
necessitam do trabalho infantil para sobreviver e que, por isso,
encontram dificuldades em deixar por vários anos seus filhos na
escola.
Quanto ao primeiro conjunto de gastos, todas as estimativas
indicam que com US$ 6 a 7 bilhões é possível dar um ensino de boa
qualidade aos alunos da rede pública, inclusive pagando aos
professores do 1
º
Grau um salário médio mensal de US$ 300.
O problema está em como financiar os gastos assistenciais
que, se se pretende atender a todos os alunos, mesmo mantendo
padrões modestos, equivalem ao total de recursos hoje alocados no
1
º
Grau. Se esse volume de recursos for considerado irrealista,
não existirá outra alternativa que não seja a de restringir tais
gastos aos segmentos mais carentes, apesar de todos os problemas
operacionais que uma focalização desse tipo implica.
SalÆrio-Educaªo
A este respeito, cabe observar que o volume de recursos que
esta fonte representa é fundamental para a sobrevivência dos
sistemas públicos de ensino. Assim, se ela for extinta,
forçosamente terá que ser substituída por outra. Entretanto, sua
permanência não exclui, a nosso ver, a necessidade de revisão de
seus mecanismos de aplicação, tornando sua gestão mais
transparente e passível de efetiva supervisão. Assim, as
propostas são:
a) simplificação e agilização da gestão dos recursos do
Salário-Educação, preservando-se, entretanto, os objetivos de
redistribuição regional;
b) a aplicação direta do Salário-Educação deve se restringir
àquelas empresas (ou consórcios de empresas) que recolham acima
26
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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de um montante significativo a ser definido. Com isso, diminuiria
a malversação dos recursos no processo de compra de vagas em
escolas privadas;
c) para as contribuições abaixo do montante acima referido,
o recolhimento seria direto à agência responsável;
d) da parcela do Salário-Educação que será recolhida, metade
deve ser destinada às regiões carentes, a partir de políticas e
prioridades claramente definidas, mediante projetos e programas,
e não da forma clientelística que tem caracterizado sua
distribuição;
e) a outra metade seria repassada preferencialmente às
escolas da rede pública que, eventualmente, poderão ser indicadas
pelas próprias empresas que fazem o recolhimento;
f) os recursos do Salário-Educação devem ser destinados ao
ensino básico, incluindo assim o ensino de 2º Grau.
3.2.5. Sistema nacional de avaliaªo
No sistema atual, a qualidade das ações educativas só pode
ser estimada pelos dados globais que apontam os altos percentuais
de evasão e repetência e os baixos índices de conclusão do 1
º
Grau. Entretanto, tais informações são insuficientes para que se
conheça, do ponto de vista estritamente pedagógico, onde estão
situados os problemas, quais as escolas que desenvolvem um bom ou
um mau trabalho ou que aspectos curriculares precisam ser
revistos. Além disso, mesmo para aqueles que têm êxito no
sistema, isto é, que conseguem concluir cada grau que o compõe,
não se pode precisar se receberam o mesmo conjunto de
conhecimentos e se desenvolveram o mesmo nível de habilidades
intelectuais.
Estas dificuldades decorrem do fato de, no Brasil, não
existir nenhum mecanismo de avaliação da Educação, que permita
comparar o desempenho dos sistemas de ensino e das escolas que os
integram. Apesar de formalmente delimitada por uma legislação que
se caracteriza pelo excesso de detalhes, a ação educativa é, na
verdade, extremamente autônoma, na medida em que não presta
27
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
contas, nem às administrações superiores e muito menos à
população, e não é efetivamente cobrada pelos resultados que
apresenta.
De outro lado, a ausência de dados mais detalhados sobre a
qualidade do trabalho desenvolvidos em cada escola impede que se
premie as mais eficientes e que se contemple adequadamente
aquelas que necessitem de maior apoio para melhoria de seu
desempenho.
Não avaliar, ou não estabelecer um padrão mínimo, permite a
perpetuação de uma "escola pobre" para as populações pobres, o
que é sinônimo de precariedade e ineficiência. O discurso do
respeito às heterogeneidades e diversidade cultural tem levado a
uma prática que é de legitimação das desigualdades, com uma
escola tanto pior quanto mais carente e distante dos grandes
centros seja a região onde está localizada.
Assim, para a obtenção de melhores instrumentos, tanto para
a melhoria da gestão dos recursos alocados na Educação, quanto
para as propostas pedagógicas que visam a elevação da qualidade
do sistema educacional, propomos a implantação de um sistema
nacional de avaliação da educação básica, orientada pelas
seguintes ações:
a) definição de um padrão nacional de educação básica, com o
estabelecimento dos conteúdos e das habilidades intelectuais que
todos os alunos do ensino básico, em todo o país, devem ser
portadores, ao final da 4
ª
e 8
ª
séries do 1
º
Grau, e da 3
ª
série
do 2
º
Grau;
b) determinação, pelos sistemas estaduais e municipais, dos
conteúdos que devem ser acrescentados ao padrão nacional, para
atender às necessidades e peculiaridades regionais;
c) implementação de um projeto nacional de educação, com
critérios claros e rígidos para a liberação de recursos geridos
pelo MEC, a partir de projetos estaduais e municipais que
contemple a supervisão e o acompanhamento da execução, já no
contexto do sistema nacional de avaliação;
28
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
d) implantação de uma instância federal responsável pelos
exames nacionais, integrada por técnicos e professores dos
sistemas públicos, por especialistas em avaliação e por
representantes de segmentos da sociedade civil organizada
(sindicatos de trabalhadores, associações de pais de alunos,
etc.);
e) aplicação anual dos exames, com divulgação ampla dos
resultados e acompanhamento da evolução de cada sistema;
f) previsão, no orçamento do MEC, de recursos a serem
aplicados nos sistemas onde os resultados sejam negativos, a
partir de projetos elaborados e diretamente supervisionados pelo
MEC, visando a elevação da qualidade do ensino naqueles sistemas;
g) estruturação, no MEC/Delegacias Regionais, de equipes que
estarão encarregadas da supervisão dos sistemas estaduais e
municipais, compostas, em cada Estado, de técnicos e professores
das esferas federal, estadual e municipal; estas equipes
acompanharão tanto o trabalho desenvolvido nas escolas, como, nas
atividades globais das Secretarias de Educação, o volume e a
destinação real dos recursos vinculados;
h) a liberação, pelo MEC, de recursos complementares para os
sistemas educacionais estaduais e municipais estará condicionada
à execução e aos resultados obtidos nos projetos de melhoria do
sistema, assim como ao gasto efetivo, em Educação, do percentual
da receita líquida determinado por lei;
i) a avaliação final de cada sistema estadual ou municipal
levará em conta tanto os resultados dos exames nacionais quanto o
volume e a natureza dos gastos realizados;
j) a rede de escolas federais de 1
º
e 2
º
Graus também
integrará o universo a ser avaliado, tanto no desempenho
pedagógico quanto na eficácia da aplicação de recursos.
29
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
4. INDICADORES
4.1. Relaıes de Trabalho e Proteªo Social
a) Gerais
. Emprego (por qualificação, setor, tamanho do
estabelecimento);
. Desemprego (por tempo, sexo, idade, nível de
qualificação);
. Índice de salário real.
b) Empresas/Setores
. Pessoal ocupado na produção;
. Admissões/desligamentos na produção;
. Número de horas pagas na produção;
. Valor dos salários contratuais;
. Valor das horas extras pagas;
. Valor da folha de pagamento;
. Número de vínculos empregatícios por nível de escolaridade
e ocupação;
. Número de vínculos empregatícios rescindidos (por nível de
escolaridade e ocupação);
. Taxa de rotatividade;
. Programas de benefícios sociais (número e escopo);
. Formas de remuneração por resultados;
. Programas de Treinamento e Requalificação (número de
trabalhadores envolvidos, duração).
4.2. Educaªo e Qualificaªo
. Taxa de escolaridade (percentagem da população da faixa
etária matriculada no nível de ensino correspondente);
. Vagas por nível de ensino, área e tipo de estabelecimento;
. Taxas de evasão, repetência e conclusão, por nível de
ensino;
. Número de horas-aula/ano, por nível de ensino e área;
30
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
. Número de professores por área e nível de carreira;
. Índices de evolução salarial e de carreira;
. Número de estabelecimentos de formação de professores e
vagas correpondentes, por área;
. Número de pessoas e recursos envolvidos nos convênios
entre instituições de ensino e empresas, por área e nível de
ensino;
. Número de pessoas e recursos envolvidos em programas
tripartites de gestão de ensino técnico;
. Índices de acompanhamento dos programas de aplicação
direta dos recursos do salário-educação;
. Número de cursos profissionalizantes, por área, duração e
vagas.
31
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
QUADRO-RESUMO
a) Relaıes de Trabalho e Proteªo Social
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
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1. Contrato Coletivo de Trabalho
- legislação de apoio e de promoção da ação coletiva
em todos os níveis X
- articulação de instáncias centralizadas e descen-
tralizadas de negociação X X
- transformação da justiça do trabalho em Instrumen-
to de Arbitragem Pública livremente acessado pelas
partes X X
- autonomia dos contratos coletivos para a negocia-
ção de todos os itens definidores das relações de
trabalho incluindo aqueles constantes na legisla-
ção X X
- reconhecimento da representação sindical por local
de trabalho X
- legislação que assegure mecanismos mínimos de pro-
teção na transição do atual sistema para outro de
negociações X
- gestão tripartite do sistema de formação profis-
sional e treinamento, bem como das articulações
com o sistema educacional regular ou supletivo X X X
2. Mecanismos de Proteção Social
- manutenção de um sistema público de seguridade bá-
sica, incluindo: previdência social, sistema de
saúde universal e assistêncial social X X
- separação das fontes de custeio da previdência,
saúde e assistência social X X
- descentralização/municipalização das ações de saú-
de e assistência social X
- efetivação de medidas de controle gerencial e fis-
calização do processo de concessão de benefícios
previdenciários X
- revisão da aposentadoria por tempo de serviço, com
a instituição da exigência de idade mínima cumula-
tivamente ao número de contribuições X X
- redefinição das aposentadorias especiais X X
- redução do número de benefícios e maior seletivi-
dade na sua concessão; X X
- introdução de mecanismos de seletividade na oferta
de alguns serviós médicos X
- coexistência da previdência pública básica com a
previdência complementar pública ou privada, fe-
chada ou aberta X X
- regulamentação de esquemas privados de seguridade
- redefinição do seguro-desemprego incorporando-o a
um plano mais abrangente de amparo ao trabalhador
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
com vistas a formação, treinamento e reciclagem X X X X
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
3. Recomendações às empresas:
- reconhecimento da importância das comissões de
trabalhadores a nível de empresas independentemen-
te da sindicalização X
- reconhecimento do direito das comissões e repre-
sentação sindical à livre informação sobre a polí-
tica das empresas X
- gestão participativa começando pelos assuntos pe-
riféricos à produção (política de benefícios) e
evoluindo para a definição de estratégias de longo
prazo sobre gestão e emprego X
- participação dos trabalhadores nos fundos de pen-
são e planos de saúde da empresa X
- redução de níveis hierárquicos e do leque salarial X
- introdução de esquemas de remuneração por resulta-
dos, negociados com os empregados da empresa, sem
substituir a remuneração salarial devida (nos ter-
mos do Substitutivo Projeto de Lei nº 4580, 1990); X
- envolvimento de todos os segmentos da força de
trabalho em programas de treinamento para a quali-
dade X
- renovação e reciclagem das gerências intermediá-
rias visando maior colaboração desses segmentos
para um gerenciamento mais participativo X
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
b) Educaªo e Qualificaªo
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
1. Novas formas de articulação entre os sis-
mas produtivo e educacional
2. Universalização da educação básica
3. Vinculação dos recursos públicos à educação
geral
4. Qualificação da mão-de-obra pelas empresas
5. Oferta pelas empresas de ensino supletivo
6. Os sindicatos de trabalhadores devem parti-
cipar da gestão das instituições de forma-
ção profissional
1. Magistério
1.1. Formação de professores X
- extinção dos cursos de habilitação X
- recriação das Escolas Normais, seletivamente X
- reformulação dos cursos de Pedagogia X
- descentralização da Licenciatura X
- apoio aos cursos de Ciências básicas nas
Universidades X
- revalorização das Práticas de Ensino
1.2. Reciclagem de professores
- fortalecimento dos CEFAM X
- expansão da Extensão para reciclagem X
- mecanismos de incentivo à reciclagem X
1.3. Revalorização da Carreira
- revisão dos salários atuais, mantendo-os
competitivos no mercado X
- estruturação de Planos de Carreira X
- incentivos salariais aos professores de-
dicados a segmentos problemáticos X
- complementação pela União dos salários
nas regiões com escassez de recursos X
- modificação da legislação atual que im-
pede a complementação anterior pela
União
2. Melhoria do Ensino Básico
- expansão do atendimento pré-escolar X
- aumento da jornada escolar X
- priorização dos 2 turnos sobre a escola
integral X
- compensação financeira pelo retardamento
do ingresso no mercado de trabalho X
- revisão dos currículos básicos, direcio-
nando-os para aptidões básicas X
- definição de um padrão nacional mínimo
compulsório para o sistema educacional
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
nacional X
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
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------
- eliminação das diferença curriculares
entre o ensino regular e técnico X
- prioridade no ensino médio para o 2
o
grau
regular e noturno X
- administração das escolas técnicas por
convênios tripartites X X X X
X
3. Ensino Superior
- reforço dos cursos de Ciências Básicas
X
- aumento da oferta de vagas nas Univer-
sidades públicas
X
- bolsas de estudo para estudantes que pre-
cisam trabalhar X
X
- combater a fragmentação profissional e a
especialização precoce
X
- incluir Humanidades nos currículos das
Engenharias
X
- implementar o Ciclo Básico
X
- maior flexibilidade à pós-graduação
X
- abrir a Universidade para profissionais
de grande experiência mesmo que sem os
requisitos formais tradicionais
X
- maior peso da relevância dos temas de
tese e na interdisciplinaridade
X
- Extensão concentrada nos programas de
reciclagem
X
- autonomia universitária associada à pro-
fissionalização da gestão
X
4. Qualificação profissional
4.1. Recomendações às empresas: ações diretas
- cooperação com as Universidades X
X
- participar dos esforços de melhoria do
ensino básico X
- abertura de oportunidades educacionais
nos espaços fabris X
- abertura da gestão dos programas de for-
36
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
mação profissional aos trabalhadores X
4.2. Recomendações às empresas: formação profissional
- utilização da rede SESI para novas expe-
riências educacionais X
- utilização dos espaços ociosos do sis-
tema SENAI para educação básica, regu-
lar ou supletiva X
- transformação da rede de escolas técni-
cas em Centros de Desenvolvimento Tec-
nológico X
- abertura das escolas técnicas aos menos
escolarizados X
- reestruturação dos currículos técnicos X
- o SENAI deve dedicar os seus recursos
a programas de interesse geral X
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
37
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
- o SENAI deve participar de programas de
difusão de novas tecnologias X
5. Sindicatos
- acesso a oportunidades de qualificação
profissional devem ser privilegiadas
nas pautas trabalhistas X
- participação pelos sindicatos da gestão
de agências de formação X X X X
6. Financiamento do ensino básico
6.1. Recursos necessários
- recursos adicionais para assistência X X
6.2. Salário-Educação
- simplificação e agilização da gestão X X
- critérios claros na amplificação direta X X
- destinação de parcelas específicas a
regiões carentes e a escolas públicas X X
- vinculação ao ensino básico X X
7. Sistema nacional de avaliação
- definição de um padrão nacional de
educação básica X X
- definição de especificidades locais
adicionais X X
- implementação de um projeto nacional
de educação X X
- implantação de uma instância federal
responsável por exames nacionais X
- implantação de programas especiais de
recuperação dos sistemas com resulta-
dos negativos X
- implantação de equipes de acompanha-
mento dos sistemas estaduais e muni-
cipais X
- liberação de recursos pelo MEC condi-
cionada aos programas X
- a avaliação deverá incluir custos e
resultados X
------------------------------------------------------------------------------------------------------
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
c) Reestruturaªo Produtiva
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
- Identificar as práticas de gestão de RH que
mais se coadunam com o esforço de incremen-
to da qualidade e produtividade X X X
X
- Acompanhar implementação de programas de
qualidade em setores básicos da indústria X X X
- Câmaras Setoriais e PBQP
- Analisar relação entre modernização tecno-
lógica e o contrato coletivo de trabalho.
O uso deste instrumento de forma flexível
pode propiciar ambiente cooperativo e ade-
quado à eficiência na introdução de inova-
ções. X X X
X
- Analisar experiência internacional e acom-
panhar experiências nacionais bem-sucedidas
de negociação da inovação X X X
X
- Câmaras Setoriais e PBQP
- Identificar as principais modalidades e
conseqüências sócio-econômicas dos proces-
sos de "terceirização" X X X
X
- Acompanhar experiências concretas com obje-
tivo de elaborar políticas destinadas a am-
pliar os benefícios e combater efeitos ne-
gativos X X X
X
- Câmaras Setoriais PBQP e SEBRAE
- Elaborar propostas de políticas de redução
significativa dos encargos sociais para
micro e pequenas empresas. Os incentivos
devem estar associados a sistemas de ava-
liação e acompanhamento
- Câmaras Setoriais, PBQP, SEBRAE X X X X
X
- Ampliar programas de apoio ao processo de
"reciclagem" de micro e pequenas empresas X X
- Estimular o fortalecimento de "redes" em
nível local, que estimulem a elevação da
eficiência coletiva X X
X
39
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
- PBQP, SEBRAE, SENAI/SENAC, Grandes Empre-
sas, Universidades e Escolas Técnicas,
Sindicatos (patronias e de trabalhadores)
e Prefeituras
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
- Criar linhas de financiamento para com-
plementar as atividades do PBQP. As empre-
sas que comprovassem esforços significati-
vos na área de qualidade poderiam obter in-
centivos para a implementação do programa
- Organismos Governamentais X
- Definir política clara em relação à segu-
rança do emprego, como forma de garantir a
colaboração efetiva dos empregados X X X
- Definir políticas de estabilização da
força-trabalho associadas à introdução de
estruturas de cargos e salários que estimu-
lem a elevação do nível de qualificação,
atualização profissional e polivalência X X X
- PBQP
- Garantir atmosfera cooperativa na empresa,
pois um ambiente conflitivo impossibilita a
implementação de programa de qualidade. In-
troduzir de programas participativos, en-
volvendo todos os funcionários na tarefa de
"repensar" as metas e a eficiência da orga-
nização
- PBQP X X X
- Promover a distribuição de ganhos a partir
de metas definidas referentes à qualidade e
produtividade e uma atitude mais aberta no
sentido de negociar o processo de mudança
com as organizações de trabalhadores
- PBQP X X X
- Realizar levantamentos sistemáticos do ní-
vel de escolaridade do pessoal empregado e
das necessidades de treinamento X X X
- Criar bancos de dados que permitam a elabo-
ração de diagnósticos da situação e poste-
rior avaliação de resultados de programas
de treinamento X X
X
- PBQP
- Ampliar oferta de cursos que visem o desen-
volvimento de habilidades analíticas e ca-
pacidade de avaliar e utilizar informações
em convênios com Universidades, Escolas
Técnicas, SENAI, etc.
- PBQP X X X
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
- Incentivar e promover a permanente recicla-
gem e atualização profissional em convênios
com Universidades, Escolas Técnicas,
SEANIS, etc.
- PBQP X X X
X
- Acompanhar via avaliação permanente a efi-
cácia do treinamento ministrado. Criar sis-
temas de avaliação do programa de treina-
mento
- PBQP X X X
X
- Aumentar o investimento na área de treina-
mento gerencial, especialmente em temas re-
lacionados com gerenciamento da mudança e
da inovação. Promover convênios com Univer-
sidades. Promover cursos destinados a obter
um perfil gerencial adequado aos desafios
atuais (visão técnico-social abrangente)
- PBQP X X X
X
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Legenda: EXEC. - Executivo
LEG. - Legislativo
JUD. - Judiciário
EMP. - Empresas e Entidades Empresariais
TRAB. - Trabalhadores e Sindicatos
ONGs - Organizações Não-Governamentais
ACAD. - Academia
Nota: Em caso de coluna em branco, leia-se "sem recomendação".
43
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
INTRODU˙ˆO
As novas formas de organização do trabalho representam um
fenômeno central do processo de reestruturação industrial nas
economias avançadas. Suas características mais marcantes são o
envolvimento e a participação dos trabalhadores, especialmente
daqueles que trabalham no "chão de fábrica", em tarefas e
decisões antes adstritas a um reduzido número de funcionários
qualificados.
A flexibilidade hoje requerida subverte as práticas
tradicionais, colocando as relações industriais e a gestão da
mão-de-obra no plano das decisões estratégicas, impondo novas
formas de divisão do trabalho e outro perfil de qualificação.
Assim, os condicionantes sociais da competitividade referem-
se, em grande medida, ao conjunto de fatores que promovam maior
envolvimento dos trabalhadores diretos, com vistas à maior
participação na melhoria de produtividade das empresas.
O tema é particularmente relevante para o caso brasileiro,
na medida em que condensa algumas de nossas principais limitações
para enfrentar os desafios das novas exigências: relações de
trabalho conflituosas, com pouco espaço para a negociação,
estruturas ocupacionais polarizadas e marcadas pelo autoritarismo
das gerências médias, falta de estímulos para uma maior
identificação com os objetivos da empresa e oportunidades
educacionais e de formação profissional fortemente concentradas
nos segmentos superiores.
Se essas condições tiveram alguma funcionalidade na
implantação e rápida difusão dos métodos tayloristas-fordistas,
contribuindo para a criação de um parque industrial moderno e
competitivo em vários setores ao final dos anos 70, nos moldes
das novas técnicas de produção elas constituem sérios entraves
para a capacitação tecnológica da nossa indústria.
44
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
É falacioso argumentar que as formas emergentes de
organização - Sistemas de Trabalho Integrados - se restringem às
poucas "ilhas" de automação flexível e que, tendo o Brasil ainda
um longo caminho a explorar na produção em grande escala de
produtos padronizados, não teria porque atribuir alta prioridade
às mudanças organizacionais e à qualificação dos trabalhadores
diretos.
Mesmo sem descartar a hipótese de sobrevida do fordismo no
Brasil, não se pode concluir daí que a moderna produção em massa
não sofrerá profundas influências das novas técnicas de automação
e das novas formas de organização industrial, associadas a outros
ritmos e padrões de qualidade. Tampouco que a necessidade de
elevar o nível de escolaridade da mão-de-obra seja algo exclusivo
dos processos de automação flexível.
As pesquisas feitas recentemente revelam, invariavelmente,
que as empresas brasileiras engajadas em programas abrangentes de
qualidade e produtividade consideram que o despreparo da mão-de-
obra semiqualificada, bem como o das gerências intermediárias,
estão entre os principais fatores inibidores da introdução de
novas técnicas organizacionais. Os resultados da pesquisa de
campo do Estudo da Competitividade da Indústria Brasileira
apontam na mesma direção.
No fundo, aqueles são argumentos ideológicos para justificar
a manutenção de estruturas ocupacionais estratificadas e para
escamotear o fato de que existem fortes sinergias entre
eficiência e eqüidade. Assim, aceitar a atual distribuição de
oportunidades educacionais é condenar o país a participar da
globalização da economia mundial através das atividades menos
promissoras, oferecendo os baixos salários como nossa principal
vantagem competitiva.
Ganha força entre nós, seja na esteira da onda neoliberal,
seja em decorrência das mazelas dos serviços públicos, a idéia de
que a melhoria das condições sociais dos trabalhadores é assunto
a ser resolvido no âmbito da empresa. Como corolário, combate-se
45
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
a cobrança dos encargos sociais que incidem sobre a folha de
pagamento que, argumenta-se, ademais de tornarem onerosa a
contratação da mão-de-obra, dificultam a elevação dos salários e
pouco ou nada significam em contrapartida de serviços públicos.
Ocorre, porém, que os trabalhadores da indústria brasileira
não compõem um segmento isolado do mercado global de trabalho. O
Brasil possui problemas de infra-estrutura social que afetam
negativamente sua produtividade sistêmica e que, portanto, inibem
o desenvolvimento de nossas vantagens comparativas e limitam o
alcance do conjunto dos ajustes microeconômicos. As iniciativas
empresariais na área social, ainda que negociadas com os
trabalhadores, por mais importantes que sejam, não substituem as
externalidades que só as políticas públicas podem proporcionar.
Ou seja, a competitividade da empresa depende também da infra-
estrutura física e social do ambiente em que ela se situa.
Por tudo isso, ainda que se reconheça o peso dos argumentos
em favor dos cortes nos encargos sociais que incidem sobre as
folhas de pagamento, qualquer proposta séria neste sentido deve
vir acompanhada de outras que apontem fontes alternativas para
financiar a educação pública e a seguridade social.
Além disso, uma das grandes contradições da nova
organização empresarial é que, se de um lado promove uma radical
diminuição nas hierarquias dentro das empresas, de outro, tende
a provocar um devastador processo de marginalização de todos os
que não estiverem em condições de participar das novas formas de
produção.
Tais constatações implicam reservar ao Estado atribuições
que, por possuírem caráter público, são intransferíveis para os
contratos privados, naturalmente excludentes. Daí a preocupação
do estudo com a clareza na definição de competências, inclusive
nas propostas de parcerias entre o setor público e o privado,
particularmente no que tange aos mecanismos de proteção social e
à formação profissional. São áreas em que, entre nós, sempre
prevaleceram as iniciativas governamentais e que, daqui para a
46
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
frente, se abrem também para o setor privado, num modelo híbrido,
como será explicitado nas propostas contidas neste estudo.
Embora a busca de maior eqüidade e de eliminação da pobreza
absoluta devam constituir prioridades nacionais em si, o presente
trabalho não tem como preocupação central a situação social do
país, mas sim as conexões entre os fatores sociais e o desempenho
dos trabalhadores no esforço de melhoria da qualidade e da
produtividade, isto é, do fortalecimento da competitividade
industrial.
Esta nota técnica de síntese abarca os tópicos do Bloco
Temático V - relações de trabalho, mecanismos de proteção social,
gestão da mão-de-obra, educação e qualificação. No caso de
Educaªo e Qualificaªo , este documento apresenta um caráter
eminentemente propositivo, visto que já existe um razoável
consenso no país a respeito do diagnóstico da situação. Já quanto
aos demais tópicos a situação é distinta. Vivemos hoje um momento
em que mal se inicia uma discussão entre os atores sociais
interessados, premidos, inclusive, pela iminente revisão
constitucional. O importante nestes tópicos é o mapeamento das
diferentes posições e a análise de suas implicações. O essencial
aqui não é tanto um elenco de proposições - ainda que estejam
presentes - até porque elas só se legitimam quando fruto de um
ambiente de negociações, que constitui, afinal, o principal
desafio para um desenvolvimento que conjugue competitividade e
eqüidade. O que mais precisamos, na área de relações de trabalho,
é substituir os atuais incentivos ao dissídio por mecanismos que
levem os envolvidos a buscar soluções negociadas para os
conflitos.
47
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
1. RELA˙ES DE TRABALHO
1.1. TendŒncias Internacionais
Os anos 80 trouxeram amplas e profundas mudanças nos
processos de trabalho e nos regimes salariais das principais
economias desenvolvidas. Estas transformações responderam a dois
processos simultâneos mas de naturezas distintas. De um lado, a
crise econômica mundial ocorrida nos anos 70 interrompeu, na
Europa e nos EUA, um longo boom de crescimento do produto e do
emprego assalariado. O segundo processo, que alterou e prossegue
transformando as principais características das relações
prevalecentes de trabalho, foi a introdução de novas técnicas de
automação e principalmente de organização do trabalho.
A intensidade das inovações tecnológicas na década de 80
trouxe para o primeiro plano questões como tecnologia,
organização das empresas, relações de trabalho, que até então
eram tidas como "resolvidas": tecnologia, em geral, reduzia-se a
uma questão de economia de escala; a organização era do tipo
taylorista-fordista; e as relações de trabalho definiam-se fora
das fábricas.
O efeito conjugado daqueles dois movimentos - recessão e
difusão de novas tecnologias - sobre os mercados de trabalho, a
representação dos interesses dos trabalhadores e os salários
reais foi intenso. Seja por ajustes de tipo defensivo provocados
pela recessão econômica e aumento da concorrência, seja pela
difusão acelerada de novas técnicas de automação, ocorreu na
maioria dos países (ressalvados os do leste asiático) declínio
nos indicadores globais de bem-estar.
De um lado, a taxa de desemprego aberto ampliou-se
notavelmente, afetando especialmente os jovens e as mulheres. De
outro, a maior segmentação dos mercados de trabalho interrompeu
tendências salariais homogeneizadoras decorrentes da
centralização dos contratos coletivos.
48
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
A terceirizaªo , um processo decorrente das amplas
transformações da base técnica, introduziu importantes mudanças
na composição do emprego e no poder dos sindicatos tradicionais.
Uma menor demanda de trabalho por unidade de produto - um
resultado da automação - e uma menor taxa de crescimento do
produto afetaram de forma muito desigual as distintas ocupações e
qualificações, provocando amplas mudanças nos salários
relativos
2
. Os sindicatos foram duplamente desafiados. De um
lado, os interesses dos diferentes grupos de trabalhadores
tornaram-se mais fragmentados; de outro, devido às maiores taxas
de desemprego, o seu poder de negociação foi diminuído, cedendo
espaço para negociações isoladas entre empregadores e grupos de
assalariados.
As mudanças da base técnica e suas implicações sobre o
processo de trabalho foram mapeadas exaustivamente na
literatura
3
. Do ponto de vista da gestão de mão-de-obra, é
importante destacar que essas inovações organizacionais alteram
o padrão prevalecente, baseado no uso extensivo de mão-de-obra
semiqualificada, para outro baseado no uso intensivo de mão-de-
obra qualificada em que se requer um maior envolvimento e
capacidade de decisão dos trabalhadores. Conhecimento, capacidade
de abstração, aptidão para trabalho em grupo tornam-se
requisitos crescentemente demandados nos novos processos
produtivos.
Estas questões deram alento a políticas em que se consideram
as mudanças nas relações do trabalho a partir de uma crescente
demanda por flexibilidade. Este tema trata de dois aspectos bem
distintos e, até mesmo, contraditórios: a flexibilidade
quantitativa, que tem a ver com as condições do mercado de
trabalho - regulações e custos que afetam a contratação e a
demissão, e a flexibilidade do salário real - e a flexibilidade
funcional, que se refere à divisão de tarefas e responsabilidades
no processo de trabalho. Em ambos os aspectos, a demanda por
2
De 1979 a 1991, as 500 maiores empresas norte-americanas eliminaram mais de 4 milhões de postos
de trabalho.
3
Na literatura brasileira, ver, entre outros, SENAI-DN/IEI-UFRJ (1990) e Coutinho (1992).
49
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
flexibilidade equivale a privilegiar a empresa como locus
essencial da política de remuneração e fixação de conteúdos e de
regimes de trabalho, como o trabalho parcial, contratos de
experiência, de aprendizagem (para os jovens), por prazo
determinado, etc.
Como assinalado, os dois aspectos podem ser contraditórios.
Se a demanda por flexibilidade quantitativa aponta para a
desestruturação dos mercados de trabalho, o envolvimento e a
polivalência, atributos cada vez mais valorizados pelas empresas,
ao contrário, implicam o estabelecimento de vínculos regulares e
estáveis entre trabalhadores e empresas. Nesse sentido, o
Contrato Coletivo, mesmo na forma centralizada, não é um
anacronismo, como apresentado nos modelos ultraliberais.
Quanto às tendências das negociações coletivas deve-se
observar que, apesar de fortes diferenças nacionais nos arranjos
e na estrutura de representação sindical, vem crescendo a
importância das negociações por empresas, reforçando a
descentralização concomitante, porém, em muitos casos, com
contratos mais amplos e com crescente participação dos governos
na definição de políticas de rendas pactadas num modelo
tripartite.
A demanda por flexibilidade funcional está mais nitidamente
ligada à difusão das novas técnicas de automação com base na
microeletrônica e, principalmente, nas novas formas de
organização inspiradas no exemplo japonês. O que muda,
essencialmente, é a expectativa quanto ao grau de envolvimento
dos trabalhadores diretos com os problemas da produção, dimensão
sempre desprezada pelos métodos tayloristas. Enquanto os
contratos tradicionais de trabalho tendiam a estabelecer uma
grande rigidez nas prescrições de tarefas para cada trabalhador,
algo hoje percebido como inibidor de um comportamento mais
participativo, passou-se a estimular o trabalho em equipe e um
perfil mais amplo de qualificações para cada um.
50
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
A implantação dessas mudanças tecnológicas pode se dar em
diferentes ambientes sociais, moldando, por sua vez, resultados
socialmente diferenciados. Uma mesma tecnologia pode ser usada de
forma a concentrar os conhecimento técnicos e gerenciais nas mãos
de poucos trabalhadores muito qualificados ou de uma forma que
descentralize entre vários postos de trabalho estes recursos.
Esta segunda forma, além de mais eqüitativa, possui a seu favor
uma potencialidade de redução dos conflitos tendendo a ser,
também por isto, tecnicamente mais eficiente.
A experiência dos países mais avançados parece afirmar o
desenvolvimento de múltiplos modelos em torno da reestruturação
produtiva e da demanda por flexibilidade, cujo desenho não
decorre exclusivamente dos requerimentos tecnológicos, mas da
estrutura industrial e das instituições de resolução dos
conflitos.
A despeito de aspectos comuns, é importante ressaltar a
variedade de experiências nacionais sobre as iniciativas de
flexibilização do trabalho. O Quadro 1, elaborado pela OCDE,
ilustra bem este ponto.
QUADRO 1
EUROPA - EXPERIÊNCIAS DE FLEXIBILIZAÇÃO DO TRABALHO EM
QUATRO PAÍSES SELECIONADOS
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
DISCRIMINAÇÃO GRÃ-BRETANHA FRANÇA ALEMANHA
SUÉCIA
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Formas atípicas de emprego XXXX XXX XX
X
Contratos comerciais substituindo
contratos de trabalho XXX XX X
X
Reorientação do tempo de trabalho XXXX XXX XX
X
Polivalência X XX XXX
X
51
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Baixas temporárias de salários,
individualização XXX XX X
X
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Fonte: Conseil Economique e Social (1991). Extraído de: Ramos (1993).
Estas variantes, se bem decorrem das diferentes instituições
de regulação do mercado de trabalho, denotam estratégias
diferenciadas sobre a flexibilidade. Boyer (1986) distingue duas
vias essenciais: a flexibilidade como uma resposta defensiva aos
desequilíbrios macroeconômicos e ao desemprego, e a flexibilidade
como uma mobilização ofensiva a partir das possibilidades criadas
pelos novos métodos de organização e produção.
O que está em questão são duas concepções de flexibilidade:
defensiva e ofensiva. A primeira limita-se à flexibilização de
empregos e salários, visando reduzir custos e recuperar condições
de equilíbrio nos moldes anteriores. Já a ofensiva, busca
alterações no processo de trabalho que facilitem uma nova
inserção no comércio internacional. Implica negociações que
reduzam as áreas de conflito e induzam à cooperação.
Tendo em vista o processo de reestruturação produtiva em
curso nos países mais desenvolvidos, é importante localizar os
novos ítens que compõem as agendas de negociações entre
empresários e trabalhadores. Reconhecida a ampla diversidade de
casos nacionais, tanto em relação à difusão de novas tecnologias
quanto ao dinamismo do mercado de trabalho, é possível
identificar os seguintes pontos:
* requalificação e formação profissional com forte ênfase
nas melhorias qualitativas das tarefas (polivalência);
* redução da jornada de trabalho;
* flexibilização negociada do contrato do trabalho;
* políticas públicas de apoio aos setores particularmente
atingidos pelo processo de reestruturação;
52
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
* superação das disparidades entre filiais de empresas
transnacionais (criação na Europa de comitês de empresas
transnacionais);
* negociação (em nível setorial) da introdução de novas
formas de organização de trabalho, em particular na indústria
automobilística; proteção do meioambiente na indústria química;
* envolvimento dos sindicatos nas políticas públicas de
desenvolvimento visando reduzir o desemprego estrutural (em
particular o dos jovens).
Como se pode depreender da experiência européia, o elemento
essencial presente nos casos nacionais mais bem-sucedidos é a
manutenção e, em alguns casos, a ampliação dos processos de
negociação sobre as relações de trabalho num contexto de
transformações estruturais. As reivindicações relativas à idéia
de "qualidade de vida" colocam um novo desafio para um
sindicalismo que foi tão bem-sucedido nas lutas econômicas.
No continente latino-americano, mesmo nos casos mais bem-
sucedidos de ajuste frente à crise da dívida e do financiamento
do setor público, constata-se, na última década, a reprodução e a
ampliação da segmentação dos mercados de trabalho. Acresce-se uma
matriz institucional com forte intervenção estatal, débil poder
sindical, relações de trabalho autoritárias e marcadas por baixa
tradição de negociação. Nestas circunstâncias, os processos de
modernização tecnológica podem até se combinar, a despeito de
inovações formais, com mecanismos tradicionais de gestão do
trabalho.
4
Este desencontro entre produtividade e salários e entre
inovações organizacionais e qualidade do trabalho, ilustra a
relativa autonomia entre regime fabril e eqüidade, chamando a
atenção para a existência de distintas vias em que se dão o
4
A implantação de fábricas de alta tecnologia made in Japan num país de porte médio e marcado
por condições sociais muito distintas das que predominam nos países avançados, como a fábrica
da Universal Motors no norte mexicano, próximo à fronteira com os EUA, constitui caso
paradigmático das questões aqui consideradas. Ao lado de inovações organizacionais, da
robotização e utilização de equipamentos de última geração, a forte competitividade da fábrica
mexicana beneficia-se do baixo custo da mão-de-obra: US$ 2 por hora contra 30 pagos em Detroit.
Ver Shaiken (1990).
53
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
progresso técnico e o processo de modernização. Aponta ainda que
as transformações no mercado de trabalho e nas relações
industriais devem ser vistas não apenas no contexto da
reestruturação demandada pelas empresas mas, também, no das
instituições e interesses dos grupos sociais envolvidos. Elas
possuem determinações concretas que não podem ser reduzidas às
formulações abstratas inscritas nos paradigmas teóricos. Em
outras palavras, o mercado de trabalho não é apenas mais um
mercado, como o de qualquer outro bem.
A experiência mais acabada de mudança das relações de
trabalho na América Latina, a chilena, se deu através da
intervenção unilateral do Estado sobre a legislação trabalhista.
Entre 1973 e 1989, transformaram-se radicalmente e
autoritariamente as instituições do trabalho no Chile na direção
de uma ampliação da gestão empresarial, redução do controle do
estado, dos direitos protetivos, individualização das relações de
trabalho, descentralização da estrutura sindical e da negociação
coletiva e exclusão na prática do direito de greve.
5
A via estatal e autoritária da desregulação e flexibilização
do mercado de trabalho vem marcando a experiência recente de
outros países latino-americanos (Panamá, Colômbia, Peru) sem que
tal movimento traduza, em qualquer sentido relevante,
necessidades impostas por transformações produtivas ou por
promoção de exportações de bens de alto valor agregado.
1.2. A Situaªo Brasileira
1.2.1. O quadro geral
No setor manufatureiro brasileiro são questionáveis o
sentido e a extensão das mudanças nas relações de trabalho
provocadas pelo processo de ajuste produtivo que hoje já vem se
afirmando de forma vigorosa. Entre trabalhadores e empresários,
5
Ver SENAI-DN/IEI-UFRJ (1990).
54
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
predomina ainda uma atitude de desconfiança mútua. Para os
empresários, os operários não possuem a qualificação e a
disposição necessárias a uma participação mais engajada e
criativa nas empresas; para os operários, os empresários não têm
revelado qualquer disposição de mudar sua postura de controle
unilateral na gestão da força de trabalho.
6
O clima de desconfiança que predomina nas relações do
trabalho reflete, por outro lado, as características
macroeconômicas que marcaram e vêm marcando a vida do país: um
regime de alta inflação e, nos últimos anos, uma aguda recessão
com forte destruição de postos de trabalho decorrente de ajustes
que visam a redução de custos das empresas.
Com efeito, as transformações que hoje se processam no
relacionamento capital-trabalho têm como motivação fundamental o
intenso ajuste quantitativo realizado pelas grandes empresas do
setor manufatureiro. Como confirma a pesquisa de campo do Estudo
da Competitividade da Indústria Brasileira, o elemento decisivo
na formulação da estratégia das empresas brasileiras tem sido a
retração do mercado interno.
A introdução de novas tecnologias e métodos produtivos,
questões que em si provocam, nas experiências nacionais
conhecidas, amplas mudanças, são aqui superpostas a um quadro de
aguda crise macroeconômica. A recessão, assim, tem contribuído
para a redução dos conflitos a despeito do atraso das relações
trabalhistas e do significativo declínio dos salários reais no
último quinqüênio.
A terceirizaªo , processo que induz a um aumento da divisão
social do trabalho e aumento da produtividade como resultado da
focalização nas atividades centrais da empresa e contratação
externa de bens e serviços, assume entre nós outra conotação. No
6
Quanto às mudanças na divisão técnica do trabalho na indústria brasileira, "o controle sobre o
trabalho continua sendo um de seus objetivos, essas gerências aproveitaram-se das novas
tecnologias para estender a organização Fordista do trabalho a novas áreas da produção (...)
Trabalhos semiqualificados continuam a predominar e a ser definidos com base em tarefas
fragmentadas e simples, especializadas por áreas de produção." (Carvalho, 1992:31).
55
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Brasil, vem predominando uma forma "espúria" de terceirização,
que tem mais a ver com informalizaªo . Sem alterar
substancialmente a base técnica, contratam-se serviços externos
visando a redução de custos salariais e compromissos
trabalhistas.
7
O quadro que emerge destas observações aponta
para o predomínio de um tipo de modernização em que se busca a
eficiência do trabalho através de mecanismos tradicionais de
gestão e disciplina ao lado de inovações formais no processo de
trabalho. A chamada "administração participativa" vem sendo
introduzida mais como forma de intensificação do trabalho do que
de ampliação do diálogo e do escopo das negociações.
8
No que se refere às relações industriais, não se pode falar
numa tendência uniforme em todo o parque industrial do país. Pelo
contrário, existe enorme diferenciação na maneira como a questão
vem sendo tratada pelos diferentes setores industriais,
abrangendo desde uma postura mais favorável à negociação do
processo de modernização com os sindicatos (como pode ser
observado em algumas das empresas do setor automotriz) até uma
tendência nitidamente anti-sindical, que se baseia na definição
unilateral do processo por parte do empresariado e, portanto, na
não disposição das empresas em negociá-lo com os trabalhadores e
sindicatos. Nesses casos, as empresas tendem, em geral, a buscar
o envolvimento dos trabalhadores a partir de benefícios
individuais, ao mesmo tempo que rechaçam qualquer forma de
organização operária nos locais de trabalho.
A existência de uma organização efetiva dos trabalhadores
dentro das fábricas tem-se mostrado importante para viabilizar a
participação sindical na discussão com as empresas. Por outro
lado, as comissões de fábricas que vêm conseguindo negociar a
introdução de novas tecnologias, vêm passando por um processo
importante de fortalecimento.
Registra-se um significativo progresso na negociação da
introdução de novas técnicas organizacionais na grande empresa no
7
Esta questão examinada da ótica dos trabalhadores encontra-se em CUT (1993).
8
Ver, a respeito, Teixeira (1993).
56
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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setor metalúrgico paulista. São exemplos desta mudança a
conquista pelos sindicatos do direito de informação (Volkswagen,
em 1985; Atlas Copco, 1988; Semco, 1990; Seco Tools, 1990), os
acordos da Mercedes Benz sobre o processo de terceirização (1990)
e a ampla e bem-sucedida negociação da Autolatina (1991) sobre a
redefinição da estrutura dos cargos e salários, negociação da
terceirização, acesso à gerência, salários e emprego
9
.
Os setores industriais que mais têm conseguido avançar uma
nova pauta de negociações são os metalúrgicos, petroleiros,
químicos e petroquímicos. Já os principais temas negociados são:
direito à informação sobre as inovações pretendidas pelas
empresas, garantia de emprego, realocação e treinamento de mão-
de-obra. Os setores onde a negociação vem sendo mais difícil:
têxtil, couro, calçados, móveis e mobiliário, vidros e cimento.
Deve-se alertar que, no interior dos setores que vêm conseguindo
negociar, a prática é muito diferente de uma empresa a outra,
havendo em geral uma convivência de empresas mais dispostas à
contratação com outras muito resistentes.
Entretanto, ainda que importantes e paradigmáticas, aquelas
experiências discrepam do conjunto da indústria, onde predomina a
prática unilateral de gestão da mão-de-obra. Uma das técnicas que
muitas empresas vêm aplicando como forma de evitar a negociação é
o enxugamento do quadro de funcionários antes da introdução de
programas de racionalização, através de demissões massivas nas
quais se busca eliminar os grupos organizados e os trabalhadores
mais próximos do sindicato.
A postura resistente à negociação por parte das empresas é
muitas vezes reforçada por uma prática sindical rígida de
oposição a toda e qualquer forma de inovação, que acaba
inviabilizando qualquer possibilidade de negociação.
9
"Sem nenhuma grande paralisação, os metalúrgicos conseguiram a recuperação salarial dos últimos
dois anos e reajustes mensais. Graças ao acordo, a Autolatina, que detém 55% do mercado
automobilístico brasileiro, conseguiu fechar o ano sem nenhuma demissão" (Jornal do Brasil,
31/01/93, p. 14). Alguns avanços importantes vêm ocorrendo na formação de comissões de fábricas
em grandes empresas.
57
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Tendo em vista esta nova realidade, cabe indagar: Quais os
obstáculos que se colocam a um desejado "envolvimento negociado",
em que comportamentos cooperativos predominem sobre
comportamentos defensivos e conflitivos ?
Desenvolveram-se, nos últimos anos, diversas iniciativas de
avaliação das relações de trabalho no país. As discussões e os
diagnósticos do grupo de trabalho responsável por este tema na
Câmara Setorial da Indústria Automotiva (GT-6), ainda que
fragmentadas e pouco conclusivas, permitem localizar os
principais pontos críticos na percepção dos empresários e dos
trabalhadores envolvidos na discussão.
10
Os sindicatos dos trabalhadores têm apontado como principais
entraves: a intervenção do Estado na vida sindical e no
relacionamento entre as partes; a estrutura empresarial
autoritária; a inexistência de organização sindical e de
representação dos trabalhadores no locais de trabalho; a ausência
de estímulos à participação dos trabalhadores na busca da
qualidade e produtividade; o tratamento desconfiado e agressivo
que o patronato dispensa aos sindicatos de trabalhadores e a
própria prática dos sindicatos (tanto de trabalhadores como de
empregadores), que não interpretam nem assumem os encaminhamentos
requeridos pelas respectivas categorias.
As associações patronais, embora também critiquem a
interferência estatal no relacionamento entre as partes, apontam
outras questões como entraves: a inexistência do direito de lock-
out; a impossibilidade de criação de turnos de trabalho
temporário, de acordo com a sazonalidade do produto; a
deficiência governamental na prestação de serviços sociais
essenciais como educação, saúde, assistência securitária e
previdenciária; a impossibilidade de flexibilização da jornada de
trabalho; o desestímulo à premiação pela eficiência individual e
coletiva, em virtude da obrigatoriedade de incorporação à
remuneração do trabalhador; os altos encargos sociais; a oposição
sindical à efetividade do trabalho participativo.
10
Ver "GT-6 Diagnósticos sobre Relações Capital e Trabalho". Consensados nas Reuniões de 8, 17 e
26/06/92 e 10/07/92, Revisados com os Sindicatos de Trabalhadores em 14/07/92 (mimeo).
58
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Este diagnóstico explicita a existência, por parte dos
principais atores, de um amplo reconhecimento sobre o atraso das
relações capital-trabalho no país. Atraso até mesmo em relação à
antiga base técnica, dada a inexistência no país de mecanismos
autônomos de negociação indispensáveis a um contrato coletivo de
trabalho. Quando se tem em vista a introdução de novas
tecnologias e processos organizacionais, o anacronismo das
relações de trabalho torna-se ainda maior.
Tomando-se este quadro como representativo das posições
atuais de parcela dos empresários e trabalhadores dos setores
mais modernos, pode-se destacar dois aspectos significativos pelo
que têm de consensuais:
i) uma atitude contrária à tutela estatal sobre as relações
de trabalho;
ii) uma atitude crítica aos serviços públicos como
contrapartida aos encargos sociais.
Enquanto o primeiro remete à questão do Contrato Coletivo, o
segundo aspecto levanta a questão do custo do trabalho e do
financiamento da Seguridade Social.
1.2.2. O contrato coletivo
A criação de relações de trabalho mais flexíveis no Brasil
distingue-se, necessariamente, do contexto europeu contemporâneo.
Enquanto os países da Europa buscaram reduzir a rigidez
decorrente de contratos coletivos centralizados nacionalmente e
do elevado custo de dispensa, no Brasil, onde estas
características nunca prevaleceram, impõe-se, devido a seu atraso
institucional, a constituição de relações de confiança e respeito
entre empregados e empregadores, maior participação dos
trabalhadores nas decisões sobre o dia-a-dia das empresas, maior
controle sobre as demissões e as políticas de remuneração, e a
implantação de contratos coletivos de trabalho com autonomia de
59
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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decisão. Isto é, trata-se no Brasil de transitar de um modelo
corporativo, autoritário e não-negocial (mas flexível na gestão
da força de trabalho), para outro que, nos seus fundamentos, foi
obtido no pós-guerra pelos países industrializados.
Cumpre ressaltar que, enquanto nos países industrializados a
taxa de sindicalização caiu significativamente ao longo dos anos
80, no Brasil esta década vivenciou ampla expansão da organização
sindical.
11
Não obstante a indiscutível abrangência do sindicalismo
brasileiro, o sindicato ainda permanece fora dos locais de
trabalho, com exceção das grandes fábricas da metalmecânica.
Ainda assim os anos 80 revelaram uma crescente vinculação dos
sindicatos com as centrais sindicais, renovando a forma de
representação e defesa dos interesses dos assalariados. Em 1990,
segundo dados da Central Única dos Trabalhadores (CUT)
12
, o número
de sindicatos afiliados a esta central era de 1.069, sendo 656
urbanos e 413 rurais. No setor urbano, a maior concentração de
sindicatos filiados à CUT se dá na indústria e no setor público.
As demais centrais sindicais também se afirmaram nos anos mais
recentes. O resultado foi o desenvolvimento de acordos setoriais
em nível nacional em diversas categorias, como bancários,
eletricitários, petroleiros.
Deste modo, as inovações nas relações de trabalho no país,
que hoje já são visíveis em certos setores e empresas ao lado do
crescimento do poder das centrais sindicais, parece apontar para
um quadro institucional em que, se de um lado a centralização vem
se afirmando como resultado da ação das centrais sindicais,
afirma-se, de outro, um conjunto de iniciativas criativas no
âmbito das empresas.
Entre as opções do movimento sindical cristalizadas na
Constituição de 1988, preservou-se a idéia básica de que as
11
Barelli (1990:8). Vale notar que não obstante a forte expansão ocorrida nos anos 80, a
densidade sindical - 28% da PEA em 1988 segundo a Pesquisa Sindical do IBGE - é ainda muito
baixa e fortemente pulverizada: em 1988 apenas 10 sindicatos tinham mais de 50 mil associados e
cerca de 70% representavam até 5 mil associados.
12
Ver Camargo & Amadeo (1992); dados baseados nos Boletins da CUT.
60
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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amplas assimetrias sociais requerem mecanismos legais de proteção
das condições gerais de trabalho, cabendo à livre negociação
entre as partes acrescentar novas agendas de comum acordo. Neste
sentido, é importante considerar que, a despeito de constituírem
aspectos relacionados, a questão dos direitos individuais dos
trabalhadores não se confunde com, nem necessariamente se opõe à
liberdade de contratação, desde que esta possa negociar ítens
presentes na legislação
13
.
Ao lado de promover algumas inovações importantes,
concedendo maior liberdade à contratação coletiva, a Constituição
preserva estruturas e procedimentos cuja mudança hoje se impõe
segundo empresários e trabalhadores
14
. Por outro lado, a
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e a Constituição
estabelecem condições que, em outros países, constituem objeto de
negociação entre as partes
15
. Deve-se ressaltar, entretanto, que o
artigo 8
º
da Constituição que trata da representação sindical
ainda está por ser regulamentado. Os diferentes projetos em
tramitação na Câmara de Deputados revelam que esta ainda é uma
questão em aberto. O que sim, parece ser consensual é o fim do
imposto sindical obrigatório conforme estabelecido na CLT em
1943.
O tema da unicidade sindical continua a dividir a opinião
tanto dos trabalhadores quanto dos empresários. Em consulta
realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) no
primeiros meses do ano, envolvendo 55 entidades patronais e 35
empresas, a unicidade sindical deveria ser mantida segundo 45%
dos consultados. Esta pesquisa revela, com eloqüência, o
13
Sobre este aspecto o caso italiano é bastante sugestivo. As normas legais predispõem um nível
de tutela mínima para os trabalhadores mediante normas não derrogáveis unilateralmente, e o
contrato coletivo, como o contrato individual de trabalho, pode produzir, em linhas gerais,
mudanças apenas "para melhor" (Arrigo, 1992:3).
14
"No conjunto, a Constituição de 1988, mesmo ampliando consideravelmente a autonomia dos
sindicatos, conservou o modelo corporativo através da manutenção do princípio da unicidade
sindical, do monopólio legal da representação, da estrutura vertical que garantiu a
continuidade das federações e confederações existentes, da contribuição sindical, dos tribunais
de trabalho com funções normativas, etc." (Rodrigues, 1990:19).
15
Como já se observou, ainda que se reconheça a rigidez e o excessivo protecionismo da
legislação, nada impede que o contrato coletivo os flexibilize. Este ponto distingue o
comportamento revisionista dos sindicatos e dos empresários que defendem a supressão destes
dispositivos da Constituição.
61
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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desencontro entre as proposições dos sindicatos patronais e dos
sindicatos dos trabalhadores, relativo a importantes aspectos das
relações industriais, como a estabilidade do emprego e a
participação dos sindicatos nas negociações coletivas.
A crítica essencial dos empresários às atuais relações de
trabalho concentra-se no capítulo II da Constituição de 1988, que
define os Direitos Sociais. Em particular, a legislação sobre
jornada de trabalho - como a limitação em 6 horas para o trabalho
em turnos ininterruptos de revezamento - é vista como um fator de
rigidez. Outros aspectos como licença-maternidade, licença-
paternidade, direito de greve, etc., são criticados. É
particularmente marcante a insatisfação dos empresários quanto à
legislação salarial, considerada impeditiva ao estabelecimento de
incentivos por desempenho devido à obrigatoriedade de
incorporação à remuneração do trabalhador.
Os mecanismos protetivos estabelecidos na Constituição, se
de um lado revelam uma concepção tutelar e substitutiva de
negociações na definição das relações de trabalho, traduz, por
outro, a convivência no país de uma diversidade empresarial e
heterogeneidade produtiva muito ampla .
Qual a agenda de negociações que se impõe para o futuro
imediato tendo em vista as atuais relações entre capital e
trabalho? Segundo os participantes do grupo de trabalho da Câmara
Setorial da indústria Automotiva, os tópicos principais seriam:
- sistemas de negociações coletivas e de solução de
conflitos individuais e coletivos;
- jornada de trabalho, reclassificações funcionais e
sistemas de remuneração.
É importante considerar que o primeiro item constitui,
formalmente, um meio para a obtenção de resultados e não uma
agenda de negociações. No entanto, substantivamente, afirma-se
como um ponto essencial, dado a inexistência de uma prática de
contratação coletiva com autonomia de negociação entre as partes.
Desse modo, o formato e as características do contrato coletivo
62
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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constituem eixos centrais para a dinâmica das relações entre
empresários e trabalhadores. Isto está evidente no segundo
tópico, ainda que, sendo mais específico para a indústria
automobilística, trate de aspectos gerais como a jornada de
trabalho e particulares como reclassificações funcionais.
Distinguir o geral e o particular de forma articulada com o tipo
e o ambiente de negociações constitui, de fato, uma agenda para
as negociações trabalhistas. Neste sentido, as negociações
futuras devem caminhar de acordo com os seguintes eixos:
i) a representação dos trabalhadores no local de trabalho,
atribuições, escopo de negociação, vinculação com o sindicato;
ii) relação entre a lei (direitos trabalhistas) e o contrato
coletivo;
iii) a alteração do papel da Justiça do Trabalho;
iv) o hibridismo institucional com proteção da CLT para os
setores não cobertos pelo contrato coletivo;
v) a operação de serviços privados e públicos de mediação e
arbitragem;
vi) centralização e descentralização da negociação: a
definição do escopo de cada nível;
vii) mecanismos promovedores e garantidores das negociações;
viii) negociação sobre mecanismos de dispensa e estabilidade
associados com a introdução de novas tecnologias;
ix) sistemas de remuneração, mecanismos de proteção social.
1.2.3. A questªo do custo do trabalho
A busca de competitividade nos mercados externos através de
baixos custos de mão-de-obra constitui uma estratégia oposta à
dos países e empresas vencedoras. Mesmo nos ramos de baixo valor
adicionado e intensivos em mão-de-obra, as vantagens decorrentes
de um baixo custo salarial dificilmente permanecem - inclusive
porque dependem de uma taxa de câmbio estável - frente ao
processo de inovação que hoje se afirma inclusive em setores
considerados tradicionais. Pelo porte de sua indústria e pela
63
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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abertura comercial, o Brasil não pode deixar de acompanhar o
progresso técnico.
Expandir a renda dos assalariados sem pressionar
excessivamente os custos salariais das empresas afirma-se, por
seu turno, um alvo crescentemente perseguido. Este alvo pode ser
obtido pela via do aumento da produtividade nos bens-salários ou
pela redução dos encargos que incidem sobre o salário direto. No
Brasil, o pensamento dominante sobre este ponto recai sobre esta
segunda via.
É generalizada no meio empresarial a percepção de que o
custo do trabalho no país é alto. Entretanto, os salários como
poder de compra são reconhecidamente "baixos". A diferença
estaria na incidência dos encargos sociais sobre os salários
diretos. Desta percepção decorrem posturas simplistas de redução
destes encargos (com propostas de aumento do salário real), que
não levam em conta sua composição. Existem três tipos distintos
de encargos: primeiro, aqueles destinados ao financiamento das
instituições de proteção e promoção social que não podem ser
analisados sem propostas alternativas de financiamento
concomitantes. Um segundo conjunto de encargos refere-se a
benefícios relacionados a salários propriamente ditos (férias,
descanso remunerado, 13
º
salário) e que, portanto, não estão em
discussão.
16
O terceiro conjunto envolve o custo de dispensa, considerado
elevado e um fator inibidor da contratação. A economia brasileira
industrializou-se, como antes se comentou, com alta flexibilidade
quantitativa da força de trabalho permitida pela grande liberdade
de dispensa, principalmente a partir de 1964 quando o Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) substituiu o estatuto da
estabilidade. As mudanças institucionais no final dos anos 80
16
A ponderação e a explicitação dos ítens dos dois primeiros conjuntos constam da Tabela 7 (em
anexo).
64
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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elevaram notavelmente o custo de dispensa de mão-de-obra
fortemente proporcional ao tempo de serviço.
17
Esta alteração, num momento marcado por forte recessão e
destruição de postos de trabalho no setor moderno da economia,
contribuiu para uma maior informalização que, por sua vez,
compromete a base de arrecadação dos fundos sociais. Voltaremos
ao ponto na seção 2.2.
1.2.4. Implantaªo do contrato coletivo no Brasil: principais
proposiıes
Aspectos Gerais
Tendo em vista as percepções de empresários, trabalhadores
e representantes de governo sobre os principais problemas
envolvendo as relações trabalhistas e os desafios globais aqui
sugeridos, procurar-se-á apresentar as principais propostas de
contrato coletivo no Brasil. Buscando confrontar posições
bastante distintas, serão resumidas a seguir as análises e
proposições mais identificadas com o empresariado, especialmente
paulista
18
- doravante denominadas proposiªo A - e as
proposições defendidas por uma das centrais sindicais
19
- aqui
denominadas proposiªo B . É preciso ressaltar que o contrato
coletivo de trabalho, entendido como um novo sistema de relações
de trabalho, só vem mobilizando, até o presente momento, os
sindicatos de trabalhadores mais modernos. Com efeito, para os
ramos mais tradicionais da indústria e sobretudo para os
sindicatos patronais, a atual estrutura de representação sindical
possui as vantagens da proteção estatal assegurada. Quanto mais
se afasta da região Sudeste, e de São Paulo em particular, maior
17
Entre aviso prévio, gratificação de natal, férias, FGTS e multa sobre o FGTS, o custo médio de
demissão para um trabalhador com 18 meses de emprego e salário de 100 é de 296,66. Com 78 meses
de emprego este custo eleva-se para 488,66. Ver Cacciamali (1992).
18
Pastore (1992). Ver também CNI (1992a) Carta ao Ministro do Trabalho e Administração, Rio de
Janeiro, 15 de dezembro de 1992.
19
CUT (1992).
65
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
é a resistência ao processo de mudança. Estas questões serão
examinadas após a apresentação das diferentes propostas.
O pano de fundo subjacente às posições patronais identifica,
no atual curso de mudanças tecnológicas e organizacionais, que se
afirma na indústria, uma comunhão de interesses entre capital e
trabalho, que se beneficiariam linearmente do aumento da
produtividade, flexibilidade, etc. As resistências a estas
inovações e à convergência de interesses decorrem, segundo os
proponentes, sobretudo nos países com forte tradição sindical
e/ou tutela estatal, dos interesses corporativos contrariados,
dos preconceitos e das ideologias anacrônicas.
Subjacente à proposta B, o conflito de interesses é da
essência do processo produtivo, o campo de convergências não é
óbvio e, por isto, é preciso promover mecanismos de negociação
sem os quais os interesses do poder econômico acabam por se
impor, penalizando os segmentos mais débeis do mercado de
trabalho.
Ambas as posições convergem na percepção de que um sistema
participativo é melhor e mais eficiente, contribuindo para
melhorar as condições de trabalho, aumentar a produtividade,
diminuir o autoritarismo das chefias e eliminar o papel tutelar
do Estado sobre as relações do trabalho. É indispensável um maior
envolvimento entre as partes e menor participação do Estado.
As posições divergem no que se refere ao grau de
centralização dos contratos. Para a proposta A, as formas de
contratação coletiva articuladas e centralizadas, tal como ainda
predominam nos países europeus, são contraditórias com o novo
cenário econômico, caracterizado por incertezas, instabilidade,
maior concorrência e rápidas mudanças tecnológicas. Elas foram
produto de anos de crescimento alto e estável dos mercados de
massa (fordismo). Hoje são obsoletas pois amarram as relações de
trabalho (emprego, salários) impedindo a individualização,
descentralização e flexibilização. Defendem, portanto, a
66
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
contratação individual ou, no máximo, a contratação coletiva
descentralizada por empresa.
Para a proposta B, o contrato coletivo de trabalho constitui
uma conquista universal e é importante que seja articulado e
centralizado: "consiste em conceber a contratação ou contratações
centrais como resultado do trabalho em conjunto dos trabalhadores
de uma determinada categoria e depois, de acordo com a
organização, força, circunstância e interesse, descentralizar o
processo" (Siqueira Neto, 1991:197). A complexidade da
contratação articulada está na combinação de distintas
particularidades de empresas e regiões com a uniformidade
requerida num contrato geral. O processo segundo os proponentes
não pode ser concebido como uma soma de contratos
descentralizados. "Para se atingir a especificidade do local de
trabalho, é necessário que se tenha uma proteção mínima para
todos os trabalhadores do setor ou ainda o conjunto dos
trabalhadores dependendo da forma de contratação. Caso contrário,
a descentralização não passaria de um ardil para isolar os
setores mais avançados." (Siqueira Neto, 1991:198).
Implantaªo no Brasil
A realidade brasileira, segundo a proposta A, é marcada pela
existência de um excesso de regulamentação e rigidez no mercado
de trabalho, aliado a altos custos dos encargos sociais. O
problema agravou-se com a Constituição de 1988. Derrogar diversos
preceitos ali estabelecidos e suprimir o poder normativo da
justiça de trabalho é precondição para um livre contrato coletivo
que deverá ser por empresa e não por setor e menos ainda
nacional. O eixo da mudança deve ser o da flexibilidade do
mercado de trabalho que, segundo esta interpretação, foi
fortemente reduzida pelo excesso de proteção da Constituição.
A realidade brasileira vista pela proposta B é da agonia de
um sistema de relações trabalhistas estatutário e desmobilizante.
As lei sociais não funcionam porque os sindicatos são frágeis. Há
em curso um processo de reestruturação econômica nas grandes
67
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
empresas mantendo, no seu fundamental, as mesmas relações
trabalhistas atrasadas. Impõe-se uma reforma profunda nas
relações de trabalho que assegurem aos trabalhadores cidadania e
maior autonomia do Estado e do poder econômico. A proposta
explícita é a de criação de um sistema permanente e articulado de
negociações coletivas, celebração de contrato nacional de
trabalho e adesão do país às Convenções da Organização
Internacional do Trabalho (OIT).
20
Esta proposição prevê uma transição entre o sistema atual e
o proposto através da elaboração de legislação de apoio, remoção
de restrições ao exercício da liberdade sindical, transformação
da Justiça de Trabalho em instrumento de arbitragem pública
acessada voluntariamente .
Contrato Coletivo e Direitos Sociais
Deve-se considerar que, no Brasil, as relações que se passam
no ambiente do trabalho são fortemente afetadas por questões
gerais, como as condições de moradia, de transporte, de saúde e
de educação, que são objeto das políticas públicas. Isto
significa que a busca de melhores condições de trabalho inclui,
necessariamente, uma agenda ampla voltada para as reformas de
mais longo prazo. Esta questão coloca, desde logo, a necessidade
de buscar instituições e instâncias de negociação suficientemente
diversificadas, representativas e promovedoras de acordos
parciais. Neste sentido, não há como superar o pêndulo
centralização-descentralização, impondo, antes, uma combinação
destas formas. O movimento sindical no Brasil de hoje deve
enfrentar o desafio e começar por definir os ítens que compõem um
acordo mais global e centralizado e aqueles que são típicos de
negociações descentralizadas.
21
Questões como greves, regras e
mecanismos de resolução de impasses seriam típicos de acordos
nacionais; a partir deles seriam definidas negociações mais
20
Em particular a Convenção 87, que trata da liberdade sindical e do direito de sindicalização.
Neste convênio a personalidade jurídica do sindicato não pode se subordinar a qualquer condição
que interfira no direito de trabalhadores e empregadores constituir sindicatos e definir seus
estatutos e procedimentos.
21
Ver Zylberstajn (1992).
68
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
concretas, em nível setorial, sobre salários e condições de
trabalho. Dependendo do setor, este acordo poderia ser nacional
ou regional. Estes acordos poderiam ser desdobrados até se chegar
no nível da empresa ou local de trabalho.
Embora, como foi dito na introdução, não seja nosso
propósito avançar propostas mais concretas nessa área, tudo
indica que ainda teremos que caminhar "em dois pés". Uma
legislação que garanta direitos mínimos universais, capaz de
proteger setores ou segmentos mais desarticulados,
concomitantemente com acordos e convenções cujas cláusulas se
sobreponham à legislação, para os setores mais avançados e
organizados.
No Brasil de hoje não apenas inexiste uma prática
institucionalizada e sofisticada de negociações descentralizadas
no âmbito das empresas, como tampouco existem negociações
coletivas centralizadas que permitam transcender as
particularidades de grupos.
Historicamente, o governo brasileiro sempre exerceu
isoladamente as funções de definir as políticas salariais e
sociais. A diluição da capacidade de iniciativa do executivo nos
anos mais recentes não foi acompanhada pela assunção, quer por
trabalhadores, quer por empresários, da responsabilidade de criar
mecanismos e instituições que permitam definir e regular
estratégias sobre estes aspectos básicos.
Nesse sentido, as Câmaras Setoriais podem vir a ser
importantes, ainda que constituam respostas parciais e
insuficientes para a configuração de uma política de rendas mais
ampla.
O ponto importante a registrar, tendo em vista os aspectos
antes examinados e as diversas e frustradas tentativas de
proposição de uma política nacional de rendas, é a via de acordos
parciais passíveis de concepção e, eventualmente, de
implementação através das Câmaras Setoriais. A sua importância no
69
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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momento atual, marcado por forte crise e cenários incertos,
baseia-se no envolvimento conjunto de trabalhadores, empresários
e governo. Cabe pensar que nas Câmaras Setoriais pode surgir um
modelo de negociação que articule comissões de fábrica, sindicato
de base e centrais sindicais, a exemplo do que vem ocorrendo no
setor automobilístico. Este modelo, entretanto, deve buscar um
quadro de referências mais amplo, com a inclusão dos temas
relacionados ao processo de reestruturação da economia, promoção
do emprego e elevação do salário real.
Ao governo caberá estabelecer as diretrizes e metas
setoriais, em consonância com os objetivos da Política
Industrial. Eventuais incentivos devem ter caráter universal e
deve-se evitar negociá-los caso a caso nas Câmaras Setoriais.
Dessa forma, elas podem realmente se afirmar como locus da
modernização das relações industriais no Brasil.
22
1.2.5. A proteªo social: principais questıes
Na literatura que aborda o tema da modernização produtiva no
Brasil, em particular da que lida com diagnósticos e perspectivas
acerca do trabalho, nota-se a quase total ausência de referências
aos direitos sociais, usualmente englobados sob a noção de
seguridade social e associados à chamada cidadania industrial.
Não faltam, porém, indicadores que atestam a precariedade em
que vive a grande maioria da população brasileira, tanto no que
concerne às privações - nutricionais, habitacionais, de renda -
dos indivíduos, quanto no que diz respeito às políticas públicas
para preveni-las ou compensá-las
23
. Os gastos sociais em
percentual do PIB são reduzidos, como mostra a Tabela 1 (em
22
O caso da indústria automotiva vem sendo objeto de controvérsias. Alguns enxergam no recente
acordo um exemplo das virtudes e potencialidades das Câmaras Setoriais - ver Oliveira et alii
(1993). Já outros percebem o mesmo exemplo como manifestação da natureza de lobby corporativo,
que teriam as Câmaras Setoriais, com efeitos danosos sobre a receita fiscal e sobre os
consumidores.
23
Ver NEPP/UNICAMP (1991), onde dados sobre o ponto são fartamente expostos.
70
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
anexo)
24
; as redes de atendimento médico, saneamento básico, etc.,
não oferecem cobertura suficiente, os programas sociais atingem
contingentes pouco expressivos da pobreza existente. Os que
dispõem de "carteira assinada" - contribuindo para a previdência
social e possuindo, portanto, os direitos estabelecidos na lei -
não ultrapassam a metade da força de trabalho. Entretanto, ter ou
não "carteira assinada" no Brasil não constitui uma segmentação
tão radical como muitas vezes se supõe. De modo geral, prevalecem
salários baixos, más condições de trabalho, desigual poder de
mobilização sindical e altas taxas de rotatividade.
O sistema de proteção social brasileiro tem sido descrito
inúmeras vezes como ineficaz do ponto de vista do desempenho,
regressivo por conta de suas fontes de financiamento e iníquo sob
o ângulo da redistributividade. (Dain, 1989; Draibe, 1990;
Vianna, 1990; Azeredo, 1987; e outros). Como observa Teixeira
(1991), o mundo da previdência - afinal, o que de algum modo
funciona no sistema de proteção social brasileiro - insere-se
contraditoriamente no marco de heterogeneidade estrutural que
caracteriza o capitalismo no Brasil. O padrão de financiamento
ainda baseado quase que exclusivamente na contribuição de
empregados e empregadores sobre a folha de salários é vulnerável
frente às oscilações econômicas e restringe os programas
assistenciais.
25
A excessiva centralização de sua organização
institucional e administrativa não é capaz sequer de garantir a
natureza pública dos serviços e mal disfarça o viés clientelista
de algumas funções e privatista de outras, seja através do
privilegiamento de segmentos sociais, seja do favorecimento de
atividades privadas.
A maioria dos benefícios previdenciários, aqueles cujos
valores médios são reduzidos (não é o caso das aposentadorias
especiais e por tempo de serviço), situa-se na faixa de baixa
24
Nos países industrializados, os gastos só com prestações de seguridade variam entre 10 e 30% do
PIB. Áustria, Bélgica, Dinamarca, França, Países Baixos, Alemanha e Suécia estão entre os que
gastam mais com seguridade - de 20 a 30% do PIB. Espanha, Finlândia, Hungria, Noruega e
Inglaterra são países de gasto médio - de 15 a 19,9% do PIB. Grécia, Suíça, Nova Zelândia,
Canadá, EUA, Israel e Japão gastam relativamente pouco: de 10 a 14,9%. Cf. Dumont (1988).
25
A Tabela 2 (em anexo) mostra a parcela referente às contribuições sobre a folha de salários na
composição das receitas da seguridade.
71
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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renda, como se pode verificar na Tabela 3 (em anexo)
26
. O
necessário alargamento da receita previdenciária esbarra, de um
lado, na frágil capacidade fiscal do Estado e, de outro, na
estreiteza do mercado formal de trabalho. Face a este quadro, os
empresários, como já assinalado, queixam-se do peso que os
encargos sociais representam no custo do trabalho e recentemente
compareceram, por intermédio de algumas entidades, à comissão de
reforma da Seguridade instituída no Congresso
27
com propostas
definidas, sugerindo, inclusive, a extinção da Previdência
Pública. Já os trabalhadores, consultados e presentes a algumas
reuniões da dita Comissão, não apresentaram propostas escritas;
contudo, embora a CUT defenda publicamente o sistema estatal, as
negociações dos trabalhadores com os patrões vêm incluindo
regularmente esquemas privados de seguridade nas empresas.
A tendência à privatização dos programas de bem-estar vem se
alastrando internacionalmente, menos como inovação relacionada à
reestruturação industrial e mais como subproduto da crise
econômica que a ela se vincula (Tavares, 1992). Ajuste recessivo,
novos padrões de produtividade industrial e re-segmentação da
proteção social constituem movimentos convergentes, cujos efeitos
colaterais são o dualismo ocupacional, o aumento do desemprego de
longa duração e a precarização do mercado de trabalho. Nos países
desenvolvidos, contudo, nem a adoção de políticas econômicas
contencionistas, nem a substituição do fordismo como forma de
organização da produção, nem o revigoramento do ideário
neoliberal implicaram o desmonte do Welfare State, ainda que
reformas tenham sido realizadas
28
.
26
O que mostra que a clientela básica da Previdência é constituída pelas populações pobres.
Contudo, os segmentos mais miseráveis, os que ganham até 1/2 Salário Mínimo e que
correspondiam, em 1986, a 41% da população, apropriam-se de apenas 18% dos benefícios, como
evidenciado em NEPP/UNICAMP (1991).
27
Comissão Especial para o Estudo do Sistema Previdenciário instalada no dia 28/1/92 no Congresso
Nacional, sob a presidência do Dep. Roberto Magalhães; o Relator da Comissão, Dep. Antonio
Brito, divulgou vários documentos ao longo do período dos trabalhos e publicou o Relatório
Final na revista Previdência em Dados, 7(2), 1992.
28
A tese do não desmonte do Welfare State é reiterada por vários autores que apontam razões como:
o apoio da população aos sistemas públicos, organização dos trabalhadores vinculados aos
programas sociais, bem como as pressões para enfrentar os novos focos de pobreza e o aumento
das desigualdades sociais. Ver, por exemplo, Dumont (1987); Flynn (1989); Vogel & Moran (1991);
Mulgan (1991); Goodin & Lehrand (1987).
72
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Antes de voltar ao caso brasileiro, convém detalhar o
argumento da importância que a seguridade social continua a ter
nos países industrializados. É útil para mostrar que a solução
"condominial", ou seja, o provimento de ítens de proteção social
dentro dos muros da empresa, não pode funcionar por si só.
73
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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2. O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL
2.1. TendŒncias Internacionais
A expansão da produção capitalista no pós-guerra foi
acompanhada do desenvolvimento de sistemas públicos de proteção
social. O fortalecimento dos partidos social-democratas, a
difusão do fordismo como modelo de organização industrial e a
eficácia da regulação macroeconômica criaram as bases para a
ampliação daquelas funções.
Nos anos 70, porém, em meio às dificuldades econômicas
evidenciadas pelo choque do petróleo, críticas aos sistemas de
bem-estar social começaram a ser recorrentes. A crise do Welfare
State tem se manifestado em pelo menos três direções: A primeira
é a crise econômica, explicitada na recessão, instabilidade e
aumento do patamar de desemprego. Portanto, verifica-se menos
receitas e maiores gastos. A segunda é a mudança na estrutura
demográfica, cujo perfil vem mostrando uma diminuição do
contingente da população ativa em relação à inativa. Assim,
menores taxas de natalidade e maior longevidade aumentam o peso
dos encargos com os idosos, aposentados, doentes crônicos, etc. A
terceira é a crise política, expressa na insatisfaªo da
populaªo - ou seja, do eleitorado - com a atuação do Estado de
Bem-Estar: impostos altos e qualidade decrescente dos serviços.
As derrotas do Partido Trabalhista inglês, dos Democratas norte-
americanos nas duas eleições que precederam à de Clinton e da
Social-Democracia alemã e sueca exemplificam esta insatisfação.
As reclamações dos próprios usuários - quanto à
burocratização dos serviços e à queda dos valores dos benefícios
e da qualidade da assistência prestada - somaram-se às censuras
dos setores empresariais, que acusavam as políticas sociais de
responsáveis pelo aumento do déficit público, pela volta da
inflação e pelo declínio dos investimentos. Impostos
progressivamente avantajados desagradavam à classe média, ao
mesmo tempo em que as altas despesas governamentais falhavam na
74
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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eliminação dos renitentes focos de pobreza. A década de 80
assistiu ao agravamento da situação, em parte também por conta de
medidas contencionistas adotadas por governos conservadores
eleitos em vários países europeus e nos EUA.
Fatores externos ao sistema atuam igualmente no agravamento
do quadro: em países que alcançaram razoável homogeneidade, a
entrada de grandes contingentes de imigrantes afeta a
solidariedade social que o aparelho público de proteção requer;
focos de pobreza renovam-se com as ondas de desemprego e
reconversão das indústrias, sobrecarregando os cofres
governamentais. Ainda que se perceba algum exagero no suposto
desmantelamento dos sistemas de bem-estar, a crise que eles
enfrentam é real.
Os principais eixos do questionamento atual do welfare
state, porém, são determinados pelas necessidades advindas de uma
nova divisão internacional do trabalho e da crise fiscal. Embora
a diversidade de situações exija cautela nas generalizações - em
alguns países houve expansão da seguridade nos anos 80 -,
alterações foram implementadas tanto para fazer face aos
problemas emergentes como para buscar compatibilizar a cidadania
welfariana às reformas centradas no mercado. De todo modo,
medidas seletivizadoras, contencionistas e privatizantes ganharam
terreno. Paralelamente ao desenrolar desta crise geral, ocorrem
os processos de reestruturação industrial. Todos estes fatores
vão convergir para o debate em torno de reformas no welfare
state.
Em linhas gerais, as mudanças ocorridas no campo da proteção
social durante os últimos 15 ou 20 anos apontam para as seguintes
tendências: a desaceleração do "esforço social" - ou seja, a
diminuição no ritmo de crescimento dos gastos -; a progressiva
introdução ou incremento de mecanismos de seletividade, através
de prioridades dadas às clientelas-alvo, da focalização dos
programas ou de restrições no acesso a benefícios; e a
desestatização relativa, que consiste basicamente no afrouxamento
da ação estatal na produªo de bens e serviços "sociais", mas não
75
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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na regulaªo , já que esta se estende, e nem no financiamento, que
continua forte. As manifestações concretas desse processo são as
modalidades de mix público/privado, tão em voga atualmente.
Estas tendências têm assumido formas e dimensões
diversificadas no capitalismo central. Sobretudo na Europa e
desde a segunda metade dos anos 70, assiste-se a uma diminuição
no ritmo de crescimento dos gastos sociais (ver Tabela 4, em
anexo). Porém, a pausa no "esforço social" - caso típico da
Inglaterra - não representou eliminação de áreas ou programas na
alocação de recursos.
29
Seguindo o exemplo inglês, medidas mais austeras de
contenção começaram a ser tomadas por outros governos no
decorrer dos anos 80. Em alguns países, contudo, houve
crescimento das prestações sociais até meados da década.
30
A recomposição do gasto social buscou imprimir maior
seletividade na provisão de bem-estar, correspondendo, em boa
parte, à criação ou expansão de benefícios para clientelas-alvo
consideradas prioritárias. O desemprego, então tratado como
problema temporário, constituiu-se também em "alvo prioritário"
até o final da década de 70: as prestações aumentaram e o prazo
para recebimento do benefício foi ampliado. Na maioria dos
países, esta orientação mudou depois de 1979, à exceção da Suécia
que ainda na década de 80 aumentou o salário-desemprego.
Nos anos 80, um mecanismo mais rigoroso de seletividade, a
limitação do acesso aos benefícios, foi reforçado e atingiu
sobretudo o seguro-desemprego. O progressivo abandono do
conceito de universalização - acesso igual e generalizado - logo
se estenderia a outros "riscos": doença, encargos familiares,
aposentadorias.
29
Cortes efetivos se deram em algumas áreas que contavam com menor adesão da população e/ou
insuficiente organização para resistir às medidas privatizantes. Este foi o caso da Habitação
e, em certa medida, da Educação. Na Saúde, foi mais difícil mexer porque os médicos e
enfermeiras resistem organizadamente em defesa do National Health System (NHS) e a demanda da
população por ele é muito forte.
30
Na Suécia, o volume de prestações sociais cresceu 46% entre 1974 e 1984; no mesmo período,
também houve aumento da massa de prestações sociais na Espanha, na França e em Portugal.
76
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Outra face da crescente seletividade, reveladora igualmente
do redirecionamento financeiro do welfare state nos países
industrializados, consiste na expansão dos benefícios
assistenciais, obviamente associada à evolução da pobreza. Na
França, a partir de 1987, o agravamento dos problemas sociais
levou o governo a criar condições para a implantação de
experiências de renda mínima
31
.
O issue central das discussões em torno do welfare, todavia,
é a reforma do chamado "núcleo duro da seguridade" -
aposentadorias e pensões - cujo peso nas despesas públicas,
juntamente com a assistência médica e com o seguro-desemprego,
(que em geral faz parte do orçamento da seguridade) se mantém
muito alto. Conforme já referido, as tentativas reformadoras têm
buscado minimizar estes custos e/ou tornar os dispêndios mais
focalizados e condicionais.
Em vários países, desde o final da década de 70, os métodos
de cálculo dos benefícios vêm sendo revistos, as datas de
reajuste adiadas, aumentos fixados em níveis inferiores aos da
inflação, indexação automática suprimida e valores modulados em
função dos rendimentos. Também os requisitos que habilitam o
cidadão a se aposentar vêm sendo alterados. Os requisitos
fundamentais - idade mínima para recebimento dos proventos e
montante de contribuições pagas - constituem-se em objeto de
intensa polêmica e flagrante complexidade.
Nos países europeus, tem predominado a tendência a
privilegiar o desafogo do mercado de trabalho, diminuindo a idade
para aposentadorias, instituindo as pré-aposentadorias e
ampliando pensões por incapacidade. Já nos EUA, depois de 1980
foram limitadas as condições de acesso às pensões por invalidez,
31
A Revenu Minimum d'Ínsertion (RMI) foi institucionalizada pelo Decreto de 06/09/89, de acordo
com a Lei de 01/12/88. Trata-se de um complemento dos seguros sociais (que não os substitui),
para favorecer a inserção social ou profissional das famílias de baixa renda. Ver RMI - Le Pari
de L'Insertion, Rapport de la Comission présidé par Pierre Vanlorenbergher, Paris, 1992. A
França foi o último dos países do norte da Europa a adotar a Renda Mínima.
77
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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incitando-se os inválidos a trabalharem. Modificações mais
recentes nos sistemas europeus apontam também neste sentido
32
.
Além da majoração das contribuições
33
, alternativa mais usual
e que incide principalmente sobre os assalariados, outras medidas
vêm sendo adotadas para enfrentar os desequilíbrios: o
rebaixamento das cotizações patronais - na tentativa de que as
empresas criem novos empregos
34
-; a elevação do teto salarial
sujeito à contribuição; e a diversificação das fontes de receita,
através de taxas específicas e de alargamento da relação
contributiva - apelando aos não-segurados, criando contribuições
de solidariedade ou instituindo impostos especiais sobre os
rendimentos dos contribuintes.
35
A "desestatização relativa", normalmente associada à
privatização, significa a implantação de esquemas privados - ou
não-públicos - de bem-estar, em sua maioria estabelecidos no
âmbito das empresas e com caráter complementar às provisões
estatais.
Sem dúvida, a adoção de medidas contencionistas e
seletivizadoras na década de 80 contribuiu, tanto quanto os
incentivos governamentais diretos, para a expansão dos esquemas
privados. Contudo, o crescimento dos seguros privados não
compromete os sistemas públicos; continuam residuais, atendendo a
32
A reforma alemã de 1992, bem como a proposta em discussão na Itália, prevê estímulos ao
retardamento da aposentadoria.
33
O aumento das contribuições previdenciárias se deu de modo variado. Países atingidos pela crise
e que decidiram manter ou melhorar a proteção social - França e Suécia, por exemplo -
aumentaram muito (de 7 a 15 pontos, conforme a Tabela 5, em anexo) as contribuições. Na Suécia,
a progressão das prestações levou a um "esforço contributivo" que, diversamente dos países de
insurance, foi exigido dos contribuintes em geral e dos empregadores (a cota dos assalariados
foi até reduzida). Canadá, EUA, Japão, Alemanha, Inglaterra e Portugal aumentaram bastante as
contribuições (2 a 6 pontos). Na Inglaterra, as majorações foram fortes até 1981, quando a
redução da cota do empregador passou a predominar.
34
O rebaixamento das cotizações patronais tem sido usado na Bélgica como "arma contra o
desemprego". Mas, apenas certas cotas foram rebaixadas: diminuíram as contribuições dos
empregadores para o auxílio familiar e para o seguro-desemprego; aumentaram as de saúde e
aposentadorias. Na França, esta tática vem sendo utilizada, mesmo no governo socialista. Na
Inglaterra, a parte dos empregadores no financiamento da seguridade baixou de 31,2% em 1970
para 30,9% em 1980 e para 25,3% em 1984/85 (Reform of Social Security, Background Papers,
1985). A parcela dos assalariados, por sua vez, aumentou.
35
A Tabela 6 (em anexo) mostra alguns países com variações nas fontes de recursos da seguridade
no período 1960/85.
78
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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uma parcela pequena da população e, embora movimentando recursos
de larga escala, sujeitos a regulamentação bastante severa,
inclusive no que diz respeito à aplicação dos mesmos (Dumont,
1987).
A "privatização" do bem-estar nos países europeus resume-se
à implementação de maior concorrência na oferta de bens e
serviços coletivos - seja dentro da própria esfera pública, como
no caso de escolas e hospitais, seja entre os setores público e
privado, como ocorre na área previdenciária - e ao aprofundamento
das experiências de mix público/privado .
2.2. A Situaªo Brasileira
Enquanto em países industrializados os regimes de seguridade
públicos, integrativos e privados, coexistem e têm se movido no
sentido da complementaridade, no Brasil aparecem geralmente como
alternativas excludentes
36
. O próprio discurso empresarial muitas
vezes enfatiza esta concepção, considerando esgotado o modelo de
previdência social baseado no regime de repartição, em que os
trabalhadores ativos sustentam os inativos, sugerindo o regime de
capitalização utilizado nas aposentadorias privadas.
37
Uma pesquisa sobre planos de benefícios previdenciários,
recentemente divulgada
38
, revela que entre as 309 empresas
estudadas, 130 adotavam algum plano formal de aposentadorias e
das 176 que ainda não tinham programas de bem-estar, 96 já
haviam promovido estudos para sua implantação. Nesta área, dois
segmentos atuam: a previdência fechada e a previdência aberta.
36
O tratamento da questão é dificultado pela ausência de estudos. Algumas pesquisas realizadas
por empresas de consultoria, sobretudo a Towers & Perrin, e dados das entidades de seguridade
são as informações disponíveis para avaliar a proteção social privada no Brasil.
37
Ver Gazeta Mercantil, 1/2/93. O presidente da Itauprev (empresa de previdência do Grupo Itaú),
Luis de Campos Salles, afirma que a rejeição ao público não é tão consensual e que é ilusão
crer que, com a privatização da Previdência, o mercado poderia absorver o setor. "Para as
camadas mais humildes a viabilidade do plano exigiria investimentos muito grandes e (...) além
disso, é impossível fazer um plano pelos preços que o Estado cobra".
38
Realizada pela Consultora Towers & Perrin e citada pela Gazeta Mercantil, 1/2/93.
79
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Na previdência aberta participam as pessoas físicas (ou
pessoas jurídicas que compram planos para seus funcionários), que
podem escolher planos individuais ou coletivos. Existem hoje, no
Brasil, cerca de 100 empresas de previdência privada aberta, das
quais a metade é constituída por seguradoras e o restante são
entidades com ou sem fins lucrativos, que somam em seus quadros
aproximadamente 3 milhões de associados ou 12 milhões de
beneficiários.
A previdência fechada congrega apenas pessoas jurídicas -
empresas
39
. Atualmente operam no mercado 266 fundações aprovadas
de previdência privada fechada, que somam um patrimônio de US$ 23
bilhões e representam mais de 1.000 empresas no país
40
. Algumas
fundações administram seus próprios recursos, enquanto outras os
entregam a bancos
41
. O maior fundo de pensão do país é o dos
funcionários do Banco do Brasil - o Previ - que acumula
patrimônio próximo a US$ 5 bilhões
42
.
A "indústria de previdência privada" expandiu-se muito nas
últimas duas décadas e "tende a crescer nos próximos anos
independentemente até mesmo de reformas na previdência social"
43
39
No Congresso Nacional tramitam projetos de Lei que autorizam os sindicatos a criar Fundos de
Pensão para seus associados. Atualmente, isso só é possível quando há vínculo empregatício
entre o patrocinador e os cotistas do Fundo.
40
Segundo projeções do presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência
Privada (ABRAPP), até o final da década de 90 o sistema deverá se ampliar e "chegar, com
folgas, a um patrimônio líquido da ordem de US$ 100 bilhões, com mais mil entidades
patrocinadas por 6 mil empresas, além das atuais 1,1 mil patrocinadoras" (Gazeta Mercantil,
1/2/93). Este montante, nada desprezível, poderia vir a se constituir em funding para resolver
problemas de longo prazo ou mesmo para financiar projetos estruturantes.
41
"Há dois produtos atualmente nas prateleiras dos bancos para atender a esse segmento. O fundo
próprio, quando uma grande empresa entrega ao banco o Fundo de seus funcionários, entrando com
parte dos recursos - é a patrocinadora - e os cotistas contribuindo com uma parcela cujo
tamanho é medido pelo perfil de cada Fundo. Existem os Fundos Múltiplos, para as pequenas e
médias empresas que não podem criar Fundos próprios; o patrocínio é gerido de forma
consolidada, o que garante uma grande economia de escala e a preservação das características
individuais de cada Fundo" (Gazeta Mercantil, 1/2/93).
42
Entre os maiores Fundos de Pensão estão, além da Previ, a Funcef (Caixa Econômica Federal), a
Petrus (Petrobrás) e algumas empresas privadas.
43
A previsão é de um diretor do Citybank que administra Fundos de Pensão. O presidente da ABRAPP,
porém, considera que o governo pode e deve tomar medidas incentivadoras do crescimento da
Previdência privada: desregulamentação das aplicações compulsórias - regra que já vale para as
entidades abertas -; suspensão da cobrança de impostos sobre juros, dividendos e ganhos de
capital dos Fundos de Pensão; incentivos fiscais para que as empresas aportem mais recursos nos
Fundos e/ou criem novos Fundos; e deduções do Imposto de Renda para os trabalhadores que
contribuem para Fundos de pensão (Gazeta Mercantil, 1/2/93).
80
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Igualmente, na área da saúde, o mercado diversificou-se,
aprofundando a tendência à "americanização" do sistema de
proteção social no Brasil
44
. Pode-se dizer que o setor privado
abarca hoje cerca de 35 milhões de pessoas (aproximadamente a
quarta parte da população brasileira), respondendo por um
faturamento de quase US$ 5 bilhões.
Evidentemente, os interessados no processo de expansão do
mercado de seguridade privada não são apenas os dirigentes da
"indústria de previdência" ou as empresas de medicina de grupo.
Os trabalhadores e empregados estão reivindicando e, com isto,
programas de bem-estar social vêm sendo regularmente negociados
com os empregadores
45
. Realizadas à margem da CLT, as negociações
trabalhistas passaram a incluir reivindicações que não
freqüentavam as pautas anteriores, entre as quais sobressaem
aquelas voltadas para o bem-estar
46
, envolvendo inclusive a
obtenção de maiores ganhos através de salários indiretos.
Demandas por bem-estar nas empresas constaram, de modo
crescente, das pautas de movimentos grevistas entre 1978 e 1987.
Em pesquisa recente (Mota, 1992), evidencia-se a emergência de
uma posição menos paternalista dos empresários na concessão de
benefícios sociais na empresa, associada a uma postura de maior
44
Esta tendência, pela qual o Serviço Público fica para os pobres e quem tem renda compra
serviços no mercado, está explorada em Vianna (1989 e 1992) e Medici (1990 e 1991).
45
"Estamos apostando que, mais do que nunca, as empresas vão estar criando os Fundos (de
previdência), porque já passa a ser uma exigência dos funcionários", afirma o diretor de
underwriting do Citybank, na citada reportagem da Gazeta Mercantil. Cabe notar que, entre 1980
e 1989, dos sistemas privados existentes no Brasil, o que menos cresceu foi a Medicina de grupo
(15%), exatamente a modalidade que oferece planos individuais para os assalariados e
profissionais de rendas médias (Golden Cross, Amil, etc.). As cooperativas médicas tiveram 46%
de aumento no número de inscritos, os programas auto-geridos por empresas 56%, os seguros-saúde
27% e os planos de administração 33% (Vianna, 1992).
46
"No início dos anos 70, a pauta de demandas dos sindicatos estudados resumia-se a
reivindicações salariais e de pagamento de adicionais e taxas, e a dois temas relacionados ao
aumento do poder sindical: o desconto da contribuição assistencial e o reconhecimento do
delegado sindical, demandado pelos metalúrgicos de São Bernardo e de São Paulo (...) Em 1980,
demandas e cláusulas negociadas incluíam políticas de bem-estar nas empresas, condições de
trabalho, situação funcional e aumento do poder sindical (...) Demandas como adicionais de
turno, de hora-extra, de tempo de serviço, de triênio, de insalubridade constituíram 23,8% e
20% dos ítens apresentados em 1980 e 1981 pelos metalúrgicos santistas, cujas pautas incluíram
ainda diversas questões referentes à política social de empresa: subsídios à habitação,
refeição, transporte, educação, complementação de benefícios previdenciários e creches".
81
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
aceitação dos mesmos pelos trabalhadores; configura-se uma
prática de negociação na qual os programas de bem-estar na
empresa passam a constituir novas demandas e, uma vez acordados,
se transformam em novos direitos contratuais.
Este é um assunto para o qual a posição do movimento
sindical guarda certa ambigüidade, motivada por fatores objetivos
e conjunturais tais como: a crise econômica do país, com seus
impactos sobre o emprego e os salários; a emergência de inovações
no campo da "democracia industrial" que, no Brasil, tem como uma
de suas características o reconhecimento tardio dos sindicatos
como interlocutores da negociação direta através dos contratos
coletivos de trabalho; a própria performance das políticas
sociais brasileiras - a falência e o sucateamento do aparelho
produtor de serviços públicos - que favorece o crescimento de
demandas sociais na empresa; a crescente organização nos locais
de trabalho e a presença dos sindicatos na empresa, identificando
mais rigorosamente as necessidades cotidianas dos trabalhadores;
e, finalmente, a inexistência de uma discussão consistente, no
interior do movimento sindical, sobre a questão das políticas
sociais.
Verifica-se, de fato, que as políticas sociais no Brasil
começam a se tornar mais abrangentes no pós-64, sob o
autoritarismo, com a criação do Instituto Nacional de Previdência
Social (INPS), resultante da unificação dos antigos Institutos de
Aposentadorias e Pensões (IAPs), da expansão da clientela
47
, das
reformas nas áreas de Saúde e de Educação, da criação do
PIS/PASEP e do FGTS. Entretanto, este movimento não resultou na
construção de um Welfare State. Ao mesmo tempo em que os
serviços considerados rentáveis - Educação, Saúde e Habitação -
se abriam à participação do setor privado, estimulou-se, nestas
áreas, uma tática restritiva da atuação do setor público,
centrada na diminuição do investimento realizado e na negligência
em relação à qualidade dos serviços prestados, o que provocou a
47
Foram incluídas na Previdência categorias até então ignoradas, como profissionais liberais,
domésticas, trabalhadores autônomos e rurais.
82
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
deterioração progressiva dos sistemas públicos responsáveis por
tais serviços.
48
Assim, a expansão da seguridade produziu também, em algumas
áreas da política social, diferenciações na qualidade do
atendimento e nas condições de acesso aos serviços, de acordo com
a inserção dos trabalhadores no mercado de trabalho. Esta
privatização da seguridade fortaleceu ainda a expansão dos
mecanismos de bem-estar próprios das empresas, fortemente
apoiados também em incentivos concretos, tais como a renúncia às
contribuições sociais, as isenções fiscais e a liberalidade para
a inserção, na contabilidade empresarial, dos custos dos
programas assistenciais. Os principais programas desenvolvidos
nas empresas brasileiras à base de incentivos são (Mota, 1989):
a) Programa de Alimentação do Trabalhador - Implementado em
março de 1977, instituído pelas Leis 6.321 e 6.452 de 28/06/78 e
pelo Decreto 78.676 de 08/11/76, tem como objetivo o fornecimento
de alimentação ao trabalhador, através de cozinha própria, da
contratação de serviços de terceiros ou, ainda, de fornecimento
de vales-refeição. As despesas efetuadas com o programa deverão
ser computadas na determinação do lucro real e ainda deduzidas em
até 5 ou 10% do Imposto de Renda devido. Para o trabalhador, os
custos do programa não podem ultrapassar 20% do valor do seu
salário.
b) Vale-Transporte - Instituído pela Lei 418 de 16/12/85, o
programa visa reduzir as despesas do trabalhador no percurso
residência-trabalho-residência. As despesas efetuadas com o
programa podem ser abatidas em até 10% do Imposto de Renda
devido, além de serem consideradas despesas operacionais. Para o
trabalhador, os gastos não podem ultrapassar a 6% do seu salário.
48
A Constituição de 1988 reformulou o conceito de proteção social, mas não reverteu este
processo. Como exemplo, o seguro-desemprego que, embora concebido como integrante da Seguridade
Social, foi regulamentado fora dela. Instituído em 1986, pelo Plano Cruzado, prevê assistência
financeira para os trabalhadores despedidos sem justa causa, que tenham trabalhado durante um
período mínimo de 6 meses imediatamente anteriores à dispensa. É garantido pelo período máximo
de 4 meses de forma continuada ou alternada a cada período aquisitivo de 16 meses. É financiado
através do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), cuja receita maior vem dos programas
PIS/PASEP.
83
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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c) Previdência Privada - Consiste na formação de uma
entidade de previdência privada, com custos cobertos por
contribuições da empresa (mínimo de 30%) e dos empregados, para
complementação dos benefícios concedidos pela Previdência
oficial, tais como aposentadoria, invalidez, auxílio-doença,
auxílio-funeral, auxílio-natalidade, pensões e pecúlios. Os
gastos com as contribuições poderão ser considerados despesas
operacionais.
A multiplicação de programas de bem-estar nas empresas -
sobretudo os planos de saúde e fundos de pensões - é uma
tendência que se propaga internacionalmente. No Brasil, a demanda
por tais programas por parte dos trabalhadores não foge à regra.
Cabe notar que, nos países industrializados, este movimento
forçou o surgimento de legislação específica a respeito e que, em
alguns casos, é bastante rígida
49
, fato que aqui ainda não
ocorreu.
Os programas de bem-estar nas empresas funcionam, na medida
em que efetivamente são um estímulo a um maior envolvimento do
trabalhador
50
. Os empresários não se queixam deste tipo de gastos,
mas têm posição bem diversa quando se trata das contribuições
sociais obrigatórias
51
.
Ineficiência e má qualidade do sistema público, aliadas à
percepção de que a proteção social oferecida pelo Estado onera os
gastos com a mão-de-obra, parecem justificar uma postura
bastante radical pró-reforma da seguridade social, expressa
concretamente através das propostas apresentadas por algumas
entidades empresariais à Comissão Parlamentar para estudos sobre
49
Inclusive, vale repetir, quanto à participação dos trabalhadores na gestão dos programas, o
que, no caso dos fundos de pensão, significa a possibilidade dos mesmos exercerem alguma
influência sobre a aplicação de recursos, cujo montante chega a ser altíssimo.
50
Algumas evidências levantadas pela equipe do Instituto Herbert Levy, para elaboração do projeto
Qualidade de Vida para as Micro e Pequenas Empresas, reforçam o ponto.
51
A respeito, ver "Bases da Arrancada da Produção: Uma Proposta de Transição" - CNI e Federações
de Indústrias, set.1991.
84
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
a Previdência.
52
As proposições contidas em todos os documentos,
divulgados como anexos do Relatório Brito, sugerem, quase que
unanimemente, a adoção do modelo chileno de seguridade; em termos
mais objetivos, propõem a extinção do sistema público
53
.
Todavia, os problemas que já começam a se revelar no modelo
chileno, mesmo atendendo a apenas 11 milhões de habitantes e
lidando com menores desigualdades
54
, indicam a necessidade de
maior cautela quanto à sua implementação num país das dimensões
do Brasil, principalmente no que diz respeito às marcantes
desigualdades sociais.
Em primeiro lugar, a estreiteza do mercado formal de
trabalho faz com que sistemas total ou parcialmente privados de
proteção social atinjam uma minoria da população, agravando as
segmentações já existentes, isolando os setores modernos do resto
da sociedade e impedindo que as benesses da modernidade,
restritas a um pequeno núcleo da economia, exerçam influência
sobre o todo. Pesquisa realizada pelo SEBRAE constatou que
entre as micro, pequenas e médias empresas - que empregam cerca
de 80% dos que trabalham na indústria, comércio e serviços - "86%
52
Das 12 propostas recebidas pelo relator da Comissão, duas são de federações empresariais (RS),
uma é da Associação Brasileira de Previdência Privada (ABRAPP) e uma vem do Instituto
Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC). Além disso, a Comissão teve acesso a estudos como o
do Instituto Liberal, vinculado ao empresariado, o de Mendonça Barros e Associados (Castro &
Brito, 1992) e o do Prof. Mario H. Simonsen (Velloso, 1992).
53
O modelo chileno, instituído em 1981, baseia-se nas Administradoras de Fondos de Pensiones
(AFP), constituídas como sociedades anônimas. As contribuições do empregador foram eliminadas e
o regime tem como base o princípio da concorrência entre as AFP, eficiência (as AFP de
melhores condições conseguem maior número de afiliados), estabilidade e segurança. Os filiados
do antigo sistema puderam optar por nele permanecerem. A ação do Estado fica restrita a:
estabelecer a obrigatoriedade de filiação a algum sistema de pensão; definir o arcabouço
normativo para a atuação privada e fiscalizar a operação do sistema (as AFP são reguladas e
fiscalizadas pela SAFP e cobertas por garantias estatais); assegurar pensão mínima aos
trabalhadores que não possam se autofinanciar; e assegurar a pensão dos filiados que optaram
pela renda vitalícia em caso de falência da companhia de seguros. Os aportes ao fundo de
pensões são obrigatórios para todo trabalhador formal, que deve contribuir mensalmente com 10%
do seu salário. Adicionalmente, os trabalhadores pagam entre 2,5% e 3,7% de seus salários para
o seguro-invalidez e para os montepios concedidos aos dependentes.
56
Em geral, as críticas são quanto à baixa cobertura - cerca de 50% - que vem caindo, não
incorporando os trabalhadores informais que são cerca de 35% da população economicamente ativa
(PEA). Existem ainda fortes evidências de que o sistema não estará em condições de pagar
pensões superiores às do antigo regime. Além disso, as pensões e aposentadorias são
extremamente diversificadas, acentuando segmentações outrora menos marcantes. Ver Marcel &
Arenas (1991), Iglesias (1992) e outros.
85
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
não oferecem planos de saúde ou seguro de vida, 68% não possuem
local de reunião para os empregados, 66% não realizam festas
coletivas de congraçamento, 62% não têm sistema de prêmios, 49%
não oferecem vale-refeição, 30% não oferecem vale-transporte"
(IHL, 1993).
A solução "condominial", portanto, está confinada às grandes
empresas, que não só procuram se resguardar da precariedade
social e contornar a insuficiência estatal, como se apartam,
substantivamente, da "mediocridade" econômica reinante, abrindo
um fosso entre "os de dentro" e "os de fora" do universo moderno,
fosso que vem se ampliando por conta de uma terceirização
"espúria", como antes mencionado. Por seu turno, o modelo
chileno, no Brasil, radicalizaria esta dicotomia, exigindo a
atuação de um Estado assistencial gigantesco, cujo financiamento
implicaria sérias dificuldades: de onde tirar recursos para
proteger quase 50 milhões de pessoas num país em que apenas 5
milhões pagam imposto de renda? Que mudanças na estrutura
tributária seriam necessárias para dar conta do contingente de
excluídos do mercado e, por conseqüência, de uma seguridade
privada?
Mas, existe ainda uma outra dimensão da mesma questão, que
anula a assepsia desejada para o "primeiro-mundo" local. A
pobreza, as carências e a desproteção em que vive a terça parte
dos brasileiros constituem, de forma inequívoca, a vala comum da
qual se recruta a maioria dos trabalhadores. Desta forma, a mão-
de-obra mais qualificada - a que preenche os postos ocupacionais
nos nichos competitivos do mercado e é melhor remunerada - faz
parte de um contexto cujas fronteiras que a separa da mão-de-obra
não-qualificada - que está imersa na diversidade dos setores
desestruturados e informais - é bastante tênue. Na vida
cotidiana, tanto o trabalhador da grande e moderna empresa quanto
aqueles que estão condenados ao subemprego enfrentam as mesmas
dificuldades de moradia, de transporte, de atendimento médico,
etc. No âmbito familiar continuam presentes e agudos, para os
dois segmentos, os problemas e incertezas relativos à garantia de
86
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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renda em situações de incapacidade para o trabalho e para a
cobertura dos cuidados requeridos pelos menores e pelos idosos.
Isto obriga a que a necessidade de um Estado de Bem-Estar
que proteja realmente a cidadania se mantenha na agenda, como
item relevante, a despeito dos ataques que a ele são dirigidos
55
.
No Brasil, sem negar a importância dos esquemas privados de
obtenção de benefícios, não há como fugir de soluções híbridas
que dêem conta do imenso desafio que reside no enfrentamento da
miséria e na superação do atraso, sem que isso redunde em omissão
quanto ao ingresso do país na contemporaneidade tecnológica e
produtiva. Convivência e compatibilidade entre público e privado,
com eficácia de um e sentido integrativo de outro, com regras
claras e democraticamente estabelecidas acerca dos respectivos
espaços e das relações entre ambos, parecem compor uma
estratégia mais adequada à sociedade brasileira do que as
soluções desenhadas pelo privatismo excludente da moda.
56
55
Aliás, bem ou mal, este sistema tem protegido. Pesquisas demonstram que a população mais pobre
faz uso intenso dos serviços sociais e que certamente estaria em piores condições caso eles
não existissem. Ver Faria (1991).
56
Ao contrário do que se divulga, a previdência privada encontra-se em situação tão ou mais
confusa que a da Previdência Social. Ver, a respeito, Gazeta Mercantil, 1/2/93 e 30/3/93.
87
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
3. EDUCA˙ˆO E QUALIFICA˙ˆO
3.1. TendŒncias Internacionais
A qualificação da mão-de-obra envolve, internacionalmente,
três situações distintas. Primeiro, a dos países que já possuíam
bons sistemas de educação básica, como por exemplo a Alemanha e o
Japão, onde importa registrar as formas eficazes de articulação
entre o Sistema Educacional e o Sistema Produtivo. Segundo, os
EUA, que enfrentam problemas muito semelhantes aos nossos na área
da educação básica. Finalmente, os "tigres asiáticos", que foram
capazes de reverter, num prazo relativamente curto, um quadro
educacional mais dramático do que o nosso atual.
"O que chama a atenção, no caso japonês, é a estreita
correspondência da estrutura educacional à estrutura ocupacional
e, principalmente, a importância atribuída ao desempenho escolar
nos processos de recrutamento e seleção. (...) As empresas
valorizam e respeitam os critérios de avaliação escolar em suas
contratações, o que, por sua vez, leva as escolas a se
preocuparem permanentemente com seu desempenho. Isto resulta,
inclusive, na grande valorização do Magistério, que percebe
salários bastante diferenciados" (IEDI, 1992).
O caso alemão merece particular atenção, pois o sistema
educacional se articula de uma outra forma com o sistema
produtivo. Tradicionalmente, existe uma estreita cooperação entre
a escola e a empresa, com papéis claramente definidos: às escolas
cabe a transmissão dos conteúdos de educação geral; às empresas,
a responsabilidade pela aplicação dos conhecimentos técnico-
científicos relacionados à habilitação específica.
Este modelo resulta na total responsabilidade das empresas,
no que se refere aos encargos técnicos e financeiros da
qualificação profissional, ainda que estes transcendam as suas
necessidades imediatas. A perspectiva é de uma qualificação geral
da mão-de-obra e os gastos envolvidos são assumidos como
88
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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investimento, que trarão retornos a longo prazo para o setor
produtivo como um todo. Nesse processo, "as Federações das
indústrias, na Alemanha, freqüentemente assumem o papel de
'agentes do interesse pœblico' em relação às empresas que se
opõem ao custo do treinamento" (Mahnkopf, 1993). No caso das
pequenas e médias empresas, a tendência é de criação de núcleos
de qualificação profissional, mantidos conjuntamente por empresas
do setor, sindicatos de trabalhadores e governo e distribuídos
pelas várias regiões do país.
Para garantir a base de educação geral necessária aos novos
perfis ocupacionais, as escolas que equivalem ao nosso 2
º
Grau
adotam grades curriculares compostas de disciplinas de conteúdo
geral, como a língua alemã, línguas estrangeiras, História Geral,
Filosofia, Geografia, Política, Matemática, Sociologia, Artes,
Química, Física, Música, Latim e Biologia. A este conjunto pode
ser incorporado o estágio profissional, com o aprofundamento dos
conhecimentos diretamente relacionados a uma habilitação
específica, e a disciplina "Informática", que é opcional (IEDI,
1992).
A experiência alemã também envolve o atendimento aos jovens
- na faixa de 15 anos de idade - que abandonam os estudos antes
de completarem o ensino básico. Para eles, oferece-se a
aprendizagem de ofcios , em cursos com duraªo de trŒs anos ,
mantidos por programas de cooperação entre governo e sindicatos
de empresas (Fisher, 1992).
Apoiados numa tradição que remonta à Idade Média, a
transmissão dos "segredos" de um ofício de geração a geração,
estes cursos abrangem desde a formação de eletricistas e
mecânicos de automóveis, até ofícios mais tradicionais, como
confeiteiros e sail-makers
57
, oferecendo remuneração (US$ 400 a
US$ 600 mensais) durante o aprendizado e, mais importante, a
garantia de emprego.
57
Veleiro, aquele que faz velas para barcos.
89
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Ainda na experiência alemã, cabe falar na atuação sindical.
Os sindicatos de trabalhadores já possuem larga tradição de
negociação numa perspectiva que tem se caracterizado mais pela
cooperação do que pelo antagonismo em relação aos empregadores.
"Com isto, a política sindical tem como base o 'apoio
negociado' aos esforços de modernização das empresas do país." E,
"diante da alternativa de participar de um ajustamento dominado
pela visão de curto prazo, na forma de um menor crescimento dos
salários em relação à produtividade ou da redução do número de
trabalhadores, os sindicatos alemães fazem a opªo estratØgica
pelo caminho da qualificaªo : flexibilidade funcional antes que
flexibilidade dos salários e do emprego" (Mahnkopf, 1993).
Exemplos marcantes desse tipo de postura são as negociações
nas indústrias química e mecânica (1988 e 1989), onde, por
acordo, "as empresas obrigam-se a planejar, em intervalos
regulares, os futuros requerimentos de qualificação que devem
acompanhar as mudanças tecnológicas (...) consultando os
conselhos de trabalhadores pelo menos uma vez por ano. Os
próprios conselhos podem oferecer planos de treinamento
alternativos, para serem negociados com as empresas" (Mahnkopf,
1993).
Com isso, os sindicatos pretendem reorientar a discussão
sobre emprego e salário, dando ênfase à capacidade dos
trabalhadores em responderem s novas exigŒncias, atravØs de
oportunidades de requalificaªo (Mahnkopf, 1993).
Os esforços dos norte-americanos para superar suas notórias
deficiências no ensino básico, consideradas hoje uma verdadeira
ameaça à sua liderança econômica, concentram-se nos seguintes
aspectos:
- "revalorização do sistema público de educação geral e não
mais do ensino vocacional;
- envolvimento das empresas com a melhoria do desempenho
pedagógico nas redes públicas do ensino básico, particularmente
90
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
aquelas que atendem aos segmentos mais problemáticos da
população;
- apoio das empresas aos programas inovadores que visem
atingir prioritariamente aos que tendem ao fracasso escolar;
- a repetência é condenada por sua ineficácia e por seus
efeitos negativos sobre a auto-estima, e é vista como principal
causa da evasão escolar;
- embora se ofereça ensino supletivo aos mais velhos, o
objetivo maior é o de dotar a população mais jovem, alvo dos
programas especiais, de condições para se reintegrar ao fluxo
regular do sistema educacional." (IEDI, 1992).
Reconhece-se que a raiz dos problemas de desempenho do
operariado norte-americano está na pouca escolaridade de um
grande grupo e na má qualidade da educação básica, principalmente
nas escolas que atendem às populações mais carentes.
Para estes grupos, estão propostas estratégias supletivas de
ensino que buscam levar o jovem de volta ao sistema regular de
ensino, para que complete sua escolaridade no tempo adequado e
para maior integração social. As propostas norte-americanas não
enfatizam mais as saídas do tipo "ensino-vocacional", como nos
anos 60. Ao contrário, elas vão na direção da valorização do
ensino regular e da recuperação dos sistemas de ensino.
"O verdadeiro desafio com que se defronta a sociedade
americana não é reverter o declínio; é sim enfrentar as
implicações sociais da nova economia (...) O sistema de ensino,
adequado  produªo em massa, precisa ser reformulado para
adequar-se  competiªo global e s novas tecnologias (...) A
melhor forma de atacar o problema da crescente desigualdade
social e simultaneamente contribuir para a melhoria da
competitividade (...) seria reformar o sistema educacional dos
Estados Unidos, de forma a dar aos cidadªos as habilitaıes
exigidas pela nova economia" (Prowse, 1992).
O caso dos países asiáticos é particularmente importante
para a situação brasileira, pois mostra que, sem apelar para
91
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
soluções de curto prazo, ou para medidas paliativas, como
campanhas de alfabetização ou cursos intensivos
profissionalizantes, lograram, num espaço de 10 a 20 anos,
praticamente universalizar um ensino básico de qualidade. O
exemplo mais significativo é o da Coréia que, até o início dos
anos 70, tinha um desempenho educacional pior do que o nosso
atual. Em 15 anos de investimento no sistema público, inclusive
na formação dos professores, o analfabetismo adulto foi reduzido
a taxas insignificantes, foi universalizado o ensino fundamental
e, no nível médio, o sistema atende hoje a cerca de 90% da
população de 15 a 19 anos.
3.2. A Situaªo Brasileira
Até o final dos anos 70, os problemas de qualificação não
configuravam um fator restritivo à expansão do parque industrial
brasileiro. Hoje, as pesquisas apontam a questão da qualificação
da mão-de-obra como um dos maiores obstáculos na busca da
competitividade.
As evidências neste sentido estão, por exemplo, na pesquisa
realizada em 1992, pela Confederação Nacional da Indústria (CNI),
na qual o item "nível educacional dos empregados" foi indicado
como o segundo mais importante dentre os fatores que dificultam a
elevação da qualidade e da produtividade (CNI, 1992b). Pesquisa
da CEPAL junto às empresas brasileiras de capital estrangeiro tem
resultados semelhantes: a "qualidade dos trabalhadores não-
qualificados" surge como um dos aspectos mais negativos em
relação ao padrão das empresas líderes no comércio mundial. 95,9%
das empresas consultadas prevêm que, na década de 90, o item
"Recursos Humanos" deverá ser objeto de investimentos muito mais
altos do que aqueles realizados nos anos 80 (CEPAL, 1992). Sobre
as fontes de competitividade no futuro, pesquisa do IEI/UFRJ
verificou a unanimidade, entre as empresas pesquisadas, na
indicação de "Recursos Humanos Qualificados", dentre os fatores
considerados "muito importantes" (Miles et alii, 1991).
92
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
De fato, o perfil de escolaridade da população brasileira
está muito aquém do que se aponta como necessário ao sucesso da
reestruturação produtiva. Mesmo comparado a países sabidamente
menos desenvolvidos, o desempenho educacional brasileiro mostra-
se bastante precário, não chegando a se igualar ao da Bolívia e
do Paraguai e sendo superior apenas ao do Suriname.
Ainda que deixemos de lado a população de 7 a 14 anos que
não está na escola - contingente estimado em torno de 4 milhões
de crianças, hoje - das quase 26 milhões que freqüentam a escola
de 1
º
Grau, cerca de 15 milhões estão fadadas ao fracasso, e pelo
menos 10 milhões delas sequer concluirão a quarta série - o
antigo curso primário.
Este quadro negativo tem alguns agravantes: a falta de
manutenção levou a rede física a um tal nível de deterioração que
pelo menos a metade dela (cerca de 90.000 escolas) funciona em
condições precárias, necessitando urgentemente de recuperação. No
que se refere aos recursos pedagógicos, não conseguimos sequer
universalizar o quadro-negro, o mais elementar deles.
Ao lado da precariedade das condições de trabalho, a
deterioração dos cursos de formação de professores encaminhou
para o sistema educacional, principalmente para o ensino
elementar, professores que simplesmente não dispõem da
competência técnico-pedagógica necessária para pelo menos
alfabetizar os milhões de crianças que entram no sistema. A baixa
remuneração, além de desestimular os que já estavam em exercício,
afastou da carreira do magistério os melhores alunos dos ensinos
médio e superior.
Este quadro crítico leva à conclusão de que, para enfrentar
as questões educacionais mais importantes, seria necessário um
enorme volume de recursos, maior do que o que atualmente se aloca
à educação básica. Entretanto, se o gasto atual, que não é pouco,
é desperdiçado pelo elevado fracasso escolar, estamos mantendo um
"barato que sai caro" e que, agora, além das já conhecidas
93
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
repercussões sociais, tem um impacto negativo significativo na
reestruturação produtiva.
Reconhece-se hoje que a grande lacuna, no caso do
trabalhador brasileiro, é de basic-skills, isto é, de
competências básicas que decorrem da posse de uma boa educação
geral. Assim, os problemas da qualificação profissional estão
agora contidos numa problemática bem mais ampla e complexa, que é
a crise do sistema educacional brasileiro.
Se a meta é uma maior produtividade sistêmica, o que se deve
buscar, no que se refere à Educação, é a elevação do nível de
escolaridade da população como um todo. Diferentemente das
soluções típicas da produção em massa de produtos padronizados,
os problemas de qualificação do trabalhador direto não se
resolvem mais por tentativas isoladas ou setoriais e nem pelo
atendimento apenas parcial da população em idade escolar.
A crise educacional brasileira afeta a economia como um
todo, e desta perspectiva deve ser enfrentada. Ainda que as
sabidas heterogeneidades do país e do próprio setor produtivo
venham a permanecer, elas não podem servir de argumento a favor
da continuidade do caráter desigual e seletivo que marcou até
aqui o sistema educacional brasileiro.
3.2.1. A educaªo geral
O perfil de escolaridade da população brasileira ainda hoje
deixa muito a desejar: a grande maioria possui conhecimentos que
equivalem no máximo às quatro primeiras séries do 1
º
Grau, além
da existência de cerca de 15 milhões de analfabetos adultos. Até
o final da década passada, 38% dos trabalhadores brasileiros
possuíam no máximo o antigo curso primário completo (4
ª
Série do
1
º
Grau) e apenas 15,4% tinham concluído o 2
º
Grau. Em 1986, na
indústria de transformação, somente 7,4% tinham o 2
º
Grau
94
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
completo e 50% possuíam no máximo a escolaridade equivalente ao
antigo curso primário.
58
Embora a expansão da rede física tenha ampliado as
oportunidades de acesso à Educação - da pré-escola à
universidade, o sistema educacional atende hoje a cerca de 36
milhões de crianças e jovens -, os indicadores apontam um
fraquíssimo desempenho, mesmo quando comparado ao dos demais
países da América Latina
59
, e são a prova de que o alto grau de
seletividade continua sendo a marca do sistema educacional
brasileiro.
Essa seletividade evidencia-se, no ensino de 1
º
Grau, pelos
baixos índices de conclusão - apenas 43% dos que o iniciam
conseguem concluir a 8
ª
série, sendo que somente 3% o faz em 8
anos. Os demais 40% levam em média 12 anos para percorrer as
oito séries e, destes, 20% só as concluem via ensino supletivo.
Constata-se a permanência de altas taxas de evasão e repetência,
a despeito da adoção, em alguns Estados e Municípios, de medidas
tais como a aprovação automática nas quatro primeiras séries do
1
º
Grau, o "bloco único" ou a exclusão da avaliação na passagem
do primeiro para o segundo ano e que, na verdade, estariam apenas
escamoteando a questão da baixa qualidade do ensino e "adiando" a
evasão e a repetência para as séries seguintes (Namo de Mello &
Neubauer Silva, 1992).
No ensino médio, embora o fluxo dos alunos seja melhor, o
total de matrículas corresponde a apenas 30% dos jovens de 15 a
19 anos, como conseqüência do fraco desempenho do 1
º
grau. Com
isto, embora a metade dos concluintes do ensino médio tenha
acesso ao ensino superior, o percentual dos jovens brasileiros
que chegam à Universidade ainda é bastante baixo. Entre 1984 e
1987, na Coréia, Taiwan e Japão as matrículas no ensino superior
representaram, respectivamente, 3,6%, 2% e 2% da população total
(Carvalho, 1992), enquanto no Brasil, ainda hoje, está em torno
58
Dados da RAIS/86, extraídos de Carvalho (1992).
59
Ao final dos anos 80, o desempenho do sistema educacional brasileiro, em comparação com os
demais países da América Latina, só era superior ao do Suriname.
95
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
de 1%, o mesmo percentual apontado nas estatísticas educacionais
dos anos 60. Vê-se, assim, que o sistema educacional se expandiu
sem conseguir alterar substancialmente a "pirâmide" educacional.
Como o acesso ao ensino de 1º grau está praticamente
universalizado no meio urbano, a demanda quantitativa não tem as
dimensões de três décadas atrás e expressa uma outra ordem de
problemas, ligados às conseqüências do uso de critérios políticos
para a localização dos novos prédios escolares e,
particularmente, à baixa qualidade do ensino oferecido e ao
fracasso escolar que, gerando altos percentuais de repetência e
motivando a evasão, acaba por ocasionar um "congestionamento" no
fluxo escolar e a distorção da relação idade-série.
Os dados indicam que a maior parte da população escolar que
fracassa permanece, em média, 5 anos na escola; há, ainda, uma
parcela significativa que chega a permanecer por 8 anos - a exata
duração do ensino de 1
º
Grau. Entretanto, são anos em que se
repete sucessivamente as mesmas séries, de modo geral as duas
primeiras, sem que sequer se consiga completar a alfabetização.
Estes fatos demonstram tanto a crença que a população tem na
escola - a persistência das crianças e de suas famílias, a
despeito dos gastos que a escola implica e dos maus resultados
obtidos - quanto a má qualidade do trabalho pedagógico e a
incapacidade da escola em, durante cinco ou mesmo oito anos,
garantir a estas crianças pelo menos o mínimo que uma escola
elementar deve fazer: ensinar a ler e a escrever.
A Gestªo do Sistema Educacional
A Constituição Federal de 1988 estabelece a divisão de
recursos e responsabilidades relativas à Educação entre a União,
os Estados e os Municípios. Embora esta seja, em princípio, uma
idéia adequada às dimensões do país e às suas peculiaridades
regionais, apresenta alguns problemas.
96
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Em primeiro lugar, poucos dos mais de quatro mil municípios
brasileiros possuem efetivamente a capacidade de assumir a gestão
de suas redes de ensino. Entre outros fatores, faltam
experiência, pessoal qualificado e competência técnico-
administrativa.
Em segundo lugar, nessa etapa ainda inicial de
descentralização, não se definiu claramente o papel do Ministério
de Educação (MEC). As mesmas razões que justificam a
descentralização aconselham também a existência de uma instância
de onde emanem diretrizes gerais que atendam a diferentes
características e necessidades regionais mantendo, todavia, um
padrão nacional de Educação, a ser seguido por todos os sistemas
de ensino.
Estas responsabilidades seriam partilhadas com outras
instâncias - órgãos representativos de dirigentes educacionais
60
,
de pais de alunos e professores, de trabalhadores, de segmentos
organizados da sociedade civil, etc. - que atuariam como
interlocutores do MEC, levando a ele suas necessidades,
discutindo as diretrizes e prioridades nacionais e ainda seus
mecanismos e estratégias de implementação e controle.
Na questão da qualidade do trabalho pedagógico, cabe lembrar
que o magistério certamente está entre as categorias
profissionais que tiveram as maiores perdas nas duas últimas
décadas, em termos de status e de salários. Isto, por si só, já
explica em grande medida a queda da qualidade do ensino. Com
isto, o tratamento dado pela administração pública aos
professores aparece como um dos aspectos mais negativos da gestão
dos sistemas educacionais.
A melhor gestão do sistema educacional deve envolver não só
a preocupação com as formas de articulação entre as instâncias
administrativas, com a melhoria dos fluxos burocráticos e dos
60
Aqui, nos referimos a órgãos como o Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED), a
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), o Conselho de Reitores das
Universidades Brasileiras (CRUB), etc.
97
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
mecanismo de liberação e controle dos recursos - aspectos
bastante citados na crítica à ação estatal - mas, também com
medidas que visem a melhoria da qualidade do ensino, dando o
devido destaque para a situação do magistério, desde a sua
formação até a carreira docente, com melhor remuneração em geral
e formas de progressão funcional que premiem adequadamente a
competência técnica.
As reformas educacionais dos anos 60 e 70 tiveram graves
conseqüências negativas. O ensino de 1
º
Grau não se universalizou
e perdeu muito em qualidade. A preocupação com a terminalidade do
2
º
Grau também contribuiu fortemente para a deterioração desse
grau de ensino. Não se fez de fato a profissionalização e
destruiu-se a estrutura curricular que garantia até então uma boa
formação geral.
A expansão do ensino superior se deu de forma desordenada e
com sério comprometimento da qualidade. A massificação do 3
º
Grau
ocorreu, em sua maior parte, através da expansão do setor privado
que, inclusive, atendeu a boa parte da demanda reprimida. Tal
como ocorreu no ensino básico, a ênfase na profissionalização
também marcou a reforma do 3
º
Grau, apoiada no seu sentido mais
pobre, o da prioridade aos conteúdos específicos e à
especialização estreita, em detrimento de uma formação mais
ampla.
Nas universidades públicas, em que pese sua grande
heterogeneidade, o ensino ministrado é geralmente de qualidade
superior à média dos estabelecimentos privados, sejam eles
universidades ou escolas isoladas. A face profissionalizante
também prevaleceu nas instituições públicas, mas o fato de serem
elas responsáveis por cerca de 90% da pesquisa científica feita
no país pode ter contribuído para que a queda da qualidade do
ensino não fosse tão pronunciada.
Do conjunto de questões mais gerais afetas ao ensino
superior, pode-se destacar um ponto particularmente relevante
para o nosso tema: o pouco envolvimento do ensino superior com a
98
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
melhoria do ensino básico. Nas universidades, as Licenciaturas se
transformaram em cursos de "segunda linha", perdendo muito em
qualidade e prestígio. Sabe-se que isto se deve também à
degradação da carreira do magistério, que se reflete até mesmo na
queda da demanda por cursos de Licenciatura nas Universidades
públicas.
A Matemática, a Química, a Biologia e a Física, bases do
conhecimento e do avanço tecnológico, tornaram-se caudatárias da
área tecnológica, assumindo predominantemente um caráter
instrumental, semelhante ao do ensino de Ciências na metodologia
da Formação Profissional. Com a valorização do conhecimento
altamente especializado, em oposição a uma formação mais ampla,
mesmo nas grandes universidades públicas existem hoje poucos
docentes com uma "formação generalista", fundamental ao
aprofundamento, nos cursos de graduação, dos conteúdos típicos do
ensino básico e à pesquisa de novos métodos de ensino daqueles
conteúdos.
Lembre-se ainda que, apesar da reconhecida má qualidade, as
instituições privadas de ensino superior recebem hoje quase dois
terços da matrícula total, sendo que a maioria está em cursos de
Licenciatura. Isto não se explica apenas pelo fato de terem
recebido apoio financeiro do Estado, ou pelas "facilidades"
concedidas pelo Conselho Federal de Educação. A decadência das
Licenciaturas nas universidades públicas abriu um mercado efetivo
para as instituições privadas e para os que nelas se graduam, e
que, hoje, apesar da precariedade da formação que receberam,
correspondem a cerca de 90% do magistério das redes públicas dos
grandes centros urbanos.
As maiores questões educacionais estão localizadas na rede
pública de ensino fundamental. É nela que também se encontram os
maiores problemas relativos à situação do magistério
61
. Existem
no Brasil cerca de 1 milhão e 100 mil professores atuando no
ensino de 1
º
Grau; destes, quase 1 milhão estão nas redes
61
Para a discussão deste ponto, baseamo-nos em Barreto (1990).
99
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
estaduais e municipais, atendendo a pelo menos 25 milhões de
crianças.
Apesar dos dados mostrarem uma melhoria do perfil de
escolaridade média dos docentes do ensino fundamental, dos mais
de 600 mil professores que lecionam nas quatro primeiras séries -
a etapa em que se localizam os piores resultados do sistema -
cerca de 1/4 tem 8 anos de escolaridade ou menos, o que significa
no máximo o 1
º
Grau completo, sem qualquer habilitação para a
função e, pior ainda, para a difícil tarefa da alfabetização.
Os professores com os mais baixos níveis de escolaridade
estão majoritariamente nas redes municipais das zonas rurais das
regiões Nordeste e Centro-Oeste, onde se destaca o segmento dos
que não possuem sequer o antigo curso primário completo. Estes
professores com menos de 5 anos de escolaridade são mais de 1/3
dos que atuam nas zonas rurais de todo o país.
A baixa média de idade - varia de 23 anos no Centro-Oeste a
29 anos no Nordeste - mostra que, apesar de identificados como
uma das principais causas do fraco desempenho das escolas do meio
rural, os professores leigos continuam a ser recrutados pelos
dirigentes municipais.
Se considerarmos o impacto sobre os alunos, com uma média de
20 deles por professor, teríamos cerca de 3,5 milhões de alunos
do 1
º
Grau, a cada ano, atendidos por aqueles professores leigos.
Na zona rural da região Nordeste, onde se concentra o maior
contingente deles, o impacto seria sobre cerca de 2 milhões de
alunos, a cada ano.
No que se refere à remuneração, os poucos estudos existentes
mostram uma situação crítica. Os dados da RAIS-1987 indicavam uma
melhora dos salários em relação ao início dos anos 80.
Entretanto, as médias regionais continuavam apresentando enormes
variações. Os quase 40 mil professores das quatro primeiras
séries residentes na zona rural do Nordeste percebiam, em 1982,
um salário médio de US$ 20,17; na região Sul, os professores em
100
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
igual condição percebiam em média US$ 73. Estas variações
praticamente se repetem em 1987, último ano para o qual se dispõe
de dados.
Mesmo com a elevação da média nacional, os professores do 1
º
Grau continuavam a ser menos remunerados em relação a categorias
profissionais com nível de escolaridade semelhante. Em todo o
país, o salário médio dos "auxiliares de contabilidade/caixas"
era, em 1987, equivalente a 1,22 vezes o salário médio dos
docentes. Embora com escolaridade menor, os "secretários"
recebiam, em 1987 também, 1,32 vezes o salário médio dos
professores.
62
Embora estes não sejam dados tão recentes, considerando-se
que, nos últimos anos, foram marcantes as diferença entre as
políticas salariais para os setores público e privado, com
grandes perdas para os servidores públicos, nada indica que
atualmente a posição relativa dos professores do 1º Grau tenha
melhorado.
3.2.2. A formaªo profissional
Atendendo a um mercado de trabalho industrial cada vez mais
"taylorizado", as instituições de Formação Profissional mudaram
suas prioridades ao longo de sua existência. No SENAI, por
exemplo, a ênfase inicial na "Aprendizagem", que então buscava
combinar o ensino fundamental com a formação específica, foi
progressivamente substituída pela prioridade aos cursos de curta
duração em conformidade com as necessidades mais imediatas das
empresas, para o que as instituições de formação profissional se
mostraram altamente dinâmicas.
Esta mudança implicou um crescente abandono da oferta de
Educação Geral, atitude sensivelmente reforçada pelo fato de que,
na medida em que o sistema educacional se expandia
62
É o contrário do que ocorre no Japão, onde os professores ganham, em média, 20% mais do que os
outros profissionais com a mesma escolaridade.
101
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
quantitativamente, os programas de Formação Profissional podiam
ser mais seletivos, elevando seus requisitos de escolaridade.
O sistema de Formação Profissional desenvolveu-se com grande
autonomia, não apenas em relação ao sistema educacional, mas
também ao próprio Estado e aos sindicatos de trabalhadores. As
tentativas de estabelecimento de políticas para a área ou a
criação de conselhos tripartites para formulação dessas políticas
eram percebidas como ingerências indevidas numa atividade
essencialmente privada, até porque os encargos sobre a folha de
salários, que financiam o SENAI, o SENAC e congêneres, sempre
foram vistos como "recursos das empresas", isto é, como recursos
privados.
A questão, agora, é saber se a estrutura e as estratégias de
atuação consolidadas nas cinco décadas de existência do sistema
de formação profissional darão conta dos requisitos ocupacionais
introduzidos pelas novas características de flexibilidade e
participação expostos no capítulo introdutório. Isto se refere
não somente a seus procedimentos internos, mas também à sua
articulação com o sistema produtivo.
Caminha-se hoje para o consenso de que a qualificação
profissional, mesmo ao nível do operariado, depende de uma base
de educação geral equivalente a, pelo menos, o 1
º
grau completo.
Neste caso, a Formação Profissional tradicionalmente conhecida,
focada essencialmente nos aspectos operacionais, já não atenderia
às novas exigências. A transferência da responsabilidade pela
qualidade para o pessoal de produção direta (Controle Estatístico
de Processos - CEP), eliminando o tradicional controle de
qualidade baseado nos inspetores, requer competências que
somente podem ser adquiridas através do aprendizado da Matemática
conforme o previsto nos currículos escolares. Tal aprendizado
simplesmente não pode ser substituído por disciplinas
instrumentais em cursos rápidos. Portanto, instituições como o
SENAI teriam que rever suas prioridades, no sentido de oferecer
uma qualificação adequada às novas necessidades das empresas.
102
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
A Participaªo do Empresariado
Acostumadas ao sucesso das estratégias de qualificação
profissional destinadas aos pouco escolarizados - cursos rápidos,
de baixíssimo custo e de resultados positivos -, as empresas
brasileiras sempre se mantiveram à distância dos problemas mais
gerais do sistema educacional.
Nesta área, a manifestação empresarial foi no sentido de
cobrar do Estado o investimento na Universidade e em cursos
técnicos, o que, no caso do ensino de nível médio, acabou por
gerar uma rede estatal de escolas técnicas, de altíssimo custo de
instalação e de manutenção, e altamente privilegiada face ao
restante da rede de ensino, apesar de atender a apenas 1% da
matrícula do ensino médio.
Assim, o interesse empresarial pelas questões afetas ao
ensino regular de 1
º
Grau é um fenômeno recente e ainda
razoavelmente restrito ao segmento mais afetado pelas
transformações que marcam a economia mundial neste final de
século. As avaliações de desempenho começam a indicar a
necessidade de se contar com trabalhadores de maior escolaridade,
na medida em que as falhas apontadas dizem respeito a habilidades
intelectuais demandadas pelas inovações introduzidas.
Esse segmento empresarial se dá conta de que "a importância
do saber pensar, assim como as novas responsabilidades e o
próprio manuseio de equipamentos caros e sensíveis, conduzem a
uma nova relação entre o homem e a máquina, e entre os diversos
níveis da hierarquia ocupacional, que demandam conhecimentos que
vão muito além dos aspectos operacionais de uma ocupação"
(Fogaça, 1992).
Embora as empresas preocupadas com a questão da escolaridade
dos trabalhadores elejam acertadamente a oferta de cursos
supletivos de 1
º
Grau como ponto de partida de seus programas
educacionais, as estratégias escolhidas demonstram uma percepção
ainda equivocada do problema. A maioria prefere criar escolas
103
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
próprias e já há um movimento significativo no sentido da
contratação de serviços de terceiros - professores autônomos ou
escolas da rede privada; poucos são os exemplos de parceria com
Prefeituras ou outras estratégias de apoio aos sistemas públicos
de ensino, o que demonstra a permanência de uma visão
particularista, de que cada empresa pode resolver o "seu"
problema.
A contratação de terceiros significa ainda a concessão de um
verdadeiro subsídio a escolas privadas, que não se justifica nem
mesmo a título de prestação de serviços educacionais e como se o
atendimento às necessidades de complementação de escolaridade de
adultos trabalhadores fosse uma especialidade de determinadas
instituições educacionais. A educação básica de que o trabalhador
precisa é a mesma que deve ser oferecida em toda a rede de ensino
regular, o que significa que não há mistérios nem fórmulas
especiais ou exclusivas deste ou daquele colégio. Com isso, o
imperativo, hoje, é salvar a rede pœblica de ensino bÆsico, pois
somente através dela a indœstria pode garantir a mão-de-obra,
jovem ou adulta, com a escolaridade necessária ao sucesso da
reestruturação produtiva.
A timidez do empresariado quanto à questão educacional pode
estar ligada ao fato de que o processo de difusão das inovações
ainda é incipiente entre nós. Mesmo em setores mais propensos às
inovações, como o de autopeças, pesquisa recente (Gitahy &
Rabelo, 1991) observou que poucas empresas possuíam um sistema de
garantia de qualidade próximo ao conceito de Controle de
Qualidade Total (CQT). Esse dado é significativo na medida em que
a amostra era composta exclusivamente de empresas que fornecem
diretamente para as montadoras e que ocupam posições de liderança
em seus respectivos mercados.
A Participaªo dos Trabalhadores
No Brasil, a luta pelos salários e pelo emprego,
principalmente em épocas de crise como a que atravessamos agora,
coloca em segundo plano outras perspectivas e necessidades da
104
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
classe trabalhadora, dentre elas a Educação, vista mesmo como uma
questão que não diz respeito ao conjunto de atividades típicas de
um sindicato. Neste contexto, mesmo quando alguns setores
começaram a se modernizar, ainda nos anos 70 - bancos, indústrias
químicas, telecomunicações, por exemplo - os sindicatos não
acusaram maior preocupação com a questão da (re)qualificação.
É bem verdade que já não se pode dizer que o alheamento face
à questão dos recursos humanos para a modernização industrial
seja uma característica de todo o sindicalismo brasileiro. Assim
como ocorre no segmento empresarial, já existem sindicatos e
centrais sindicais tratando da questão, principalmente aqueles
que vêm participando dos comitês encarregados de discutir a
reestruturação produtiva. Entretanto, também é verdade que, mesmo
entre estes, as percepções dominantes ainda não incorporam
aspectos extremamente importantes para a própria classe
trabalhadora:
- em primeiro lugar, os sindicatos ainda não percebem a
educação geral como o principal instrumento de adequação do
trabalhador aos novos requisitos ocupacionais. Com isto,
continuam demandando a expansão da oferta de treinamento
operacional ou de programas tradicionais de formação
profissional, independentemente da complementação da escolaridade
básica;
- em segundo lugar, os trabalhadores continuam delegando ao
empresariado, através de suas instituições educativas e dos
programas internos de treinamento, a competência exclusiva das
decisões em torno dos rumos da Formação Profissional, ao invés de
reivindicar a participação na gestão das instituições e programas
de formação profissional;
- por último, os sindicatos continuam percebendo a luta pela
educação básica pública apenas numa perspectiva, a da cidadania,
o que significa colocá-la num contexto diferenciado daquele em
que se discute a reestruturação produtiva. Isto, num momento em
que poderiam cobrar as "promessas" da nova vinculação entre
105
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
escolaridade e qualificação profissional, inclusive a
participação nas decisões de política educacional.
106
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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4. PROPOSI˙ES
4.1. Relaıes de Trabalho e a Proteªo Social
A natureza dos tópicos - basicamente objeto de negociações -
não permite seguir de forma rígida as recomendações do Estudo da
Competitividade da Indústria Brasileira sobre a apresentação das
propostas. Neste tema, os agentes são sempre os sindicatos, as
empresas e o governo. As sugestões apresentadas envolvem
necessariamente estes agentes.
As propostas deste documento levam em consideração os
seguintes elementos condicionadores para a mudança, tanto das
relações de trabalho quanto dos programas de bem-estar social:
i) a realidade brasileira atual é marcada por forte
heterogeneidade no mercado de trabalho, com alto peso ainda de
setores desestruturados em que predominam altas taxas de
rotatividade, falta de estímulos à qualificação e à identificação
entre empresas e trabalhadores. A diversidade dos níveis de
produtividade das empresas é também notável;
ii) mesmo nos setores de mais alta produtividade, cujos
mercados de trabalho são mais estáveis, o meio ambiente do qual
se recruta a maior parcela dos empregados é comum ao dos
assalariados dos setores mais desestruturados. Este é marcado por
uma precária oferta de serviços públicos desafiados por uma
demanda crescente e insatisfeita;
iii) a crise econômica e a baixa capacidade fiscal do Estado
resultaram numa deterioração na oferta dos serviços públicos,
levando a uma proliferação caótica de alternativas privadas de
compensações e benefícios que são incapazes de alterar aquelas
deficiências básicas na infra-estrutura social;
107
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
iv) a vida sindical no país, ainda que dinâmica e em
expansão, caracteriza-se por elevada proliferação de sindicatos
que, em sua maioria, estão ausentes dos locais de trabalho;
v) se do lado dos trabalhadores as centrais sindicais se
afirmaram como representantes legítimos com inegável enraizamento
na vida sindical, do lado dos empresários ocorre baixa
representatividade das organizações tipicamente sindicais;
vi) na maioria das empresas predominam hierarquias rígidas e
uma gestão do trabalho exclusivamente centrada na gerência;
vii) há uma tradição e um conjunto de instituições que
impõem uma tutela estatal sobre as relações de trabalho, gerando
um clima em que o apelo à legislação substitui a negociação;
viii) estas duas últimas características vêm sendo
parcialmente alteradas nos setores mais dinâmicos e nas regiões
mais desenvolvidas tendo em vista os desafios impostos pela crise
e a introdução de mudanças organizacionais.
Tendo em mente este quadro, o sentido geral das propostas
rejeita aquelas que remetem à empresa a gestão exclusiva, e
portanto privada, das relações do trabalho e dos programas
sociais.
Propõe-se aqui uma visão de mudanças nas relações de
trabalho e nas políticas sociais de forma mais integrada e
sistêmica. Reconhece-se que o formato do sistema de proteção
social deverá ser híbrido, isto é, combinando políticas públicas,
naquilo que diz respeito às atribuições intransferíveis do
Estado, com políticas privadas.
63
Por outro lado, considera-se que a transição de sistemas
protetivos e de relações de trabalho não será efetuada por atos
63
Esta análise encontra apoio em Zylberstajn para quem existe a possibilidade de criarmos "um
modelo híbrido": "uma parte dos trabalhadores brasileiros e suas respectivas empresas
praticarão relações de trabalho mais avançadas e autônomas. Uma parte, porém, ainda será
protegida por leis e pela Justiça do Trabalho" (Zylberstajn, 1992:107).
108
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
voluntaristas, mas por acúmulos de experiências parciais e
práticas efetivas de negociação.
Neste sentido, no que se refere às relações de trabalho,
propõe-se a seguir um conjunto de encaminhamentos para uma
Comissão Tripartite de Revisão do Sistema de Relações de Trabalho
e para as Câmaras Setoriais. Estas devem ser consideradas um
locus privilegiado para acordos parciais e setoriais entre
trabalhadores, empresários e governo nas questões relativas tanto
a uma política negociada de rendas quanto para questões relativas
à difusão de novas tecnologias e métodos organizacionais. No que
concerne às políticas sociais, as recomendações sugeridas podem e
devem ser encampadas nestes fóruns, mas se dirigem mais
exatamente à instância legislativa, tendo em vista, inclusive, a
proximidade das reformas constitucionais.
4.1.1. Contrato coletivo de trabalho
Objetivos: promoção do contrato coletivo de trabalho como
instrumento básico e definidor das relações capital-trabalho
visando um crescente envolvimento e reciprocidade entre as
partes. Destacadamente, deve incluir os seguintes alvos:
* explicitar e buscar formas de resolução negociada dos
conflitos;
* criar um clima favorável à difusão de novas técnicas de
automação industrial e técnicas organizacionais através de maior
envolvimento dos trabalhadores e maiores perspectivas de
qualificação;
* maior estabilidade no emprego concomitante a uma maior
flexibilidade funcional;
* participação dos trabalhadores nos resultados das
empresas;
* diminuição do leque salarial e das hierarquias.
Requisitos/Instrumentos/Ações:
109
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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- definição de uma legislação de apoio e promovedora da ação
coletiva em todos os níveis;
- articulação de níveis centralizados de negociação - setor,
região - e descentralizados - empresa - visando garantir graus
mínimos e realistas de homogeneidade sem inibir as iniciativas
nas empresas mais modernas e a diversidade de situações;
- transformação da Justiça do Trabalho num instrumento de
arbitragem pública livremente acessado pelas partes;
- definição de legislação que permita transitar do sistema
atual para um sistema de negociações, assegurando em lei
mecanismos protetivos mínimos;
- autonomia dos contratos coletivos para a negociação de
todos os ítens definidores das relações de trabalho, ressalvadas
as garantias mínimas previstas em lei;
- reconhecimento da representação sindical por local de
trabalho;
- gestão tripartite do sistema de formação profissional e
treinamento, bem como das articulações com o sistema educacional
regular ou supletivo.
4.1.2. Mecanismos de proteªo social
Definição das competências públicas e privadas, através de:
- manutenção de um sistema público de seguridade incluindo a
previdência social, o sistema de saúde universal e assistência
social;
- descentralização/municipalização das ações de saúde e
assistência social;
- efetivação de medidas de controle gerencial e fiscalização
do processo de concessão de benefícios previdenciários;
- revisão da aposentadoria por tempo de serviço com a
instituição da exigência de idade mínima cumulativamente ao
número de contribuições;
- redefinição das aposentadorias especiais;
- redução do número de benefícios e maior seletividade na
sua concessão;
110
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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- introdução de mecanismos de seletividade na oferta de
alguns serviços médicos;
- coexistência da previdência pública básica com a
previdência complementar pública ou privada, fechada ou aberta;
- regulamentação de esquemas privados de seguridade:
estabelecimento de regras de funcionamento, de aplicação de
recursos no caso da previdência e do alcance do atendimento no
caso da saúde;
- estabelecimento de laços de complementaridade efetivos
entre previdência pública e privada a partir de negociações
coletivas descentralizadas, guardados os limites estabelecidos
pela negociação;
- redefinição do seguro-desemprego, incorporando-o a um
plano mais abrangente de amparo ao trabalhador com vistas a
formação, treinamento e reciclagem. O FAT, principal fonte de
recursos, deve permanecer no BNDES e da sua gestão devem
continuar a participar os trabalhadores.
4.1.3. Recomendaıes s empresas
- reconhecimento da importância das comissões de
trabalhadores em nível de empresa;
- reconhecimento do direito das comissões e representação
dos sindicatos à livre informação sobre a política das empresas;
- o exercício da gestão participativa deve começar pelos
assuntos referentes à política de benefícios da empresa, e
evoluir para o envolvimento dos trabalhadores na definição de
estratégias de longo prazo sobre gestão e emprego, estabelecendo
mecanismos de negociação sobre critérios de dispensa, admissão,
terceirização;
- participação dos trabalhadores nos fundos de pensão e nos
planos de saúde das empresas;
- redução do níveis hierárquicos e do leque salarial;
- introdução de esquemas de remuneração por resultados
negociados com os empregados da empresa, sem substituir ou
complementar a remuneração salarial devida (nos termos do
Substitutivo Projeto de Lei nº 4580 de 1990);
111
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
- envolvimento de todos segmentos da força de trabalho em
programas de treinamento para a qualidade;
- renovação e reciclagem das gerências intermediárias
visando obter maior colaboração desses segmentos para um
gerenciamento mais participativo.
4.2. Educaªo e Qualificaªo
4.2.1. Diretrizes e recomendaıes
A multiplicidade de questões que decorrem da análise do
panorama educacional brasileiro torna necessária a determinação
de prioridades de ação, que deverão orientar o tratamento da
relação entre Educação e Qualificação Profissional, de acordo com
os novos padrões de competitividade.
A determinação destas prioridades ocorre a partir de seis
recomendações básicas:
i) No que se refere aos recursos humanos, o maior problema
da indústria brasileira, como todas as pesquisas mostram, é a
baixa escolaridade dos trabalhadores, o que resulta em
dificuldades de adaptação aos novos requisitos, mesmo quando se
trata de treinamentos operacionais.
ii) É preciso que se estabeleçam novas formas de articulação
entre o sistema produtivo e o sistema educacional, visando,
simultaneamente, a elevação da escolaridade da população e a
qualificação dos recursos humanos.
iii) Estas novas formas de articulação devem privilegiar a
repartição de responsabilidades entre escola e empresa. O Estado,
através dos sistemas públicos de ensino, deve se dedicar à
universalização da educação básica - ensino de 1
º
e 2
º
Graus de
educação geral, que é a base da qualificação. As empresas devem
assumir a qualificação da mão-de-obra em geral - operários e
112
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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técnicos de nível médio, através de parcerias, de suas
associações setoriais ou regionais e, inclusive, com a
participação de sindicatos de trabalhadores.
iv) A qualificação profissional diz respeito, agora, à posse
de uma escolaridade básica, de educação geral. Nesse sentido, as
empresas, diretamente ou através de suas instituições educativas
(SESI, SESC) e de formação profissional (SENAI e SENAC), devem
oferecer oportunidades de ensino supletivo de educação geral aos
trabalhadores adultos semiqualificados e de pouca escolaridade,
que encontram problemas para o retorno à rotina escolar.
v) Os recursos públicos vinculados por lei à Educação devem
financiar a educação geral (o ensino regular de 1
º
e 2
º
Graus),
enquanto os gastos com a qualificação (incluindo a formação
específica oferecida nos cursos técnicos de 2º Grau) deverão ser
assumidos pelas empresas.
vi) Os sindicatos de trabalhadores devem participar da
gestão dos sistemas públicos de ensino e das instituições de
formação profissional, especialmente no que se refere à
implantação de programas de requalificação da mão-de-obra.
4.2.2. Aıes prioritÆrias
MagistØrio
A melhoria do ensino básico está diretamente relacionada à
qualidade do trabalho pedagógico; embora a questão da qualidade
esteja relacionada a outras variáveis, a ação do professor é
decisiva para o sucesso de qualquer projeto de melhoria do ensino
básico. Neste aspecto, as ações dividem-se em três linhas:
i) Formação de Professores - boa parte do mau desempenho dos
professores deve-se à má qualidade da formação que recebem.
Assim, no que se refere aos cursos de formação para o magistério,
113
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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tanto de nível médio quanto as Licenciaturas oferecidas pelas
Universidades, propomos:
a) extinção dos atuais cursos de Habilitação ao Magistério;
b) recriação das redes estaduais de Escolas Normais;
c) reformulação dos Cursos de Pedagogia, visando a formação
de professores-alfabetizadores e o desenvolvimento de pesquisas
de novos métodos e técnicas pedagógicas para o Ensino
Fundamental;
d) criação de poucas e boas Escolas Normais Superiores, para
a formação e o aperfeiçoamento de professores dos Cursos de
Licenciatura;
e) descentralização dos cursos de Licenciatura, de modo que
cada Instituto ou Faculdade, nas áreas de conhecimento e
disciplinas que compõem o currículo do ensino básico, ofereça a
formação pedagógica ao longo de todo o curso de graduação;
f) apoio, nas Universidades, aos cursos de Ciências Básicas
(Matemática, Física, Química e Biologia) e das Ciências
Humanas/Sociais que oferecem Licenciaturas, visando a melhoria
da formação dos professores do ensino de 1
º
e 2
º
Graus;
g) revalorização da Prática de Ensino nos Colégios de
Aplicação e nos Cursos Normais, com ênfase nos métodos e técnicas
mais adequados às necessidades e características dos segmentos
mais problemáticos da clientela do ensino básico.
ii) Reciclagem de Professores - a média de idade do atual
contingente de professores do ensino básico ainda é bastante
baixa, o que significa a permanência no sistema, por mais uma
década e meia, em média, dos malformados e dos não-qualificados.
No sentido de compensar a má formação recebida e contribuir para
a melhoria do desempenho em sala de aula, devem ser desenvolvidas
as seguintes ações:
a) fortalecimento dos Centros de Formação e Aperfeiçoamento
do Magistério (CEFAMs), para atividades permanentes de
atualização e retreinamento de professores do ensino básico, em
programas vinculados às Universidades públicas;
114
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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b) expansão das atividades de Extensão Universitária
voltadas para a reciclagem de professores do ensino básico, tanto
nos aspectos pedagógicos quanto na atualização dos conteúdos das
disciplinas que lecionam;
c) criação de mecanismos de incentivo à reciclagem e
atualização permanente (bolsas, progressão funcional, etc.).
iii) Revalorização da Carreira - a carreira do magistério
precisa voltar a ser atraente, trazendo para os cursos de
formação os bons alunos dos cursos médio e superior e estimulando
o professor a se manter em regência de classe e permanentemente
atualizado. Para tanto, recomendamos como principais ações:
a) elevação dos salários atuais, mantendo-os em patamares
competitivos em relação ao mercado de trabalho de profissionais
de qualificação semelhante;
b) estruturação de Planos de Carreira, com mecanismos de
progressão funcional vinculados tanto à qualificação, quanto ao
desempenho em sala de aula; e incentivos salariais à permanência
em regência de classe, de modo a desestimular o abandono das
salas de aula, em troca de funções burocráticas;
c) incentivos salariais especiais aos professores do ensino
básico dedicados ao atendimento dos segmentos mais problemáticos;
d) responsabilidade financeira da União na complementação
dos salários dos professores do 1
º
Grau, nas regiões e
localidades que não tenham recursos suficientes para o
financiamento dos novos planos de carreira, desde que o Estado ou
Município em questão já esteja aplicando na Educação a totalidade
dos percentuais exigidos por lei. Lembre-se que, para isto, a
legislação atual, que proíbe a União de realizar tal iniciativa,
precisa ser alterada.
Melhoria do Ensino BÆsico
Além das ações específicas para o Magistério, outras medidas
devem ser tomadas, relativas à estrutura e ao funcionamento do
ensino básico. Estas medidas, que no seu conjunto visam a
revalorização e a melhoria da educação geral, são:
115
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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a) expansão do atendimento ao pré-escolar, para oferecer a
todos as mesmas oportunidades de sucesso e progressão escolar,
desde as primeiras séries. As iniciativas comunitárias
consideradas habilitadas devem ser apoiadas, eximindo o Estado,
neste momento, da construção de uma rede de pré-escolas;
b) aumento da jornada escolar, nos sistemas públicos, nas
quatro primeiras séries do 1
º
Grau, dando prioridade ao
restabelecimento dos dois turnos diurnos; a expansão quantitativa
da rede deverá atender à demanda decorrente da eliminação dos
múltiplos turnos;
c) no ensino de 1
º
Grau, as escolas de tempo integral, com
exceção daquelas que comprovadamente atendam às populações muito
carentes ou com grandes defasagens idade/série, só devem se
expandir na medida em que se cumpra o programa da volta, na rede
de escolas "comuns", aos dois turnos diurnos;
d) nos casos em que seja imprescindível o atendimento em
escolas de tempo integral, pode-se prever incentivos materiais
(bolsas) para compensar a renda não auferida pelo retardamento da
entrada no mercado de trabalho, pelo menos até os 14 anos;
e) revisão dos conteúdos curriculares do ensino de 1
º
e 2
º
Graus, com vistas, no 1
º
Grau, ao atendimento da aquisição de
competências básicas - raciocínio, linguagem, capacidade de
abstração, etc. - fundamentais à participação do indivíduo na
sociedade moderna; no 2
º
Grau, além da continuidade desses
objetivos, acrescente-se o da oferta de uma sólida base de
conhecimentos técnico-científicos (Ciências Exatas, Humanas e
Biológicas), que servirá tanto à posterior aquisição de
habilitação específica de nível médio, quanto ao prosseguimento
dos estudos em nível superior;
f) definição de um padrão nacional mínimo de educação
básica, de aplicação compulsória em todo o sistema educacional
brasileiro;
g) extinção das diferenciações curriculares entre as escolas
de 2
º
Grau de educação geral e aquelas atualmente dedicadas ao
ensino técnico. Tal como no ensino de 1
º
Grau, a escola de nível
médio deve ser única e democrática;
h) na rede pública, a prioridade no ensino médio deve ser
para o 2
º
Grau regular, de educação geral, com ampliação das
116
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
vagas em horário noturno, em locais acessíveis, para atender aos
jovens trabalhadores, cuja demanda por este nível de ensino tem
aumentado muito;
i) na atual rede pública de escolas técnicas, as oficinas e
toda a parte de formação especial devem ser administradas por
convênios com empresas, sindicatos de trabalhadores e associações
dos diferentes setores, abrindo-se ainda a outras clientelas que
demandem as habilitações oferecidas.
Ensino Superior
O ensino superior tem importante papel a desempenhar no
processo brasileiro de reestruturação produtiva, seja na formação
de mais e melhores professores, seja na qualificação de recursos
humanos para o setor produtivo, melhor preparados para os atuais
requisitos da capacitação tecnológica. Para tanto, propomos:
a) reforçar os cursos de Ciências Básicas (Matemática,
Física, Química e Biologia), no sentido de formar profissionais
capazes de atuar eficientemente em sistemas de inovações
tecnológicas;
b) aumentar a oferta de vagas, nas Universidades Federais,
principalmente nas disciplinas mencionadas, buscando atrair,
através da expansão dos cursos noturnos ou da oferta de bolsas de
estudos, os jovens que trabalham em tempo integral;
c) combater a excessiva fragmentação profissional e a
especialização precoce, que conduzem à ênfase no conhecimento
instrumental, cuja utilidade tende a diminuir, e às
regulamentações correspondentes, que funcionam mais como "reserva
de mercado" do que como garantia de bom exercício profissional;
d) com base no item anterior e a exemplo de outros países,
incluir disciplinas das "Humanidades" nos currículos de graduação
das Engenharias, tendo em vista as mudanças organizacionais em
curso e seus reflexos nas funções gerenciais;
e) retomar e implementar de fato a idéia de Ciclo Básico, no
intuito de fornecer uma formação universitária abrangente, não
especializada, no espírito do BA norte-americano, altamente
valorizada hoje em dia no mercado de trabalho;
117
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
f) a pós-graduação deverá se tornar mais flexível nos seus
conteúdos e na sua estrutura, a fim de atender a vocações e
mercados distintos: docentes, pesquisadores e profissionais de
alto nível para atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D)
nas empresas, evitando introduzir diferenças na qualidade e no
status da formação oferecida;
g) esta flexibilidade implica também combinações distintas
de carga horária de aulas, de trabalhos individuais e de
pesquisa, em atenção às várias vocações a serem atendidas;
h) com o mesmo intuito da proposta anterior, abrir a
Universidade, especialmente a pós-graduação, para profissionais
com grande experiência, em condições de contribuir para a geração
de conhecimentos, ainda que não possuam o currículo normalmente
associado à carreira universitária;
i) a pós-graduação deve dar alta prioridade à relevância dos
temas de tese, levando em conta, no tratamento das questões, o
caráter crescentemente interdisciplinar. Isto pode significar
menor rigidez dos departamentos universitários para a avaliação
de teses que interessem pelo seu conteúdo, ainda que ele
ultrapasse os "limites" de suas áreas de conhecimento, ou que o
candidato ao título não possua as credenciais formais daquele
departamento ao qual apresenta o trabalho;
j) a Extensão Universitária deve concentrar esforços na
colaboração com programas de reciclagem profissional em todos os
níveis: professores, trabalhadores qualificados, gerentes,
técnicos e profissionais de alto nível;
k) a autonomia universitária deve vir acompanhada de
práticas de gestão mais profissionais, com vistas à maior
captação de recursos próprios, tanto através de melhor gestão do
patrimônio, como de maior cooperação com o sistema produtivo.
Qualificaªo Profissional
Neste aspecto, as ações podem ser divididas em duas linhas:
i) O Papel das Empresas: Ações Diretas - como assinala o
documento elaborado para a Comissão Empresarial de Produtividade,
"a ação direta dos empresários pode apenas complementar o papel
118
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
das escolas públicas". Entretanto, esta ação complementar não
significa nem a permanência do atual nível de participação do
empresariado na Educação, e muito menos a continuidade da
expectativa de que o Estado, além dos encargos relativos à
Educação Geral, continue a assumir aqueles relativos à
qualificação profissional. Assim, o caráter complementar da ação
empresarial é o de desonerar o Estado nas ações de habilitação
específica e o de com ele colaborar, principalmente nos esforços
para a elevação da escolaridade básica dos trabalhadores
brasileiros. Nesse sentido, consideramos que às empresas e às
associações empresariais compete:
a) incentivar as novas modalidades de cooperação entre o
setor produtivo e as Universidades, incluindo um maior apoio às
pesquisas que se dedicam à busca de métodos e técnicas
pedagógicas mais adequados à clientela da escola básica;
b) participar diretamente no esforço de melhoria do ensino
público de 1
º
e 2
º
Graus, através de convênios de cooperação com
as Secretarias de Educação, para a manutenção das escolas
existentes nas comunidades onde se localizam as empresas;
c) efetivar a abertura de oportunidades educacionais nos
espaços fabris (escolas anexas às fábricas) e criação de
facilidades para que seus empregados menos escolarizados possam
completar sua educação básica, vencendo as resistências e os
problemas que levam a fracassar as iniciativas de ensino
supletivo extra-empresa, pelo esforço adicional que exigem do
trabalhador;
d) a gestão dos programas empresariais de formação
profissional deve contar com a participação de representantes dos
trabalhadores.
ii) O Papel da Empresa: A Formação Profissional - além das
ações realizadas diretamente pelos empresários e no ambiente da
empresa, há um conjunto de medidas que dizem respeito às
instituições educativas administradas por órgãos representativos
das empresas, que se referem à sua adequação aos novos
requisitos de qualificação profissional e à colaboração que
119
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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através delas pode ser dada ao esforço de elevação da
escolaridade básica dos trabalhadores. São elas:
a) utilização da capacidade instalada da rede do SESI -
pela sua menor dimensão e maior disponibilidade de recursos - em
programas de apoio aos sistemas públicos de ensino, para o
desenvolvimento de projetos experimentais, visando a produção de
inovações pedagógicas para posterior difusão na rede pública;
b) utilização dos espaços ociosos do sistema SENAI, em
parceria com toda e qualquer agência capaz de oferecer educação
básica, regular ou supletiva, para a oferta de oportunidades de
educação geral aos jovens e adultos pouco escolarizados;
c) a atual rede de escolas técnicas, na sua parte
profissionalizante, deverá ser transformada numa rede de Centros
de Desenvolvimento Tecnológico, administrados por associações
setoriais da indústria, para atender à formação/atualização de
trabalhadores, técnicos e gerentes. Para a ação destinada aos
trabalhadores e técnicos, é fundamental a participação do SENAI;
para o segmento de nível superior, as empresas deverão se
articular com as Universidades;
d) abertura das instituições de formação profissional aos
menos escolarizados, empregados ou não, em programas de
profissionalização que contemplem também a oferta de educação
geral;
e) reestruturação dos cursos regulares das instituições de
formação profissional, privilegiando o desenvolvimento de uma
"cultura tecnológica", com a substituição das disciplinas
instrumentais por uma base sólida de conteúdos técnico-
científicos amplos;
f) o SENAI deve preservar os recursos provenientes das
contribuições sobre a folha de pagamentos exclusivamente para as
atividades que atendam aos interesses gerais da indústria;
treinamentos do tipo firm specific devem ser financiados
integralmente pelas empresas demandantes;
g) através de seus Centros de Desenvolvimento Tecnológico, o
SENAI deverá colaborar com as empresas também na experimentação e
difusão de novas técnicas de organização do trabalho, com vistas
120
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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a diminuir os riscos e as incertezas inerentes aos programas de
reestruturação.
4.2.3. Papel dos sindicatos
a) O acesso da população em geral a um ensino básico de
qualidade deve ser considerado um item estratégico nas
conversações e negociações entre sindicatos e Governo.
b) A maior oferta de oportunidades de complementação da
escolaridade básica e de formação profissional, inclusive em
programas de requalificação, deve merecer maior atenção dos
sindicatos nas pautas de negociação.
c) As entidades sindicais devem participar da gestão das
instituições de ensino, tanto nas agências de formação
profissional como nas redes públicas.
d) As entidades sindicais devem participar da formulação e
acompanhamento da implementação de planos e políticas de educação
básica regular, nos três níveis da administração pública.
e) Conforme o previsto no projeto da LDB, as entidades
sindicais devem buscar participar, nas instituições de ensino
superior, da definição de ações e projetos que atendam aos
problemas do ensino básico, principalmente no que se refere às
necessidades de atualização e requalificação de trabalhadores.
4.2.4. Financiamento do ensino bÆsico
Os Recursos NecessÆrios ao Ensino BÆsico
O problema dos recursos para o Ensino Básico envolve duas
questões de naturezas distintas: de um lado, o financiamento de
ítens diretamente ligados às atividades pedagógicas propriamente
ditas: salários de docentes, material didático e de apoio, e
espaço físico (conservação, recuperação e ampliação da rede
física); de outro, os gastos assistenciais necessários à
manutenção das crianças na escola.
121
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Nenhum país, e muito menos o Brasil, com seu nível de
pobreza, pode prescindir dos gastos assistenciais, que envolvem
atualmente a merenda escolar e alguma atenção básica em Saúde.
Além dessa assistência, caberia também pensar em alguma
compensação financeira para as famílias muito carentes que
necessitam do trabalho infantil para sobreviver e que, por isso,
encontram dificuldades em deixar por vários anos seus filhos na
escola.
Quanto ao primeiro conjunto de gastos, todas as estimativas
indicam que com US$ 6 a 7 bilhões é possível dar um ensino de boa
qualidade aos alunos da rede pública, inclusive pagando aos
professores do 1
º
Grau um salário médio mensal de US$ 300.
O problema está em como financiar os gastos assistenciais
que, se se pretende atender a todos os alunos, mesmo mantendo
padrões modestos, equivalem ao total de recursos hoje alocados no
1
º
Grau. Se esse volume de recursos for considerado irrealista,
não existirá outra alternativa que não seja a de restringir tais
gastos aos segmentos mais carentes, apesar de todos os problemas
operacionais que uma focalização desse tipo implica.
SalÆrio-Educaªo
A este respeito, cabe observar que o volume de recursos que
esta fonte representa é fundamental para a sobrevivência dos
sistemas públicos de ensino. Assim, se ela for extinta,
forçosamente terá que ser substituída por outra. Entretanto, sua
permanência não exclui, a nosso ver, a necessidade de revisão de
seus mecanismos de aplicação, tornando sua gestão mais
transparente e passível de efetiva supervisão. Assim, as
propostas são:
a) simplificação e agilização da gestão dos recursos do
Salário-Educação, preservando-se, entretanto, os objetivos de
redistribuição regional;
b) a aplicação direta do Salário-Educação deve se restringir
àquelas empresas (ou consórcios de empresas) que recolham acima
122
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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de um montante significativo a ser definido. Com isso, diminuiria
a malversação dos recursos no processo de compra de vagas em
escolas privadas;
c) para as contribuições abaixo do montante acima referido,
o recolhimento seria direto à agência responsável;
d) da parcela do Salário-Educação que será recolhida, metade
deve ser destinada às regiões carentes, a partir de políticas e
prioridades claramente definidas, mediante projetos e programas,
e não da forma clientelística que tem caracterizado sua
distribuição;
e) a outra metade seria repassada preferencialmente às
escolas da rede pública que, eventualmente, poderão ser indicadas
pelas próprias empresas que fazem o recolhimento;
f) os recursos do Salário-Educação devem ser destinados ao
ensino básico, incluindo assim o ensino de 2º Grau.
4.2.5. Sistema nacional de avaliaªo
No sistema atual, a qualidade das ações educativas só pode
ser estimada pelos dados globais que apontam os altos percentuais
de evasão e repetência e os baixos índices de conclusão do 1
º
Grau. Entretanto, tais informações são insuficientes para que se
conheça, do ponto de vista estritamente pedagógico, onde estão
situados os problemas, quais as escolas que desenvolvem um bom ou
um mau trabalho ou que aspectos curriculares precisam ser
revistos. Além disso, mesmo para aqueles que têm êxito no
sistema, isto é, que conseguem concluir cada grau que o compõe,
não se pode precisar se receberam o mesmo conjunto de
conhecimentos e se desenvolveram o mesmo nível de habilidades
intelectuais.
Estas dificuldades decorrem do fato de, no Brasil, não
existir nenhum mecanismo de avaliação da Educação, que permita
comparar o desempenho dos sistemas de ensino e das escolas que os
integram. Apesar de formalmente delimitada por uma legislação que
se caracteriza pelo excesso de detalhes, a ação educativa é, na
verdade, extremamente autônoma, na medida em que não presta
123
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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contas, nem às administrações superiores e muito menos à
população, e não é efetivamente cobrada pelos resultados que
apresenta.
De outro lado, a ausência de dados mais detalhados sobre a
qualidade do trabalho desenvolvidos em cada escola impede que se
premie as mais eficientes e que se contemple adequadamente
aquelas que necessitem de maior apoio para melhoria de seu
desempenho.
Não avaliar, ou não estabelecer um padrão mínimo, permite a
perpetuação de uma "escola pobre" para as populações pobres, o
que é sinônimo de precariedade e ineficiência. O discurso do
respeito às heterogeneidades e diversidade cultural tem levado a
uma prática que é de legitimação das desigualdades, com uma
escola tanto pior quanto mais carente e distante dos grandes
centros seja a região onde está localizada.
Assim, para a obtenção de melhores instrumentos, tanto para
a melhoria da gestão dos recursos alocados na Educação, quanto
para as propostas pedagógicas que visam a elevação da qualidade
do sistema educacional, propomos a implantação de um sistema
nacional de avaliação da educação básica, orientada pelas
seguintes ações:
a) definição de um padrão nacional de educação básica, com o
estabelecimento dos conteúdos e das habilidades intelectuais que
todos os alunos do ensino básico, em todo o país, devem ser
portadores, ao final da 4
ª
e 8
ª
séries do 1
º
Grau, e da 3
ª
série
do 2
º
Grau;
b) determinação, pelos sistemas estaduais e municipais, dos
conteúdos que devem ser acrescentados ao padrão nacional, para
atender às necessidades e peculiaridades regionais;
c) implementação de um projeto nacional de educação, com
critérios claros e rígidos para a liberação de recursos geridos
pelo MEC, a partir de projetos estaduais e municipais que
contemple a supervisão e o acompanhamento da execução, já no
contexto do sistema nacional de avaliação;
124
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
d) implantação de uma instância federal responsável pelos
exames nacionais, integrada por técnicos e professores dos
sistemas públicos, por especialistas em avaliação e por
representantes de segmentos da sociedade civil organizada
(sindicatos de trabalhadores, associações de pais de alunos,
etc.);
e) aplicação anual dos exames, com divulgação ampla dos
resultados e acompanhamento da evolução de cada sistema;
f) previsão, no orçamento do MEC, de recursos a serem
aplicados nos sistemas onde os resultados sejam negativos, a
partir de projetos elaborados e diretamente supervisionados pelo
MEC, visando a elevação da qualidade do ensino naqueles sistemas;
g) estruturação, no MEC/Delegacias Regionais, de equipes que
estarão encarregadas da supervisão dos sistemas estaduais e
municipais, compostas, em cada Estado, de técnicos e professores
das esferas federal, estadual e municipal; estas equipes
acompanharão tanto o trabalho desenvolvido nas escolas, como, nas
atividades globais das Secretarias de Educação, o volume e a
destinação real dos recursos vinculados;
h) a liberação, pelo MEC, de recursos complementares para os
sistemas educacionais estaduais e municipais estará condicionada
à execução e aos resultados obtidos nos projetos de melhoria do
sistema, assim como ao gasto efetivo, em Educação, do percentual
da receita líquida determinado por lei;
i) a avaliação final de cada sistema estadual ou municipal
levará em conta tanto os resultados dos exames nacionais quanto o
volume e a natureza dos gastos realizados;
j) a rede de escolas federais de 1
º
e 2
º
Graus também
integrará o universo a ser avaliado, tanto no desempenho
pedagógico quanto na eficácia da aplicação de recursos.
125
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
5. INDICADORES
5.1. Relaıes de Trabalho e Proteªo Social
a) Gerais
. Emprego (por qualificação, setor, tamanho do
estabelecimento);
. Desemprego (por tempo, sexo, idade, nível de
qualificação);
. Índice de salário real.
b) Empresas/Setores
. Pessoal ocupado na produção;
. Admissões/desligamentos na produção;
. Número de horas pagas na produção;
. Valor dos salários contratuais;
. Valor das horas extras pagas;
. Valor da folha de pagamento;
. Número de vínculos empregatícios por nível de escolaridade
e ocupação;
. Número de vínculos empregatícios rescindidos (por nível de
escolaridade e ocupação);
. Taxa de rotatividade;
. Programas de benefícios sociais (número e escopo);
. Formas de remuneração por resultados;
. Programas de Treinamento e Requalificação (número de
trabalhadores envolvidos, duração).
5.2. Educaªo e Qualificaªo
. Taxa de escolaridade (percentagem da população da faixa
etária matriculada no nível de ensino correspondente);
. Vagas por nível de ensino, área e tipo de estabelecimento;
. Taxas de evasão, repetência e conclusão, por nível de
ensino;
. Número de horas-aula/ano, por nível de ensino e área;
126
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
. Número de professores por área e nível de carreira;
. Índices de evolução salarial e de carreira;
. Número de estabelecimentos de formação de professores e
vagas correpondentes, por área;
. Número de pessoas e recursos envolvidos nos convênios
entre instituições de ensino e empresas, por área e nível de
ensino;
. Número de pessoas e recursos envolvidos em programas
tripartites de gestão de ensino técnico;
. Índices de acompanhamento dos programas de aplicação
direta dos recursos do salário-educação;
. Número de cursos profissionalizantes, por área, duração e
vagas.
127
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
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131
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
ANEXO
TABELA 1
GASTO SOCIAL FEDERAL CONSOLIDADO POR ÁREAS SOCIAIS
RECURSOS TOTAIS - PARTICIPAÇÃO NO PIB
1980-1991
(%)
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
ALIMENTAÇÃO SANEAMENTO EDUCAÇÃO HABITAÇÃO ASSISTÊNCIA
ANO E SAÚDE E PROTEÇÃO E E TRABALHO E
TOTAL
NUTRIÇÃO AO AMBIENTE CULTURA URBANISMO PREVIDÊNCIA
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
1980 0,06 1,76 0,33 0,89 1,14 0,04 5,04
9,25
1981 0,06 1,74 0,44 1,14 0,95 0,04 5,74
10,10
1982 0,08 1,72 0,38 1,11 0,95 0,04 5,81
10,09
1983 0,09 1,51 0,30 1,01 0,80 0,04 5,64
9,39
1984 0,10 1,53 0,18 0,95 0,46 0,03 4,69
7,94
1985 0,17 1,60 0,31 1,15 0,42 0,05 4,75
8,44
1986 0,22 1,57 0,25 1,45 0,34 0,06 4,83
8,73
1987 0,25 2,34 0,40 1,77 0,38 0,09 4,40
9,63
1988 0,24 2,32 0,38 2,05 0,70 0,09 4,71
10,49
1989 0,21 2,53 0,24 1,86 0,24 0,32 5,38
10,78
1990 0,26 2,35 0,25 1,43 0,27 0,98 5,99
11,52
1991 0,13 1,87 0,28 1,01 0,44 0,64 5,31
9,69
Média 1980-91 0,16 1,90 0,31 1,32 0,59 0,20 5,19
9,67
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Fonte: Conta Consolidada do Gasto Social, IPEA/IPLAN.
Notas: (1) Recursos do Tesouro: FPAS, FINSOCIAL, FGTS, FAS, e outras fontes.
(2) De 1980 a 1985 em Cr$ 1.000,00; de 1986 a 1988 em Cz$ 1.000,00; 1989 em NCz$; 1990 e 1991
em Cr$.
TABELA 2
ORÇAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL
DISTRIBUIÇÃO DAS FONTES DE RECURSOS POR MINISTÉRIO
1992
(%)
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
132
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
MINISTÉRIO DO ENCARGOS
FONTES TRABALHO E DA MINISTÉRIO MINISTÉRIO PREVIDENCIÁRIOS OUTROS
TOTAL
PREV. SOCIAL DA SAúDE AÇÃO SOCIAL DA UNIÃO
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
100 Recursos Ordinarios 0,58 16,08 8,50 26,33 23,44
7,23
151 Cont. sobre Lucro 0,00 3,55 0,24 39,35 0,00
4,87
153 FINSOCIAL 4,72 65,35 72,58 12,58 39,02
20,54
154 Cont. Empregadores e
Trabalhadores 74,19 0,00 0,00 0,00 0,00
47,05
122 Receita de Concursos de
Prognósticos 0,00 3,65 0,00 0,00 0,70
0,62
140 PIS/PASEP 15,58 0,00 0,00 0,00 0,00
9,88
156 Seguridade Social do
Servidor 0,00 0,00 0,00 15,17 0,00
1,65
Outros 4,93 11,37 18,68 6,58 36,85
8,16
TOTAL 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
100,00
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Fonte: Projeto de Lei Orçamentaria - 1992.
Elaboração: Assessoria Legislativa da Câmara dos Deputados.
133
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
TABELA 3
NÚMERO DE BENEFÍCIOS EM MANUTENÇÃO POR FAIXAS DE SALÁRIO MÍNIMO
E SEGUNDO ESPÉCIE DE BENEFÍCIO
1990
(%)
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
FAIXA DE URBANOS
SALÁRIO APOS. APOS. APOS. APOS. ABONO ABONO PENSÕES AUXÍLIOS
MÍNIMO VELH. T.SERVICO ESP. INVAL. 20% 25%
DOENÇA/ACIDENTE
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
0 - 1 59,54 10,77 6,39 71,63 55,11 24,93 72,38 83,28
1 - 2 19,56 14,72 13,89 15,78 27,43 30,60 12,27 11,12
2 - 3 8,79 14,14 17,79 5,99 8,04 18,33 6,51 3,12
3 - 5 6,94 22,80 29,91 4,18 8,99 21,27 5,71 1,67
5 - 7 2,76 15,50 14,65 1,53 0,39 4,23 2,21 0,61
7 - 10 2,14 18,27 14,81 0,75 0,04 0,51 0,61 0,19
10 - 15 0,27 3,46 2,44 0,13 0,01 0,11 0,20 0,01
15 - 20 0,01 0,20 0,10 0,02 0,00 0,01 0,08 0,00
20 + 0,00 0,13 0,03 0,00 0,00 0,01 0,05 0,00
TOTAL 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
FAIXA DE RURAIS
SALÁRIO APOSENT. APOSENT. PENSÃO PENSÃO APOS.INVAL. APOS.INVAL
TOTAL
MÍNIMO VELHICE VELHICE EMPREG. TRAB. EMPREG. TRAB.
EMPREG.RURAL TRAB.RURAL RURAL RURAL RURAL RURAL
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
0 - 1 63,27 100,00 88,49 100,00 73,96 100,00
72,53
1 - 2 27,47 0,00 7,41 0,00 21,98 0,00
10,00
2 - 3 3,60 0,00 2,25 0,00 1,80 0,00
5,34
3 - 5 3,95 0,00 1,47 0,00 1,52 0,00
5,87
5 - 7 1,29 0,00 0,32 0,00 0,56 0,00
2,98
7 - 10 0,37 0,00 0,03 0,00 0,16 0,00
2,70
10 - 15 0,04 0,00 0,03 0,00 0,02 0,00
0,51
15 - 20 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
0,04
20 + 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
0,03
TOTAL 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
100,00
134
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Fonte: IBMEC - Relatório de Pesquisa - Reformulação da Previdência Social do Brasil. Primeiro
Relatório: Previdência Social Brasileira: Evolução Recente e Perspectivas: RJ, novembro/91.
Fonte dos dados primários: síntese.
Apud: Comissão Especial para Estudo do Sistema Previdenciário - Relatório Final.
Relator: Deputado Antonio Britto.
135
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
TABELA 4
DIFERENCIAIS DE CRESCIMENTO DOS GASTOS SOCIAIS
Diferença entre as taxas de crescimento do PIB em termos reais e
as taxas de crescimento das despesas sociais
(incluída Educação) em termos reais
1960-1981
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
DISCRIMINAÇÃO 1960-1975 1975-
1981
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Países que diminuiram os gastos:
RFA +3,2 -
0,6
Países Baixos +6,0 -
0,4
Canadá +4,2 -
0,2
Estados Unidos +4,6 0
Noruega +5,8
+0,5
Reino Unido +3,3
+0,8
Suíça +4,2 +1
Países que diminuiram parcialmente os gastos:
Itália +3,1
+1,9
Japão +4,2
+3,7
Suécia +3,9
+3,7
Países que aumentaram os gastos:
Nova Zelândia +1,5
+3,1
França +2,3
+3,4
Grécia +1,8
+5,4
Bélgica +4,8
+5,7
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Fonte: OECD (1985), apud: Dumont (1987).
136
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
TABELA 5
AUMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS EM PAÍSES SELECIONADOS
1970-1987
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
1970 1974 1984 de 1974 a 1984
1987
PAÍS --------------------------------------- (pontos)
(%)
(em porcentagem) (*)
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Áustria 33,8 35,0 43,1 8,1
42,3
França(1) 35,0 35,2 42,0 6,8
43,3
Suécia(2) 18,5 18,3 31,0 12,7
32,1
Hungria - 25,0 40,0 15,0
49,0
Países Baixos - 32,3 34,7 2,4
33,1
EUA(1) 9,6 11,7 14,0 2,3
14,3
Japão(3) 13,2 15,3 19,1 3,8
21,6
Alemanha(RFA) 26,5 29,5 34,5 5,0
34,1
Reino Unido - 14,0 19,5 5,5
19,5
Portugal 23,0 23,5 29,0 5,5
35,5
------------------------------------------------------------------------------------------------------
-----
(*) % das receitas da seguridade.
(1) Não inclui as contribuições para o Seguro-desemprego.
(2) Excluídas contribuições obrigatórias para creches, garantia de salários e educação.
(3) Excluídas contribuições obrigatórias para programas de trabalho.
137
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
TABELA 6
FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL EM PAISES SELECIONADOS
1960-1984
(%)
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
DISCRIMINAÇÃO PAGAMENTOS PAGAMENTOS
PODERES
ASSEGURADOS EMPREGADORES
PÚBLICOS
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
País com financiamento público
Dinamarca
1960 14,9 10,6
51,5
1980 1,8 6,0
58,0
1984 4,0 10,4
78,1
Países com financiamento misto
Reino Unido
1960 20,0 17,9
53,4
1980 15,8 26,5
48,3
1985 24,3 25,3
49,2
Alemanha (RFA)
1960 25,9 44,4
25,0
1980 34,0 34,2
28,5
1984(ass.) 29,8 40,5
26,3
Países com financiamento tipo ass.
EUA
1960 21,8 34,9
24,2
1980 23,4 40,4
21,4
França
1960 15,6 62,9
15,3
1980 20,9 53,4
20,9
1984 24,5 51,9
20,0
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Fonte: Dumont (1987).
138
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
TABELA 7
BRASIL - CUSTOS LABORAIS SOBRE O TRABALHO
1992
(%)
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
DISCRIMINAÇÃO CUSTOS EM
PORCENTAGEM
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
GRUPO A
Seguridade Social 20,00
FGTS 8,00
Salário Educação 2,50
SESI 1,70
SENAI 1,40
INCRA 0,20
Seguro Contra Acidentes 2,00
Total 35,80
GRUPO B
Férias 9,42
Abono de Férias 3,62
Descanso Remunerado 18,04
Feriados 3,99
Gratificação de Natal 10,87
Total 46,74
Incidência de A em B 16,73
Incidência do INSS sobre Gratificação de Natal 2,17
TOTAL GERAL 101,44
------------------------------------------------------------------------------------------------------
------
Fonte: Cacciamali (1992).
Observações: os ítens do Grupo B foram calculados sob a hipótese de 276 dias produtivos, 52 domingos,
12 dias feriados, sendo que um feriado cai no domingo; foram consideradas as seguintes provisões:
auxílio enfermidade, auxilio paternidade, aviso prévio e rescisões contratuais.
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