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Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP
Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - PADCT
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE
DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
_____________________________________________________________________________________________
COMPETITIVIDADE, EDUCAÇÃO E
QUALIFICAÇÃO
Nota Técnica Temática do Bloco
"Condicionantes Sociais da Competitividade"
O conteúdo deste documento é de
exclusiva responsabilidade da equipe
técnica do Consórcio. Não representa a
opinião do Governo Federal.
Campinas, 1993
Documento elaborado pelos consultores Azuete Fogaça e Cláudio L. Salm (Instituto de Economia Industrial - UFRJ).
A Comissão de Coordenação - formada por Luciano G. Coutinho (IE/UNICAMP), João Carlos Ferraz (IEI/UFRJ), Abílio dos Santos
(FDC) e Pedro da Motta Veiga (FUNCEX) - considera que o conteúdo deste documento está coerente com o Estudo da Competitividade da Indústria
Brasileira (ECIB), incorpora contribuições obtidas nos workshops e servirá como subsídio para as Notas Técnicas Finais de síntese do Estudo.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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CONSÓRCIO
Comissão de Coordenação
INSTITUTO DE ECONOMIA/UNICAMP
INSTITUTO DE ECONOMIA INDUSTRIAL/UFRJ
FUNDAÇÃO DOM CABRAL
FUNDAÇÃO CENTRO DE ESTUDOS DO COMÉRCIO EXTERIOR
Instituições Associadas
SCIENCE POLICY RESEARCH UNIT - SPRU/SUSSEX UNIVERSITY
INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL - IEDI
NÚCLEO DE POLÍTICA E ADMINISTRAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA - NACIT/UFBA
DEPARTAMENTO DE POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA - IG/UNICAMP
INSTITUTO EQUATORIAL DE CULTURA CONTEMPORÂNEA
Instituições Subcontratadas
INSTITUTO BRASILEIRO DE OPINIÃO PÚBLICA E ESTATÍSTICA - IBOPE
ERNST & YOUNG, SOTEC
COOPERS & LYBRAND BIEDERMANN, BORDASCH
Instituição Gestora
FUNDAÇÃO ECONOMIA DE CAMPINAS - FECAMP
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EQUIPE DE COORDENAÇÃO TÉCNICA
Coordenação Geral: Luciano G. Coutinho (UNICAMP-IE)
João Carlos Ferraz (UFRJ-IEI)
Coordenação Internacional: José Eduardo Cassiolato (SPRU)
Coordenação Executiva: Ana Lucia Gonçalves da Silva (UNICAMP-IE)
Maria Carolina Capistrano (UFRJ-IEI)
Coord. Análise dos Fatores Sistêmicos: Mario Luiz Possas (UNICAMP-IE)
Apoio Coord. Anál. Fatores Sistêmicos: Mariano F. Laplane (UNICAMP-IE)
João E. M. P. Furtado (UNESP; UNICAMP-IE)
Coordenação Análise da Indústria: Lia Haguenauer (UFRJ-IEI)
David Kupfer (UFRJ-IEI)
Apoio Coord. Análise da Indústria: Anibal Wanderley (UFRJ-IEI)
Coordenação de Eventos: Gianna Sagázio (FDC)
Contratado por:
Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
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Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - PADCT
COMISSÃO DE SUPERVISÃO
O Estudo foi supervisionado por uma Comissão formada por:
João Camilo Penna - Presidente Júlio Fusaro Mourão (BNDES)
Lourival Carmo Mônaco (FINEP) - Vice-Presidente Lauro Fiúza Júnior (CIC)
Afonso Carlos Corrêa Fleury (USP) Mauro Marcondes Rodrigues (BNDES)
Aílton Barcelos Fernandes (MICT) Nelson Back (UFSC)
Aldo Sani (RIOCELL) Oskar Klingl (MCT)
Antonio dos Santos Maciel Neto (MICT) Paulo Bastos Tigre (UFRJ)
Eduardo Gondim de Vasconcellos (USP) Paulo Diedrichsen Villares (VILLARES)
Frederico Reis de Araújo (MCT) Paulo de Tarso Paixão (DIEESE)
Guilherme Emrich (BIOBRÁS) Renato Kasinsky (COFAP)
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José Paulo Silveira (MCT) Wilson Suzigan (UNICAMP)
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SUM`RIO
RESUMO EXECUTIVO .......................................... 1
INTRODUÇÃO: EDUCAÇÃO E PRODUTIVIDADE SISTÊMICA ............ 30
1. TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS .............................. 35
2. A SITUAÇÃO BRASILEIRA .................................. 41
2.1. A Educação Geral .................................. 41
2.1.1. Breve diagnóstico .......................... 41
2.1.2. Educação e políticas compensatórias ........ 44
2.1.3. A gestão do sistema educacional ............ 46
2.1.4. A deterioração do sistema educacional ...... 49
2.1.5. A situação do Magistério: qualificação e
remuneração ................................ 53
2.1.6. O financiamento da educação ................ 56
2.2. A Formação Profissional ........................... 61
2.3. A Participação do Empresariado .................... 70
2.4. A Participação dos Trabalhadores .................. 75
3. PROPOSTAS DE AÇÕES PRIORITÁRIAS ........................ 78
3.1. Magistério ........................................ 79
3.2. Melhoria do Ensino Básico ......................... 81
3.3. Ensino Superior ................................... 83
3.4. Qualificação Profissional ......................... 85
3.5. Financiamento do Ensino Básico .................... 87
3.6. Sistema Nacional de Avaliação ..................... 89
4. INDICADORES ............................................ 92
BIBLIOGRAFIA .............................................. 93
NTR
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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RESUMO EXECUTIVO
1. INTRODU˙ˆO E TEND˚NCIAS INTERNACIONAIS
No contexto dos condicionantes sociais do processo de
reestruturação produtiva, a questão dos recursos humanos tem tido
grande destaque, na medida em que se reconhece a emergência de
novos perfis ocupacionais e de profundas transformações na
organização do trabalho, que implicam uma maior participação dos
trabalhadores nas decisões da empresa.
Estes novos requisitos decorrem de aspectos que caracterizam
o atual processo de desenvolvimento tecnológico e que mudam o
próprio conceito de capacitação tecnológica. Diferentemente do
que ocorre na automação eletro-mecânica - onde a simples adoção
de "pacotes tecnológicos", ou de conjuntos de equipamentos de
última geração, era suficiente para atualizar tecnologicamente
uma empresa e lhe assegurar maior produtividade (ganhos de
escala) - hoje, o alcance de maior competitividade de uma
indústria não depende exclusivamente do uso de equipamentos e
sistemas informatizados. Isto porque não se trata apenas de
adotar inovaıes mas, principalmente, de ser capaz de gerar
inovaıes .
A capacitação tecnológica, ou seja, a condição da empresa
criar inovações, não está restrita ao pessoal diretamente
envolvido em P&D. A produção, à medida em que diminui o trabalho
direto, incorpora atividades mais abstratas que habilitam o
trabalhador a colaborar no aperfeiçoamento e na geração de
inovações de produtos e de processos.
Ao contrário do que ocorre nos perfis e requisitos
ocupacionais da automação rígida, no conjunto de requisitos que
agora emerge, diminui sensivelmente a importância da habilidade
manual, e o melhor desempenho diz respeito principalmente ao
2
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conhecimento mais amplo do processo de trabalho, a uma atitude
cooperativa e ao uso de habilidades intelectuais que são produtos
da Educação Geral, ou seja, do conjunto de conteúdos das
diferentes áreas do conhecimento que compõem os currículos do
ensino básico regular, voltados para o desenvolvimento pleno das
capacidades/potencialidades dos indivíduos.
Essas novas expectativas quanto ao desempenho e à
participação da força de trabalho levaram à valorização de alguns
ítens básicos, que devem estar presentes nos perfis ocupacionais,
independentemente da área de "especialização" do trabalhador
direto.
No caso específico do trabalhador direto, a complexificação
das tarefas tradicionais, o grau de abstração das novas tarefas
e, ainda, a participação adequada nas novas formas de gestão, ao
invés de prescindir de maiores níveis de escolaridade, como
ocorre nos processos tayloristas, pressupõem a escolaridade
básica completa (no caso brasileiro, a conclusão do 2º Grau), o
que corresponde à posse dos conhecimentos necessários à geração
de inovações ao nível do chão-da-fábrica.
Entretanto, estas não são as únicas diferenças entre os dois
tipos de organização da produção, no que se refere às mudanças no
processo de trabalho e seus impactos sobre o perfil e a
qualificação dos recursos humanos. Um elemento fundamental das
novas formas de automação é a flexibilidade.
A automação flexível leva ainda à construção do conceito de
competitividade nacional, a partir do qual a discussão em torno
da reestruturação produtiva envolve necessariamente diversos
aspectos da vida nacional.
Com isto, flexibilidade e competitividade nacional conduzem
a um terceiro conceito, também fundamental: o de produtividade
sistŒmica, que implica a visão e o tratamento articulados das
questões sociais e econômicas, de aspectos de infra-estrutura,
3
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etc., como precondição ao sucesso de um projeto de reestruturação
produtiva. Para o que nos interessa aqui - a relação entre
Educação e Qualificação Profissional - significa que os desafios
relativos à formação de uma mão-de-obra adequada aos novos
requisitos ocupacionais estão contidos numa problemática bem mais
ampla e complexa, que é a crise do sistema educacional
brasileiro.
Se a meta é uma maior produtividade sistêmica, o que se deve
buscar, no que se refere à Educação, é a elevação do nível de
escolaridade da população como um todo, e não apenas daqueles
que, nesta ou naquela empresa, neste ou naquele setor, estarão
mais diretamente envolvidos com as novas tecnologias.
Diferentemente das soluções típicas do fordismo, os problemas de
qualificação do trabalhador direto não se resolvem mais por
tentativas isoladas ou setoriais e nem pelo atendimento apenas
parcial da população em idade escolar.
Na experiência internacional, naquilo que se refere à
qualificação de recursos humanos de acordo com os novos
requisitos, é interessante destacar aqui três situações
distintas: em primeiro lugar, aqueles países que já possuíam bons
sistemas de educação básica, como por exemplo a Alemanha e o
Japão. Destes, o que importa registrar são as formas de
articulação entre Educação, Qualificação e Sistema Produtivo. Em
segundo lugar, países como os Estados Unidos, que enfrentam
problemas muito semelhantes aos nossos na área da educação
básica. E, finalmente, os late comers, em particular os "tigres
asiáticos", que foram capazes de reverter, num prazo
relativamente curto, um quadro educacional mais dramático do que
o nosso atual.
Na Alemanha, outro exemplo de dinamismo tecnológico, o
sistema educacional articula-se de uma outra forma com o sistema
produtivo. O essencial desta experiência é que, tradicionalmente,
existe estreita cooperação entre a escola e a empresa, com papéis
claramente definidos: às escolas, cabe a transmissão dos
4
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conteúdos de educação geral; às empresas, a responsabilidade pela
aplicação dos conhecimentos técnico-científicos relacionados à
habilitação específica.
Assim, diferentemente do dualismo de inspiração norte-
americana, onde o sistema educacional se divide em redes
escolares com finalidades e conteúdos distintos, o caráter dual
do sistema educacional alemão reside atualmente no fato de que a
escola pode, ou não, estar articulada com as empresas em
programas de habilitação profissional, sem que isto implique
conteúdos curriculares diferenciados.
Este modelo resulta na total responsabilidade das empresas,
no que se refere aos encargos técnicos e financeiros da
qualificação profissional, ainda que estes transcendam às suas
necessidades imediatas. A perspectiva é de uma qualificação geral
da mão-de-obra e os gastos envolvidos são assumidos como
investimento, que trarão retornos a longo prazo para o setor
produtivo como um todo. Nesse processo, "as Federações das
indústrias, na Alemanha, freqüentemente assumem o papel de
'agentes do interesse pœblico' em relação às empresas que se
opõem ao custo do treinamento"
1
. No caso das pequenas e médias
empresas, a tendência é de criação de núcleos de qualificação
profissional, mantidos conjuntamente - empresas do setor,
sindicatos de trabalhadores e governo - e distribuídos pelas
várias regiões do país.
Assim, o que as empresas alemãs esperam do sistema
educacional é que este forneça aos seus alunos um conjunto de
conhecimentos que será a base da formação específica para aqueles
que demandem qualificação profissional de nível médio. Para
tanto, nas escolas que equivalem ao nosso 2º Grau, as grades
curriculares em vigor se compõem de disciplinas de conteúdo
geral, como a língua alemã, línguas estrangeiras, História Geral,
Filosofia, Geografia, Política, Matemática, Sociologia, Artes,
1
MAHNKOPF, B. (1993) "The 'Skill-oriented' - Estrategies of German Trade Unions: Their Impact on
Efficiency and Equality Objectives" - British Journal of Industrial Relations, publicado na
revista Política Industrial, nº3. SP, IEDI, jan.
5
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Química, Física, Música, Latim e Biologia. A este conjunto de
disciplinas pode ser incorporado o estágio profissional, com o
aprofundamento dos conhecimentos mais estreitamente voltados para
a habilitação específica, assim como a disciplina Informática,
que é opcional
2
.
A experiência alemã também envolve o atendimento aos jovens
- na faixa de 15 anos de idade - que abandonam os estudos antes
de completarem o ensino básico (o 2º Grau) e, por isso, não têm
acesso às oportunidades de qualificação profissional oferecidas
pelo sistema de ensino regular em cooperação com as empresas.
Para eles, oferece-se então a aprendizagem de ofcios , em cursos
mantidos por um programa de cooperação entre o governo e
sindicatos de empresas, com duraªo de trŒs anos
3
.
Apoiados numa tradição que remonta à Idade Média, da
transmissão de um ofício de uma geração para a próxima, estes
cursos abrangem desde a formação de eletricistas e mecânicos de
automóveis, até ofícios mais tradicionais, como confeiteiros e
sail-makers
4
, oferecendo remuneração (US$ 400 a US$ 600 mensais)
e, mais importante ainda, a garantia de emprego, já que os que
passam por eles são reconhecidos como profissionais não só pela
população mas, principalmente, pelos empregadores.
Ainda na experiência alemã, cabe falar na atuação sindical.
Os sindicatos de trabalhadores já possuem larga tradição de
negociação numa perspectiva que se caracterizaria mais pela
cooperação do que pelo antagonismo, em relação aos empregadores.
"Com isto, a política sindical tem como base o 'apoio negociado'
aos esforços de modernização das empresas do país." Nas
negociações coletivas, ao lado das cláusulas que garantem
direitos já adquiridos em negociações anteriores, acrescentam-se
aquelas que visam proteger os trabalhadores de eventuais efeitos
negativos da modernização, principalmente um possível desemprego.
2
IEDI (1992) A Nova Relação Entre Competitividade e Educação: Estratégias Empresariais. SP, jan.
3
FISHER, M. (1992) "Finding Out How Germany Works" - artigo publicado no Herald Tribune, Hong
Kong, 19/10/1992 (artigo transcrito do Washington Post).
4
Veleiro, aquele que faz velas para barcos.
6
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Existe também uma grande preocupação com um processo crescente de
"heterogeneização" dos interesses de trabalhadores, ou seja, com
a multiplicidade de situações ou de fatores internos às empresas,
de acordo com suas estratégias específicas de produção, que
resulta em agendas de reivindicações específicas dos
trabalhadores em cada empresa, o que pode comprometer a eficácia
dos acordos coletivos firmados.
Os esforços dos norte-americanos para superar suas notórias
deficiências no ensino básico, consideradas hoje uma verdadeira
ameaça à sua liderança econômica, concentram-se nos seguintes
aspectos: a) revalorização do sistema público de educação geral e
não mais do ensino vocacional; b) envolvimento das empresas com a
melhoria do desempenho pedagógico nas redes públicas do ensino
básico, particularmente aquelas que atendem aos segmentos mais
problemáticos da população; c) apoio das empresas aos programas
inovadores que visem atingir prioritariamente aos que tendem ao
fracasso escolar; d) a repetência é condenada por sua ineficácia
e por seus efeitos negativos sobre a auto-estima, e é vista como
principal causa da evasão escolar; e) embora se ofereça ensino
supletivo aos mais velhos, o objetivo maior é o de dotar a
população mais jovem, alvo dos programas especiais, de condições
para se reintegrar ao fluxo regular do sistema educacional"
(IEDI, 1992).
A definição destes objetivos baseia-se no reconhecimento de
que a raiz dos problemas de desempenho do operariado norte-
americano está na pouca escolaridade de um grande grupo, e na má
qualidade da educação básica, principalmente nas escolas que
atendem às populações mais carentes e mais sensíveis aos grandes
problemas sociais - as drogas, por exemplo. Para estes grupos,
estão propostas estratégias supletivas de ensino que, entretanto,
buscam levar o jovem a um patamar de conhecimentos que lhe
permita reingressar no sistema regular de ensino, para que
complete sua escolaridade no tempo adequado ao conjunto de
conhecimentos necessários tanto a um bom desempenho profissional,
como a uma maior integração social. Assim, o que se depreende das
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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propostas norte-americanas para o enfrentamento da questão da
qualificação dos recursos humanos é que elas não priorizam, como
tradicionalmente se fez até aqui, as soluções de curto prazo, os
cursos rápidos e intensivos. Ao contrário, elas vão na direção da
valorização do ensino regular e da recuperação dos sistemas de
ensino.
Entretanto, há uma preocupação especial com os trabalhadores
mais antigos, considerados importantes para a empresa pela enorme
experiência que possuem, mas que são praticamente analfabetos.
Para estes, de quem já não se deve esperar o reingresso na escola
regular, as grandes empresas norte-americanas estão incentivando
a oferta de cursos supletivos nos sistemas públicos de ensino,
visando principalmente o domínio da leitura e da escrita, no
sentido de requalificá-los de acordo com as novas exigências
tecnológicas.
O caso dos países asiáticos é particularmente importante
para a situação brasileira, pois mostra que, sem apelar para
soluções de curto prazo, ou para medidas paliativas, como
campanhas de alfabetização ou cursos intensivos
profissionalizantes, lograram, num espaço de 10 a 20 anos,
praticamente universalizar um ensino básico de qualidade. O
exemplo mais significativo é o da Coréia que, até o início dos
anos 70, tinha um desempenho educacional pior do que o nosso
atual. Em 15 anos de investimento no sistema público, inclusive
na formação e remuneração dos professores, o analfabetismo adulto
foi reduzido a taxas insignificantes, foi universalizado o ensino
fundamental e, no nível médio, o sistema atende, hoje, a cerca de
90% da população de 15 a 19 anos.
Em síntese, do conjunto das experiências aqui analisadas
observa-se que as soluções passam sempre pelo ensino público,
pela valorização e boa remuneração do magistério e, ainda, por
mecanismos nacionais de avaliação. Quanto ao ensino pós-
secundário, observa-se um grande leque de opções não-
universitárias, o que, entretanto, ocorre mais facilmente em
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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países onde o credencialismo não se manifesta em diferenciais tão
marcantes quanto os nossos. Outro aspecto fundamental a destacar
é a importância dos mecanismos de cooperação - empresas, governo
e sindicatos - em função da recuperação ou da reestruturação dos
sistemas educacionais. Nesses mecanismos, além da repartição de
responsabilidades, há também o investimento financeiro das partes
envolvidas, na perspectiva da obtenção de resultados amplos, que
favoreçam à sociedade como um todo.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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2. DIAGNSTICO DA SITUA˙ˆO BRASILEIRA
Verifica-se, no Brasil, uma mudança significativa na
percepção das questões relativas à formação da mão-de-obra. De
fato, até o final dos anos 70, os problemas de qualificação não
configuravam um fator restritivo à expansão de um parque
industrial moderno e competitivo. Assim, mesmo contando com um
sistema educacional pouco eficiente, o Brasil pôde desenvolver
sua economia sem maiores problemas para a incorporação de
trabalhadores à produção industrial.
Este panorama vem se alterando radicalmente, e hoje as
pesquisas revelam, invariavelmente, que a questão da qualificação
da mão-de-obra é percebida como um dos maiores obstáculos na
busca da competitividade.
As evidências neste sentido estão, por exemplo, na pesquisa
realizada em 1992 pela Confederação Nacional da Indústria (CNI),
na qual o item "nível educacional dos empregados" foi apontado
como o segundo mais importante dentre os fatores que dificultam a
elevação da qualidade e da produtividade, perdendo apenas para a
falta de recursos financeiros para investimento em modernização.
Pesquisa da CEPAL junto às empresas brasileiras de capital
estrangeiro indicou a "qualidade dos trabalhadores não-
qualificados" como um dos aspectos mais negativos em relação ao
padrão das empresas líderes no comércio mundial.
Ainda na pesquisa da CEPAL, e na suposição de que o país
volte a crescer, 95,9% das empresas consultadas prevêem que o
item "Recursos Humanos", ao lado de "medidas ambientais" e
"organização/management", deverá ser objeto de investimentos
muito mais altos do que aqueles realizados nos anos 80. Sobre as
fontes de competitividade no futuro, pesquisa do IEI/UFRJ (Miles
et alii) verificou a unanimidade, entre as empresas pesquisadas,
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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na indicação de "Recursos Humanos Qualificados" dentre os fatores
considerados "muito importantes"
5
.
De fato, o perfil de escolaridade da população brasileira
está muito aquém do que se aponta como necessário ao sucesso da
reestruturação produtiva. A grande maioria possui conhecimentos
que equivalem às quatro primeiras séries do 1º Grau, além da
existência de cerca de 15 milhões de analfabetos adultos. Até o
final da década passada, 38% dos trabalhadores brasileiros
possuíam no máximo o antigo curso primário completo (4ª série do
1º Grau) e apenas 15,4% tinham concluído o 2º Grau. Na indústria
de transformação, o quadro é mais grave: somente 7,4% possuíam o
2º Grau completo e 50% tinham no máximo a escolaridade
equivalente ao antigo curso primário
6
.
Sob este aspecto, cabe fazer algumas considerações sobre os
sistema educacional brasileiro. Pouco adianta discutir se os seus
resultados apresentam ou não alguma melhoria nas duas últimas
décadas. Dependendo da leitura e interpretação dos dados, pode-se
até mesmo detectar alguns avanços. O problema, entretanto, está
na distância que ainda nos separa daquele que seria um perfil
educacional adequado, o que torna essa discussão inócua.
Mesmo comparado a países sabidamente menos desenvolvidos, o
desempenho educacional brasileiro mostra-se bastante precário,
não chegando a se igualar ao da Bolívia e do Paraguai e sendo
superior apenas ao do Suriname.
Ainda que deixemos de lado a população de 7 a 14 anos que
não está na escola - contingente estimado em torno de 4 milhões
de crianças -, hoje, das quase 26 milhões que freqüentam a
escola de 1º Grau, cerca de 15 milhões estão fadadas ao fracasso,
5
CEPAL (1992) "Transnational Corporations and Industrial Modernization in Brazil". Santiago,
out.; CNI (1992) "Estado Atual da Gestão Pela Qualidade e Produtividade nas Indústrias
Brasileiras". Rio de Janeiro; MILES, I., RUSH, H. & FERRAZ, J.C. (1991) "Tendências e
Implicações do Uso de Inovações Modernizantes no Brasil". Nova Economia, 2(2). Belo Horizonte,
Depto. de Ciências Econômicas/UFMG, nov.
6
Dados extraídos de CARVALHO, R.Q. (1992) Projeto de Primeiro Mundo com Conhecimento e Trabalho
de Terceiros. Campinas, DPCT/IG/UNICAMP (Texto para Discussão, 12).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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e pelo menos 10 milhões delas sequer concluirão a quarta série -
o antigo curso primário.
Este quadro negativo tem alguns agravantes: a falta de
manutenção levou a rede física a um tal nível de deterioração,
que pelo menos a metade dela (cerca de 90.000 escolas) funciona
em condições precárias, necessitando urgentemente de recuperação.
No que se refere aos recursos pedagógicos, não conseguimos sequer
universalizar o quadro-negro, o mais elementar deles.
Ao lado da precariedade das condições de trabalho, a
deterioração dos cursos de formação de professores encaminhou
para o sistema educacional, principalmente para o ensino
elementar, professores que simplesmente não dispõem da
competência técnico-pedagógica necessária para pelo menos
alfabetizar os milhões de crianças que entram no sistema. E, como
se sabe, a baixa remuneração, além de desestimular os que já
estavam em exercício, afastou da carreira do magistério os
melhores alunos dos ensinos médio e superior.
Paralelamente, embora a maioria da clientela dos sistemas
públicos seja hoje de crianças vindas dos segmentos de mais baixa
renda, existe um contingente mais carente que merece ser
destacado. Para este, a permanência na escola por 3 ou 4 anos,
sem que isto signifique qualquer aquisição de conhecimento e nem
mesmo uma alfabetização completa, representa um custo
insuportável, principalmente se levarmos em conta o que deixam de
ganhar, mesmo em atividades informais de baixa remuneração, em
troca da freqüência a uma escola que não demonstra a menor
competência para cumprir suas funções básicas.
Este quadro crítico leva à conclusão de que, para enfrentar
as questões educacionais mais importantes, seria necessário um
enorme volume de recursos, maior do que o que atualmente se aloca
à educação básica. Entretanto, se o gasto atual, que não é pouco,
é desperdiçado pelo elevado fracasso escolar, estamos mantendo um
"barato que sai caro" e que, agora, além das já conhecidas
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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repercussões sociais, tem um impacto significativo na
reestruturação produtiva.
Reconhece-se, hoje, que a grande lacuna, no caso do
trabalhador brasileiro, é de basic-skills, isto é, de
competências básicas, e não de habilidades passíveis de serem
adquiridas em treinamentos operacionais. Em outras palavras, os
problemas hoje identificados dizem respeito a
habilidades/competências que decorrem da ausência de uma base de
educação geral, ao contrário do que ocorria há vinte anos atrás.
Assim, os problemas da qualificação profissional estão agora
contidos numa problemática bem mais ampla e complexa, que é a
crise do sistema educacional brasileiro.
Se a meta é uma maior produtividade sistêmica, o que se deve
buscar, no que se refere à Educação, é a elevação do nível de
escolaridade da população como um todo, e não apenas daqueles
que, nesta ou naquela empresa, neste ou naquele setor, estarão
mais diretamente envolvidos com as novas tecnologias.
Diferentemente das soluções típicas do fordismo, os problemas de
qualificação do trabalhador direto não se resolvem mais por
tentativas isoladas ou setoriais e nem pelo atendimento apenas
parcial da população em idade escolar. O eventual sucesso de
ações tópicas não obscurece o fato, mundialmente comprovado, de
que o mais racional e eficaz é o investimento e a colaboração com
os sistemas públicos de ensino.
A crise educacional brasileira afeta a economia como um
todo, e desta perspectiva deve ser enfrentada. Ainda que as
sabidas heterogeneidades do país e do próprio setor produtivo
venham a permanecer, não podem servir de argumento a favor da
continuidade do caráter desigual e seletivo que marcou até aqui o
sistema educacional brasileiro.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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3. PROPOSTAS DE A˙ES PRIORIT`RIAS
A multiplicidade de questões que decorrem da análise do
panorama educacional brasileiro torna necessária a determinação
de prioridades de ação, que deverão orientar o tratamento da
relação entre Educação e Qualificação Profissional, de acordo com
os novos padrões de competitividade global.
A determinação destas prioridades ocorre a partir de seis
recomendações básicas:
1) No que se refere aos recursos humanos, o maior problema
da indústria brasileira, como todas as pesquisas mostram, é a
baixa escolaridade dos trabalhadores, o que resulta em
dificuldades de adaptação aos novos requisitos, mesmo quando se
trata de treinamentos operacionais.
2) É preciso que se estabeleçam novas formas de articulação
entre o sistema produtivo e o sistema educacional, visando,
simultaneamente, a elevação da escolaridade da população e a
qualificação dos recursos humanos.
3) Estas novas formas de articulação devem privilegiar a
repartição de responsabilidades entre escola e empresa. O Estado,
através dos sistemas públicos de ensino, deve se dedicar à
universalização da educação básica - ensino de 1º e 2º Graus de
educação geral, que é a base da qualificação. As empresas devem
assumir a qualificação da mão-de-obra em geral - operários e
técnicos de nível médio, através de parcerias, de suas
associações setoriais ou regionais e, inclusive, com a
participação de sindicatos de trabalhadores.
4) A qualificação profissional diz respeito, agora, à posse
de uma escolaridade básica, de educação geral. Nesse sentido, as
empresas, diretamente ou através de suas instituições educativas
(SESI, SESC) e de formação profissional (SENAI e SENAC), devem
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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oferecer oportunidades de ensino supletivo de educação geral aos
trabalhadores adultos semiqualificados e de pouca escolaridade,
que encontram problemas para o retorno à rotina escolar.
5) Os recursos públicos vinculados por lei à Educação devem
financiar a educação geral - o ensino regular de 1º e 2º Graus -,
enquanto os gastos com a qualificação, incluindo a formação
específica oferecida nos cursos técnicos de 2º Grau, deverão ser
assumidos pelas empresas.
6) Os sindicatos de trabalhadores devem participar da gestão
das instituições de formação profissional, especialmente no que
se refere à implantação de programas de requalificação da mão-
de-obra, bem como do sistema regular de educação básica, visando
a elevação do nível de escolaridade de jovens e adultos,
trabalhadores ou não.
A partir destas recomendações básicas, as prioridades de
ação são as que se seguem.
3.1. MagistØrio
A melhoria da qualidade do ensino básico está diretamente
relacionada à qualidade do trabalho pedagógico; embora a questão
da qualidade esteja relacionada a outras variáveis, a ação do
professor é decisiva para o sucesso de qualquer projeto de
melhoria do ensino básico.
Formaªo de professores
Boa parte do mau desempenho dos professores se deve à má
qualidade da formação que recebem. Assim, no que se refere aos
cursos de formação para o magistério, tanto de nível médio quanto
as Licenciaturas oferecidas pelas Universidades, propomos:
a) extinção dos atuais cursos de Habilitação ao Magistério;
b) recriação das redes estaduais de Escolas Normais;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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c) reformulação dos Cursos de Pedagogia, visando a formação
de professores-alfabetizadores e o desenvolvimento de pesquisas
de novos métodos e técnicas pedagógicas para o Ensino
Fundamental;
d) criação de poucas e boas Escolas Normais Superiores, para
a formação e o aperfeiçoamento de professores dos Cursos de
Licenciatura;
e) descentralização dos cursos de Licenciatura, de modo que
cada Instituto ou Faculdade, nas áreas de conhecimento e
disciplinas que compõem o currículo do ensino básico, ofereça a
formação pedagógica ao longo de todo o curso de graduação;
f) apoio, nas Universidades, aos cursos de Ciências Básicas
(Matemática, Física, Química e Biologia) e das Ciências
Humanas/Sociais que oferecem Licenciaturas, visando a melhoria
da formação dos professores do ensino de 1º e 2º Graus nas
disciplinas dessas áreas;
g) revalorização da Prática de Ensino nos Colégios de
Aplicação e nos Cursos Normais, com ênfase nos métodos e técnicas
mais adequados às necessidades e características dos segmentos
mais problemáticos da clientela do ensino básico.
Reciclagem de professores
A média de idade do atual contingente de professores do
ensino básico ainda é bastante baixa, o que significa a
permanência dos mal formados e dos não-qualificados no sistema
por mais uma década e meia, em média. No sentido de compensar a
má formação recebida e contribuir para a melhoria do desempenho
em sala de aula, devem ser desenvolvidas as seguintes ações:
a) fortalecimento dos Centro de Formação e Aperfeiçoamento
do Magistério (CEFAM), para atividades permanentes de atualização
e retreinamento de professores do ensino básico, em programas
vinculados às Universidades públicas;
b) expansão das atividades de Extensão Universitária
voltadas para a reciclagem de professores do ensino básico, tanto
nos aspectos pedagógicos, quanto na atualização dos conteúdos das
disciplinas que lecionam;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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c) criação de mecanismos de incentivo à reciclagem e
atualização permanente (bolsas, progressão funcional, etc.).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Revalorizaªo da carreira
A carreira do magistério precisa voltar a ser atraente,
trazendo para os cursos de formação os bons alunos dos cursos
médio e superior e estimulando o professor que já está em
exercício a se manter em regência de classe, permanentemente
atualizado e com um bom desempenho profissional. Para tanto,
recomendamos como principais ações:
a) revisão dos salários atuais, mantendo-os em patamares
competitivos em relação ao mercado de trabalho de profissionais
de qualificação semelhante;
b) estruturação de Planos de Carreira, com mecanismos de
progressão funcional vinculados tanto à qualificação quanto ao
desempenho em sala de aula; e incentivos salariais à permanência
em regência de classe, de modo a desestimular o abandono das
salas de aula, em troca de funções burocráticas;
c) incentivos salariais especiais aos professores do ensino
básico dedicados ao atendimento dos segmentos mais problemáticos;
d) responsabilidade financeira da União na complementação
dos salários dos professores do 1º Grau, nas regiões e
localidades que não tenham recursos suficientes para o
financiamento dos novos planos de carreira, desde que o Estado ou
Município em questão já esteja aplicando na Educação a totalidade
dos percentuais exigidos por lei. Lembre-se que, para isto, a
legislação atual, que proíbe a União de realizar tal iniciativa,
precisa ser alterada.
3.2. Melhoria do Ensino BÆsico
Além das ações específicas para o Magistério, outras medidas
devem ser tomadas, relativas à estrutura e ao funcionamento do
ensino básico. Estas medidas, que no seu conjunto visam a
revalorização e a melhoria da educação geral, são:
a) expansão do atendimento ao pré-escolar, para oferecer a
todos as mesmas oportunidades de sucesso e progressão escolar,
desde as primeiras séries. As iniciativas comunitárias
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consideradas habilitadas devem ser apoiadas, eximindo o Estado,
neste momento, da construção de uma rede de pré-escolas;
b) aumento da jornada escolar, nos sistemas públicos, nas
quatro primeiras séries do 1º Grau, dando prioridade ao
restabelecimento dos dois turnos diurnos; a expansão quantitativa
da rede deverá atender à demanda decorrente da eliminação dos
múltiplos turnos;
c) no ensino de 1º Grau, as escolas de tempo integral, com
exceção daquelas que comprovadamente atendam às populações muito
carentes ou com grandes defasagens idade/série, só devem se
expandir na medida em que se cumpra o programa da volta, na rede
de escolas "comuns", aos dois turnos diurnos;
d) nos casos em que seja imprescindível o atendimento em
escolas de tempo integral, pode-se prever incentivos materiais
(bolsas) para compensar a renda não auferida pelo retardamento da
entrada no mercado de trabalho, pelo menos até os 14 anos;
e) revisão dos conteúdos curriculares do ensino de 1º e 2º
Graus, com vistas, no 1º Grau, ao atendimento da aquisição de
competências básicas - raciocínio, linguagem, capacidade de
abstração, etc.) - fundamentais à participação do indivíduo na
sociedade moderna; no 2º Grau, além da continuidade desses
objetivos, acrescente-se o da oferta de uma sólida base de
conhecimentos técnico-científicos (Ciências Exatas, Humanas e
Biológicas), que servirá tanto à posterior aquisição de
habilitação específica de nível médio, quanto ao prosseguimento
dos estudos em nível superior;
f) definição de um padrão nacional mínimo de educação
básica, de aplicação compulsória em todo o sistema educacional
brasileiro;
g) extinção das diferenciações curriculares entre as escolas
de 2º Grau de educação geral e aquelas atualmente dedicadas ao
ensino técnico. Tal como no ensino de 1º Grau, a escola de nível
médio deve ser única e democrática;
h) na rede pública, a prioridade no ensino médio deve ser
para o 2º Grau regular, de educação geral, com ampliação das
vagas em horário noturno, em locais acessíveis, para atender aos
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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jovens trabalhadores, cuja demanda por este nível de ensino tem
aumentado muito;
i) na atual rede pública de escolas técnicas, as oficinas e
toda a parte de formação especial devem ser administradas por
convênios com empresas, sindicatos de trabalhadores e associações
dos diferentes setores, abrindo-se ainda a outras clientelas que
demandem as habilitações oferecidas.
3.3. Ensino Superior
O ensino superior tem importante papel a desempenhar no
processo brasileiro de reestruturação produtiva, seja na formação
de mais e melhores professores, função já tratada no item
anterior, seja na qualificação de recursos humanos para o setor
produtivo, melhor preparados para os atuais requisitos da
capacitação tecnológica. Para tanto, propomos:
a) reforçar os cursos de Ciências Básicas (Matemática,
Física, Química e Biologia), no sentido de formar profissionais
capazes de atuar eficientemente em sistemas de inovações
tecnológicas;
b) aumentar a oferta de vagas, nas Universidades Federais,
principalmente nas disciplinas mencionadas, buscando atrair,
através da expansão dos cursos noturnos ou da oferta de bolsas de
estudos, os jovens que trabalham em tempo integral;
c) combater a excessiva fragmentação profissional e a
especialização precoce, que conduzem à ênfase no conhecimento
instrumental, cuja utilidade tende a diminuir, e às
regulamentações correspondentes, que funcionam mais como "reserva
de mercado" do que como garantia de bom exercício profissional;
d) com base no item anterior e a exemplo de outros países,
incluir disciplinas das "Humanidades" nos currículos de graduação
das Engenharias, tendo em vista as mudanças organizacionais em
curso e seus reflexos nas funções gerenciais;
e) retomar e implementar de fato a idéia de Ciclo Básico, no
intuito de fornecer uma formação universitária abrangente, não
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especializada, no espírito do BA norte-americano, altamente
valorizada hoje em dia no mercado de trabalho;
f) a Extensão Universitária deve concentrar esforços na
colaboração com programas de reciclagem profissional em todos os
níveis: professores, trabalhadores qualificados, gerentes,
técnicos e profissionais de alto nível;
g) a autonomia universitária deve vir acompanhada de
práticas de gestão mais profissionais, com vistas à maior
captação de recursos próprios, tanto através de melhor gestão do
patrimônio, como de maior cooperação com o sistema produtivo.
3.4. Qualificaªo Profissional
O papel das empresas: aıes diretas
Conforme assinala o documento elaborado para a Comissão
Empresarial de Produtividade, "a ação direta dos empresários pode
apenas complementar o papel da escolas públicas". Este caráter
complementar da ação empresarial significa desonerar o Estado
nas ações de habilitação específica e com ele colaborar,
principalmente nos esforços para a elevação da escolaridade
básica dos trabalhadores brasileiros.
Os programas empresariais na área da Educação,
principalmente o supletivo de 1º Grau, devem se basear em quatro
pontos: a) parceria com a rede pública; b) mobilização do sistema
SESI; c) definição de horários e locais adequados aos
trabalhadores; d) nas grandes empresas, utilização direta e ágil
do Salário-Educação para estas atividades.
Nesse sentido, consideramos que às empresas e às associações
empresariais compete:
a) incentivar as novas modalidades de cooperação entre o
setor produtivo e as Universidades, com um maior apoio às
pesquisas que se dedicam à busca de métodos e técnicas
pedagógicas mais adequados à clientela da escola básica;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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b) participar diretamente no esforço de melhoria do ensino
público de 1º e 2º Graus, através de convênios de cooperação com
as Secretarias de Educação, para a manutenção das escolas
existentes nas comunidades onde se localizam as empresas;
c) efetivar a abertura de oportunidades educacionais nos
espaços fabris (escolas anexas às fábricas) e criação de
facilidades para que seus empregados menos escolarizados possam
completar sua educação básica, vencendo as resistências e os
problemas que levam a fracassar as iniciativas de ensino
supletivo extra-empresa, pelo esforço adicional que exigem do
trabalhador;
d) a gestão dos programas empresariais de formação
profissional deve contar com a participação de representantes dos
trabalhadores.
O papel da empresa: a formaªo profissional
Além das ações realizadas diretamente pelos empresários e no
ambiente da empresa, há um conjunto de medidas que dizem respeito
às instituições educativas administradas por órgãos
representativos das empresas, que se referem à sua adequação aos
novos requisitos de qualificação profissional e à colaboração que
através delas pode ser dada ao esforço de elevação da
escolaridade básica dos trabalhadores. São elas:
a) utilização da capacidade instalada da rede do SESI -
pela sua menor dimensão e maior disponibilidade de recursos - em
programas de apoio aos sistemas públicos de ensino, para o
desenvolvimento de projetos experimentais, visando a produção de
inovações pedagógicas para posterior difusão na rede pública;
b) utilização dos espaços ociosos do sistema SENAI, em
parceria com toda e qualquer agência capaz de oferecer educação
básica, regular ou supletiva, para a oferta de oportunidades de
educação geral aos jovens e adultos pouco escolarizados;
c) a atual rede de escolas técnicas, na sua parte
profissionalizante, deverá ser transformada numa rede de Centros
de Desenvolvimento Tecnológico, administrados por associações
setoriais da indústria, para atender à formação/atualização de
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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trabalhadores, técnicos e gerentes. Para a ação destinada aos
trabalhadores e técnicos, é fundamental a participação do SENAI;
para o segmento de nível superior, as empresas deverão se
articular com as Universidades;
d) abertura das instituições de formação profissional aos
menos escolarizados, empregados ou não, em programas de
profissionalização que contemplem também a oferta de educação
geral;
e) reestruturação dos cursos regulares das instituições de
formação profissional, privilegiando o desenvolvimento de uma
"cultura tecnológica", com a substituição das disciplinas
instrumentais por uma base sólida de conteúdos técnico-
científicos amplos;
f) o SENAI deve preservar os recursos provenientes das
contribuições sobre a folha de pagamentos exclusivamente para as
atividades que atendam aos interesses gerais da indústria;
treinamentos do tipo firm specific devem ser financiados
integralmente pelas empresas demandantes;
g) através de seus Centros de Desenvolvimento Tecnológico, o
SENAI deverá colaborar com as empresas também na experimentação e
difusão de novas técnicas de organização do trabalho, com vistas
a diminuir os riscos e as incertezas inerentes aos programas de
reestruturação.
Sindicatos
a) maior destaque, nas pautas de negociação, ao acesso às
oportunidades de formação profissional e, principalmente, de
requalificação;
b) participação na gestão das agências de formação
profissional;
c) participação na gestão dos sistemas públicos de educação,
da escola de 1º Grau à Universidade.
3.5. Financiamento do Ensino BÆsico
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Os recursos necessÆrios ao ensino bÆsico
O problema dos recursos para o Ensino Básico envolve duas
questões de naturezas distintas: de um lado, o financiamento de
ítens diretamente ligados às atividades pedagógicas propriamente
ditas: salários de docentes, material didático e de apoio e
espaço físico (conservação, recuperação e ampliação da rede
física); de outro, os gastos assistenciais necessários à
manutenção das crianças na escola. Nenhum país, e muito menos o
Brasil, com seu nível de pobreza, pode prescindir dos gastos
assistenciais, que envolvem atualmente a merenda escolar e alguma
atenção básica em Saúde. Além dessa assistência, caberia também
pensar em alguma compensação financeira para as famílias muito
carentes que necessitam do trabalho infantil para sobreviver e
que, por isso, encontram dificuldades em deixar por vários anos
seus filhos na escola.
Quanto ao primeiro conjunto de gastos, todas as estimativas
indicam que com US$ 6 a 7 bilhões será possível dar um ensino de
boa qualidade aos alunos da rede pública, mesmo pagando aos
professores do 1º Grau um salário médio de US$ 300 mensais. O
problema está em como financiar os gastos assistenciais que, se
se pretende atender a todos os alunos, mesmo mantendo padrões
modestos, pode equivaler ao total de recursos hoje alocados às
atividades de ensino. Se esse volume de recursos for considerado
irrealista, não existirá outra alternativa que não a de
restringir tais gastos aos segmentos mais carentes, apesar de
todos os problemas operacionais que uma focalização desse tipo
implica.
SalÆrio-educaªo
A este respeito, cabe observar que o volume de recursos que
esta fonte representa é fundamental para a sobrevivência dos
sistemas públicos de ensino. Assim, se ela for extinta,
forçosamente terá que ser substituída por outra. Entretanto, sua
permanência não exclui, a nosso ver, a necessidade de revisão de
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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seus mecanismos de aplicação, tornando sua gestão mais
transparente e passível de efetiva supervisão. Assim, as
propostas são:
a) simplificação e agilização da gestão dos recursos do
Salário-Educação, preservando-se, entretanto, os objetivos de
redistribuição regional;
b) a aplicação direta do Salário-Educação deve se restringir
àquelas empresas (ou consórcios de empresas) que recolham acima
de um montante significativo a ser definido. Com isso, diminuiria
a malversação dos recursos no processo de compra de vagas em
escolas privadas;
c) para as contribuições abaixo do montante acima referido,
o recolhimento seria direto à agência responsável;
d) da parcela do Salário-Educação que será recolhida, metade
deve ser destinada às regiões carentes, a partir de políticas e
prioridades claramente definidas, mediante projetos e programas,
e não da forma clientelística que tem caracterizado sua
distribuição;
e) a outra metade seria repassada preferencialmente às
escolas da rede pública que, eventualmente, poderão ser indicadas
pelas próprias empresas que fazem o recolhimento;
f) os recursos do Salário-Educação devem ser destinados ao
ensino básico, incluindo assim o ensino de 2º Grau.
3.6. Sistema Nacional de Avaliaªo
No sistema atual, a qualidade das ações educativas só pode
ser estimada pelos dados globais que apontam os altos percentuais
de evasão e repetência e os baixos índices de conclusão do 1º
Grau. Entretanto, tais informações são insuficientes para que se
conheça, do ponto de vista estritamente pedagógico, onde estão
situados os problemas, quais as escolas que desenvolvem um bom ou
mau trabalho ou ainda, que aspectos curriculares precisam ser
revistos. Além disso, mesmo para aqueles que têm êxito no
sistema, isto é, que conseguem concluir cada grau que o compõe,
não se pode precisar se receberam o mesmo conjunto de
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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conhecimentos e se desenvolveram o mesmo nível de habilidades
intelectuais.
Estas dificuldades decorrem do fato de, no Brasil, não
existir nenhum mecanismo de avaliação da Educação, que permita
comparar o desempenho dos sistemas de ensino e das escolas que os
integram. Apesar de formalmente delimitada por uma legislação que
se caracteriza pelo excesso de detalhes, a ação educativa é, na
verdade, extremamente autônoma, na medida em que não presta
contas nem às administrações superiores e muito menos à
população, e não é efetivamente cobrada pelos resultados que
apresenta. De outro lado, a ausência de dados mais detalhados
sobre a qualidade do trabalho desenvolvidos em cada escola impede
que se premie as mais eficientes e que se contemple adequadamente
aquelas que necessitem de maior apoio para melhoria de seu
desempenho.
Assim, para a obtenção de melhores instrumentos, tanto para
a melhoria da gestão dos recursos alocados na Educação, quanto
para as propostas pedagógicas que visam a elevação da qualidade
do sistema educacional, propomos a implantação de um sistema
nacional de avaliação da educação básica, orientada pelas
seguintes ações:
a) definição de um padrão nacional de educação básica, com o
estabelecimento dos conteúdos e habilidades intelectuais que
todos os alunos do ensino básico, em todo o país, devem ser
portadores, ao final da 4ª e 8ª séries do 1º Grau, e da 3ª série
do 2º Grau;
b) determinação, pelos sistemas estaduais e municipais, dos
conteúdos que devem ser acrescentados ao padrão nacional, para
atender às necessidades e peculiaridades regionais;
c) implementação de um projeto nacional de educação, com
critérios claros e rígidos para a liberação de recursos geridos
pelo MEC, a partir de projetos estaduais e municipais onde se
contemple a supervisão e o acompanhamento da execução, já no
contexto do sistema nacional de avaliação;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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d) implantação de uma instância federal responsável pelos
exames nacionais, integrada por técnicos e professores dos
sistemas públicos, por especialistas em avaliação e por
representantes de segmentos da sociedade civil organizada
(sindicatos de trabalhadores, associações de pais de alunos,
etc.);
e) aplicação anual dos exames, com divulgação ampla dos
resultados e acompanhamento da evolução de cada sistema;
f) previsão, no orçamento do MEC, de recursos a serem
aplicados nos sistemas onde os resultados sejam negativos, a
partir de projetos elaborados e diretamente supervisionados pelo
MEC, visando a elevação da qualidade do ensino naqueles sistemas;
g) estruturação, no MEC/Delegacias Regionais, de equipes que
estarão encarregadas da supervisão dos sistemas estaduais e
municipais, compostas, em cada Estado, de técnicos e professores
das esferas federal, estadual e municipal; estas equipes
acompanharão tanto o trabalho desenvolvido nas escolas, como, nas
atividades globais das Secretarias de Educação, o volume e a
destinação real dos recursos vinculados;
h) a liberação, pelo MEC, de recursos complementares para os
sistemas educacionais estaduais e municipais, estará condicionada
à execução e aos resultados obtidos nos projetos de melhoria do
sistema, assim como ao gasto efetivo, em Educação, do percentual
da receita líquida determinado por lei;
i) a avaliação final de cada sistema estadual ou municipal
levará em conta tanto os resultados dos exames nacionais quanto o
volume e a natureza dos gastos realizados;
j) a rede de escolas federais de 1º e 2º Graus também
integrará o universo a ser avaliado, tanto no desempenho
pedagógico quanto na eficácia da aplicação de recursos.
27
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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QUADRO-RESUMO
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
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1. Novas formas de articulação entre os sis-
mas produtivo e educacional
2. Universalização da educação básica
3. Vinculação dos recursos públicos à educação
geral
4. Qualificação da mão-de-obra pelas empresas
5. Oferta pelas empresas de ensino supletivo
6. Os sindicatos de trabalhadores devem parti-
cipar da gestão das instituições de forma-
ção profissional
1. Magistério
1.1. Formação de professores X
- extinção dos cursos de habilitação X
- recriação das Escolas Normais, seletivamente X
- reformulação dos cursos de Pedagogia X
- descentralização da Licenciatura X
- apoio aos cursos de Ciências básicas nas
Universidades X
- revalorização das Práticas de Ensino
1.2. Reciclagem de professores
- fortalecimento dos CEFAM X
- expansão da Extensão para reciclagem X
- mecanismos de incentivo à reciclagem X
1.3. Revalorização da Carreira
- revisão dos salários atuais, mantendo-os
competitivos no mercado X
- estruturação de Planos de Carreira X
- incentivos salariais aos professores de-
dicados a segmentos problemáticos X
- complementação pela União dos salários
nas regiões com escassez de recursos X
- modificação da legislação atual que im-
pede a complementação anterior pela
União
2. Melhoria do Ensino Básico
- expansão do atendimento pré-escolar X
- aumento da jornada escolar X
- priorização dos 2 turnos sobre a escola
integral X
- compensação financeira pelo retardamento
do ingresso no mercado de trabalho X
- revisão dos currículos básicos, direcio-
nando-os para aptidões básicas X
- definição de um padrão nacional mínimo
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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compulsório para o sistema educacional
nacional X
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
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- eliminação das diferença curriculares
entre o ensino regular e técnico X
- prioridade no ensino médio para o 2
o
grau
regular e noturno X
- administração das escolas técnicas por
convênios tripartites X X X X
X
3. Ensino Superior
- reforço dos cursos de Ciências Básicas
X
- aumento da oferta de vagas nas Univer-
sidades públicas
X
- bolsas de estudo para estudantes que pre-
cisam trabalhar X
X
- combater a fragmentação profissional e a
especialização precoce
X
- incluir Humanidades nos currículos das
Engenharias
X
- implementar o Ciclo Básico
X
- maior flexibilidade à pós-graduação
X
- abrir a Universidade para profissionais
de grande experiência mesmo que sem os
requisitos formais tradicionais
X
- maior peso da relevância dos temas de
tese e na interdisciplinaridade
X
- Extensão concentrada nos programas de
reciclagem
X
- autonomia universitária associada à pro-
fissionalização da gestão
X
4. Qualificação profissional
4.1. Recomendações às empresas: ações diretas
- cooperação com as Universidades X
X
- participar dos esforços de melhoria do
ensino básico X
- abertura de oportunidades educacionais
nos espaços fabris X
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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- abertura da gestão dos programas de for-
mação profissional aos trabalhadores X
4.2. Recomendações às empresas: formação profissional
- utilização da rede SESI para novas expe-
riências educacionais X
- utilização dos espaços ociosos do sis-
tema SENAI para educação básica, regu-
lar ou supletiva X
- transformação da rede de escolas técni-
cas em Centros de Desenvolvimento Tec-
nológico X
- abertura das escolas técnicas aos menos
escolarizados X
- reestruturação dos currículos técnicos X
- o SENAI deve dedicar os seus recursos
a programas de interesse geral X
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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AÇÕES/DIRETRIZES DE POLÍTICA AGENTE/ATOR
EXEC. LEG. JUD. EMP. TRAB. ONGs
ACAD.
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- o SENAI deve participar de programas de
difusão de novas tecnologias X
5. Sindicatos
- acesso a oportunidades de qualificação
profissional deve ser privilegiado nas
pautas de negociação X
- participação na gestão das agências de
formação profissional X X X X
- participação na gestão dos sistemas
públicos de educação X X X X
6. Financiamento do ensino básico
6.1. Recursos necessários
- recursos adicionais para assistência X X
6.2. Salário-Educação
- simplificação e agilização da gestão X X
- critérios claros na amplificação direta X X
- destinação de parcelas específicas a
regiões carentes e a escolas públicas X X
- vinculação ao ensino básico X X
7. Sistema nacional de avaliação
- definição de um padrão nacional de
educação básica X X
- definição de especificidades locais
adicionais X X
- implementação de um projeto nacional
de educação X X
- implantação de uma instância federal
responsável por exames nacionais X
- implantação de programas especiais de
recuperação dos sistemas com resulta-
dos negativos X
- implantação de equipes de acompanha-
mento dos sistemas estaduais e muni-
cipais X
- liberação de recursos pelo MEC condi-
cionada aos programas X
- a avaliação deverá incluir custos e
resultados X
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Legenda: EXEC. - Executivo
LEG. - Legislativo
JUD. - Judiciário
EMP. - Empresas e Entidades Empresariais
TRAB. - Trabalhadores e Sindicatos
ONGs - Organizações Não-Governamentais
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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ACAD. - Academia
Nota: Em caso de coluna em branco, leia-se "sem recomendação".
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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4. INDICADORES
. Taxa de escolaridade (percentagem da população da faixa
etária matriculada no nível de ensino correspondente).
. Vagas por nível de ensino, área e tipo de estabelecimento.
. Taxas de evasão, repetência e conclusão, por nível de
ensino.
. Número de horas-aula/ano, por nível de ensino e área.
. Número de professores por área e nível de carreira.
. Índices de evolução salarial e de carreira.
. Número de estabelecimentos de formação de professores e
vagas correpondentes, por área.
. Número de pessoas e recursos envolvidos nos convênios
entre instituições de ensino e empresas, por área e nível de
ensino.
. Número de pessoas e recursos envolvidos em programas
tripartites de gestão de ensino técnico.
. Índices de acompanhamento dos programas de aplicação
direta dos recursos do salário-educação.
. Número de cursos profissionalizantes, por área, duração e
vagas.
34
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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INTRODU˙ˆO: EDUCA˙ˆO E PRODUTIVIDADE SIST˚MICA
No contexto dos condicionantes sociais do processo de
reetruturação produtiva, a questão dos recursos humanos tem tido
grande destaque, na medida em que se reconhece a emergência de
novos perfis ocupacionais e de profundas transformações na
organização do trabalho, que implicam uma maior participação dos
trabalhadores nas decisões da empresa.
Estes novos requisitos decorrem de aspectos que caracterizam
o atual processo de desenvolvimento tecnológico e que mudam o
próprio conceito de capacitação tecnológica. Diferentemente do
que ocorre na automação eletro-mecânica - onde a simples adoção
de "pacotes tecnológicos", ou de conjuntos de equipamentos de
última geração, era suficiente para atualizar tecnologicamente
uma empresa e lhe assegurar maior produtividade (ganhos de
escala) -, hoje, o alcance de maior competitividade de uma
indústria não depende exclusivamente do uso de equipamentos e
sistemas informatizados. Isto porque não se trata apenas de
adotar inovaıes mas, principalmente, de ser capaz de gerar
inovaıes :
"Nas condições do capitalismo contemporâneo,
produzir é, cada vez mais, 'produzir inovação'(...)
Para indústrias que já estão na fronteira tecnológica e
que já constituem uma parcela muito significativa da
produção nas economias avançadas, 'produzir' avanços
tecnológicos é o estágio crucial do seu ciclo
produtivo, assim como a inovação é o principal produto
ou serviço que vendem (...)
Quanto mais um setor ou firma é 'intensivo em
ciência', isto é, quanto mais sua posição competitiva
depende do contínuo desenvolvimento de tecnologias
apropriáveis derivadas de avanços científicos, mais o
centro de gravidade de seu ciclo produtivo tende a se
deslocar para suas atividades de inovação (...)
No entanto, esta tendência não deve ser entendida
como perda da importância estratégica da produção. Ao
contrário, o mesmo processo que leva a ampliar o
conceito de produção para incorporar a 'produção da
inovação', atua no sentido de ampliar o conceito de
35
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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inovação para incorporar a inovação que 'nasce' no chão
da fábrica" (Carvalho, 1992; grifos nossos).
Assim, a capacitação tecnológica, ou seja, a condição da
empresa criar inovações, não está restrita ao pessoal diretamente
envolvido em P&D. A produção, à medida em que diminui o trabalho
direto, incorpora atividades mais abstratas que habilitam o
trabalhador a colaborar no aperfeiçoamento e na geração de
inovações de produtos e de processos. E aqui, é fundamental a
contribuição das novas formas de organização da produção:
"Parece inquestionável que elas implicam uma maior
integração das funções de produção, controle de
qualidade e organização da produção. A idéia de
'produzir qualidade' (...) pressupõe também uma busca
permanente de pequenas inovações na maneira de
produzir, que nascem do conhecimento acumulado pelos
trabalhadores na própria vivência da produção (...)
Quanto maior o conhecimento teórico e prático acumulado
pelos trabalhadors, maiores serão os ganhos inovativos
advindos dessa fonte" (Carvalho, 1992).
Ao contrário do que ocorre nos perfis e requisitos
ocupacionais da automação rígida, no conjunto de requisitos que
agora emerge, diminui sensivelmente a importância da habilidade
manual, e o melhor desempenho diz respeito principalmente ao
conhecimento mais amplo do processo de trabalho, a uma atitude
cooperativa e ao uso de habilidades intelectuais que são produtos
da Educação Geral, ou seja, do conjunto de conteúdos das
diferentes áreas do conhecimento que compõem os currículos do
ensino básico regular, voltados para o desenvolvimento pleno das
capacidades/potencialidades dos indivíduos.
Essas novas expectativas quanto ao desempenho e à
participação da força de trabalho levaram à valorização de alguns
ítens básicos, que devem estar presentes nos perfis ocupacionais,
independentemente da área de "especialização" do trabalhador
direto - têxtil, mecânica, química, etc. - e que tornam
indispensável, para nós, a revisão da relação entre Educação e
Qualificação. Estes ítens são, resumidamente: a) capacidade de
leitura e compreensão de texto, para a leitura de manuais,
formulários, painéis eletrônicos, etc.; b) capacidade de redigir
36
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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comunicados, documentos e relatórios; c) capacidade de falar e de
comunicar-se com seus superiores hierárquicos, com seus colegas e
com subordinados; d) capacidade para trabalhar em computação,
para interpretar números, fazer medições de tempo, distâncias,
volume, etc.; e) habilidade para entender, organizar e analisar
problemas quantitativos; f) capacidade de identificar e definir
problemas, formular alternativas, equacionar soluções e avaliar
resultados; g) criatividade, iniciativa, inventiva, uso de
intuição e do raciocínio lógico, transformando idéias em
aplicações práticas; h) auto-estima, motivação e capacidade de
assumir responsabilidades; i) capacidade de negociar e contra-
argumentar, espírito de colaboração e de aglutinação" (Alexim,
1992).
No caso específico do trabalhador direto, a complexificação
das tarefas tradicionais, o grau de abstração das novas tarefas
e, ainda, a participação adequada nas novas formas de gestão, ao
invés de prescindir de maiores níveis de escolaridade, como
ocorre nos processos tayloristas, pressupõem a escolaridade
básica completa (no caso brasileiro, a conclusão do 2º Grau), o
que corresponde à posse dos conhecimentos necessários à geração
de inovações ao nível do chão-da-fábrica.
Entretanto, estas não são as únicas diferenças entre os dois
tipos de organização da produção, no que se refere às mudanças no
processo de trabalho e seus impactos sobre o perfil e a
qualificação dos recursos humanos. Um elemento fundamental das
novas formas de automação é a flexibilidade, cujos impactos são
também bastante significativos.
"A introdução de sistemas flexíveis (...) combina-
se à montagem de uma ampla e complexa rede de
informações, que interliga, em maior ou menor grau, as
vendas com o embarque das mercadorias, a produção com
as compras, a contabilidade e o marketing com a P&D,
etc. Todo o processo industrial Ø afetado.
(...) Antes de mais nada, com a flexibilidade,
alteram-se as regras da concorrência e o significado de
conceitos antigos e caros ao "senso comum" na gestão
das empresas. Por exemplo, os conceitos de economia de
37
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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escala e as formas de utilização da capacidade
instalada.
A escala, certamente, continua a ser importante
para as empresas. A diferença é que agora os custos sªo
rateados entre muitos produtos e a escala econmica
mnima estÆ ligada ao produto total , e não a um único
modelo" (Stewart, 1992).
A automação flexível leva ainda à construção do conceito de
competitividade nacional, a partir do qual a discussão em torno
da reestruturação produtiva envolve necessariamente diversos
aspectos da vida nacional.
"A competitividade de uma nação depende tanto de
sua habilidade de produzir bens e serviços para os
mercados globais e assegurar a melhoria do padrªo de
vida dos seus cidadªos, como também de sua capacidade
de ter um crescimento que seja, simultaneamente,
sustentado no tempo, financiado internamente e
suficiente para elevar a renda de todas as camadas da
populaªo " (Prowse, 1992).
Com isto, flexibilidade e competitividade nacional conduzem
a um terceiro conceito, também fundamental: o de produtividade
sistŒmica, que implica a visão e o tratamento articulados das
questões sociais e econômicas, de aspectos de infra-estrutura,
etc., como precondição ao sucesso de um projeto de reestruturação
produtiva. Para o que nos interessa aqui - a relação entre
Educação e Qualificação Profissional - significa que os desafios
relativos à formação de uma mão-de-obra adequada aos novos
requisitos ocupacionais estão contidos numa problemática bem mais
ampla e complexa, que é a crise do sistema educacional
brasileiro.
Se a meta é uma maior produtividade sistêmica, o que se deve
buscar, no que se refere à Educação, é a elevação do nível de
escolaridade da população como um todo, e não apenas daqueles
que, nesta ou naquela empresa, neste ou naquele setor, estarão
mais diretamente envolvidos com as novas tecnologias.
Diferentemente das soluções típicas do fordismo, os problemas de
qualificação do trabalhador direto não se resolvem mais por
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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tentativas isoladas ou setoriais e nem pelo atendimento apenas
parcial da população em idade escolar.
A crise educacional brasileira afeta a economia como um
todo, e desta perspectiva deve ser enfrentada. Ainda que as
sabidas heterogeneidades do país e do próprio setor produtivo
venham a permanecer, não podem servir de argumento a favor da
continuidade do caráter desigual e seletivo que marcou até aqui o
sistema educacional brasileiro.
39
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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1. TEND˚NCIAS INTERNACIONAIS
Na experiência internacional, naquilo que se refere à
qualificação de recursos humanos de acordo com os novos
requisitos, é interessante destacar aqui três situações
distintas: em primeiro lugar, aqueles países que já possuíam bons
sistemas de educação básica, como por exemplo a Alemanha e o
Japão. Destes, o que importa registrar são as formas de
articulação entre Educação, Qualificação e Sistema Produtivo. Em
segundo lugar, países como os Estados Unidos, que enfrentam
problemas muito semelhantes aos nossos na área da educação
básica. E, finalmente, os late comers, em particular os "tigres
asiáticos", que foram capazes de reverter, num prazo
relativamente curto, um quadro educacional mais dramático do que
o nosso atual.
"O que chama a atenção, no caso japonês, é a
estreita correspondência da estrutura educacional à
estrutura ocupacional e, principalmente, a importância
atribuída ao desempenho escolar nos processos de
recrutamento e seleção (...) As empresas valorizam e
respeitam os critérios de avaliação escolar em suas
contratações, o que, por sua vez, leva as escolas a se
preocuparem permanentemente com seu desempenho. Isto
resulta, inclusive, na grande valorização do
Magistério, que percebe salários bastante
diferenciados" (IEDI, 1992).
Na Alemanha, outro exemplo de dinamismo tecnológico, o
sistema educacional articula-se de uma outra forma com o sistema
produtivo. O essencial desta experiência é que, tradicionalmente,
existe estreita cooperação entre a escola e a empresa, com papéis
claramente definidos: às escolas cabe a transmissão dos conteúdos
de educação geral; às empresas, a responsabilidade pela aplicação
dos conhecimentos técnico-científicos relacionados à habilitação
específica.
Assim, diferentemente do dualismo de inspiração norte-
americana, onde o sistema educacional se divide em redes
escolares com finalidades e conteúdos distintos, o caráter dual
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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do sistema educacional alemão reside atualmente no fato de que a
escola pode, ou não, estar articulada com as empresas em
programas de habilitação profissional, sem que isto implique
conteúdos curriculares diferenciados.
Este modelo resulta na total responsabilidade das empresas,
no que se refere aos encargos técnicos e financeiros da
qualificação profissional, ainda que estes transcendam às suas
necessidades imediatas. A perspectiva é de uma qualificação geral
da mão-de-obra e os gastos envolvidos são assumidos como
investimento, que trarão retornos a longo prazo para o setor
produtivo como um todo. Nesse processo, "as Federações das
indústrias, na Alemanha, freqüentemente assumem o papel de
'agentes do interesse pœblico' em relação às empresas que se
opõem ao custo do treinamento" (Mahnkopf, 1993). No caso das
pequenas e médias empresas, a tendência é de criação de núcleos
de qualificação profissional, mantidos conjuntamente - empresas
do setor, sindicatos de trabalhadores e governo - e distribuídos
pelas várias regiões do país.
Assim, o que as empresas alemãs esperam do sistema
educacional é que este forneça aos seus alunos um conjunto de
conhecimentos que será a base da formação específica para aqueles
que demandem qualificação profissional de nível médio. Para
tanto, nas escolas que equivalem ao nosso 2º Grau, as grades
curriculares em vigor se compõem de disciplinas de conteúdo
geral, como a língua alemã, línguas estrangeiras, História Geral,
Filosofia, Geografia, Política, Matemática, Sociologia, Artes,
Química, Física, Música, Latim e Biologia. A este conjunto de
disciplinas pode ser incorporado o estágio profissional, com o
aprofundamento dos conhecimentos mais estreitamente voltados para
a habilitação específica, assim como a disciplina Informática,
que é opcional (IEDI, 1992).
A experiência alemã também envolve o atendimento aos jovens
- na faixa de 15 anos de idade - que abandonam os estudos antes
de completarem o ensino básico (o 2º Grau) e, por isso, não têm
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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acesso às oportunidades de qualificação profissional oferecidas
pelo sistema de ensino regular em cooperação com as empresas.
Para eles, oferece-se então a aprendizagem de ofcios , em cursos
mantidos por um programa de cooperação entre o governo e
sindicatos de empresas, com duraªo de trŒs anos (Fisher, 1992).
Apoiados numa tradição que remonta à Idade Média, da
transmissão de um ofício de uma geração para a próxima, estes
cursos abrangem desde a formação de eletricistas e mecânicos de
automóveis, até ofícios mais tradicionais, como confeiteiros e
sail-makers
7
, oferecendo remuneração (US$ 400 a US$ 600 mensais)
e, mais importante ainda, a garantia de emprego, já que os que
passam por eles são reconhecidos como profissionais não só pela
população mas, principalmente, pelos empregadores.
Ainda na experiência alemã, cabe falar na atuação sindical.
Os sindicatos de trabalhadores já possuem larga tradição de
negociação numa perspectiva que se caracterizaria mais pela
cooperação do que pelo antagonismo, em relação aos empregadores.
"Com isto, a política sindical tem como base o 'apoio negociado'
aos esforços de modernização das empresas do país." Nas
negociações coletivas, ao lado das cláusulas que garantem
direitos já adquiridos em negociações anteriores, acrescentam-se
aquelas que visam proteger os trabalhadores de eventuais efeitos
negativos da modernização, principalmente um possível desemprego.
Existe também uma grande preocupação com um processo crescente de
"heterogeneização" dos interesses de trabalhadores, ou seja, com
a multiplicidade de situações ou de fatores internos às empresas,
de acordo com suas estratégias específicas de produção, que
resulta em agendas de reivindicações específicas dos
trabalhadores em cada empresa, o que pode comprometer a eficácia
dos acordos coletivos firmados.
"Estes fatores, entre outros, tornam extremamente
complexas as estratégias de negociação coletiva dos
sindicatos, que procuram manter a capacidade de
iniciativa e de proposiªo dos trabalhadores ,
7
Veleiro, aquele que faz velas para barcos.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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explorando outras alternativas e possibilidades de
cooperação com as empresas.
Diante da alternativa de participar de um
ajustamento dominado pela visão de curto prazo, na
forma de um menor crescimento dos salários em relação à
produtividades ou da redução do número de
trabalhadores, os sindicatos alemães fazem a opªo
estratØgica pelo caminho da qualificaªo :
'flexibilidade funcional' antes que flexibilidade dos
salários e do emprego" (Mahnkopf, 1993).
Exemplos marcantes desse tipo de postura são as negociações
nas indústrias química e mecânica (1988 e 1989), onde, por
acordo, "as empresas obrigam-se a planejar, em intervalos
regulares, os futuros requerimentos de qualificação que devem
acompanhar as mudanças tecnológicas (...) consultando os
conselhos de trabalhadores pelo menos uma vez por ano. Os
próprios conselhos podem oferecer planos de treinamento
alternativos, para serem negociados com as empresas" (Mahnkopf,
1993).
Com isso, os sindicatos pretendem reorientar a discussão
sobre emprego e salário, dando ênfase não às necessidades das
empresas e à destruição de algumas qualificações mas, sim, à
capacidade dos trabalhadores em responderem s novas exigŒncias,
atravØs de oportunidades de requalificaªo . Na indústria química,
um acordo nesse sentido determinou inclusive que o tempo de
treinamento seria alternativo à redução do tempo de trabalho, o
que resultou ainda numa diminuição considerável do contingente de
trabalhadores não-qualificados (Mahnkopf, 1993).
Os esforços dos norte-americanos para superar suas notórias
deficiências no ensino básico, consideradas hoje uma verdadeira
ameaça à sua liderança econômica, concentram-se nos seguintes
aspectos: a) revalorização do sistema público de educação geral e
não mais do ensino vocacional; b) envolvimento das empresas com a
melhoria do desempenho pedagógico nas redes públicas do ensino
básico, particularmente aquelas que atendem aos segmentos mais
problemáticos da população; c) apoio das empresas aos programas
inovadores que visem atingir prioritariamente aos que tendem ao
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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fracasso escolar; d) a repetência é condenada por sua ineficácia
e por seus efeitos negativos sobre a auto-estima, e é vista como
principal causa da evasão escolar; e) embora se ofereça ensino
supletivo aos mais velhos, o objetivo maior é o de dotar a
população mais jovem, alvo dos programas especiais, de condições
para se reintegrar ao fluxo regular do sistema educacional"
(IEDI, 1992).
A definição destes objetivos baseia-se no reconhecimento de
que a raiz dos problemas de desempenho do operariado norte-
americano está na pouca escolaridade de um grande grupo, e na má
qualidade da educação básica, principalmente nas escolas que
atendem às populações mais carentes e mais sensíveis aos grandes
problemas sociais - as drogas, por exemplo. Para estes grupos,
estão propostas estratégias supletivas de ensino que, entretanto,
buscam levar o jovem a um patamar de conhecimentos que lhe
permita reingressar no sistema regular de ensino, para que
complete sua escolaridade no tempo adequado ao conjunto de
conhecimentos necessários tanto a um bom desempenho profissional,
como a uma maior integração social. Assim, o que se depreende das
propostas norte-americanas para o enfrentamento da questão da
qualificação dos recursos humanos é que elas não priorizam, como
tradicionalmente se fez até aqui, as soluções de curto prazo, os
cursos rápidos e intensivos. Ao contrário, elas vão na direção da
valorização do ensino regular e da recuperação dos sistemas de
ensino.
"O verdadeiro desafio com que se defronta a
sociedade americana não é reverter o declínio; é sim
enfrentar as implicações sociais da nova economia (...)
O sistema de ensino nas escolas precisa adequar-se às
novas necessidades da economia (...) O sistema de
ensino, adequado  produªo em massa, precisa ser
reformulado para adequar-se  competiªo global e s
novas tecnologias (...) O futuro agora pertence às
sociedades que se organizam para aprender (...) A
melhor forma de atacar o problema da crescente
desigualdade social e simultaneamente contribuir para a
melhoria da competitividade (...) seria reformar o
sistema educacional dos Estados Unidos, de forma a dar
aos cidadªos as habilitaıes exigidas pela nova
economia" (Prowse, 1992).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Entretanto, há uma preocupação especial com os trabalhadores
mais antigos, considerados importantes para a empresa pela enorme
experiência que possuem, mas que são praticamente analfabetos.
Para estes, de quem já não se deve esperar o reingresso na escola
regular, as grandes empresas norte-americanas estão incentivando
a oferta de cursos supletivos nos sistemas públicos de ensino,
visando principalmente o domínio da leitura e da escrita, no
sentido de requalificá-los de acordo com as novas exigências
tecnológicas.
O caso dos países asiáticos é particularmente importante
para a situação brasileira, pois mostra que, sem apelar para
soluções de curto prazo, ou para medidas paliativas, como
campanhas de alfabetização ou cursos intensivos
profissionalizantes, lograram, num espaço de 10 a 20 anos,
praticamente universalizar um ensino básico de qualidade. O
exemplo mais significativo é o da Coréia que, até o início dos
anos 70, tinha um desempenho educacional pior do que o nosso
atual. Em 15 anos de investimento no sistema público, inclusive
na formação e remuneração dos professores, o analfabetismo adulto
foi reduzido a taxas insignificantes, foi universalizado o ensino
fundamental e, no nível médio, o sistema atende, hoje, a cerca de
90% da população de 15 a 19 anos.
Em síntese, do conjunto das experiências aqui analisadas,
observa-se que as soluções passam sempre pelo ensino público,
pela valorização e boa remuneração do magistério e, ainda, por
mecanismos nacionais de avaliação. Quanto ao ensino pós-
secundário, observa-se um grande leque de opções não-
universitárias, o que, entretanto, ocorre mais facilmente em
países onde o credencialismo não se manifesta em diferenciais tão
marcantes quanto os nossos. Outro aspecto fundamental a destacar
é a importância dos mecanismos de cooperação - empresas, governo
e sindicatos - em função da recuperação ou da reestruturação dos
sistemas educacionais. Nesses mecanismos, além da repartição de
responsabilidades, há também o investimento financeiro das partes
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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envolvidas, na perspectiva da obtenção de resultados amplos, que
favoreçam à sociedade como um todo.
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2. A SITUA˙ˆO BRASILEIRA
2.1. A Educaªo Geral
2.1.1. Breve diagnstico
O perfil de escolaridade da população brasileira ainda hoje
deixa muito a desejar: a grande maioria possui conhecimentos que
equivalem no máximo às quatro primeiras séries do 1º Grau, além
da existência de cerca de 15 milhões de analfabetos adultos. Esta
é uma questão diretamente ligada às discussões em torno da
reestruturação produtiva, na medida em que diz respeito à
qualificação da força de trabalho: até o final da década passada,
38% dos trabalhadores brasileiros possuíam no máximo o antigo
curso primário completo (4ª Série do 1º Grau) e apenas 15,4%
tinham concluído o 2º Grau. Na indústria de transformação,
somente 7,4% tinham o 2º Grau completo e 50% possuíam no máximo a
escolaridade equivalente ao antigo curso primário (segundo dados
da RAIS/86, extraídos de Carvalho, 1992).
Há que se reconhecer, contudo, que a expansão da rede
física, iniciada ao final dos anos 60, ampliou
extraordinariamente as oportunidades de acesso à Educação. Com
isto, o sistema educacional atende, hoje, a cerca de 36 milhões
de crianças e jovens, distribuídos da seguinte maneira: 9,8% na
pré-escola ( 3.500.000 matrículas); 76,5% no 1º Grau (27.300.000
matrículas); 9,5% no 2º Grau (3.300.000 matrículas); 4,2% no 3º
Grau (1.400.000 matrículas).
Entretanto, apesar de uma aparente melhoria quantitativa,
estes números ainda correspondem a um fraquíssimo desempenho,
mesmo quando comparado ao dos demais países da América Latina
8
, e
são a prova de que o alto grau de seletividade continua sendo a
8
Ao final dos anos 80, o desempenho do sistema educacional brasileiro, em comparação com os
demais países da América Latina, só era superior ao do Suriname.
47
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marca do sistema educacional brasileiro. Essa seletividade
evidencia-se, no ensino de 1º Grau, na permanência de altas taxas
de evasão e repetência, a despeito da adoção, em alguns Estados e
Municípios, de medidas tais como a aprovação automática nas
quatro primeiras séries do 1º Grau, o "bloco único" ou a exclusão
da avaliação na passagem do primeiro para o segundo ano.
Estas medidas são altamente controvertidas porque, na
verdade, estariam apenas escamoteando a questão da baixa
qualidade do ensino: "no decorrer da década (anos 80), a
diminuição de tais índices (evasão e repetência) nas séries
iniciais, motivadas por medidas político-administrativas, como a
instituição do ciclo básico no Estado de São Paulo, foi
compensada pelo aumento proporcional na reprovação e evasão que
passou a incidir sobre as séries mais avançadas (5ª a 8ª)" (Namo
de Mello & Neubauer Silva, 1992).
No ensino médio, embora o fluxo dos alunos seja melhor, o
total de matrículas corresponde a apenas 30% dos jovens de 15 a
19 anos, já que apenas 22% dos que ingressam na 1ª série do
ensino de 1º Grau conseguem concluí-lo. Embora nossa preocupação
maior seja com a educação básica, cabe destacar uma concepção
errônea dos resultados do 2º Grau, no que se refere ao acesso à
Universidade. Aponta-se para o que seria uma distorção do sistema
educacional, o fato de 50% dos que concluem o ensino médio
ingressarem na universidade, o que seria uma taxa extremamente
elevada e confirmaria tanto uma demanda excessiva por ensino
superior quanto a pouca "terminalidade" do ensino médio.
Na verdade, o percentual dos jovens brasileiros que chegam à
Universidade ainda é bastante baixo, comparado aos dos países
que recentemente investiram significativamente na implantação de
sistemas de inovações. Entre 1984 e 1987, na Coréia, Taiwan e
Japão, as matrículas no ensino superior representam,
respectivamente, 3,6%, 2% e 2% da população total (Carvalho,
1992), enquanto no Brasil, ainda hoje, está em torno de 1%, o
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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mesmo percentual apontado nas estatísticas educacionais dos anos
60.
Dessa forma, para que atingíssemos os percentuais dos países
que adaptaram seus sistema educacionais às necessidades da
reestruturação produtiva, todos os atuais concluintes do ensino
médio deveriam ter ingresso automático na Universidade. Como se
percebe então, a questão não está no fato de 50% dos egressos do
ensino médio ingressarem no ensino superior mas, sim, em que 78%
dos que ingressam no sistema não conseguem chegar ao final do 2º
grau.
Vê-se assim, que o sistema educacional se expandiu sem
entretanto alterar substancialmente a "pirâmide" educacional. No
ensino de 1º Grau, a cobertura, em termos gerais, pode ser
considerada boa: no meio urbano, pelo menos 90% das crianças de 7
a 14 anos têm oportunidade de acesso à escola. No ensino de 2º
Grau, até o final dos anos 80 a oferta de vagas foi suficiente
para atender pelo menos 85% dos concluintes do 1º Grau. Agora, a
rede física dos sistemas públicos começa a ser insuficiente,
fenômeno acelerado, em boa parte, pelo retorno de jovens e
crianças da classe média, hoje com dificuldades em acompanhar os
constantes aumentos das mensalidades na rede privada.
Assim, no que se refere ao acesso, o problema quantitativo
não é hoje tão grave como há três décadas atrás, mas deve merecer
atenção, pois, ao aumento da demanda por razões econômicas,
acrescenta-se a questão das escolas de três ou mais turnos, e dos
prédios escolares cujo alto grau de deterioração determina a
interdição de espaços e consequente diminuição da capacidade de
atendimento. Estes são problemas já conhecidos, mas para os quais
ainda não foram tomadas medidas realmente eficazes.
Outro aspecto que deve ser registrado é a existência de
escolas com espaços ociosos, com capacidade de atendimento
superior à demanda local, enquanto outras, em regiões de alta
densidade populacional, funcionam em mais de dois turnos, com
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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turmas saturadas e sem condições de receber as crianças que as
procuram.
Há que se ter cuidado, assim, com a demanda quantitativa,
porque ela não tem as dimensões de três décadas atrás, quando a
construção de novos prédios em todos os sistemas era
imprescindível e prioritário. A demanda atual expressa uma outra
ordem de problemas, ligados às conseqüências do uso de critérios
políticos para a localização dos novos prédios escolares e,
particularmente, à baixa qualidade do ensino oferecido.
De fato, uma análise mais atenta dos números que
caracterizam o desempenho do sistema educacional brasileiro
mostra que a questão maior diz respeito ao fracasso escolar, ou
seja, à baixa qualidade do ensino que nele se oferece, que gera
altos percentuais de repetência, motiva a evasão e acaba por
ocasionar um "congestionamento" no fluxo escolar e a distorção da
relação idade-série, inclusive deixando de liberar vagas para
aqueles que alcancem a idade de ingresso no sistema.
Os dados indicam que a maior parte da população escolar que
fracassa permanece, em média, 5 anos na escola; há, ainda,
parcela significativa que chega a permanecer por 8 anos - a exata
duração do ensino de 1º Grau. Entretanto, são anos em que se
repetem sucessivamente as mesmas séries, de modo geral as duas
primeiras, sem que sequer se consiga completar a alfabetização.
Estes fatos demonstram, de um lado, a crença que a população
tem na escola, a persistência das crianças e de suas famílias, a
despeito dos gastos que a escola implica e dos maus resultados
obtidos. De outro lado, evidencia-se a má qualidade do trabalho
pedagógico, a incapacidade da escola em, durante cinco ou mesmo
oito anos, garantir a estas crianças pelo menos o mínimo que uma
escola elementar deve fazer: ensinar a ler e a escrever.
2.1.2. Educaªo e polticas compensatrias
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Durante pelo menos duas décadas (anos 70 e 80), o mau
desempenho do sistema educacional foi "explicado" basicamente por
razões externas a ele: as políticas e diretrizes governamentais
(a excessiva centralização, o autoritarismo, o "economicismo" da
política educacional, os interesses político-eleitoreiros, os
"interesses do Capital", etc.) e os problemas sócio-econômicos da
maioria da população brasileira (a fome, a pobreza, a carência
cultural, os desajustes familiares, etc.). Embora não se devam
descartar as variáveis que se situam fora da escola, os
indicadores educacionais hoje disponíveis mostram que não dá mais
para explicar a repetência e a evasão nas séries iniciais, assim
como o baixo índice de conclusões do 1º Grau, apenas por uma
suposta falta de condições de aprendizagem da clientela, por um
também suposto desinteresse familiar ou, ainda, por uma falta de
autonomia do professor.
Além disto, a dimensão dada aos problemas sócio-econômicos
da clientela facilitou a introdução de inúmeras políticas
compensatórias - merenda escolar, material didático e, no limite,
as escolas de tempo integral tipo CIEPs e CIACs - que se tornaram
prioritárias e erroneamente deram à educação escolar uma
dimensão que ela não pode ter: a de instância corretora dos
problemas advindos principalmente da esfera econômica. A escola
foi, mais do que nunca, transformada num locus privilegiado de
interesses políticos que pouco tinham a ver com os reais
problemas educacionais e que, sem contribuir para a resolução dos
problemas sociais, justificaram ainda que recursos vinculados à
Educação fossem utilizados em atividades que, ao fim e ao cabo,
não colaboraram para uma efetiva melhoria da qualidade do ensino
e nem mesmo do atendimento às populações mais carentes.
Assim, é preciso que se discuta, agora, a baixa qualidade do
trabalho pedagógico, não só porque ela é real, mas também porque
ela é, das variáveis ligadas à questão do fracasso escolar,
aquela que depende, em sua maior parte, de mudanças internas ao
próprio sistema educacional. Em outras palavras, nas duas últimas
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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décadas a discussão dos problemas educacionais sempre destacou
questões cujas soluções estavam fora do alcance da escola. Isto
pode ter sido útil para que se percebesse as conseqüências, no
processo educacional, das decisões e dos problemas sócio-
políticos e econômicos mais amplos. Entretanto, a ênfase naquelas
variáveis levou a um certo imobilismo no que se refere aos
aspectos pedagógicos propriamente ditos, na medida em que, ou se
entendia que nada poderia ser feito para melhorar o ensino antes
que os macroproblemas fossem resolvidos, ou se percebia a rede
escolar apenas como uma rede de postos de distribuição dos
benefícios que eram objeto das políticas compensatórias.
Agora, quando se conhece melhor as respostas da população ao
problema educacional, ou quando já se sabe que apenas em
situações extremas as carências materiais, nutricionais, afetivas
ou culturais significam um entrave definitivo à aprendizagem,
cabe tratar daquilo que é específico da Educação. Sem menosprezar
as iniciativas de apoio aos segmentos mais carentes, é preciso
destacar as deficiências do trabalho pedagógico ou, em resumo, a
parcela de responsabilidade do próprio sistema educacional,
principalmente naquilo que diz respeito à competência técnica dos
recursos humanos que o integram.
2.1.3. A gestªo do sistema educacional
Quanto à administração do sistema, um item importante é o da
relação entre as diferentes esferas governamentais. Após um longo
período de centralização excessiva, onde a atuação do Governo
Federal buscava o controle das iniciativas locais e regionais,
iniciamos uma etapa de descentralização, apoiada inclusive pelas
determinações da Constituição Federal de 1988, que estabelece a
divisão de recursos e responsabilidades relativas à Educação,
entre a União, os Estados e os Municípios. Embora esta seja, em
princípio, uma idéia adequada às dimensões do país e às suas
peculiaridades regionais, alguns problemas podem ser observados.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Em primeiro lugar, poucos dos mais de quatro mil municípios
brasileiros possuem efetivamente a capacidade de assumir a gestão
de suas redes de ensino; entre outros fatores, faltam
experiência, pessoal qualificado e competência técnico-
administrativa.
Em segundo lugar, nessa etapa ainda inicial de
descentralização, não se definiu claramente o papel do MEC.
Evidentemente, não cabe mais pensar numa atuação nos moldes dos
anos 70 e 80. Todavia, as mesmas razões que justificam a
descentralização - a dimensão continental e as diferenças
regionais - aconselham também a existência de uma instância de
onde emanem diretrizes gerais, no sentido de que, mesmo atendendo
a diferentes características e necessidades, seja mantido um
padrão nacional de Educação, a ser seguido por todos os sistemas
de ensino.
A determinação desse padrão seria fundamental principalmente
na perspectiva de uma reestruturação produtiva, na medida em que,
atendendo aos requisitos educacionais postos pelos novos perfis
ocupacionais, garantiria melhores oportunidades de inserção no
mercado de trabalho para todos os egressos do sistema
educacional, independentemente da região ou localidade de origem.
A implantação desse padrão nacional seria tarefa do MEC, a quem
deveria caber inclusive a responsabilidade de oferecer apoio, sob
a forma de cooperação técnica, aos Estados e Municípios que
apresentem menores possibilidades técnicas e financeiras para a
resolução dos seus problemas educacionais.
A atribuição destas responsabilidades ao MEC não
significaria uma volta à centralização, na medida em que não será
impeditiva de que outras instâncias - órgãos representativos de
dirigentes educacionais
9
, de pais de alunos e professores, de
segmentos organizados da sociedade civil, etc. - fossem
9
Aqui, nos referimos a órgãos como o Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED), a
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), o Conselho de Reitores das
Universidades Brasileiras (CRUB), etc.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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interlocutores do MEC, levando a ele suas necessidades,
discutindo as diretrizes e prioridades nacionais e ainda seus
mecanismos e estratégias de implementação e controle.
A definição do padrão nacional de Educação Básica seria
também o ponto de apoio de um projeto nacional de Educação, a
partir do qual seriam determinados critØrios mais rgidos que os
atuais para a distribuiªo e a liberaªo dos recursos repassados
pelo MEC através do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação
(FNDE). Com isto, se poderia cobrar maior responsabilidade de
Estados e Municípios na aplicação dos recursos vinculados por lei
à Educação, procurando evitar tanto o desvio quanto a
pulverização desses recursos em projetos pouco conseqüentes ou
desarticulados de uma política educacional mais ampla.
O padrão nacional de Educação Básica seria também a base
para o estabelecimento de um sistema nacional de avaliação, com o
objetivo de acompanhar principalmente o desempenho qualitativo
dos sistemas de ensino. Aqui, é preciso que se entenda a
avaliação não como um mecanismo punitivo, mas como uma estratégia
de garantia de que, em qualquer ponto do país, os alunos dos
cursos de 1º e 2º Graus receberão a mesma base de conhecimentos
relativos a cada um daqueles níveis de ensino. A avaliação
nacional pode ser também um instrumento para a identificação dos
pontos frágeis do sistema educacional, para os quais seriam
dispensadas as atenções necessárias e as devidas medidas
corretivas, seja em termos de recursos financeiros, seja em
termos de assistência técnica, no sentido de que os parâmetros do
padrão nacional venham a ser atingidos. Em síntese, o objetivo
maior do sistema de avaliação deve ser o de elevar a qualidade do
ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro.
Na questão da qualidade do trabalho pedagógico, é importante
esclarecer que a ênfase que a ela deve ser dada não significa a
condenação dos professores. Quanto a isto, cabe lembrar que esta
talvez tenha sido a categoria profissional que, ao menos no
serviço público, teve as maiores perdas nas duas últimas décadas,
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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em termos de status e de salários, o que, em princípio, já
explicaria em grande medida a queda da qualidade do ensino. O
tratamento dado pelas instâncias administrativas aos professores
pode ser visto, assim, como um dos aspectos negativos da gestão
dos sistemas educacionais, por se tornar um dos fatores
determinantes dos problemas qualitativos.
A perda de prestígio e a baixa remuneração, além de
desestimular aqueles que já estavam em exercício, fez com que o
magistério se tornasse uma opção profissional "de segunda linha",
procurada de modo geral pelos alunos de mais fraco desempenho,
que vêm nos cursos de Habilitação ao Magistério e nas
Licenciaturas um caminho fácil de profissionalização, ainda que a
baixos salários, compensados em parte pela estabilidade de um
emprego público.
Paralelamente, e por razões que veremos adiante, os cursos
de formação de professores perderam muito em qualidade,
oferecendo então um preparo bastante precário. Tudo isto, no
período em que a expansão da rede física propiciava o progressivo
acesso de crianças e jovens oriundos das camadas menos
favorecidas, o que exigiria, ao contrário do que ocorreu,
professores com maior competência técnica - domínio de métodos
mais adequados e eficientes - e, principalmente, criatividade,
para o desenvolvimento de técnicas e recursos capazes de levar
esta nova clientela a um bom rendimento escolar.
Assim, a gestão do sistema educacional deve envolver não só
a preocupação com as formas de articulação entre as instâncias
administrativas, com a melhoria dos fluxos burocráticos e dos
mecanismo de liberação e controle dos recursos mas, ainda, com a
tomada de medidas que visem também a melhoria da qualidade do
ensino, com o devido destaque para a situação do magistério,
desde a sua formação - a melhoria dos cursos de formação de
professores - até a carreira docente, com melhor remuneração em
geral e formas de progressão funcional que premiem adequadamente
a competência técnica e o bom trabalho pedagógico realizado.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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2.1.4. A deterioraªo do sistema educacional
Nos meios educacionais existe consenso de que as reformas de
1968 (ensino superior) e 1971 (ensino básico) contribuíram
fortemente para o quadro atual. Essencialmente, desestruturamos
um modelo de escola que fazíamos com alguma competência e que
hoje se mostra mais adequado, e incorporamos o que havia de pior
no modelo norte-americano, como as vocational high school que,
hoje, mesmo nos Estados Unidos, são reconhecidas como um
fracasso
10
.
À medida que o sistema educacional se expandia, abandonamos
progressivamente a preocupação em oferecer uma educação geral de
qualidade no ensino básico, coisa que até então o sistema
educacional realizava a contento, em troca de uma pretensa
profissionalização, justificada na época pela suposição de uma
demanda crescente de quadros técnicos de nivel médio.
Em que pesem os objetivos proclamados, a reforma do ensino
básico pode ser vista também como uma estratégia de diminuição da
pressão por vagas no ensino superior, acenando aos jovens com a
possibilidade de uma entrada mais imediata no mercado de trabalho
que, com a profissionalização, ofereceria boas perspectivas de
remuneração.
Não cabe aqui discutir se houve ou não intencionalidade
nesse processo. O que importa é destacar as suas conseqüências
negativas. A preocupação com a terminalidade do 2º Grau acabou
por contribuir fortemente para a deterioração desse grau de
ensino. Não se fez de fato a profissionalização e destruiu-se a
estrutura curricular que garantia até então uma boa formação
geral. A ênfase nos conteúdos específicos acabou ainda por
transferir para o ensino superior a tarefa de oferecer uma
10
Este fracasso é hoje reconhecido inclusive no Relatório do MIT - Made in America - como uma
tentativa equivocada de fornecer habilitações específicas em instituições externas à empresa.
56
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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educação mais completa e melhor, incluindo os conteúdos mais
gerais.
Entretanto, se esta era uma expectativa dos planejadores das
reformas, pode-se afirmar ter sido quase que totalmente
frustrada, principalmente pela expansão do ensino superior, que
se deu de forma desordenada e com sério comprometimento da
qualidade dos cursos oferecidos. A massificação do 3º Grau
ocorreu, em sua maior parte, através da expansão do setor privado
que, inclusive, atendeu a boa parte da demanda reprimida.
Todavia, da tentativa de incorporação do modelo americano, poucas
mudanças efetivamente podem hoje ser apontadas e dizem mais
respeito à organização formal: a estrutura departamental, a
matrícula por semestre, o sistema de créditos, etc. E não se pode
afirmar com segurança que tenham significado de fato um avanço.
Tal como ocorreu no ensino básico, a ênfase na
profissionalização também marcou a reforma do 3º Grau, apoiada no
seu sentido mais pobre, o da prioridade aos conteúdos específicos
e à especialização estreita, em detrimento de uma formação mais
ampla. Não se configurou, no ensino superior brasileiro, algo
semelhante ao "Bachelor of Arts", o BA norte-americano, onde o
estudante tem contato amplo com diversas disciplinas, sem
preocupação imediata com a opção profissional, que só irá ocorrer
da fato na pós-graduação. Mesmo a existência formal/legal de um
Ciclo Básico não significou qualquer aproximação ao conceito de
BA. Sua implantação não foi generalizada, tendo havido,
inclusive, implícitas e fortes resistências nas áreas das
profissões liberais tradicionais - Medicina, Engenharia e
Direito
11
.
Nas universidades públicas, em que pese sua grande
heterogeneidade, o ensino ministrado é geralmente de qualidade
superior à dos estabelecimentos privados, sejam eles
universidades ou escolas isoladas. A face profissionalizante
também preveleceu nas instituições públicas, mas o fato de serem
11
Sobre este assunto, ver Schwartzman (1991).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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elas responsáveis por cerca de 90% da pesquisa científica feita
no país pode ter contribuído para que a queda da qualidade do
ensino não fosse tão pronunciada.
Do conjunto de questões mais gerais afetas ao ensino
superior podem-se destacar dois pontos particularmente relevantes
para o nosso tema. O primeiro seria o pouco envolvimento do
ensino superior com a melhoria do ensino básico. Nas
universidades, as Licenciaturas se transformaram em cursos de
"segunda linha", perdendo muito em qualidade e prestígio. Sabe-se
que isto se deve também à degradação da carreira do magistério,
que se reflete até mesmo na queda da demanda por cursos de
Licenciatura nas Universidades públicas. Entretanto, mesmo que
houvesse reversão deste quadro, muito teria que ser feito nas
Universidades para recuperar uma de suas funções básicas, que é a
formação de professores. Elas ficaram tão desaparelhadas para o
cumprimento desta função que, nas proposições, há que se pensar
em algo inteiramente novo para atender à formação de recursos
humanos para o ensino básico.
O segundo ponto vem da observação, ao longo das duas últimas
décadas, de uma concentração de recursos na área tecnológica, em
detrimento das Ciências, inclusive as Humanas e Sociais. Desta
forma, a Matemática, a Química, a Biologia e a Física, bases do
conhecimento e do avanço tecnológico, tornaram-se caudatárias da
área tecnológica, assumindo predominantemente um caráter
meramente instrumental, semelhante ao do ensino de Ciências na
metodologia da Formação Profissional. Reduziram-se, nessas áreas,
tanto o espaço e o apoio à pesquisa básica, como à formação de
docentes, à medida que se transformavam em "estágio preparatório"
dos cursos da área tecnológica.
Nessas áreas científicas, inclusive nas Ciências Humanas e
Sociais, a valorização do conhecimento altamente especializado,
em oposição a uma formação mais ampla, trouxe graves
consequências para a capacitação tecnológica mas atingiu
principalmente a formação de docentes para o ensino básico. Mesmo
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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nas grandes universidades públicas, existem hoje poucos docentes
com a chamada "formação generalista", fundamental ao
aprofundamento, nos cursos de graduação, dos conteúdos típicos do
ensino básico, e à pesquisa de novos métodos de ensino daqueles
conteúdos.
Lembre-se ainda que, apesar da reconhecida má qualidade, as
instituições privadas de ensino superior recebem hoje quase dois
terços da matrícula total, sendo que a maioria está em cursos de
Licenciatura. Isto não se explica apenas pelo fato de terem
recebido apoio financeiro do Estado, ou pelas "facilidades"
concedidas pelo Conselho Federal de Educação. Ao retrair as
instituiçoes públicas, o Estado abriu um mercado efetivo tanto
para as instituições privadas como para aqueles que nelas se
graduavam, e que hoje, apesar da precariedade da formação que
receberam, correspondem a cerca de 90% do magistério das redes
públicas.
"Lembre-se que, no caso particular da Educação, há
uma peculiaridade que não tem sido observada: a
capacidade de melhoria e crescimento do sistema
educacional depende essencialmente dos professores, que
são, entretanto, produtos desse próprio sistema. Se ele
se deteriora, deterioram-se também suas possibilidades
de expansão e melhoria. Em outras palavras, a
recuperação do sistema educacional não pode depender
dos professores mal formados que ele, e só ele, pode
produzir.
(...) Neste ponto, é fundamental destacar a enorme
responsabilidade das Universidades, principalmente
aquelas mantidas por recursos públicos, já que a elas
compete restabelecer um círculo virtuoso, oferecendo
cursos de Licenciatura que garantam a oferta de bons
professores para o ensino básico, com especial atenção
para aqueles que irão atuar nos Cursos de Habilitação
ao Magistério, formando os professores de 1º Grau que
serão os responsáveis pela difícil etapa da
alfabetização, que é onde se localizam as maiores
evidências do fracasso escolar" (Fogaça, 1992).
Assim, evidencia-se a necessidade das instituições públicas
de ensino superior melhorarem seus cursos de Licenciatura e
ampliarem a oferta de vagas, principalmente em horário noturno,
de modo a receber e dar uma boa formação à clientela que hoje é
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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obrigada a recorrer aos cursos caros, e de modo geral ruins, das
instituições privadas.
2.1.5. A situaªo do MagistØrio: qualificaªo e remuneraªo
12
Diante dos dados que denunciam o fraco desempenho do sistema
educacional e dos indicativos de que grande parte dos maus
resultados está relacionada à qualidade do trabalho pedagógico,
torna-se evidente que qualquer iniciativa no sentido da melhoria
do ensino básico deve começar por uma atenção especial ao
professor, a quem caberá, em última análise, transformar as novas
propostas que eventualmente surjam numa ação pedagógica
competente.
Os maiores problemas educacionais estão localizados na rede
pública de ensino fundamental. É nela que também se encontram os
maiores problemas relativos à situação do magistério. Existem, no
Brasil, cerca de 1 milhão e cem mil professores atuando no ensino
de 1º Grau; destes, quase 1 milhão está nas redes estaduais e
municipais, atendendo a pelo menos 25 milhões de crianças. A
metade desses docentes está nas regiões Sul e Sudeste, onde
encontramos menores problemas quanto ao nível de escolaridade e
quanto à remuneração.
Apesar dos dados mostrarem melhoria do perfil de
escolaridade média dos docentes do ensino fundamental, dos mais
de 600 mil professores que lecionam nas quatro primeiras séries -
a etapa onde se localizam os piores resultados do sistema - cerca
de 1/4 tem 8 anos de escolaridade ou menos, o que significa no
máximo o 1º Grau completo, sem qualquer habilitação para a função
do magistério e, pior ainda, para a difícil tarefa da
alfabetização.
Os professores com os mais baixos níveis de escolaridade
estão majoritariamente nas redes municipais das zonas rurais das
regiões Nordeste e Centro-Oeste, onde, inclusive, se destaca o
12
Para a elaboração deste item, baseamo-nos em Barreto (1990).
60
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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segmento daqueles que não possuem sequer o antigo curso primário
completo. Estes professores com menos de 5 anos de escolaridade
são mais de 1/3 dos que atuam nas zonas rurais de todo o país.
A figura do professor leigo já é suficientemente conhecida e
apontada como uma das práticas clientelistas mais utilizadas nos
pequenos municípios do interior do Brasil. A baixa média de idade
destes professores - varia de 23 anos no Centro-Oeste a 29 anos
no Nordeste - mostra que, apesar de já identificados como uma das
principais causas do fraquíssimo desempenho das escolas do meio
rural, continuam a ser recrutados pelos dirigentes municipais.
Assim, mesmo que a partir deste momento não fossem feitas novas
contratações de leigos, mantidos no sistema, estes professores
trabalhariam ainda durante 12 a 15 anos, quando atingiriam a
idade mínima para a aposentadoria.
Se considerarmos o impacto sobre os alunos, com uma média de
20 alunos por professor, teríamos, durante aquele período, cerca
de 3,5 milhões de alunos do 1º Grau, a cada ano, atendidos por
aqueles professores leigos. Na zona rural da região Nordeste,
onde se concentra o maior contingente de professores de baixa
escolaridade, o impacto seria sobre cerca de 2 milhões de alunos,
a cada ano. Assim, embora em termos absolutos o total de
professores com baixa escolaridade não seja hoje tão
significativo face ao total de docentes, o impacto sobre o
alunado ainda é preocupante, porque trata de cerca de 25% da
matrícula das zonas rurais.
No que se refere à remuneração, ainda que os poucos estudos
existentes mostrem uma estreita relação entre salários e nível de
instrução, permanecem profundas desigualdades por região e por
local de residência. De modo geral, quanto mais baixo o nível de
instrução mais baixo o salário mas, professores residentes na
zona rural percebem salários mais baixos do que aqueles que
residem nas zonas urbanas, mesmo possuindo o mesmo nível de
escolaridade.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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Os dados da RAIS 1987 indicavam uma melhora dos salários em
relação ao início dos anos 80. A remuneração média nacional
passara de US$ 182,60, em 1982, para US$ 286,80. Entretanto, as
médias regionais continuavam apresentando enormes variações. Os
quase 40 mil professores das quatro primeiras séries residentes
na zona rural do Nordeste percebiam, em 1982, um salário médio de
US$ 20,17; na região Sul, os professores em igual condição
percebiam em média US$ 73. Estas variações praticamente se
repetem na RAIS 87, último ano para o qual se dispõe de dados.
Mesmo com a elevação da média nacional, os professores do 1º
Grau continuavam a ser menos remunerados em relação a categorias
profissionais com nível de escolaridade semelhante. Em todo o
país, o salário médio dos "auxiliares de contabilidade/caixas"
era, em 1987, equivalente a 1,22 vezes o salário médio dos
docentes. Embora com escolaridade menor, os "secretários"
recebiam, em 1987 também, 1,32 vezes o salário médio dos
professores. Nos cálculos da remuneração por anos de estudo,
tomando-se a região Sudeste, onde encontramos os melhores
salários do magistério, enquanto a remuneração dos professores
era US$ 27, a dos "auxiliares de contabilidade/caixa" chegava a
US$ 36 e a dos "secretários" a US$ 40
13
.
Embora estes não sejam dados tão recentes, considerando-se
que, nos últimos anos, foram marcantes as diferença entre as
políticas salariais para os setores público e privado, com
grandes perdas para os servidores públicos, nada indica que
atualmente a posição relativa dos professores do 1º Grau tenha
melhorado.
2.1.6. O financiamento da educaªo
O aspecto político mais importante incorporado na
Constituição Federal de 1988 e ligado à questão do financiamento
da Educação, foi a descentralização das decisões quanto à
13
É o contrário do que ocorre no Japão, onde os professores ganham, em média, 20% mais do que os
outros profissionais com a mesma escolaridade.
62
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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aplicação dos recursos: eliminou-se a aplicação direta pela
União, através do MEC e em projetos para o ensino de 1º e 2º
Graus planejados centralmente, o que, entretanto, trouxe alguns
problemas.
A Constituição, além de definir os percentuais dos recursos
a serem aplicados na Educação, estabeleceu o grau de
responsabilidade de cada instância governamental em relação ao
sistema educacional. No caso do ensino fundamental, embora a
competência constitucional seja dos municípios, aos Estados cabe
compartilhar esta tarefa e, ao Governo Federal, a função de
oferecer apoio técnico aos Estados e Municípios, no que se refere
à organização curricular, na pesquisa e experimento de novos
métodos pedagógicos e, ainda, em programas de treinamento e
atualização dos professores dos sistemas estaduais e municipais.
Entretanto, apesar destes preceitos constitucionais, a ação
da União não tem sido efetuada de modo a realizar suas funções,
centrando-se quase que exclusivamente no repasse de recursos,
utilizando as transferências negociadas - a destinação dos
recursos geridos pelo FNDE - para atender, na maioria das vezes,
a objetivos casuísticos e clientelistas. Todavia, outras
conseqüências das alterações introduzidas em 1988 podem ser
citadas.
Em primeiro lugar, houve maior explicitação da crise
financeira do Estado, porque ao deixar de atuar diretamente nos
sistemas públicos de ensino básico e com isso minimizar eventuais
problemas de financiamento, a União passou a ter que transferir
os recursos para que Estados e Municípios passassem a implementar
suas próprias ações.
Em segundo lugar, à descentralização das decisões não
correspondeu uma efetiva repartição de encargos. Com isto,
abriram-se novos espaços de conflito entre Estados, Municípios e
Governo Federal, na partilha de recursos escassos, já que as
administrações estaduais e municipais não tomaram de fato, para
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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si, a responsabilidade sobre os já suficientemente conhecidos
problemas do ensino básico, cujas soluções são agora de sua
inteira competência. Apesar das dimensões da crise educacional,
não implementaram nenhum projeto relevante para a melhoria do
ensino.
A participação do ensino fundamental nos gastos do MEC é
outro ponto que chama bastante a atenção. Nos últimos anos, ela
tem sido oscilante; os recursos para o 1º Grau são crescentes
entre 1983 e 1986, caindo sistematicamente daí em diante. De
acordo com a Constituição Federal de 1988, dos 18% da receita
líquida de impostos - parte vinculada à Educação - pelo menos a
metade deve ser aplicada na erradicação do analfabetismo e na
universalização do ensino de 1º Grau. Entretanto, naquele mesmo
ano, o Governo gastou apenas 6,6% neste nível de ensino. Nos
anos recentes, os recursos aplicados diretamente pela União no
ensino fundamental têm se movimentado no sentido contrário às
prioridades declaradas.
Lembre-se, entretanto, que o desrespeito à Constituição não
é privilégio do Governo Federal. Estados e Municípios utilizam-se
dos mais variados subterfúgios para escaparem à determinação de
gastar em Educação 25% do total de suas receitas de impostos e
transferências.
A complexidade dos caminhos burocráticos pelos quais os
recursos transitam dificultam também o acompanhamento e o
controle da sua aplicação. A falta de informações mais completas
ou a falta de fidedignidade daquelas que são divulgadas tornam
duvidosos diagnósticos tais como aqueles apresentados em
relatórios do Banco Mundial, por exemplo, de que o nível global
de recursos destinados à Educação seria suficiente, enquanto que
as formas de distribuição ou de aplicação é que seriam
equivocadas; em resumo, que o problema maior, no que se refere ao
financiamento da Educação, seria o da gestªo e não o do volume
dos recursos alocados na Educação.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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De qualquer modo, não é possível perceber, nos dados
disponíveis, quaisquer indicações que confirmem tratamento
privilegiado ao ensino fundamental em termos de gasto público.
Nem mesmo a obrigatoriedade, por parte dos Municípios, de
aplicação em Educação de 25% da receita de impostos é uma
garantia de que o ensino fundamental esteja sendo atendido. A
grande evidência, no caso, é que a dimensão da questão
educacional pressupõe um volume de recursos que ultrapassa a
capacidade financeira atual de qualquer burocracia tomada
isoladamente. Mesmo os Estados mais ricos, como São Paulo por
exemplo, não podem prescindir da participação conjunta das três
esferas administrativas no enfrentamento do problema. Isto traz
dúvidas, necessariamente, sobre propostas extremas de
descentralização e autonomia, tipo "municipalização do ensino de
1º Grau". No contexto da crise, a questão que se coloca não é a
da autonomia, mas a do estabelecimento, para todos os níveis
administrativos, de regras e mecanismos de controle da aplicação
das verbas da Educação, de modo que se assegure a realização de
programas e projetos realmente eficazes.
Sobre esta questão, sabe-se que embora o país gaste pouco
menos de 4% do PIB em Educação, "apenas 1% chega efetivamente às
escolas de 1º Grau, onde se encontram mais de 25 milhões de
crianças. (...) Se as leis do país fossem cumpridas, haveria
cerca de 300 dólares para cada aluno do ensino fundamental.
Ocuparíamos o primeiro lugar na América Latina, em termos de
investimento educativo. Com as distorções do sistema atual, estão
disponíveis apenas cerca de 160 dólares mas, desses, apenas 80
chegam efetivamente à escola. E nem sempre esses 80 dólares se
destinam a fins escolares" (Fundação Bradesco & Instituto Herbert
Levy, 1992).
Quanto ao uso mais adequado e eficaz dos recursos
disponíveis, podemos pensar, por exemplo, no Governo Federal, que
administra cerca de 40% dos US$ 16 ou 17 bilhões que o país gasta
com o ensino público. Com estes recursos, a União poderia ter
presença decisiva no problema do fracasso nas séries iniciais do
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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1º Grau. A cada ano, o total de alunos novos que tende a repetir
corresponde a cerca de 3,5 milhões. A contratação de 175 mil
professores-alfabetizadores de bom nível, para trabalhar com
estes alunos em turmas de, no máximo, 20, implicaria um gasto
anual de US$ 910 milhões, se cada um desses professores recebesse
US$ 400 mensais, o que seria um salário muito superior ao que a
maioria dos Estados e Municípios paga hoje. Ainda assim, tal
programa corresponderia a apenas 14% dos recursos geridos pelo
MEC.
Em resumo, deve-se pensar no aumento dos gastos com a
Educação, porque os problemas são muitos e de grande amplitude.
Ao mesmo tempo, deve-se considerar que o que se gasta atualmente
com os sistemas públicos de ensino, mesmo que não seja
suficiente, pode ser aplicado de maneira mais adequada. Em outras
palavras, a crise financeira do Estado não pode servir de
argumento para que se encubra a existência de problemas na gestão
dos recursos destinados à Educação. Mas, por outro lado, não se
pode deixar de buscar novas fontes e formas de financiamento de
projetos e programas que visem a superação dos problemas
educacionais, a pretexto de que a questão do financiamento da
Educação se resolve apenas pela melhoria da gestão
14
.
A existência de problemas de gestão também não deve, por sua
vez, impedir a discussão em torno das parcerias necessárias para
que, num prazo o mais breve possível, se eleve a escolaridade da
população em geral e dos trabalhadores em especial.
Por todas as razões expostas até aqui, é indiscutível, hoje,
a crescente importncia da escolaridade bÆsica como requisito
para a profissionalizaªo . Assim, pressupõe-se uma ação das
empresas, diretamente e também através de suas instituições
educativas e de formação profissional, no sentido de colaborar
com o setor público, ampliando a oferta de educação geral, de
escolaridade básica para a clientela atendida por aquelas
instituições. De acordo com estudos feitos nessa área, esta
14
Até aqui, este item está baseado em IEDI (1992) e Fogaça & Eichenberg (1993).
66
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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oferta já vem ocorrendo, mas sem a amplitude necessária e ainda
interpretada de maneira oposta ao que mostram as tendências
internacionais: "SENAI e SESI vêm deslocando mais de 25% (...) de
seu esforço financeiro (...) para o suprimento das carências
cognitivas dos aprendizes que eles recebem em suas escolas"
(Fundação Bradesco & Instituto Herbert Levy, 1992).
Este fato vem sendo considerado como "um desvirtuamento de
suas funıes essenciais ", para o que se recomenda que tais
recursos, ou esforços financeiros, "deveriam se concentrar na
formação profissional"/(Fundação Bradesco & Instituto Herbert
Levy, 1992). Lembre-se que os recursos que mantêm aquelas
instituições não são de fato recursos privados, como normalmente
se faz crer, já que a parcela recolhida para seu financiamento,
tendo como base a folha de salários, está embutida nos preços
praticados pela indústria, o que a transforma em recurso público.
Assim, os problemas do financiamento da Educação, tanto a
destinação e gestão dos recursos na esfera pública, quanto a
utilização daqueles geridos pelas instituições empresariais,
indicam a importância, para este trabalho, de se esclarecer os
papéis dos diferentes agentes envolvidos na questão da
qualificação dos recursos humanos - o quê compete a quem - o que
se explicitará melhor no capítulo das propostas.
2.2. A Formaªo Profissional
Em relação ao nosso sistema de formação profissional, cabe
assinalar que ele cumpriu uma importante tarefa na
industrialização brasileira, que foi a formação dos trabalhadores
qualificados de acordo com os requisitos da base técnica
dominante. Como se sabe, a estrutura ocupacional típica do
paradigma eletro-mecânico contém um pequeno segmento de
trabalhadores cuja qualificação pode ser obtida a partir de uma
capacitação básica (basic skill) equivalente ao antigo curso
primário. Por outro lado, a organização taylorista do trabalho
também estreita o âmbito das responsabilidades, mesmo no caso dos
trabalhadores qualificados.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Estas características explicam, em boa medida, como foi
possível, num curto espaço de poucas décadas, transformar um país
"essencialmente agrícola" numa importante economia industrial,
sem que houvesse surgido maiores estrangulamentos quanto à
disponibilidade de mão-de-obra qualificada (Fogaça, 1990).
Essa peculiaridade da organização taylorista-fordista
permitiu, por exemplo, que o SENAI, a mais expressiva instituição
na área da Formação Profissional, mudasse suas prioridades ao
longo de sua existência. A ênfase inicial na Aprendizagem, que
então buscava combinar o ensino fundamental com a formação
específica, foi progressivamente substituída pela prioridade aos
cursos de curta duração em conformidade com as necessidades mais
imediatas das empresas, para o que as instituições de formação
profissional se mostraram altamente dinâmicas.
Esta mudança de ênfase implicou um crescente abandono da
preocupação com a oferta de Educação Geral, vista então como
algo fora de suas atribuições. Esta atitude foi sensivelmente
reforçada pelo fato de que, na medida em que o sistema
educacional se expandia quantitativamente, os programas de
Formação Profissional podiam até mesmo ser mais seletivos,
elevando seus requisitos de escolaridade.
A possibilidade de qualificar mão-de-obra independentemente
de uma melhoria qualitativa do sistema educacional acabou por
criar um fosso entre essas duas esferas, o que se manifestou
inclusive na desarticulação institucional entre o Ministério do
Trabalho, "responsável" pela Formação Profissional, e o
Ministério da Educação, a quem competem as preocupações com a
Educação Geral. As eventuais tentativas de superação dessa
desarticulação não foram bem-sucedidas e, na maioria das vezes,
foram vistas como uma intromissão dos educadores numa esfera que
se supunha não terem eles competência.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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A autonomia do nosso sistema de Formação Profissional não se
referia apenas ao sistema educacional, mas também ao próprio
Estado e aos sindicatos de trabalhadores. As tentativas de
estabelecimento de políticas para a área ou a criação de
conselhos tripartites para formulação dessas políticas eram
percebidas como ingerências indevidas numa atividade
essencialmente privada, até porque os encargos sobre a folha de
salários, que financiam o SENAI, o SENAC e congêneres, sempre
foram vistos como "recursos das empresas", isto é, como recursos
privados. No máximo, o sistema de Formação Profissional se
propunha a prestar colaboração técnica, oferecendo programas
especiais para clientelas outras que não as indicadas pelas
empresas, desde que o Estado os financiasse.
Este cuidado com sua autonomia não criou até agora maiores
constrangimentos junto ao meio sindical, na medida em que, ao
contrário do que ocorre em outros países, a Formação Profissional
jamais constituiu ponto de destaque na agenda das negociações. Ao
que tudo indica, esta postura já está mudando, o que certamente
levantará a questão da gestão tripartite das instituições de
Formação Profissional.
O fato é que esta colagem das instituições de formação
profissional às necessidades mais imediatas e específicas das
empresas, se por um lado possui uma racionalidade inquestionável,
por outro, constitui-se numa barreira tanto aos desempregados e
aos ocupados em atividades informais, quanto ao acesso dos menos
escolarizados à Formação Profissional. Essa exclusão pode se
tornar ainda mais problemática para aqueles segmentos que já não
poderão ser reciclados - por serem mais velhos ou pela baixa
escolaridade - na eventualidade de uma intensa difusão das novas
tecnologias. Isto quanto aos trabalhadores diretos.
A questão, agora, é saber se a estrutura e as estratégias de
atuação consolidadas nas cinco décadas de existência do sistema
de formação profissional darão conta dos requisitos ocupacionais
introduzidos pelas novas características de flexibilidade e
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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participação expostos no capítulo introdutório. Isto se refere
não somente a seus procedimentos internos, mas também à sua
articulação com o sistema produtivo. Como veremos na seção
seguinte, pode-se detectar uma tendência, pelo menos nas empresas
tecnologicamente mais dinâmicas, a assumir intra-muros uma
responsabilidade cada vez maior na Formação Profissional,
diminuindo a dependência face a instituições externas. Isto
mudaria significativamente os objetivos e as formas de atuação
das instituições de formação profissional.
Lembre-se ainda que o conceito de qualificação consagrado
nas ações de formação profissional influenciou
extraordinariamente a estrutura e o funcionamento dos cursos
profissionalizantes das redes de ensino regular - os cursos
técnicos -, orientando-os para a prioridade aos conteúdos
específicos e à parte prática da qualificação profissional.
Assim, embora esta discussão esteja centrada nas instituições de
formação profissional, seus resultados dizem respeito também às
decisões que devam ser tomadas, por exemplo, em relação à rede de
escolas técnicas.
De todo modo, existe hoje o consenso de que a qualificação
profissional, mesmo ao nível do operariado, depende de uma base
de educação geral equivalente a, pelo menos, o 1º grau completo.
Neste caso, a Formação Profissional tradicionalmente conhecida,
focada essencialmente nos aspectos operacionais, já não atenderia
às novas exigências. Portanto, instituições como o SENAI teriam
que rever suas prioridades, no sentido de oferecer uma
qualificação adequada às novas necessidades das empresas.
Entretanto, este é um item que tem gerado alguma
controvérsia. De um lado, considera-se que, no caso brasileiro,
tanto os novos requisitos, quanto os efeitos positivos da
modernização tecnológica, recairão apenas sobre a parcela de
trabalhadores localizada nas áreas informatizadas da produção. De
outro lado, acredita-se que a modernização não significará o fim
da heterogeneidade que se verifica hoje na indústria brasileira.
Nos processos em que as economias de escala e a padronização
70
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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continuem sendo importantes, predominariam, ainda, as estruturas
ocupacionais polarizadas e o trabalho fragmentado, com tarefas
rigidamente definidas e realizadas sob estreita supervisão.
Assim, seja porque a maioria dos trabalhadores continuaria
exercendo as funções e tarefas tradicionais, seja porque "o
Brasil ainda vai precisar por muito tempo de torneiros
mecânicos", considera-se que a metodologia tradicionalmente
empregada nas instituições de formação profissional
corresponderia às necessidades atuais e futuras da indústria
brasileira.
Para ambos os casos, cabe esclarecer que o atendimento a
empresas em diferentes estágios tecnológicos continuaria a ser um
dos objetivos das instituições de formação profissional. Isto
inclui tanto as indústrias "de ponta", como aquelas
tecnologicamente mais atrasadas. Mais ainda, estamos falando da
emergência de uma nova base técnica, cujo alcance não está
restrito ao contingente de pessoas direta e imediatamente
envolvidas com os novos equipamentos e formas de organização; ao
contrário, ela se torna dominante na medida em influencia todas
as instâncias da sociedade, o que inclui os padrões, a
mentalidade e o comportamento dos agentes econômicos.
Assim, mesmo que se reconheça a hipótese de sobrevida do
fordismo, principalmente nas regiões menos desenvolvidas, e que
uma maior competitividade e produtividade pode ser alcançada
ainda em aperfeiçoamentos dos processos baseados na automação
rígida, não se pode concluir que a moderna produção em massa não
sofrerá profundas influências das novas técnicas de automação e
das novas formas de divisão do trabalho entre empresas,
associadas a outros ritmos e padrões de qualidade.
Da mesma forma, não se pode considerar que a necessidade de
elevação da escolaridade da força de trabalho não seja desejável,
a pretexto de que os novos requisitos ocupacionais seriam uma
necessidade exclusiva da automação flexível. Em pesquisas sobre
71
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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modernização, qualidade e produtividade realizadas recentemente,
verifica-se o consenso de que grande parte da mão-de-obra da
indústria brasileira, em especial a "semiqualificada", não possui
as competências básicas (basic-skills) requeridas pelos novos
padrões e que os problemas de desempenho apresentados dizem
respeito à falta da escolaridade regular de conteúdos gerais. Com
isto, a oferta de educação geral passa a ser peça fundamental na
formação, qualificação e reciclagem de trabalhadores.
No SENAI, algumas mudanças já vêm ocorrendo, justificadas em
termos de redefinição de objetivos e de estratégias de atuação
face às novas necessidades da indústria. A Aprendizagem, que foi
a grande justificativa para sua criação, deixou de ser a
prioridade maior, cedendo espaço aos cursos curtos e realizados
dentro das empresas. De acordo com a experiência do SENAI de São
Paulo, ao decréscimo de matrículas nos cursos de Aprendizagem,
Qualificação e Aperfeiçoamento - que são os de mais longa duração
e que acoplam a aprendizagem de Tarefas e Operações a um conjunto
de conhecimentos mínimos indispensáveis ao exercício da ocupação
(as "disciplinas instrumentais") - tem correspondido o aumento da
demanda, por parte das empresas, de cursos curtos destinados
principalmente ao pessoal diretamente ligado à produção
(trabalhadores qualificados e semiqualificados) (Leite, 1992).
Nesses cursos, os conteúdos mais solicitados pelas empresas
seriam exatamente aqueles que compõem as disciplinas
instrumentais dos cursos regulares do SENAI. Outra área em
expansão seria o que denominam "Treinamento para a Comunidade",
cursos operacionais de curta duração, abrangendo ocupações que,
em princípio, permitiriam a obtenção de renda adicional,
principalmente através do trabalho autônomo ou doméstico, e
destinados, pelo que se deduz, a trabalhadores não-qualificados,
desempregados, domésticas, etc.
Para o SENAI/SP, estas mudanças seriam a resposta adequada
às exigências educacionais postas pelo novos requisitos
ocupacionais, porque atendem aos segmentos mais frágeis (no
72
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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"Treinamento para a Comunidade") e porque os cursos de curta
duração demandados pelas empresas e destinados aos trabalhadores
diretos estariam privilegiando os conteúdos gerais, sob a forma
das disciplinas instrumentais.
Sem dúvida alguma, mesmo com programas eminentemente
operacionais, o atendimento a demandas sociais sempre tem uma
conotação positiva, principalmente quando o mercado de trabalho
se ressente de uma aguda crise econômica. Da mesma forma, a
transmissão dos conteúdos das disciplinas instrumentais a
trabalhadores de pouca qualificação e, de modo geral, de baixa
escolaridade, significam de fato algum acréscimo de conhecimento,
o que será sempre benvindo, mesmo que não corresponda aos
conceitos que norteiam a discussão em torno da reestruturação
produtiva.
Pode-se também afirmar que, ao demandar este tipo de curso,
as empresas estariam externando uma nova percepção em relação às
necessidades de treinamento do pessoal diretamente ligado à
produção. Isto, sem dúvida, é um indício importante de que o
empresariado começa a se dar conta de que os problemas de
desempenho não se resumem à habilidade na operação de máquinas e
equipamentos. Entretanto, a atenção que dão hoje às estratégias
e conteúdos apontados pelo SENAI/SP não deve elidir a questão
maior, que é a da necessidade da elevação do nível de
escolaridade da força de trabalho, chegando pelo menos ao nível
do 1º grau, de modo que a indústria brasileira possa contar com
trabalhadores com efetivas condições de acompanhar a evolução da
tecnologia e que, de outro lado, se evite uma possível
marginalização de grandes contingentes da população.
As disciplinas instrumentais, como o próprio nome indica,
embora digam respeito, na origem, às disciplinas técnico-
científicas que estão presentes no ensino regular de educação
geral - Matemática, Física, Química, Biologia, etc. -, abrangem
apenas e tão somente os ítens daquelas disciplinas que estejam
estreitamente relacionados a um determinado conjunto de tarefas,
73
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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que caracteriza, por sua vez, uma determinada ocupação ou mesmo
um posto-de-trabalho. Desta forma, não se pode entender que as
disciplinas instrumentais sejam, mesmo em seu conjunto,
equivalentes ou substitutas da educação básica e que conduzam à
polivalência que caracterizaria o moderno trabalhador industrial.
No caso específico dos segmentos mais frágeis, a preocupação
com uma fonte de renda adicional imediata é importante e, aliás,
sempre foi a principal justificativa para programas especiais, do
tipo Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra Industrial
(PIPMOI; depois transformado em PIPMO), destinados aos três
setores da economia, e cuja proposta era a de atender
principalmente aos desempregados e não-qualificados. Os
resultados obtidos nestes programas não autorizam a dizer que
cursos curtos, intensivos, resolvam ou minimizem a questão do
emprego ou da distribuição de renda.
Mais ainda, observe-se que as qualificações geralmente
oferecidas por programas desse tipo, assistenciais e comunitários
são, em sua maioria, as que já têm um mercado reduzido, ou
aquelas que são bastante suscetíveis às oscilações do mercado.
Em outras palavras, para os desempregados e menos qualificados,
ao lado da oferta de possibilidades mais imediatas de auferição
de algum rendimento, deve haver uma preocupação maior em torná-
los menos frágeis numa etapa de desenvolvimento econômico na
qual, já se sabe, muitas ocupações poderão se tornar totalmente
obsoletas e deverá ocorrer sensível diminuição da demanda por
trabalhadores semiqualificados.
De todo modo, o que nos parece estar ocorrendo na discussão
em torno de como as instituições de formação profissional devem
se ajustar a um processo de reestruturação produtiva, é o mesmo
fenômeno que paralisou a busca de soluções para o ensino de 2º
grau quando da reforma educacional de 1982, que acabou com a
profissionalização compulsória, condenada quase que unanimemente
pelos educadores. Ainda assim, há quase uma década que se
persegue a descoberta de uma "fórmula" a partir da qual o ensino
74
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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de 2º grau nem seja tão "acadêmico" quanto nos anos 50 e 60, nem
tão profissionalizante como na vigência da Lei 5.692/71.
No caso da Formação Profissional, admite-se a inadequação do
conceito tradicional de Qualificação Profissional, que conduz à
especialização estreita e à prioridade para os conteúdos
específicos; reconhece-se a emergência de um novo conceito, no
qual se destaca a importância da Educação Geral, ou da
escolaridade básica, como pré-requisito à melhor inserção no
mercado de trabalho. Entretanto, buscam-se adaptações de práticas
antigas, estruturadas a partir do conceito tradicional, ou busca-
se um meio-termo, algo que nem seja a educação geral que
conhecemos, e nem seja a formação profissional que há 50 anos vem
sendo oferecida. É neste contexto que se enquadram tanto a idéia
das disciplinas instrumentais como resposta à necessidade de
desenvolvimento de habilidades intelectuais, como substitutas da
educação regular de 1º e 2º Graus, quanto a idéia algo difusa de
"general vocational education"
15
.
Em síntese, parece restar alguma dificuldade em aceitar
concretamente aquilo que a nível do discurso é amplamente
consensual. Lembrando a experiência internacional, em especial a
americana, que possui problemas semelhantes aos nossos, não
haveria dúvida de que a educação geral é a melhor "qualificação
profissional" que se pode oferecer aos jovens e adultos pouco
escolarizados, estejam eles empregados ou não. Nesta tarefa, o
papel das empresas e das instituições de Formação Profissional
pode ser exatamente o de aproveitar os programas de treinamento
na empresa ou as ações junto às comunidades para a oferta, ao
lado dos conteúdos "profissionalizantes", de conteúdos de
educação geral. Lembre-se ainda que estamos tratando de um
segmento da população que, exatamente pela multiplicidade de
problemas que enfrenta, dificilmente volta aos bancos escolares;
desta forma, as oportunidades no local de trabalho ou de moradia
seriam alternativas mais adequadas e, talvez, mais eficientes do
que as estratégias tradicionais de ensino supletivo.
15
Referimo-nos aqui aos trabalhos de Leite (1992) e de Amadeo (1992).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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No que se refere ao atendimento dos segmentos mais carentes
e/ou menos escolarizados, cabe lembrar ainda a experiência alemã.
Como já vimos, os sindicatos de empresas oferecem cursos de
aprendizagem de ofcios (no sentido mais tradicional da palavra)
para aqueles que abandonam o sistema educacional numa fase que
equivale ao nosso 1º Grau. No Brasil, ao contrário, as
oportunidades de ingresso nos cursos regulares de Aprendizagem
não estão abertas a esse contingente de jovens.
Entretanto, ainda que estas oportunidades sejam oferecidas,
não significa que se resolva o problema de emprego destes jovens,
ou mesmo dos adultos trabalhadores não-qualificados e também de
pouca escolaridade, porque, para que se assegure alguma eficácia,
a oferta de aprendizagem de ofícios, principalmente os mais
"tradicionais", pressupõe a existência de mercados de trabalho
estruturados, ou seja, que como aprendiz e, posteriormente, como
profissional os indivíduos sejam reconhecidos como tais, isto é,
como profissionais "do ramo", a quem será dada preferência na
ocupação das vagas existentes.
Outro aspecto importante a ser lembrado é que as iniciativas
alemãs de formação profissional que se mostraram bem-sucedidas, e
a aprendizagem de ofícios é ainda o exemplo, são aquelas que são
conduzidas pela indœstria - e não por empresas - através de
órgãos representativos, em parceria com os sindicatos de
trabalhadores e com o Governo. No Brasil, ainda não chegamos a
este tipo de ação tripartite.
2.3. A Participaªo do Empresariado
O fraco desempenho do ensino básico brasileiro nem sempre
constituiu preocupação para o empresariado. Acostumadas ao
sucesso das estratégias de qualificação profissional destinadas
aos pouco escolarizados - cursos rápidos, de baixíssimo custo e
de resultados positivos -, as empresas brasileiras sempre se
mantiveram à distância dos problemas mais gerais do sistema
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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educacional, atentando, no máximo, para as situações diretamente
ligadas às suas necessidades de pessoal de maior qualificação - o
ensino superior nas áreas tecnológicas e o ensino técnico de 2º
Grau.
Ainda assim, a manifestação empresarial foi no sentido de
cobrar do Estado o investimento naqueles cursos, o que, no caso
do ensino técnico de nível médio, acabou por gerar uma rede de
escolas técnicas, de altíssimo custo de instalação e de
manutenção, e altamente privilegiada. Na previsão de gastos para
1992, as escolas técnicas federais, apesar de contribuírem com
menos de 1% da matrícula total do ensino de 2º Grau, foram
contempladas pelo MEC com recursos equivalentes, por aluno, a 70
vezes mais do que na rede de educação geral. Lembre-se que nem
mesmo o setor privado da Educação jamais investiu tão pesadamente
quanto o Estado na oferta de cursos técnicos de nível médio. Em
outras palavras, no Brasil, ao contrário do que ocorreu na
Alemanha, por exemplo, o Estado deixa de aplicar recursos na
universalização da educação básica - de conteúdos gerais - que é
o seu dever, para financiar as habilitações específicas de um
reduzidíssimo contingente de alunos, o que deveria ser de inteira
responsabilidade das empresas.
Assim, o interesse empresarial pelas questões afetas ao
ensino regular de 1º Grau é um fenômeno recente e ainda
razoavelmente restrito ao segmento mais afetado pelas
transformações que marcam a economia mundial neste final de
século. Neste segmento, os problemas de desempenho começam a
indicar a necessidade de se contar com trabalhadores de maior
escolaridade, na medida em que as falhas de desempenho apontadas
dizem respeito às habilidades intelectuais demandadas pelas
inovações introduzidas. Esse segmento empresarial se dá conta de
que "a importância do saber pensar, assim como as novas
responsabilidades e o próprio manuseio de equipamentos caros e
sensíveis, conduzem a uma nova relação entre o homem e a máquina,
e entre os diversos níveis da hierarquia ocupacional, que
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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demandam conhecimentos vão muito além dos aspectos operacionais
de uma ocupação" (Fogaça, 1992).
Todavia, boa parte das propostas de enfrentamento da crise
do sistema educacional vindas do empresariado, seja
individualmente, seja através de órgãos representativos, apontam
para soluções intra e inter-empresas, algumas delas - as que se
referem ao Salário-Educação, por exemplo - apoiadas na crítica
aos problemas da gestão dos recursos destinados à Educação.
Embora as empresas preocupadas com a questão da escolaridade dos
trabalhadores elejam acertadamente a oferta de cursos supletivos
de 1º Grau como ponto de partida de seus programas educacionais,
as estratégias escolhidas demonstram uma percepção ainda
equivocada do problema. A maioria prefere criar escolas próprias
e já há um movimento significativo no sentido da contratação de
serviços de terceiros - professores autônomos ou escolas da rede
privada; poucos são os exemplos de parceria com Prefeituras ou
outras estratégias de apoio aos sistemas públicos de ensino, o
que demonstra a permanência de uma visão particularista, de que
cada empresa pode resolver o "seu" problema. Acrescente-se que
existem ainda aquelas que pretenderiam o acesso a recursos
públicos para financiar suas iniciativas educacionais, ou o
estabelecimento de incentivos fiscais para compensação dos gastos
com a educação de seus empregados (Fleury, 1993).
Quanto a isto, é preciso que se lembre que a oferta de
educação básica gratuita é um dever do Estado, porém em seus
sistemas públicos de ensino, o que garante principalmente que ela
seja aberta a todos, sem discriminação de qualquer espécie. Em
segundo lugar, os recursos vinculados à Educação hoje
existentes, particularmente o Salário-Educação, são fundamentais
à sobrevivência dos sistemas públicos, notadamente nas regiões
menos desenvolvidas. Assim, o deslocamento dos recursos do
Salário-Educação para a manutenção daquele sistema administrado
pelas empresas poderia significar o colapso do sistema público, o
que, em última análise, pode significar o agravamento dos
problemas atuais.
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Lembre-se ainda que, se os requisitos de escolaridade estão
postos mesmo para os mais baixos níveis da hierarquia ocupacional
e, mais ainda, se envolvem necessariamente o próprio consumidor,
que precisa estar em condições de usufruir dos bens e serviços
mais modernos, significa então que a questão educacional não se
resolve mais por iniciativas isoladas ou mesmo setoriais, e nem
pelo atendimento a parcelas da população em idade escolar. Assim,
o envolvimento empresarial com a educação fundamental deve ser
principalmente no sentido de apoiar os sistemas públicos, em
esquemas de parceria com as secretarias estaduais ou municipais
de Educação, e em iniciativas que se abram não só para seus
empregados mas, também, para os demais jovens e adultos que
demandem a complementação da escolaridade básica.
Dessa forma, também não se justifica a concessão de um
verdadeiro subsídio a escolas privadas, nem mesmo a título de
prestação de serviços educacionais e como se o atendimento às
necessidades de complementação de escolaridade de adultos
trabalhadores fosse uma especialidade de determinadas
instituições educacionais. A educação básica que o trabalhador
precisa é a mesma que deve ser oferecida em toda a rede de ensino
regular, o que significa que não há mistérios nem fórmulas
especiais ou exclusivas deste ou daquele colégio; com isso, o
imperativo, hoje, é salvar a rede pœblica de ensino bÆsico, pois
somente através dela a indœstria, e não esta ou aquela empresa,
pode garantir a mão-de-obra, jovem ou adulta, com a escolaridade
necessária ao sucesso da reestruturação produtiva.
O problema educacional brasileiro afeta a economia como um
todo, e desta perspectiva deve ser enfrentado. Ainda que as
sabidas heterogeneidades do país e do próprio setor produtivo
permaneçam, não podem servir de argumento a favor da continuidade
do caráter desigual e seletivo que marca até aqui o sistema
educacional brasileiro.
Por conseqüência, e tomando como base as tendências
internacionais, a atuação empresarial em favor da Educação Básica
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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deve se dar através de seus órgãos representativos e associações,
neste momento aproveitando inclusive as Câmaras Setoriais onde,
junto com o Governo e com os trabalhadores, o empresariado vem
discutindo o projeto brasileiro de reestruturação produtiva.
Esta atuação pode ocorrer em vários níveis:
- Através de uma participação maior na condução das
políticas educacionais e na tomada de decisões em torno dos
problemas que configuram a crise do sistema educacional
brasileiro, exigindo principalmente maior transparência na gestão
dos recursos aplicados nos sistemas públicos de ensino. Nas
questões relativas ao Salário-Educação, deve-se pensar na
simplificação do processo de arrecadação e distribuição, e também
na maior facilidade para os casos de aplicação direta pela
empresa mas, fundamentalmente, que se exija dos governos uma
utilização correta e eficiente daqueles recursos, passível de ser
supervisionada pela sociedade, de modo a evitar os atuais desvios
e mau uso político constatados.
- Através da capacidade instalada que as empresas já
possuem, voltadas hoje para a qualificação profissional. Em
outras palavras, dadas as dimensões da crise educacional e da
crise financeira do Estado, as empresas podem colaborar com os
sistemas públicos, atendendo principalmente à população adulta,
formalmente empregada ou não, recuperando a oferta de educação
geral nas ações de qualificação profissional que desenvolva
internamente ou através de suas instituições de formação
profissional. Lembre-se que, no caso dos adultos trabalhadores,
uma das maiores dificuldades para a complementação da
escolaridade, através do ensino supletivo, é a conciliação entre
os horários de estudo e a jornada de trabalho. Ainda aqui, é
importante lembrar que, se a escolaridade básica é fator de
melhoria de desempenho, ela deve ser tratada e oferecida como uma
ação de qualificação profissional e, assim, ser oferecida pela
empresa, ser realizada no próprio local de trabalho e dentro da
jornada normal diária.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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- Através de maior aproximação com as Universidades,
estimulando novas formas de cooperação que favoreçam tanto o
desenvolvimento científico e tecnológico - com o financiamento de
pesquisas básica e aplicada - quanto a formação e o
aperfeiçoamento de recursos humanos, em todos os níveis
hierárquicos, com a estruturação de programas permanentes de
Extensão.
- Através de uma articulação direta com o sistema
educacional, seja abrindo os espaços fabris para a formação
específica dos alunos do ensino médio que demandem habilitação
profissional, nos moldes do exemplo alemão; seja contribuindo
para a manutenção da rede de escolas técnicas, na parte referente
à formação específica; seja transformando as atuais escolas
técnicas em Centros de Desenvolvimento Tecnológico, num esquema
de cooperação com as Universidades, com os sindicatos de
trabalhadores e com a participação de suas próprias instituições
de formação profissional, criando um espaço de pesquisa aplicada
e de formação e aperfeiçoamento, que atenda desde o trabalhador
até a alta gerência, com o objetivo de viabilizar a capacitação
tecnológica das empresas.
Finalmente, cabe lembrar que todo e qualquer esforço no
sentido do aumento da qualificação do trabalhador, principalmente
no que se refere à elevação da escolaridade básica, deve estar
relacionado a uma maior participação nos processos decisórios da
empresa e, o que é muito importante, a ganhos salariais. A busca
de maior qualificação e melhor desempenho deve estar acompanhada
de planos de carreira e de progressão funcional onde tal esforço
esteja contemplado.
2.4. A Participaªo dos Trabalhadores
O sindicalismo brasileiro, conquanto tenha mudado bastante
há pelo menos uma década, sob a influência dos grandes movimentos
de metalúrgicos do ABC paulista, ainda carrega marcas profundas,
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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resultantes do longo período de atrelamento à máquina do Estado,
do passado de "peleguismo" e de uma legislação restritiva, que
determinava inclusive o tipo e o âmbito de atuação dos
sindicatos. A principal e mais problemática destas marcas é a que
denominamos "sindicalismo de reação", ou seja, uma ação sindical
que se caracteriza pela resposta a fatos consumados ou a decisões
já tomadas, demonstrando certa dificuldade de se antecipar, de
perceber e analisar tendências e de encaminhar propostas
defendendo seus interesses antes que se efetivem decisões no
sentido contrário.
É bem verdade que a luta pelos salários e pelo emprego,
principalmente em épocas de crise, como a que atravessamos agora,
coloca em segundo plano outras perspectivas e necessidades da
classe trabalhadora, dentre elas a Educação, vista mesmo como uma
questão que não dizia respeito ao conjunto de atividades típicas
de um sindicato.
Assim como ocorre com a média do empresariado, a
possibilidade de transformação de indivíduos pouco escolarizados
em operários da indústria pode explicar o fato de, até bem pouco
tempo, os sindicatos manifestarem pouco interesse em relação à
questão educacional, que se revelava na não inclusão, nas pautas
de negociações, de ítens relativos a oportunidades educacionais
para os trabalhadores, principalmente quando se refere à
escolaridade básica. Outro fator explicativo poderia ser a
constatação de que, para os níveis mais baixos da hierarquia da
empresa, os acréscimos de educação geral não resultam em
melhorias salariais, o que desestimularia trabalhadores e
sindicatos a dispenderem esforços nesta direção.
E foi talvez neste contexto, acrescido das restrições
impostas pelo regime ditatorial, que mesmo quando alguns setores,
ainda nos anos 70, começaram a se modernizar - bancos, indústrias
químicas, telecomunicações, por exemplo - não se registrou uma
reação sindical mais significativa, diferentemente do que ocorreu
com sindicatos europeus que, preocupados com os possíveis efeitos
negativos da automação, ofereceram resistência, num primeiro
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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momento, e negociaram, posteriormente, políticas e programas de
requalificação da mão-de-obra e de proteção aos segmentos mais
frágeis - mulheres, trabalhadores mais velhos ou de menos
escolaridade, por exemplo - face à obsolescência de suas
qualificações.
Esta postura, associada à preocupação empresarial em
garantir os recursos humanos com as qualificações adequadas às
novas técnicas e processos, colaborou para que, na Alemanha, como
já vimos, a implantação e a gestão dos programas de qualificação
e requalificação profissional de trabalhadores jovens e adultos
fossem delegadas às entidades sindicais (de trabalhadores e de
empregadores), às vezes até mesmo excluindo os próprios
educadores das decisões sobre modalidades e conteúdos dos cursos
(Fogaça, 1992).
É bem verdade que já não se pode dizer que o alheamento face
à questão dos recursos humanos para a modernização industrial
seja uma característica de todo o sindicalismo brasileiro. Assim
como ocorre no segmento empresarial, sindicatos e centrais
sindicais estão tratando da questão, principalmente aqueles que
vêm participando dos comitês encarregados de discutir a
reestruturação produtiva. Entretanto, também é verdade que, em
boa parte das entidades sindicais, as percepções dominantes ainda
não incorporam alguns aspectos extremamente importantes:
- Em primeiro lugar, ainda não se difundiu suficientemente
a percepção da educação geral como o principal instrumento de
adequação do trabalhador aos novos requisitos ocupacionais. Com
isto, muitos continuam demandando a expansão da oferta de
treinamento operacional ou de programas tradicionais de formação
profissional, independentemente da complementação da escolaridade
básica.
- Em segundo lugar, continua sendo delegada ao empresariado,
através de suas instituições educativas e dos programas internos
de treinamento, a competência exclusiva das decisões em torno dos
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rumos da Formação Profissional. A reivindicação de participação
na gestão das instituições e dos programas de formação
profissional ainda é pouco incisiva face à resistência do
empresariado em democratizar seus sistemas de Formação
Profissional.
- Por último, a tônica da luta pela educação básica pública
contempla ainda apenas uma perspectiva, a da questão da
cidadania, colocada num contexto diferenciado daquele em que se
discute a reestruturação produtiva. Isto, num momento em que se
poderia cobrar as "promessas" da nova vinculação entre
escolaridade e qualificação profissional, que permite colocar em
bases mais objetivas a questão da universalização de um ensino
básico de qualidade.
Entretanto, é importante destacar que este é um panorama que
tende a mudar rapidamente. Em primeiro lugar, o debate em torno
das questões relativas à reestruturação produtiva já incluiu
definitivamente o problema dos Recursos Humanos, especialmente o
dos trabalhadores diretos. E este problema envolve, a cada passo,
um contingente mais significativo de entidades e dirigentes
sindicais. Cabe citar aqui as iniciativas do DIEESE, nas quais os
trabalhadores têm se manifestado, tanto na identificação de
problemas quanto na reivindicação de oportunidades, conferindo
especial destaque para a questão da Educação e da Formação
Profissional (DIEESE, 1993).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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3. PROPOSTAS DE A˙ES PRIORIT`RIAS
A multiplicidade de questões que decorrem da análise do
panorama educacional brasileiro torna necessária a determinação
de prioridades de ação, que deverão orientar o tratamento da
relação entre Educação e Qualificação Profissional, de acordo com
os novos padrões de competitividade global.
A determinação destas prioridades ocorre a partir de seis
recomendações básicas:
1) No que se refere aos recursos humanos, o maior problema
da indústria brasileira, como todas as pesquisas mostram, é a
baixa escolaridade dos trabalhadores, o que resulta em
dificuldades de adaptação aos novos requisitos, mesmo quando se
trata de treinamentos operacionais.
2) É preciso que se estabeleçam novas formas de articulação
entre o sistema produtivo e o sistema educacional, visando,
simultaneamente, a elevação da escolaridade da população e a
qualificação dos recursos humanos.
3) Estas novas formas de articulação devem privilegiar a
repartição de responsabilidades entre escola e empresa. O Estado,
através dos sistemas públicos de ensino, deve se dedicar à
universalização da educação básica - ensino de 1º e 2º Graus de
educação geral, que é a base da qualificação. As empresas devem
assumir a qualificação da mão-de-obra em geral - operários e
técnicos de nível médio, através de parcerias, de suas
associações setoriais ou regionais e, inclusive, com a
participação de sindicatos de trabalhadores.
4) A qualificação profissional diz respeito, agora, à posse
de uma escolaridade básica, de educação geral. Nesse sentido, as
empresas, diretamente ou através de suas instituições educativas
(SESI, SESC) e de formação profissional (SENAI e SENAC), devem
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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oferecer oportunidades de ensino supletivo de educação geral aos
trabalhadores adultos semiqualificados e de pouca escolaridade,
que encontram problemas para o retorno à rotina escolar.
5) Os recursos públicos vinculados por lei à Educação devem
financiar a educação geral - o ensino regular de 1º e 2º Graus -,
enquanto os gastos com a qualificação, incluindo a formação
específica oferecida nos cursos técnicos de 2º Grau, deverão ser
assumidos pelas empresas.
6) Os sindicatos de trabalhadores devem participar da gestão
das instituições de formação profissional, especialmente no que
se refere à implantação de programas de requalificação da mão-
de-obra, bem como do sistema regular de educação básica, visando
a elevação do nível de escolaridade de jovens e adultos,
trabalhadores ou não.
A partir destas recomendações básicas, as prioridades
de ação são as que se seguem.
3.1. MagistØrio
A melhoria da qualidade do ensino básico está diretamente
relacionada à qualidade do trabalho pedagógico; embora a questão
da qualidade esteja relacionada a outras variáveis, a ação do
professor é decisiva para o sucesso de qualquer projeto de
melhoria do ensino básico.
Formaªo de professores
Boa parte do mau desempenho dos professores se deve à má
qualidade da formação que recebem. Assim, no que se refere aos
cursos de formação para o magistério, tanto de nível médio quanto
as Licenciaturas oferecidas pelas Universidades, propomos:
a) extinção dos atuais cursos de Habilitação ao Magistério;
b) recriação das redes estaduais de Escolas Normais;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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c) reformulação dos Cursos de Pedagogia, visando a formação
de professores-alfabetizadores e o desenvolvimento de pesquisas
de novos métodos e técnicas pedagógicas para o Ensino
Fundamental;
d) criação de poucas e boas Escolas Normais Superiores, para
a formação e o aperfeiçoamento de professores dos Cursos de
Licenciatura;
e) descentralização dos cursos de Licenciatura, de modo que
cada Instituto ou Faculdade, nas áreas de conhecimento e
disciplinas que compõem o currículo do ensino básico, ofereça a
formação pedagógica ao longo de todo o curso de graduação;
f) apoio, nas Universidades, aos cursos de Ciências Básicas
(Matemática, Física, Química e Biologia) e das Ciências
Humanas/Sociais que oferecem Licenciaturas, visando a melhoria
da formação dos professores do ensino de 1º e 2º Graus nas
disciplinas dessas áreas;
g) revalorização da Prática de Ensino nos Colégios de
Aplicação e nos Cursos Normais, com ênfase nos métodos e técnicas
mais adequados às necessidades e caracteristicas dos segmentos
mais problemáticos da clientela do ensino básico.
Reciclagem de professores
A média de idade do atual contingente de professores do
ensino básico ainda é bastante baixa, o que significa a
permanência dos mal formados e dos não-qualificados no sistema
por mais uma década e meia, em média. No sentido de compensar a
má formação recebida e contribuir para a melhoria do desempenho
em sala de aula, devem ser desenvolvidas as seguintes ações:
a) fortalecimento dos Centro de Formação e Aperfeiçoamento
do Magistério (CEFAM), para atividades permanentes de atualização
e retreinamento de professores do ensino básico, em programas
vinculados às Universidades públicas;
b) expansão das atividades de Extensão Universitária
voltadas para a reciclagem de professores do ensino básico, tanto
nos aspectos pedagógicos, quanto na atualização dos conteúdos das
disciplinas que lecionam;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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c) criação de mecanismos de incentivo à reciclagem e
atualização permanente (bolsas, progressão funcional, etc.).
Revalorizaªo da carreira
A carreira do magistério precisa voltar a ser atraente,
trazendo para os cursos de formação os bons alunos dos cursos
médio e superior e estimulando o professor que já está em
exercício a se manter em regência de classe, permanentemente
atualizado e com um bom desempenho profissional. Para tanto,
recomendamos como principais ações:
a) revisão dos salários atuais, mantendo-os em patamares
competitivos em relação ao mercado de trabalho de profissionais
de qualificação semelhante;
b) estruturação de Planos de Carreira, com mecanismos de
progressão funcional vinculados tanto à qualificação quanto ao
desempenho em sala de aula; e incentivos salariais à permanência
em regência de classe, de modo a desestimular o abandono das
salas de aula, em troca de funções burocráticas;
c) incentivos salariais especiais aos professores do ensino
básico dedicados ao atendimento dos segmentos mais problemáticos;
d) responsabilidade financeira da União na complementação
dos salários dos professores do 1º Grau, nas regiões e
localidades que não tenham recursos suficientes para o
financiamento dos novos planos de carreira, desde que o Estado ou
Município em questão já esteja aplicando na Educação a totalidade
dos percentuais exigidos por lei. Lembre-se que, para isto, a
legislação atual, que proíbe a União de realizar tal iniciativa,
precisa ser alterada.
3.2. Melhoria do Ensino BÆsico
Além das ações específicas para o Magistério, outras medidas
devem ser tomadas, relativas à estrutura e ao funcionamento do
ensino básico. Estas medidas, que no seu conjunto visam a
revalorização e a melhoria da educação geral, são:
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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a) expansão do atendimento ao pré-escolar, para oferecer a
todos as mesmas oportunidades de sucesso e progressão escolar,
desde as primeiras séries. As iniciativas comunitárias
consideradas habilitadas devem ser apoiadas, eximindo o Estado,
neste momento, da construção de uma rede de pré-escolas;
b) aumento da jornada escolar, nos sistemas públicos, nas
quatro primeiras séries do 1º Grau, dando prioridade ao
restabelecimento dos dois turnos diurnos; a expansão quantitativa
da rede deverá atender à demanda decorrente da eliminação dos
múltiplos turnos;
c) no ensino de 1º Grau, as escolas de tempo integral, com
execeção daquelas que comprovadamente atendam às populações muito
carentes ou com grandes defasagens idade/série, só devem se
expandir na medida em que se cumpra o programa da volta, na rede
de escolas "comuns", aos dois turnos diurnos;
d) nos casos em que seja imprescindível o atendimento em
escolas de tempo integral, pode-se prever incentivos materiais
(bolsas) para compensar a renda não auferida pelo retardamento da
entrada no mercado de trabalho, pelo menos até os 14 anos;
e) revisão dos conteúdos curriculares do ensino de 1º e 2º
Graus, com vistas, no 1º Grau, ao atendimento da aquisição de
competências básicas - raciocínio, linguagem, capacidade de
abstração, etc. - fundamentais à participação do indivíduo na
sociedade moderna; no 2º Grau, além da continuidade desses
objetivos, acrescente-se o da oferta de uma sólida base de
conhecimentos técnico-científicos (Ciências Exatas, Humanas e
Biológicas), que servirá tanto à posterior aquisição de
habilitação específica de nível médio, quanto ao prosseguimento
dos estudos em nível superior;
f) definição de um padrão nacional mínimo de educação
básica, de aplicação compulsória em todo o sistema educacional
brasileiro;
g) extinção das diferenciações curriculares entre as escolas
de 2º Grau de educação geral e aquelas atualmente dedicadas ao
ensino técnico. Tal como no ensino de 1º Grau, a escola de nível
médio deve ser única e democrática;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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h) na rede pública, a prioridade no ensino médio deve ser
para o 2º Grau regular, de educação geral, com ampliação das
vagas em horário noturno, em locais acessíveis, para atender aos
jovens trabalhadores, cuja demanda por este nível de ensino tem
aumentado muito;
i) na atual rede pública de escolas técnicas, as oficinas e
toda a parte de formação especial devem ser administradas por
convênios com empresas, sindicatos de trabalhadores e associações
dos diferentes setores, abrindo-se ainda a outras clientelas que
demandem as habilitações oferecidas. O Estado se encarregará da
Educação Geral (diretrizes, professores, conteúdos e
financiamento), enquanto o setor privado se responsabilizará pela
parte prática (instalação e manutenção de oficinas e
laboratórios, instrutores, matéria-prima, etc.).
3.3. Ensino Superior
O ensino superior tem importante papel a desempenhar no
processo brasileiro de reestruturação produtiva, seja na formação
de mais e melhores professores, função já tratada no item
anterior, seja na qualificação de recursos humanos para o setor
produtivo, melhor preparados para os atuais requisitos da
capacitação tecnológica. Para tanto, propomos:
a) reforçar os cursos de Ciências Básicas (Matemática,
Física, Química e Biologia), no sentido de formar profissionais
capazes de atuar eficientemente em sistemas de inovações
tecnológicas;
b) aumentar a oferta de vagas, nas Universidades Federais,
principalmente nas disciplinas mencionadas, buscando atrair,
através da expansão dos cursos noturnos ou da oferta de bolsas de
estudos, os jovens que trabalham em tempo integral;
c) combater a excessiva fragmentação profissional e a
especialização precoce, que conduzem à ênfase no conhecimento
instrumental, cuja utilidade tende a diminuir, e às
regulamentações correspondentes, que funcionam mais como "reserva
de mercado" do que como garantia de bom exercício profissional;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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d) com base no item anterior e a exemplo de outros países,
incluir disciplinas das "Humanidades" nos curriculos de graduação
das Engenharias, tendo em vista as mudanças organizacionais em
curso e seus reflexos nas funções gerenciais;
e) retomar e implementar de fato a idéia de Ciclo Básico, no
intuito de fornecer uma formação universitária abrangente, não
especializada, no espírito do BA norte-americano, altamente
valorizada hoje em dia no mercado de trabalho;
f) a pós-graduação deverá se tornar mais flexível nos seus
conteúdos e na sua estrutura, a fim de atender a vocações e
mercados distintos: docentes, pesquisadores e profissionais de
alto nível para P&D nas empresas, evitando introduzir diferenças
na qualidade e no status da formação oferecida;
g) esta flexibilidade implica também combinações distintas
de carga horária de aulas, de trabalhos individuais e de
pesquisa, considerando às várias vocações a serem atendidas;
h) com o mesmo intuito da proposta anterior, abrir a
Universidade, especialmente a pós-graduação, para profissionais
com grande experiência, em condições de contribuir para a geração
de conhecimentos, ainda que não possuam o currículo normalmente
associado à carreira universitária;
i) a pós-graduação deve dar alta prioridade à relevância dos
temas de tese, levando em conta, no tratamento das questões, o
caráter crescentemente interdisciplinar. Isto pode significar
menor rigidez dos departamentos universitários para a avaliação
de teses que interessem pelo seu conteúdo, ainda que ele
ultrapasse os "limites" de suas áreas de conhecimento, ou que o
candidato ao título não possua as credenciais formais daquele
departamento ao qual apresenta o trabalho;
j) a Extensão Universitária deve concentrar esforços na
colaboração com programas de reciclagem profissional em todos os
níveis: professores, trabalhadores qualificados, gerentes,
técnicos e profissionais de alto nível;
k) a autonomia universitária deve vir acompanhada de
práticas de gestão mais profissionais, com vistas à maior
captação de recursos próprios, tanto através de melhor gestão do
patrimônio, como de maior cooperação com o sistema produtivo.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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3.4. Qualificaªo Profissional
O papel das empresas: aıes diretas
Conforme assinala o documento elaborado para a Comissão
Empresarial de Produtividade, "a ação direta dos empresários pode
apenas complementar o papel das escolas públicas". Entretanto,
esta ação complementar não significa nem a permanência do atual
nível de participação do empresariado na Educação nem, muito
menos, a continuidade da expectativa de que o Estado, além dos
encargos relativos à Educação Geral, continue a assumir aqueles
relativos à qualificação profissional. Assim, o caráter
complementar da ação empresarial significa desonerar o Estado nas
ações de habilitação específica e com ele colaborar,
principalmente nos esforços para a elevação da escolaridade
básica dos trabalhadores brasileiros.
Nesse sentido, consideramos que às empresas e às associações
empresariais compete:
a) incentivar as novas modalidades de cooperação entre o
setor produtivo e as Universidades, incluindo um maior apoio às
pesquisas que se dedicam à busca de métodos e técnicas
pedagógicas mais adequados à clientela da escola básica;
b) participar diretamente no esforço de melhoria do ensino
público de 1º e 2º Graus, através de convênios de cooperação com
as Secretarias de Educação, para a manutenção das escolas
existentes nas comunidades onde se localizam as empresas;
c) efetivar a abertura de oportunidades educacionais nos
espaços fabris (escolas anexas às fábricas) e criação de
facilidades para que seus empregados menos escolarizados possam
completar sua educação básica, vencendo as resistências e os
problemas que levam a fracassar as iniciativas de ensino
supletivo extra-empresa, pelo esforço adicional que exigem do
trabalhador;
d) a gestão dos programas empresariais de formação
profissional deve contar com a participação de representantes dos
trabalhadores.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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O papel da empresa: a formaªo profissional
Além das ações realizadas diretamente pelos empresários e no
ambiente da empresa, há um conjunto de medidas que dizem respeito
às instituições educativas administradas por órgãos
representativos das empresas, que se referem à sua adequação aos
novos requisitos de qualificação profissional e à colaboração que
através delas pode ser dada ao esforço de elevação da
escolaridade básica dos trabalhadores. São elas:
a) utilização da capacidade instalada da rede do SESI -
pela sua menor dimensão e maior disponibilidade de recursos - em
programas de apoio aos sistemas públicos de ensino, para o
desenvolvimento de projetos experimentais, visando a produção de
inovações pedagógicas para posterior difusão na rede pública;
b) utilização dos espaços ociosos do sistema SENAI, em
parceria com toda e qualquer agência capaz de oferecer educação
básica, regular ou supletiva, para a oferta de oportunidades de
educação geral aos jovens e adultos pouco escolarizados;
c) a atual rede de escolas técnicas, na sua parte
profissionalizante, deverá ser transformada numa rede de Centros
de Desenvolvimento Tecnológico, administrados por associações
setoriais da indústria, para atender à formação/atualização de
trabalhadores, técnicos e gerentes. Para a ação destinada aos
trabalhadores e técnicos, é fundamental a participação do SENAI;
para o segmento de nível superior, as empresas deverão se
articular com as Universidades;
d) abertura das instituições de formação profissional aos
menos escolarizados, empregados ou não, em programas de
profissionalização que contemplem também a oferta de educação
geral;
e) reestruturação dos cursos regulares das instituições de
formação profissional, privilegiando o desenvolvimento de uma
"cultura tecnológica", com a substituição das disciplinas
instrumentais por uma base sólida de conteúdos técnico-
científicos amplos;
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
                                                                                                     
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f) o SENAI deve preservar os recursos provenientes das
contribuições sobre a folha de pagamentos exclusivamente para as
atividades que atendam aos interesses gerais da indústria;
treinamentos do tipo firm specific devem ser financiados
integralmente pelas empresas demandantes;
g) Através de seus Centros de Desenvolvimento Tecnológico, o
SENAI deverá colaborar com as empresas também na experimentação e
difusão de novas técnicas de organização do trabalho, com vistas
a diminuir os riscos e as incertezas inerentes aos programas de
reestruturação.
Sindicatos
a) maior destaque, nas pautas de negociação, ao acesso às
oportunidades de formação profissional e, principalmente, de
requalificação;
b) participação na gestão das agências de formação
profissional;
c) participação na gestão dos sistemas públicos de educação,
da escola de 1º Grau à Universidade.
3.5. Financiamento do Ensino BÆsico
Os recursos necessÆrios ao ensino bÆsico
O problema dos recursos para o Ensino Básico envolve duas
questões de naturezas distintas: de um lado, o financiamento de
ítens diretamente ligados às atividades pedagógicas propriamente
ditas: salários de docentes, material didático e de apoio e
espaço físico (conservação, recuperação e ampliação da rede
física); de outro, os gastos assistenciais necessários à
manutenção das crianças na escola. Nenhum país, e muito menos o
Brasil, com seu nível de pobreza, pode prescindir dos gastos
assistenciais, que envolvem atualmente a merenda escolar e alguma
atenção básica em Saúde. Além dessa assistência, caberia também
pensar em alguma compensação financeira para as famílias muito
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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carentes que necessitam do trabalho infantil para sobreviver e
que, por isso, encontram dificuldades em deixar por vários anos
seus filhos na escola.
Quanto ao primeiro conjunto de gastos, todas as estimativas
indicam que com US$ 6 a 7 bilhões será possível dar um ensino de
boa qualidade aos alunos da rede pública, mesmo pagando aos
professores do 1º Grau um salário médio de US$ 300 mensais. O
problema está em como financiar os gastos assistenciais que, se
se pretende atender a todos os alunos, mesmo mantendo padrões
modestos, pode equivaler ao total de recursos hoje alocados no 1º
Grau. Se esse volume de recursos for considerado irrealista, não
existirá outra alternativa que não a de restringir tais gastos
aos segmentos mais carentes, apesar de todos os problemas
operacionais que uma focalização desse tipo implica.
SalÆrio-educaªo
A este respeito, cabe observar que o volume de recursos que
esta fonte representa é fundamental para a sobrevivência dos
sistemas públicos de ensino. Assim, se ela for extinta,
forçosamente terá que ser substituída por outra. Entretanto, sua
permanência não exclui, a nosso ver, a necessidade de revisão de
seus mecanismos de aplicação, tornando sua gestão mais
transparente e passível de efetiva supervisão. Assim, as
propostas são:
a) simplificação e agilização da gestão dos recursos do
Salário-Educação, preservando-se, entretanto, os objetivos de
redistribuição regional;
b) a aplicação direta do Salário-Educação deve se restringir
àquelas empresas (ou consórcios de empresas) que recolham acima
de um montante significativo a ser definido. Com isso, diminuiria
a malversação dos recursos no processo de compra de vagas em
escolas privadas;
c) para as contribuições abaixo do montante acima referido,
o recolhimento seria direto à agência responsável;
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d) da parcela do Salário-Educação que será recolhida, metade
deve ser destinada às regiões carentes, a partir de políticas e
prioridades claramente definidas, mediante projetos e programas,
e não da forma clientelística que tem caracterizado sua
distribuição;
e) a outra metade seria repassada preferencialmente às
escolas da rede pública que, eventualmente, poderão ser indicadas
pelas próprias empresas que fazem o recolhimento;
f) os recursos do Salário-Educação devem ser destinados ao
ensino básico, incluindo assim o ensino de 2º Grau.
3.6. Sistema Nacional de Avaliaªo
No sistema atual, a qualidade das ações educativas só pode
ser estimada pelos dados globais que apontam os altos percentuais
de evasão e repetência e os baixos índices de conclusão do 1º
Grau. Entretanto, tais informações são insuficientes para que se
conheça, do ponto de vista estritamente pedagógico, onde estão
situados os problemas, quais as escolas que desenvolvem um bom ou
mau trabalho ou ainda, que aspectos curriculares precisam ser
revistos. Além disso, mesmo para aqueles que têm exito no
sistema, isto é, que conseguem concluir cada grau que o compõe,
não se pode precisar se receberam o mesmo conjunto de
conhecimentos e se desenvolveram o mesmo nível de habilidades
intelectuais.
Estas dificuldades decorrem do fato de, no Brasil, não
existir nenhum mecanismo de avaliação da Educação, que permita
comparar o desempenho dos sistemas de ensino e das escolas que os
integram. Apesar de formalmente delimitada por uma legislação que
se caracteriza pelo excesso de detalhes, a ação educativa é, na
verdade, extremamente autônoma, na medida em que não presta
contas nem às administrações superiores e muito menos à
população, e não é efetivamente cobrada pelos resultados que
apresenta. De outro lado, a ausência de dados mais detalhados
sobre a qualidade do trabalho desenvolvidos em cada escola impede
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que se premie as mais eficientes e que se contemple adequadamente
aquelas que necessitem de maior apoio para melhoria de seu
desempenho.
Assim, para a obtenção de melhores instrumentos, tanto para
a melhoria da gestão dos recursos alocados na Educação, quanto
para as propostas pedagógicas que visam a elevação da qualidade
do sistema educacional, propomos a implantação de um sistema
nacional de avaliação da educação básica, orientada pelas
seguintes ações:
a) definição de um padrão nacional de educação básica, com o
estabelecimento dos conteúdos e habilidades intelectuais que
todos os alunos do ensino básico, em todo o país, devem ser
portadores, ao final da 4ª e 8ª séries do 1º Grau, e da 3ª série
do 2º Grau;
b) determinação, pelos sistemas estaduais e municipais, dos
conteúdos que devem ser acrescentados ao padrão nacional, para
atender às necessidades e peculiaridades regionais;
c) implementação de um projeto nacional de educação, com
critérios claros e rígidos para a liberação de recursos geridos
pelo MEC, a partir de projetos estaduais e municipais onde se
contemple a supervisão e o acompanhamento da execução, já no
contexto do sistema nacional de avaliação;
d) implantação de uma instância federal responsável pelos
exames nacionais, integrada por técnicos e professores dos
sistemas públicos, por especialistas em avaliação e por
representantes de segmentos da sociedade civil organizada
(sindicatos de trabalhadores, associações de pais de alunos,
etc.);
e) aplicação anual dos exames, com divulgação ampla dos
resultados e acompanhamento da evolução de cada sistema;
f) previsão, no orçamento do MEC, de recursos a serem
aplicados nos sistemas onde os resultados sejam negativos, a
partir de projetos elaborados e diretamente supervisionados pelo
MEC, visando a elevação da qualidade do ensino naqueles sistemas;
g) estruturação, no MEC/Delegacias Regionais, de equipes que
estarão encarregadas da supervisão dos sistemas estaduais e
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municipais, compostas, em cada Estado, de técnicos e professores
das esferas federal, estadual e municipal; estas equipes
acompanharão tanto o trabalho desenvolvido nas escolas, como, nas
atividades globais das Secretarias de Educação, o volume e a
destinação real dos recursos vinculados;
h) a liberação, pelo MEC, de recursos complementares para os
sistemas educacionais estaduais e municipais, estará condicionada
à execução e aos resultados obtidos nos projetos de melhoria do
sistema, assim como ao gasto efetivo, em Educação, do percentual
da receita líquida determinado por lei;
i) a avaliação final de cada sistema estadual ou municipal
levará em conta tanto os resultados dos exames nacionais quanto o
volume e a natureza dos gastos realizados;
j) a rede de escolas federais de 1º e 2º Graus também
integrará o universo a ser avaliado, tanto no desempenho
pedagógico quanto na eficácia da aplicação de recursos.
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4. INDICADORES
. Taxa de escolaridade (percentagem da população da faixa
etária matriculada no nível de ensino correspondente).
. Vagas por nível de ensino, área e tipo de estabelecimento.
. Taxas de evasão, repetência e conclusão, por nível de
ensino.
. Número de horas-aula/ano, por nível de ensino e área.
. Número de professores por área e nível de carreira.
. Índices de evolução salarial e de carreira.
. Número de estabelecimentos de formação de professores e
vagas correpondentes, por área.
. Número de pessoas e recursos envolvidos nos convênios
entre instituições de ensino e empresas, por área e nível de
ensino.
. Número de pessoas e recursos envolvidos em programas
tripartites de gestão de ensino técnico.
. Índices de acompanhamento dos programas de aplicação
direta dos recursos do salário-educação.
. Número de cursos profissionalizantes, por área, duração e
vagas.
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