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Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP
Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - PADCT
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE
DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
_____________________________________________________________________________________________
COMPETITIVIDADE EM BIOTECNOLOGIA
Nota Técnica Setorial
do Complexo Agroindustrial
O conteúdo deste documento é de
exclusiva responsabilidade da equipe
técnica do Consórcio. Não representa a
opinião do Governo Federal.
Campinas, 1993
Documento elaborado pelo consultor Sérgio Luiz M. Salles Filho (IG/Departamento de Política Científica e Tecnológica - UNICAMP).
A Comissão de Coordenação - formada por Luciano G. Coutinho (IE/UNICAMP), João Carlos Ferraz (IEI/UFRJ), Abílio dos Santos
(FDC) e Pedro da Motta Veiga (FUNCEX) - considera que o conteúdo deste documento está coerente com o Estudo da Competitividade da Indústria
Brasileira (ECIB), incorpora contribuições obtidas nos workshops e servirá como subsídio para as Notas Técnicas Finais de síntese do Estudo.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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CONSÓRCIO
Comissão de Coordenação
INSTITUTO DE ECONOMIA/UNICAMP
INSTITUTO DE ECONOMIA INDUSTRIAL/UFRJ
FUNDAÇÃO DOM CABRAL
FUNDAÇÃO CENTRO DE ESTUDOS DO COMÉRCIO EXTERIOR
Instituições Associadas
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INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL - IEDI
NÚCLEO DE POLÍTICA E ADMINISTRAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA - NACIT/UFBA
DEPARTAMENTO DE POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA - IG/UNICAMP
INSTITUTO EQUATORIAL DE CULTURA CONTEMPORÂNEA
Instituições Subcontratadas
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Instituição Gestora
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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EQUIPE DE COORDENAÇÃO TÉCNICA
Coordenação Geral: Luciano G. Coutinho (UNICAMP-IE)
João Carlos Ferraz (UFRJ-IEI)
Coordenação Internacional: José Eduardo Cassiolato (SPRU)
Coordenação Executiva: Ana Lucia Gonçalves da Silva (UNICAMP-IE)
Maria Carolina Capistrano (UFRJ-IEI)
Coord. Análise dos Fatores Sistêmicos: Mario Luiz Possas (UNICAMP-IE)
Apoio Coord. Anál. Fatores Sistêmicos: Mariano F. Laplane (UNICAMP-IE)
João E. M. P. Furtado (UNESP; UNICAMP-IE)
Coordenação Análise da Indústria: Lia Haguenauer (UFRJ-IEI)
David Kupfer (UFRJ-IEI)
Apoio Coord. Análise da Indústria: Anibal Wanderley (UFRJ-IEI)
Coordenação de Eventos: Gianna Sagázio (FDC)
Contratado por:
Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
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COMISSÃO DE SUPERVISÃO
O Estudo foi supervisionado por uma Comissão formada por:
João Camilo Penna - Presidente Júlio Fusaro Mourão (BNDES)
Lourival Carmo Monaco (FINEP) - Vice-Presidente Lauro Fiúza Júnior (CIC)
Afonso Carlos Corrêa Fleury (USP) Mauro Marcondes Rodrigues (BNDES)
Aílton Barcelos Fernandes (MICT) Nelson Back (UFSC)
Aldo Sani (RIOCELL) Oskar Klingl (MCT)
Antonio dos Santos Maciel Neto (MICT) Paulo Bastos Tigre (UFRJ)
Eduardo Gondin de Vasconcellos (USP) Paulo Diedrichsen Villares (VILLARES)
Frederico Reis de Araújo (MCT) Paulo de Tarso Paixão (DIEESE)
Guilherme Emrich (BIOBRAS) Renato Kasinsky (COFAP)
José Paulo Silveira (MCT) Wilson Suzigan (UNICAMP)
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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SUMÁRIO
RESUMO EXECUTIVO............................................................................................................1
APRESENTAÇÃO...................................................................................................................15
1. O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA EM NÍVEL INTERNACIONAL:
SUA INSERÇÃO NA INDÚSTRIA, NA AGRICULTURA E NOS COMPLEXOS
AGROINDUSTRIAIS..........................................................................................................16
1.1. A Criação de Empresas Especializadas em Biotecnologia...............................................17
1.2. A Entrada das Grandes Companhias...............................................................................21
1.3. A Inserção da Biotecnologia em Nível Setorial: as Especificidades do Setor Agro-
alimentar........................................................................................................................25
2. O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA NO BRASIL E IMPACTOS
SOBRE A PRODUÇÃO DE ADITIVOS PARA A INDÚSTRIA ALIMENTAR .................30
2.1. Alguns Aspectos sobre os Impactos da Biotecnologia na Produção Interna, e no
Nível e na Qualificação do Emprego dos Países Menos Desenvolvidos...........................30
2.2. Particularidades e Condicionantes do Desenvolvimento da Biotecnologia no Brasil........34
2.3. Impactos e Tendências da Biotecnologia em Aditivos Alimentares no Brasil...................40
2.4. Políticas Implementadas no Brasil para Biotecnologia....................................................55
3. ELEMENTOS PARA UMA POLÍTICA PARA O DESENVOLVIMENTO DA
BIOTECNOLOGIA NO BRASIL........................................................................................64
3.1. Uma Interpretação da Situação Atual.............................................................................64
3.2. Proposições de Políticas.................................................................................................67
3.2.1. Políticas gerais para a estruturação técnica e econômica.......................................67
3.2.2. Políticas setoriais .................................................................................................69
3.2.3. Políticas relacionadas aos fatores sistêmicos.........................................................70
4. INDICADORES DE COMPETITIVIDADE.........................................................................72
BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................................74
RELAÇÃO DE TABELAS, QUADROS E FIGURAS..............................................................76
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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RESUMO EXECUTIVO
1. TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS DA COMPETITIVIDADE
1.1. Caraterísticas Estruturais da Evolução da Biotecnologia
O atual desenvolvimento da biotecnologia, em âmbito internacional, está aquém dos
prognósticos feitos durante os anos 70 e 80 sobre seu potencial de ruptura e reestruturação
industrial. Em primeiro lugar, são ainda localizados os impactos econômicos de produtos obtidos
com a moderna biotecnologia, existindo importantes gargalos de natureza técnico-científica e
mercadológica para a efetiva transformação das potencialidades em produtos industriais
comercializáveis. Ademais, não se pode falar da criação de uma nova "indústria" de base
biotecnológica, mas sim da inserção diferenciada das biotecnologias nos setores industriais
existentes.
Nesse sentido, observa-se uma grande disparidade quanto à efetiva implementação de
processos biotecnológicos, destacando-se o setor farmacêutico com um dinamismo muito maior
com relação às agrobiotecnologias, enquanto o setor de aditivos para alimentos está numa
situação intermediária. Em 1990, 63% das empresas americanas de biotecnologia estavam
concentradas na área de saúde humana, contra apenas 8% nas agrobiotecnologias. As diferenças
setoriais no ritmo de introdução da bitecnologia podem ser explicadas a partir da dinâmica dos
diversos ambientes concorrenciais dos setores específicos e pela existência de obstáculos técnico-
científicos diferenciados nas diversas áreas de aplicação.
Assim, no caso da indústria farmacêutica, o lançamento de novos produtos de alto valor
agregado se constitui num elemento chave na concorrência. Trata-se de um mercado muito
receptivo e demandante de inovações. Além disso, observa-se um esgotamento nas trajetórias
tecnológicas desta indústria, com custos crescentes das atividades de P&D. Por outro lado, a
maioria das substâncias com ação terapêutica são geradas por microorganismos, área onde os
obstáculos para a aplicação de técnicas de base biotecnológica vêm sendo, em boa parte,
superados.
Para a biotecnologia aplicada à agricultura, a receptividade dos mercados a inovações é,
em geral, menor, sendo o preço dos produtos ainda um elemento chave na concorrência. Do
ponto de vista do esgotamento da base técnica, há um movimento menos evidente que no caso
farmacêutico e, portanto, uma menor premência por inovações. No caso particular da
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manipulação de espécies vegetais, os obstáculos de natureza técnica são maiores que no caso de
microorganismos.
No setor de aditivos para alimentos, a biotecnologia não aparece como solução para
gargalos tecnológicos prementes, nem se observa um esgotamento das trajetórias. No entanto, por
se tratar de um setor caraterizado como "fornecedor especializado", onde a qualidade dos
produtos e a relação usuário-produtor são elementos chave na competitividade, a biotecnologia
deve se constituir numa importante via para complementar o leque de opções tecnológicas
exitentes, permitindo uma melhor exploração da diversificação de produtos na indústria alimentar.
1.2. Estratégias Empresariais
No final dos anos 70 e início dos 80, o fenômeno mais marcante quanto às estratégias
empresariais relacionadas às biotecnologias foi o surgimento de pequenas empresas especializadas
(as Novas Empresas de Biotecnologia - NEBs), principalmente nos Estados Unidos, chegando a
constituir um total de 1.100 empresas, com um faturamento de US$ 2,9 bilhões em 1991. Estas
empresas pretendiam explorar o potencial tecnológico e mercadológico dos avanços no
conhecimento científico, aproveitando o potencial do sistema de capital de risco existente naquele
país. Entretanto, a maioria destas empresas teve dificuldades para se consolidar devido a
problemas de natureza financeira (dificuldades de sustentação no longo prazo), técnico-científica
(existência de "gargalos" no conhecimento e dificuldades de scale-up), mercadológica (falta de
inserção nos mercados onde pretendiam entrar), gerencial (devido à falta de experiência
empresarial dos fundadores das NEBs, que eram, na maior parte das vezes, oriundos do meio
acadêmico) e de regulamentação (existência de legislações restritivas ao uso de produtos
biotecnológicos e dificuldades de apropriabilidade).
No período recente, o fenômeno mais marcante quanto a estratégias empresariais refere-se
à entrada das grandes empresas multinacionais e à realização de diversos tipos de alianças e
acordos entre grandes companhias e empresas especializadas. Assim, as NEBs estão se
transformando em "fornecedores especializados" em P&D, ainda quando não fosse esse seu
propósito inicial. As razões que explicam o surgimento destas alianças dizem respeito à busca de
complementaridades:
- no caso das NEBs, são uma forma de ter acesso aos mercados finais e de obter recursos
financeiros para a sustentação de suas atividades de P&D no longo prazo;
- no caso das grandes companhias, as alianças interessam como forma de aproveitar a
capacitação científico-técnica existente nas empresas especializadas. Assim, o poder econômico
das grandes companhias lhes permite queimar etapas, evitando o risco do investimento pioneiro,
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numa área ainda fortemente carregada de incerteza. Por outro lado, através do controle das
empresas especializadas, as grandes companhias procuram limitar o acesso dos concorrentes às
novas tecnologias. Assim, a estratégia das grandes companhias procura ajustar o trade off
existente entre os riscos de verticalizar uma atividade de resultados ainda incertos e os custos de
transação derivados das dificuldades de "apropriabilidade".
Na realização de alianças estratégicas merece ser destacada a crescente participação de
parceiros de diversos países, como parte das estratégias de globalização dos mercados que se
observam em vários dos setores de aplicação das biotecnologias. Entretanto, ao mesmo tempo em
que ocorre a diversificação dos mercados, está ocorrendo uma re-localização das atividades
produtivas das grandes companhias nos países centrais, a partir do aumento das economias de
escala pela incorporação das novas tecnologias e da maior articulação entre atividades de P&D e
atividades produtivas. Neste contexto, embora os países em desenvolvimento possam chegar a se
constituir em importantes mercados para os produtos de base biotecnológica, as empresas
multinacionais procuraram a inserção nesses mercados através das importações muito mais do que
pela internalização de plantas produtivas.
A estratégia da inserção das grandes companhias nas biotecnologias inclui, além da
incorporação e realização de acordos com firmas especializadas, um aumento sensível dos
investimentos de P&D in house, incluindo a criação de importantes laboratórios de biotecnologia.
Pode ser citado, como exemplo, o caso da empresa Monsanto que, em 1984, criou um laboratório
em St.Louis (EUA) que emprega 1.200 pesquisadores, sendo 270 Ph.Ds, com um investimento
anual em pesquisa de US$ 575 milhões (BDM, 1989).
Além das estratégias "ofensivas" das grandes companhias com relação à exploração de
novos produtos gerados pela biotecnologia, devem ser destacadas as estratégias "defensivas", isto
é, aquelas adotadas com a intenção de revigorar seus mercados tradicionais. Tal é o caso, por
exemplo, do investimento do setor agroquímico na geração de variedades resistentes a herbicidas
como forma de prolongar o ciclo de vida de produtos cujas patentes já expiraram.
1.3. Principais Fatores de Competitividade
Na área das biotecnologias, um elemento chave das estratégias empresariais tem sido a
capacidade de definir alianças estratégicas. Outro elemento importante para a inserção competitiva
das empresas na biotecnologia diz respeito à correta identificação daqueles segmentos de mercado
mais receptivos a novos produtos e daqueles processos biotecnológicos mais próximos à obtenção
de um produto comercializável. Uma estratégia alternativa, quando os investimentos têm um
maior prazo de maturação, tem sido a realização de atividades complementares, não
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necessariamente relacionadas à moderna biotecnologia, que permitam gerar um rápido fluxo de
caixa para a sustentação da empresa no longo prazo.
Por último, merece ser destacada a exploração do potencial sinérgico gerado pelas
atividades de P&D em biotecnologia quanto ao estabelecimento de linhas preferenciais de
diversificação produtiva das empresas.
Quanto aos fatores estruturais que influenciam as possibilidades de êxito, deve-se destacar
as caraterísticas dos mercados específicos em que as empresas vão atuar, na sua demanda e
capacidade de absorver novos produtos de alto conteúdo tecnológico. Dado que os produtos
biotecnológicos se constituem em insumos de outros setores produtivos, devem ser avaliados
também esses setores na sua dinâmica inovativa e estratégias concorrenciais. Como visto, estes
fatores estruturais têm sido muito importantes na definição de padrões setoriais diferenciados de
inserção das biotecnologias.
Por último, como fatores sistêmicos deve-se destacar: a) a existência de instituições de
pesquisa científica e tecnológica bem consolidadas e com efetiva interação com o setor produtivo;
b) a existência de um marco legal adequado para o desenvolvimento da biotecnologia, seja em
relação aos mecanismos legais de "apropriabilidade" como em relação às exigências
regulamentares; e, c) a existência de mecanismos adequados para o financiamento ao risco
tecnológico, inerente a atividades de fronteira.
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2. COMPETITIVIDADE DOS SETORES E COMPLEXOS
2.1. Características Estruturais da Biotecnologia no Brasil
A situação no Brasil registra, em primeiro lugar, um nível muito baixo de atividades
sistemáticas de P&D e investimentos em biotecnologia por parte das empresas já estabelecidas nas
áreas de química, farmacêutica, pesticidas, alimentos e sementes. Tampouco a formação de NEBs
é expressiva, predominando, em ambos os casos, projetos de mais curto prazo, caracterizados pela
busca de nichos reduzidos de mercado e utilização de técnicas com um grau "intermediário" de
sofisticação (cultura de tecidos, fermentações, etc).
Existe uma ampla predominância do investimento do setor público, sendo que mais de
80% das atividades e dos investimentos em biotecnologia estão localizados em universidades e
instituições públicas de pesquisa, que ademais concentram mais de 90% do pessoal qualificado.
Outra peculiaridade da indústria nacional é a maior participação relativa de empresas de
agrobiotecnologia com relação a outras áreas de aplicação, inclusive saúde humana, como
consequência da tradição e infraestrtura na pesquisa agrícola, principalmente no setor público,
frente aos escassos investimentos em P&D por parte da indústria farmacêutica local. Numa
amostra de 30 empresas com atividades em biotecnologia, 14 atuam com agricultura, 11 com
saúde humana, 4 com agroindústria alimentar, 5 com produtos bioquímicos (enzimas e ácidos
orgânicos), 2 com álcool e 2 com tratamento de resíduos (note-se que várias empresas atuam em
mais de uma área).
A posição de destaque das empresas de agrobiotecnologia só se verifica em termos do
número de empresas, mas não em termos de desempenho. Não há hoje no país empreendimentos
de peso econômico na área vegetal e tampouco na área de aditivos para alimentos. Em geral, são
microempresas ou centros de desenvolvimento tecnológico que operam em nichos reduzidos de
mercados de insumos agrícolas (como mudas e inoculantes para fixação biológica de nitrogênio) e
alimentares (aqui encontra-se apenas o Centro de Desenvolvimento Biotecnológico de Santa
Catarina, um empreendimento misto público/privado). Já nas áreas de saúde humana e animal
encontram-se empresas de maior porte, com procedimentos tecnológicos e comerciais mais bem
estabelecidos, como são os casos da Biobrás, da Cibran, da Valleé e da BioFill.
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2.2. Competitividade da Biotecnologia em Aditivos Alimentares
Na área de insumos para produtos alimentares existe um predomínio das empresas
multinacionais, embora também exista um conjunto expressivo de empresas nacionais atuando
nesse segmento. Os elementos-chaves na definição da liderança no mercado de aditivos
relacionam-se à qualidade industrial dos seus produtos e ao estabelecimento de uma rede eficiente
de assistência técnica ao usuário, tendo a competição em preços um papel secundário.
O mercado de aditivos alimentares pode ser atingido fortemente por processos
biotecnológicos para a fabricação de produtos que permitam uma maior eficiência e aumento da
produtividade na indústria alimentar, bem como explorar novas rotas de diversificação produtiva.
Entretanto, não deve deixar de ser considerado o caráter "tradicional" do consumo alimentar, que
opõe resistência à introdução de novos produtos (principalmente que alterem características de
sabor e textura) e o caráter heterogêneo da indústria alimentar no país, que provoca uma
segmentação no mercado de aditivos, permitindo a sobrevivência de produtos de preço e
qualidade diferenciados.
Pensando no longo prazo, o acesso das empresas nacionais aos novos processos de base
biotecnológica será um elemento-chave na definição da competitividade da indústria nacional.
Neste sentido, hoje observa-se que, embora exista um certo nível de capacitação em instituições
de pesquisa, a ponte entre esta competência e os mercados ainda não foi construída.
A possibilidade de inserção das empresas nacionais em processos de base biotecnológica
depende do estabelecimento dessa ponte com as instituições de P&D, dado que o pequeno
tamanho e/ou a falta de rotina de pesquisa destas empresas dificilmente permitiria a realização de
pesquisa in house como estratégia predominante ou pelo menos de grande importância. Por outro
lado, merece ser destacado a necessidade de realizar acordos e joint ventures que permitam a
efetiva transferência das novas tecnologias.
Um exemplo interessante de um novo produto obtido pela biotecnologia que pode alterar
a estrutura de mercado hoje existente é o do coalho obtido por engenharia genética, em
substituição ao coalho bovino, obtido por via extrativa. O coalho genético apresenta melhor
rendimento industrial e condições mais homogêneas de operação e controle nos laticínios. Neste
caso, a empresa líder no mercado nacional, que é também líder em nível internacional (onde
existem apenas três empresas produtoras de coalho genético), está pensando em introduzir o novo
produto a partir de importações da matriz, podendo chegar a desativar suas instalações produtivas
hoje existentes no país.
Por outro lado, sua principal concorrente nacional, que ocupa 30% do mercado, aposta
que substituição do coalho bovino pelo genético ocorrerá mais lentamente. Mesmo assim, a
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empresa tem claro que, caso pretenda manter sua competitividade no médio e longo prazos,
deverá procurar mecanismos de transferência da tecnologia do coalho genético. Além da escolha
de parceiros adequados para a realização desse processo de transferência, se não pretende ser
apenas um representante comercial da empresa estrangeira no país, será fundamental o
desenvolvimento da capacitação endógena à firma para absorver efetivamente as novas
tecnologias.
Pode-se concluir que, mesmo pensando num quadro de acirramento da concorrência, onde
a inserção das empresas nacionais seja crescentemente obstaculizada, ainda existe um certo espaço
para a manutenção da competitividade das empresas nacionais do setor, sempre que se
estabeleçam estratégias adequadas de capacitação tecnológica. Essas estratégias devem incluir não
apenas as empresas, mas também a atuação das instituições públicas de pesquisa e fomento
governamentais.
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3. PROPOSIÇÃO DE POLÍTICAS
3.1. Políticas para a Estruturação Técnica e Econômica
Num nível mais geral, pode-se enunciar algumas diretrizes com vistas à estruturação da
biotecnologia no país como base ao desenvolvimento tecnológico nas principais áreas de
aplicação. É necessário ter em conta que: a) os condicionantes relativos ao conhecimento técnico-
científico consituem elementos objetivos de limite ao desenvolvimento empresarial e setorial; b) a
diferença no dinamismo tecnológico dos principais mercados afetos à biotecnologia, no que
respeita à maior ou menor premência por inovações, vem sendo o elemento atrator mais
importante no desenvolvimento tecnológico e na formação dos mercados da biotecnologia; c) a
necessidade de novos mecanismos institucionais de regulamentação para novos produtos e novos
mercados coloca condições "extras" de incerteza ao empreendimento empresarial.
Neste sentido, é importante implementar instrumentos de políticas que tomem em conta e
que venham a atender as necessidades e as questões estratégicas relacionadas a estes três
elementos estruturais básicos. Antes de qualquer sugestão em âmbito setorial, é fundamental que
haja uma política formal e orgânica que contemple o curto, o médio e o longo prazos.
Para o desenvolvimento do conhecimento técnico-científico, deve-se eleger centros de
excelência para o investimento em conhecimento básico e aplicável, nas principais áreas
disciplinares de aplicação da moderna biotecnologia. A identificação de áreas prioritárias do
conhecimento, que representem âmbitos de capacitação com grande poder de desdobramento
(relativas às core technologies) e sua localização em centros escolhidos para seu desenvolvimento,
apresenta-se como uma necessidade inadiável em face do ritmo de evolução que vem assumindo a
biotecnologia nos países desenvolvidos. A recuperação do atraso relativo deveria ser empreendida
de imediato através, entre outros mecanismos, do envio sistemático e dirigido de técnicos para
formação nos principais laboratórios do mundo.
Em relação ao segundo item, relativo à importância desigual das áreas de aplicação da
biotecnologia, que em parte é devida aos diferentes dinamismos tecnológicos dos setores afetados
pelo novo conhecimento, as políticas de direcionamento de recursos de C&T para o
desenvolvimento tecnológico e para o investimento privado devem estar calcadas em análises que
apontem, tanto quanto possível, o potencial de absorção da nova tecnologia no curto e médio
prazos nos mercados já existentes, bem como o potencial de criação de mercados radicalmente
novos. Ademais, devem também ter em conta as capacidades de desdobramento das tecnologias e
dos mercados no longo prazo. Tal observação remete, obviamente, à existência de indicadores de
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prioridades, mas que sejam constantemente revisados em função do caráter incerto e formativo
dos impactos econômicos da moderna biotecnologia.
Com respeito ao terceiro item, das condições de regulamentação dos novos produtos e
novos processos e de sua introdução na esfera produtiva, as políticas devem estar calcadas em
perspectivas que nem sejam obstaculizadoras do desenvolvimento (relativas, por exemplo, à
proibição da comercialização de produtos geneticamente modificados), nem tão inocentemente
liberais que deixem de aproveitar certas vantagens comparativas relacionadas ao meio físico e aos
mercados com maior capacidade de absorção tecnológica, ou com potencial de crescimento
dentro das novas regras do comércio internacional1.
Em linhas gerais, propõe-se a criação de um programa de longo prazo, descentralizado
mas coordenado, de prioridades nos âmbitos do conhecimento científico e da aplicação técnica, da
consideração das especificidades dos mercados (existentes e em criação), e dos instrumentos de
regulação.
3.2. Políticas Setoriais e de Modernização Tecnológica
Justamente por apresentar uma grande heterogeneidade quanto aos impactos setoriais,
com maior e crescente desenvolvimento nos ramos produtivos relacionados à produção de
diagnósticos e terapêuticos vis-à-vis aqueles relacionados à agricultura e à produção alimentar; e
porque os setores apresentam dinamismos tecnológicos nitidamente distintos, parece claro que as
políticas para biotecnologia devem, a partir de um nível mais geral como o acima apontado, ser
setorializadas. Mais ainda, devem estar referidas, quanto à sua aplicabilidade para o crescimento
industrial e econômico, a segmentos de mercado dentro de um determinado setor ou ramo da
economia.
Nos projetos mais específicos de capacitação técnica e econômica para processos e
produtos biotecnológicos, duas dimensões devem ser privilegiadas: a dimensão "nicho de
mercado" e a da atualização tecnológica dos ramos produtivos mais diretamente ameaçados pelas
novas tecnologias. A idéia de nicho não se restringe a mercados pequenos e de alcance restrito,
mas a segmentos onde, embora possa ter resultados modestos num primeiro momento, a
1 Por exemplo, a questão do aproveitamento do patrimônio genético exige um tratamento urgente por parte da
sociedade brasileira e que não pode mais se ater à esfera da retórica. Esta vantagem estática do país só pode ser
transformada em uma vantagem de fato no caso de um empreendimento sistemático de reconhecimento,
catalogação, formação de bancos de germoplasma e, sobretudo, controle do fluxo internacional desse germoplasma.
O Brasil necessita de um programa para tornar dinâmica essa vantagem comparativa e ele pode, caso faça isso, vir
a ser um dos protagonistas desse fluxo.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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capacitação em biotecnologia seja empreendida com vistas a desdobramentos futuros, ao
crescimento do mercado e das firmas nele atuantes.
A modernização tecnológica de indústrias que já se utilizam de processos biotecnológicos,
embora com técnicas tradicionais, é um passo de curto prazo que apresenta as vantagens de já
contar com mercados organizados e escala para incorporar novos métodos produtivos e de
possuir uma certa capacitação tecnológica que, embora não esteja necessariamente referida ao
novo conhecimento, pode ser um importante ponto de apoio para uma estratégia mais global de
capacitação.
Uma necessidade a mais que se impõe para as empresas que já trabalham com processos
biológicos, ou que operam em mercados ameaçados pelas novas tecnologias, está relacionada às
perspectivas de substituição de processos e de produtos. São ilustrativos os casos da subsitiuição
do açúcar de cana por sucedâneos e de uma série de produtos terapêuticos outrora extraídos de
órgãos humanos e de animais e plantas, por similares obtidos através de microorganismos
geneticamente modificados.
No caso da indústria de aditivos para o setor alimentar, vem ocorrendo algo semelhante,
como visto. Tanto a mudança de processos como a introdução de novos produtos requerem um
movimento de atualização tecnológica para as firmas estabelecidas. No caso relatado, de
substituição do coalho bovino pelo coalho genético, fica evidente a situação de fragilidade das
empresas nacionais, que se veêm obrigadas ou a modificar seus processos produtivos para
competir com as multinacionais que incorporaram tal tecnologia, ou a se tornarem meras
representantes comerciais dos produtos dessas empresas.
Uma política de objetivos mais amplos deveria estimular a capacitação no novo
conhecimento, de modo a que as empresas deste ramo empreendam um esforço de aprendizado
dos novos processos, que as capacitem a voltar a produzir, agora sob a égide da nova base
técnica.
Nesse sentido, a existência de uma legislação de propriedade intelectual pode trazer
benefícios, na medida em que diminui os entraves para a elaboração de tais acordos.
Paralelamente, é importante que haja um procedimento ostensivo de capacitação técnica de
pessoal, o que pode ser conseguido se houver um maior direcionamento dos programas de
formação de recursos humanos no país, como é o caso do programa para a formação de Recursos
Humanos em Áreas Estratégicas (RHAE), que poderia ser aproveitado para fazer parte de uma
política de capacitação de longo prazo.
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3.3. Políticas Relacionadas aos Fatores Sistêmicos
Em relação aos fatores sistêmicos, três aspectos são particularmente importantes: a)
relativos à existência de uma base institucional de pesquisa, desenvolvimento e ensino; b) relativos
à criação de normas para a pesquisa, produção e comercialização de processos e produtos
biotecnológicos; e c) relativos aos mecanismos de financiamento. Como os dois primeiros
aspectos já foram abordados nos itens acima, valeria aqui tecer alguns comentários quanto ao
ponto dos mecanismos de financiamento. Um dos motivos do Brasil apresentar um perfil diferente
de evolução do investimento privado em biotecnologia daquele observado nos E.U.A, refere-se à
inexistência de capital de risco, que obstaculiza o surgimento de novas empresas especializadas e
limita as possibilidades de cooperação entre empresas estabelecidas e empresas emergentes ou de
desenvolvimento tecnológico.
Como tal questão no fundo remete ao problema mais geral de instabilidade econômica
crônica no país, que impede que este tipo de mecanismo se estruture e cumpra seu papel na
economia, deve-se, num primeiro momento, atentar para a revitalização de linhas preferenciais de
financiamento por parte dos bancos de desenvolvimento, com critérios alicerçados e integrados às
definições de prioridades inscritas num programa de biotecnologia; prioridades estas que devem ir
além da mera indicação do que pode, num dado momento, ser considerado mais importante, mas
que contemplem um círculo virtuoso de capacitação prevendo efeitos de transbordamento.
Assim, as políticas para biotecnologia no país devem buscar, no curto prazo, uma
definição de prioridades de desenvolvimento e, para terem efeitos virtuosos devem,
necessariamente, ser conduzidas de forma orgânica: financiamento, fortalecimento de mercados,
formação de recursos humanos e participação de empresários dispostos a empreender projetos de
criação de capacitação e de formação de mercados devem estar norteados por uma política que dê
diretrizes e oriente prioridades. Os mecanismos existentes, precisam ser reforçados e
coordenados. Os programas RAHE, PADCT e as linhas de financiamento da FINEP, do BNDES
(e de outros bancos de desenvolvimento), e os pólos de tecnologia, podem ser potencializados se
pensados de forma orgânica e se focalizadas certas prioridades.
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3.4. Proposição de Políticas para Biotecnologia - Quadro Sinótico
AGENTE/ATOR
OBJETIVOS / AÇÕES DE POLÍTICA
EXEC LEG EMP TRAB ASSOC ACAD
1. Reestruturação Setorial
Objetivo: Diminuir lacunas de conhecimento
Ações: - priorizar centros de P&D X X
- priorizar programas de pesquisa X X
Objetivo: Definir e priorizar mercados
Ação: - possibilidades de sucesso comercial
para curto, médio e longo prazos X X X X
Objetivo: Regulamentação
Ação: - definir/priorizar critérios X X X X X X
2. Modernização Produtiva
Objetivo: Hierarquizar mercados e nichos
Ação: - identificar dinamismo tecnológico e
priorizar nichos X X X X
Objetivo: Atualização tecnológica de indústrias
afins
Ação: - estímulo à incorporação de novas
tecnologias X X X X X
3. Fatores Sistêmicos
Objetivo: Mecanismos de financiamento
Ações: - viabilizar capital de risco X X X X X
- fortalecimento e adequação de fontes
de captação X X X
Objetivo: Estímulo aos mecanismos de
cooperação
Ações: - consolidação de legislação de pro-
priedade intelectual X X X X X X
- estruturação das Universidades e Ins-
titutos de Pesquisa para cooperação X X X X
Legendas: EXEC - Executivo
LEG - Legislativo
EMP - Empresas e Entidades Empresariais
TRAB - Trabalhadores e Sindicatos
ASSOC - Associações Civis
ACAD - Academia
Nota: Em caso de coluna em branco, leia-se "sem recomendação".
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
4. INDICADORES DE COMPETITIVIDADE
No que diz respeito aos indicadores para avaliar a competitividade da biotecnologia no
país, fica muito difícil definí-los numa situação na qual ainda não há mercados minimamente
estruturados e onde a participação de empresas nacionais e mesmo multinacionais na moderna
biotecnologia é bastante reduzida. Entretanto, a experiência recente de avaliação do desempenho
de algumas empresas de biotecnologia no Brasil evidenciou alguns pontos que podem ser
extrapolados para situações mais gerais. Tais são:
a) a influência da estrutura gerencial nos caminhos dos investimentos privados em
biotecnologia, no que diz respeito: (i) à capacidade de articulação ao ambiente externo, e (ii) à
dinâmica gerencial interna da firma;
b) a influência do tipo de mercado privilegiado sobre o desempenho das firmas, no que diz
respeito: (i) ao seu tamanho e ao seu potencial de crescimento, (ii) à sua capacidade em absorver
inovações (ou ao seu dinamismo tecnológico);
c) a influência da capacidade de sustentação financeira nos rumos do investimento;
d) a influência da estratégia de acesso aos mercados visados;
e) a influência dos limitantes técnico-científicos e a importância das cumulatividades
existentes e adquiridas.
Em termos mais concretos, os indicadores mais relevantes seriam: forma e grau de
articulação com os grupos controladores (quando for o caso); a capacidade financeira das
empresas maiores e sua importância para a cooperação com pequenas empresas; planejamento de
curto, médio e longo prazos para geração de caixa para sustentar necessidades de investimentos
de mais longo prazo; capacidade de realizar acordos pré-competitivos de cooperação para
pesquisa, produção e comercialização.
Numa perspectiva mais quantitativa, o desempenho de empresas de alta tecnologia pode
ser mensurado pelas seguintes medidas: burn rate, que mede quanto capital está sendo consumido
pela empresa por mês; burn rate de P&D, que representa o consumo em pesquisa e
desenvolvimento; burn rate de tecnologia, que é a soma dos gastos com P&D com os gastos
médios mensais com capital fixo; overall burn rate, que representa a soma de todos os custos e
gastos mensais; net burn rate, que é a overall menos as rendas mensais médias da firma, o que dá
idéia do consumo líquido de recursos financeiros; survival index, que é uma medida entre o
consumo líquido de recursos financeiros sobre a disponibilidade de reservas das firmas (cash
book).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
A constatação de uma burn rate elevada e de uma net burn rate positiva indicam que a
empresa está ainda em fase de estruturação, que não começou a gerar retornos suficientes para
cobrir seus gastos gerais e, particularmente com atividades de P&D. Da mesma forma, o
comportamento do survival index serve para medir se os investimentos em desenvolvimento
tecnlógico de produtos estão caminhando satisfatoriamente (índice decrescente) ou não (índice
crescente).
Na verdade este tipo de medição aplica-se sobretudo a novas firmas, sejam elas NEBs ou
joint ventures. São indicadores complementares e aplicáveis a mercados em formação.
Adicionalmente, é da maior importância monitorar os caminhos que estão sendo trilhados pelas
grandes companhias que estão investindo na moderna biotecnologia e suas possíveis estratégias
para os mercados correlatos e para o mercado brasileiro. Este monitoramento permanente é uma
tarefa essencial e complementar à determinação de prioridades para se traçar programas de
desenvolvimento da biotecnologia no país.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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APRESENTAÇÃO
Este estudo visa avaliar o desempenho da biotecnologia no Brasil, e mais especificamente
do segmento de aditivos para a indústria alimentar, tomando como referência a evolução recente e
tendências internacionais nesta área. Visa também propor políticas para o desenvolvimento da
biotecnologia no país, a partir do diagnóstico realizado e da avaliação dos principais programas
públicos e políticas já implementados.
O documento está estruturado da seguinte forma: o primeiro capítulo apresenta o
desenvolvimento da biotecnologia em nível internacional, sua inserção na indústria, na agricultura
e nos complexos agroindustriais. O segundo faz uma descrição de impactos econômicos e sociais
(sobre o nível e a qualificação da mão-de-obra) esperados para os países menos desenvolvidos, e
analisa o desenvolvimento da biotecnologia no Brasil e os impactos recentes sobre a produção de
aditivos para a indústria alimentar, descrevendo aí alguns estudos de caso de empresas que
trabalham com coalho extrativo e genético, com enzimas e com aromas alimentícios. Neste item
foram estudados os casos de 4 empresas: a Novo Nordisk, a HA-LA do Brasil (Christian Hansen),
a Bela Vista e a Ferminish. Aborda também as políticas para biotecnologia no Brasil, incluindo
dados sobre investimentos dos principais programas em âmbito federal coletados junto ao
BNDES, à FINEP a ao Ministério da Ciência e Tecnologia. O terceiro capítulo faz uma indicação
de políticas para o desenvolvimento da biotecnologia em geral e para o setor de aditivos em
particular. O quarto e último capítulo propõe indicadores para o acompanhamento do desempenho
das empresas de biotecnologia no Brasil.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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1. O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA EM NÍVEL INTERNACIONAL:
SUA INSERÇÃO NA INDÚSTRIA, NA AGRICULTURA E NOS COMPLEXOS
AGROINDUSTRIAIS
Em princípio, pode ser entendida como biotecnologia qualquer técnica que utilize
organismos vivos com o objetivo de produção e/ou pesquisa e desenvolvimento. Trata-se,
portanto, de um conceito muito amplo, incluindo um grande número de processos desenvolvidos
ao longo da história. Nesse sentido, é importante diferenciar a "biotecnologia tradicional" da
"biotecnologia moderna", entendendo esta última como um conjunto de técnicas de
desenvolvimento recente, baseadas nos avanços da genética molecular. Entre estas técnicas,
destaca-se a do ADN recombinante, com a qual é possível realizar a tranferência de genes de um
individuo para outro, que passa a reproduzí-los como próprios, permitindo assim incorporar uma
série de caraterísticas "úteis" a partir da manipulação da herença genética. Os primeiros resultados
concretos na utilização desta técnica foram obtidos em 1973, dando início ao que se poderia
chamar, não sem certa imprecisão, de "indústria" biotecnológica.
Todavia, esta classificação dicotômica entre biotecnologia "tradicional" e "moderna"
parece insuficiente para caraterizar um conjunto de técnicas, de desenvolvimento também recente,
que embora mais sofisticadas do que as biotecnologias "tradicionais", não constituem
verdadeiramente engenharia genética. No entanto, muitas destas técnicas são auxiliares para o
desenvolvimento da biotecnologia moderna. Além disso, em alguns casos, foram identificadas
oportunidades de aplicação comercial destas técnicas, como é o caso, por exemplo, da cultura de
tecidos utilizada para a produção de mudas sadias e uniformes na produção vegetal e da
transferência de embriões na produção animal. Por isso, Salles F
o
et alli (1986), propõem a
caraterização dessas tecnologias como "intermediárias", incluindo, entre outras, cultura de tecidos
vegetais, técnicas elaboradas de fermentação, transferência de embriões, produção de
microorganismos para controle biológico de pragas e fixação biológica de nitrogênio. No presente
estudo, analisamos o desenvolvimento da biotecnologia "moderna" e "intermediária" em nível
internacional e a inserção do Brasil nesse contexto, com ênfase em seus impactos no Complexo
Agroindustrial.
A partir do surgimento da biotecnologia "moderna", foi estabelecido um debate sobre seu
potencial de alterar as estruturas industriais existentes, conformando um novo "paradigma" de
produção. Devido ao caráter genérico das técnicas biotecnológicas, que permitem uma grande
variedade de aplicações possíveis, alguns analistas prognosticaram seu efeito "revolucionário", no
sentido da possível criação de novos setores industriais e da modificação das fronteiras dos
anteriormente existentes. Nessa interpretação, destacou-se o provável surgimento de empresários
"schumpeterianos", que saberiam explorar o potencial de aplicação comercial das novas
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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descobertas científicas. Apontava-se a possível existência de "janelas de oportunidade" para as
pequenas empresas inovativas, mesmo nos países em desenvolvimento, uma vez que os momentos
de "ruptura do paradigma" seriam mais propícios para esses novos entrantes e para o
estreitamento do gap com os países desenvolvidos (PEREZ & SOETE, 1988). Também sob a
perspectiva de ruptura radical, foram destacadas as possíveis ameaças do desenvolvimento da
biotecnologia para os países em desenvolvimento, a partir da possibilidade de substituição de
vários produtos agrícolas tradicionalmente exportados por esses países. Assim, são citados os
casos dos novos adoçantes e seu efeito sobre o mercado açucareiro, a produção de aminoáciodos
essenciais pela via biotecnológica em substituição da proteina da soja e a produção de manteiga de
cacau por vias altenativas, para citar apenas alguns exemplos. No extremo, foi prognosticada a
substituição das lavouras agrícolas por processos biotecnológicos que passariam a produzir
compostos básicos de natureza genérica, a partir de cuja combinação seriam produzidos os
alimentos (GOODMAN et alii, 1990).
Todavia, até o presente, a evolução da biotecnologia apresenta um quadro muito aquém
desses prognósticos de ruptura e reestruturação industrial. Em primeiro lugar, ainda são poucos
os produtos biotecnológicos efetivamente comercializados. Por outro lado, existem ainda muitas
lacunas no conhecimento científico e na sua aplicação produtiva. Além disso, as empresas que
lidam com biotecnologia deverão enfrentar sérios problemas, seja de ordem técnico-científica,
produtivos, financeiros ou comerciais, que ainda não conseguiram ser totalmente equacionados.
Estes fenômenos revelam a necessidade de desenhar um perfil do realmente ocorrido em termos
de aplicação da biotecnologia em lugar da simples extrapolação de tendências futuristas.
1.1. A Criação de Empresas Especializadas em Biotecnologia
O surgimento de Novas Empresas de Biotecnologia -NEBs, teve origem nos EUA, a partir
de finais da década de 70, pouco tempo depois de serem obtidos os primeiros resultados
experimentais das técnicas do ADN recombinante. Numerosas empresas foram criadas desde
então, chegando a constituir um total de 1.100 com um faturamento de US$ 2,9 bilhões para 1991
(BURRILL & LEE, Jr., 1991). Entretanto, a partir de 1983, observa-se um decréscimo no ritmo
de criação desse tipo de empresa o que está refletindo uma reversão das expectativas
excessivamente otimistas do período inicial. PISANO et alli (1988) constatam esta queda no ritmo
de criação de novas empresas de biotecnologia nos EUA: enquanto no triênio 1981-1983 foi
criada uma média de 53 empresas por ano, no triênio 1984-1986 esta média passou para 16,
chegando a menos de 5 empresas nesse último ano. Recentemente, porém, esta tendência vem se
revertendo, voltando a crescer o número de empresas.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Observa-se uma grande disparidade quanto aos setores atingidos pela biotecnologia. A
maior parte das NEBs americanas estão concentradas na área de sáude humana, correspondendo a
63%, enquanto apenas 8% das empresas têm seu principal mercado na área das agro-
biotecnologias (Figura 1.1).
FIGURA 1.1
DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DAS NEBS AMERICANAS
SEGUNDO ÁREA DE ATUAÇÃO
28%
8%
18%
11%
35%
Diagnóstico
Terapêutico
Agro-biotecnologia
Fornecedores para
indústria
Outros
Fonte: Burril & Lee Jr. (1991).
Além disso, a participação relativa das empresas de agro-biotecnologia nesse país tem
diminuido, como se constata ao comparar os dados de 1983 com os de 1990, aumentando a
disparidade com relação aos investimentos em saúde humana (Figura 1.2).
FIGURA 1.2
EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE EMPRESAS NAS ÁREAS DE APLICAÇÃO
DA BIOTECNOLOGIA NOS EUA
(1983/90)
1983 1990
0
50
100
150
200
250
Saúde humana
Saúde animal
Agricultura
Especialid.
químicas
Ambiente
Obs. Amostra de 219 empresas em 1983 e de 422 em 1990.
Fontes: para 1983 OTA (1984); para 1990 Burrle & Lee Jr. (1991).
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Também na Inglaterra, um estudo publicado por Oakey et alii, em 1990, revelam que de
um total de 150 empresas especializadas em biotecnologia, apenas 6% pertenciam à área
agropecuária e 4% ao setor de alimentos.
No conjunto do setor, a maioria das empresas é ainda deficitária, devido, principalmente,
ao insuficiente volume das vendas, frente aos elevados custos de P&D. Foi só em 1989 que um
número razoável de empresas especializadas obtiveram lucro líquido (GEBM, 1990). Mesmo
assim, para 1991, apenas 21% das NEBs americanas tiveram rentabilidade positiva (Burril & Lee
Jr., 1991). No entanto, essa mesma fonte revela que as expectativas de vendas das empresas são
bastante mais otimistas, prevendo-se a duplicação do seu volume nos próximos 2 anos, um
aumento de sete vezes nos próximos 5 anos, e 20 vezes na próxima década. Este seria um
crescimento substantivo, mesmo considerando a estreita base atual sobre a qual são realizadas
essas projeções. Por outro lado, deve ser destacado que os problemas não têm a mesma
magnitude para todos os estratos empresariais: enquanto tiveram rentabilidade positiva apenas
10% das pequenas empresas (até 50 empregados), 24% das médias (51 a 135 empregados) e 23%
das grandes, no caso das maiores empresas (mais de 300 empregados), já 65% tiveram
rentabilidade positiva para 1991(Burril & Lee Jr., 1991).
Outras fontes também revelam o fraco desempenho das firmas especializadas de
biotecnologia. Assim, tendo sido analisadas as principais empresas que atuam no setor de
biotecnologia aplicada à obtenção de produtos farmacêuticos no E.U.A, constata-se que apenas 9
tiveram lucro líquido positivo para 1991, alcançando US$ 189,2 milhões, enquanto 53 empresas
desse mesmo setor tiveram perdas de US$ 397,6 milhões nesse ano (BIO/TECHNOLOGY, abril
1992). A situação é ainda mais problemática no setor das agro-biotecnologias, onde 1991 foi o
primeiro ano em que uma empresa teve lucro líquido. Essa mesma fonte revela a elevada
participação dos gastos em P&D frente ao faturamento, que no setor bio-farmaceútico alcançou
188,3% das vendas para esse mesmo ano (BIO/TECHNOLOGY, julho 1992). No caso das agro-
biotecnologias, o maior investimento em P&D foi feito pela empresa especializada Calgene,
representando US$ 11,2 milhões, frente a um faturamento de US$ 26,1 milhões. Todavia, neste
ano, essa empresa pretende lançar ao mercado a primeira variedade transgênica: o tomate Flavr
Savr, que fora engenheirado para ter sua maturação retardada.
O desempenho das empresas, embora deficitário para o conjunto do setor, foi diferenciado
de acordo com o tamanho do emprendimento. Assim, enquanto os gastos em P&D representaram,
em média, 42% do faturamento para o conjunto do setor, para as pequenas empresas a P&D
correspondeu a 115% do seu faturamento, em 1991. Ao mesmo tempo, os setores mais afetados
foram os de menor "maturidade tecnológica", como é o caso das agro-biotecnologias, onde os
gastos em P&D corresponderam a 60% do seu faturamento, mesmo considerando que uma
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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estratégia frequente das empresas é a venda de produtos convencionais, como uma forma de gerar
recursos enquanto os produtos de conteúdo biotecnológico não alcançam o mercado.
Além do crescimento das vendas, outras estratégias foram procuradas como possível
solução para equilibrar o fluxo de caixa das empresas. Em tal sentido, destaca-se a formação de
alianças e, em alguns casos, a diminuição dos gastos, incluídos gastos em P&D. Setorialmente, o
segmento agro-alimentar foi o que apresentou com maior frequência esta última estratégia, sendo
que 50% das firmas procuraram tal caminho.
Pode-se argumentar que seria normal esperar que as indústrias nascentes, baseadas na
ciência, que pretendem lidar com processos tecnológicos complexos, requeiram elevados volumes
de financiamento e tenham altos gastos com P&D. Ocorre que a situação deficitária da maioria
das empresas se prolonga por mais de uma década, indo muito além dos prognósticos feitos
quando do surgimento de tais emprendimentos.
Na frustração das expectativas iniciais sobre o desempenho das NEBs, podem ser
apontados alguns elementos explicativos: 1) as dificuldades de natureza técnico-científica
revelaram-se maiores do que o esperado (este fator é mais importante nas agro-biotecnologias que
trabalham com organismos pluriceluares, frente ao setor farmacêutico e de alimentos que emprega
majoritariamente microorganismos unicelurares); 2) o tempo e os custos de experimentação e
teste dos novos produtos para atender às exigências regulamentares revelaram-se bastante
elevados; 3) o scale-up dos resultados de laboratório para a produção industrial mostrou-se, em
muitos casos, bastante problemático; 4) a escassa experiência empresarial dos fundadores das
NEBs, que provinham frequentemente do meio acadêmico; 5) as limitações para a inserção em
mercados fortemente oligopolizados e dominados por grandes empresas estabelecidas.
Entretanto, desta série de dificuldades não pode ser deduzido que as empresas
especializadas sejam inviáveis. Recentemente, inclusive, houve um segundo momento de
valorização do papel das NEBs americanas, com o surgimento de novas empresas na área de
biofármacos. Além disso, a partir de 1991 a cotação das ações do conjunto das empresas de
biotecnologia cresceu, chegando a janeiro de 1992 com uma performance superior à media do
mercado de capitais americano (BUSINESS WEEK, 1992). Não obstante, trata-se da revigoração
de empresas orientadas ao mercado de fármacos, que além de ser muito receptivo a novos
produtos de alto valor agregado, conta, no caso americano, com o apoio do National Institutes of
Health, responsável direto pelo avanço do conhecimento científico em biologia molecular nos
E.U.A.
A evolução recente da biotecnologia está mostrando que mais do que numa nova
"indústria", as NEBs estão se transformando - embora não fosse esse seu propósito inicial - em
"fornecedores especializados" (utilizando o conceito de Pavitt, 1984) de P&D, a partir do
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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estabelecimento de diversos tipos de acordos, alianças estratégicas e fusões com as grandes
companhias. Desta forma, as aplicações da biotecnologia estão ocorrendo no contexto das
trajetórias tecnológicas e dos ambientes concorrenciais de setores industriais já existentes,
revelando um protagonismo cada vez maior das grandes corporações do setor químico,
farmacêutico, de sementes e de alimentos. Desta forma, na explicação da heterogeneidade dos
impactos da biotecnologia nos diversos setores atingidos, além de considerar a existência de
diferentes graus de dificuldade para a superação dos gargalos técnico-científicos, devem ser
analisadas as estratégias das grandes companhias com relação ao seu engajamento no "negócio
biotecnológico", no contexto das normas que regem a competitividade em seus ambientes
concorrenciais específicos.
1.2. A Entrada das Grandes Companhias
A partir do início da década de 80 muitas das grandes companhias optaram por uma
estratégia mais "ofensiva" com relação à biotecnologia, depois de ter tido uma atitude de
"monitoração tecnológica" no período anterior enquando o nível de incerteza sobre a possível
aplicação dos resultados da biotecnologia em nível comercial era maior. Vários fatores explicam
este maior interesse das grandes companhias pela biotecnologia.
Em primeiro lugar, merece ser destacado o esgotamento das trajetórias tecnológicas
seguidas pelo setor farmacêutico e agro-químico. Nestes setores, a forma de concorrência
predominante é a diferenciação de produtos. O lançamento de novos produtos ocorre a partir de
procedimentos de P&D rotinizados que levam à descoberta de novas moléculas com ação
terapêutica, inseticida, fungicida, etc. Dado o caráter estocástico das pesquisas, é necessário
realizar um número elevado de ensaios o que eleva seu custo. O custo do lançamento de um novo
produto na indústria química é da ordem de US$ 80 milhões (BDM, set. 1990). Além disso, esses
custos são crescentes devido ao esgotamento das trajetórias tecnológicas. Consequentemente,
rotas alternativas para a obtenção de novos produtos são preferencialmente exploradas. Nesse
sentido, a biotecnologia vem se constituindo em foco importante nas estratégias concorrenciais
das grandes companhias, entendida como uma "nova forma de resolução de problemas", isto é,
como um novo "paradigma científico", na acepção de Kuhn (1978).
Além do esgotamento das trajetórias tecnológicas, as empresas do setor químico
enfrentaram, no período recente, uma queda na taxa de lucro pela vulgarização do conteúdo
tecnológico de boa parte dos seus produtos que se transformaram em commodities, com a
expansão das capacidade de produção mundial e o aprendizado imitativo realizado por vários
países, além da expiração do prazo das patentes. Como forma de recuperar suas taxas de lucro,
muitas das grandes corporações procuraram a obtenção de novos produtos de alto conteúdo
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tecnológico através da ampliação dos seus investimentos em P&D. Assim, por exemplo, os gastos
em pesquisa das principais empresas do setor farmacêutico em nível mundial, que constituiram 6%
do faturamento do setor em 1980 (OCDE, 1982), elevaram-se para 14% em 1990 (SCRIP, 1991).
Some-se a isso o acirramento da concorrência a partir da globalização dos mercados e do
processo de concentração ocorrido em vários dos setores onde tradicionalmente atuam essas
companhias, para ter a consolidação de um ambiente onde a tecnologia passou a jogar um papel
fundamental nas estratégias concorrenciais.
No marco dessa redefinição dos ambientes concorrenciais, os investimentos em
biotecnologia foram privilegiados pelo seu potencial de criação de novos produtos de alto valor
agregado e pelo seu caráter genérico, que permite a exploração de economias de escopo,
marcando rotas preferenciais para a diversificação empresarial a partir de esforços unificados de
P&D.
Por outro lado, ao mesmo tempo em que as empresas pretendem entrar em outros
mercados, abertos pelos investimentos em biotecnologia e seu potencial de criação de novos
produtos, também exploram uma estratégia "defensiva", na medida em que procuram revigorar
seus mercados tradicionais. Este último é, por exemplo, o caso da geração de variedades
resistentes a herbicidas por parte das grandes companhias do setor agroquímico. Além disso, em
certos casos, considera-se a possível ameaça de variantes biotecnológicas para alguns produtos,
como, por exemplo, a difusão do controle biológico de pragas em substituição aos pesticidas
químicos, optando algumas empresas por explorar ambos caminhos paralelamente.
Assim, as dificuldades financeiras vividas pelas NEBs foram ao encontro do interesse das
grandes corporações pela biotecnologia, resultando em vários tipos de acordos, fusões e
associações entre grandes companhias e pequenas empresas especializadas que se constituem, sem
dúvida, no fato mais marcante no desenvolvimento da biotencologia no período recente.
Através desses "acordos", procura-se maximizar as sinergias, alcançando certa
complementaridade. Do lado das NEBs, estes acordos interessam como uma forma de ter acesso
aos mercados finais, hoje controlados pelas grandes companhias. Por outro lado, também
procuram recursos financeiros para sua sustentação no longo prazo e para manter seus esforços de
P&D. Além disso, as novas empresas podem ter acesso à capacitação em produção das grandes
companhias, permitindo superar as dificuldades encontradas para o scale-up dos novos processos.
Quase todas as NEBs tem estabelecido acordos, seja para P&D, seja para comercialização
de novos produtos. Cada empresa constituiu, em média, três acordos deste tipo (Burril & Lee,
1991), sendo a intenção da maioria delas reforçar este tipo de aliança estratégica nos próximos
anos. Recentemente, tem aumentado a realização de acordos entre NEBs americanas e firmas
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estrangeiras. Um dos casos mais notáveis foi a compra de 60% do pacote acionário da maior
empresa americana de biotecnologia, a Genentech, pelo laboratório suiço Hoffmann-La Roche, em
1990.
Dos acordos realizados pelas NEBs americanas, 38% correspondem a grandes
corporações também americanas, 29% a firmas européias, 21% com outras NEBs americanas e
13% a parceiros japoneses. Em geral, trata-se de aproveitar rotas de comercialização já
estabelecidas pelos parceiros. Porém, em alguns casos, outras motivaçoes são predominantes,
como por exemplo, o caso das alianças com empresas japonesas, onde se busca fundamentalmente
superar os obstáculos de regulamentação existentes naquele país. Deve ser destacado também que
a maior parte dos acordos ocorre entre os países desenvolvidos, sendo que só 11% das empresas
tem feito algum tipo de acordo com os países em desenvolvimento. Além disso, nota-se que a
participação das alianças com estes países tem sido decrescente: em 1986, 20% dos acordos
realizados por firmas especializadas americanas foram feitos com parceiros de países em
desenvolvimento, enquanto este tipo de acordo representou apenas a 3% para 1991
(BIO/TECHNOLOGY, maio 1992).
Para as grandes companhias, o acesso às NEBs interessa como forma de aproveitar a
capacitação científico-técnica dessas empresas, procurando se associar com aquelas que se
revelem mais promissoras na obtenção de novos produtos. Desta forma, queimam-se etapas, não
tendo que enfrentar o risco do investimento pioneiro e, ao mesmo tempo, evita-se o acesso de
concorrentes potenciais aos novos produtos.
Entretanto, a estratégia das grandes corporações não se restringe apenas à realização de
acordos ou incorporação de pequenas empresas especializadas, senão que também pode ser
constatado um reforço das atividades de pesquisa in house das grandes companhias. Mesmo
quando as atividades de P&D desenvolvidas in house são fortemente market oriented, algumas
empresas desenvolvem também pesquisa básica naquelas áreas onde as lacunas no conhecimento
científico possam significar um obstáculo para a aplicação tecnológica. Pode ser citado, como
exemplo, o caso da empresa Monsanto, que em 1984 criou um laboratorio em St. Louis (E.U.A)
que emprega 1.200 pesquisadores, sendo 270 Ph.Ds, com um investimento anual em pesquisa de
US$ 575 milhões (BDM, set. 1989).
A maioria das empresas combina estratégias que incluem o desenvolvimento de pesquisa in
house, a incorporação de empresas especializadas e a contratação de atividades de P&D em
universidades, institutos de pesquisa e empresas especializadas, assim como a formação de
alianças pré-competitivas com outras companhias para a realização de atividades de P&D,
formação de joint-ventures, etc. Esta articulação de estratégias procura resolver o trade off
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existente entre os riscos de verticalizar uma atividade de resultados ainda incertos e os custos de
transação derivados das dificuldades de apropriabilidade na área das biotecnologias.
Por outro lado, esta rede de relações está de acordo com as necessidades de intercâmbio
de informação num campo de caráter multidisciplinar, ainda em formação, onde existe uma forte
relação entre conhecimento científico e aplicação tecnológica. Além disso, no contexto de
mudança do "paradigma" ainda não foi constituída uma ciência "normal" que permita a efetiva
consolidação de rotinas de P&D nas grandes companhias. Neste contexto, a diversificação das
relações externas também forma parte dos processos de "busca" das empresas. Assim, existe lugar
a uma diversidade de atitudes das grandes corporações com relação ao seu engajamento na
biotecnologia, influenciadas pelos ambientes concorrenciais e pelo grau de aversão ao risco dos
agentes (Joly & Ducos, 1992).
Na maior parte dos casos, as estratégias das grandes companhias incluem a concentração
de suas atividades de P&D in house num laboratório central, enquanto as subsidiárias realizam
apenas atividades de teste para a adaptação dos produtos às condições locais. Por outro lado, com
relação às atividades produtivas, também se observa uma tendência à concentração nos países
centrais, ao mesmo tempo em que as estratégias de mercado tendem à globalização e o espaço da
competição passa a ser o mercado mundial. A relocalização das atividades produtivas nos países
centrais é favorecida pelo aumento da escala técnica de produção permitida pelas novas
tecnologias e também deriva da necessidade de uma vinculação mais estreita entre atitividades de
produção e pesquisa. Por outro lado, por se tratar de tecnologias com maior grau de sofisticação,
que implicam maior cuidado nas variáveis de controle de processo, as tradicionais vantagens dos
países menos desenvolvidos, como a mão-de-obra barata e o amplo acesso a matérias-primas
perdem importância, frente à definição de novos determinantes da competitividade.
Duas considerações se deduzem do contexto anteriormente desenhado. Em primeiro lugar,
não seria factível esperar uma expansão do investimento estrangeiro nos países em
desenvolvimento associado à biotecnologia, seja em atividades de produção, seja de pesquisa,
mesmo que alguns problemas normativos, como a reformulação do marco de propriedade
intelectual, fossem equacionados. Em segundo lugar, dado o caráter globalizante das estratégias
das multinacionais e a consequente redefinição dos espaços concorrenciais, parece pouco
adequado tratar o desenvolvimento da biotecnologia nos países em vias de desenvolvimento como
um fenômeno isolado, uma vez que seus mercados serão afetados, certamente, pelas estratégias
concorrenciais das grandes companhias.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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1.3. A Inserção da Biotecnologia em Nível Setorial: as Especificidades do Setor Agro-
alimentar
Os principais setores alcançados pela biotecnologia são: farmacêutico, agroquímico,
sementes e indústria alimentar. Nestes setores, o ritmo da aplicação da biotecnologia é claramente
diferenciado de acordo com a dinâmica concorrencial que predomina em cada segmento de
mercado e de acordo com as dificuldades de ordem técnica e de regulação específicas.
Assim, o setor que se apresenta como mais dinâmico e aberto a inovações biotecnológicas
é o de produtos destinados à saúde humana. Os novos produtos nesta área são proteínas de ação
terapêutica, vacinas e testes de diagnóstico. O segmento privilegiado é o das doenças ditas
"incuráveis", cujo mercado anual é da ordem de US$ 100 bilhões em nível mundial, com uma alta
receptividade para produtos de maior qualidade e poder terapêutico. Além da maior dinâmica
inovativa desses mercado, o Estado joga um papel muito importante, em muitos países, seja pelos
investimentos em pesquisa do setor público ou através do seu poder de compra para o sistema
público de saúde. No caso dos E.U.A, os aportes governamentais à pesquisa básica destinavam,
em 1985, 38,3% ao setor de saúde, significando para o ano seguinte, um valor de US$ 5,1 bilhões
(Mowery & Rosenberg, 1989).
Já no setor agro-alimentar, os investimentos em biotecnologia são menos significativos.
Mesmo quando os problemas de elevados custos de P&D frente ao volume de vendas atinge tanto
as empresas biotecnológicas orientadas ao setor de saúde e as agro-biotecnologias, o volume dos
recursos envolvidos, seja do gasto em P&D, seja das vendas, é claramente diferenciado para esses
dois segmentos, como pode ser constatados ao comparar os dados relativos às principais empresas
especializadas de ambos segmentos (Tabelas 1.1 e 1.2).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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TABELA 1.1
PERFIL DOS GASTOS COM PESQUISA E DO FATURAMENTO DE NOVAS EMPRESAS
DE BIOTECNOLOGIA NA ÁREA DE SAÚDE HUMANA
Empresa Gastos com P&D
Vendas
(US$ 10
6
)
Lucros
(US$ 10
6
)
US$ 10
6
(1991)
Crescim. %
(1991/90)
% do
Faturamento
US$ por
empregado
Alza Pharmaceuticals
11,6 14,4 8,3 13,8 139,7 -62,0
Amgen 107,4 56,1 15,8 62,3 682,0 97,8
Biogen 44,2 26,5 72,1 133,8 61,4 7,1
Centocor 67,4 217,5 126,7 n.d. 53,1 -195,5
Cetus 24,3 44,1 70,6 28,6 34,5 -75,1
Chiron 79,3 58,2 115,7 52,5 68,6 -425,2
Elan (3/91) 8,2 41,3 12,5 14,9 66,0 10,6
Genetech 212,9 36,2 46,3 96,6 459,6 44,3
Genetics Inst.(11/91) 45,6 0,4 55,2 77,1 82,5 -10,7
Genzyme 10,6 21,6 9,7 13,4 109,4 11,2
Iddex Labs* 3,8 11,0 12,7 16,6 30,4 3,1
Immunex 20,0 105,1 38,1 38,0 52,6 0,8
MÉDIA 53,0 52,7 48,6 45,6 153,3 -49,4
* Opera também em agrobiotecnologia.
Fonte: BIO/TECHNOLOGY (Julho de 1992).
TABELA 1.2
PERFIL DOS GASTOS COM PESQUISA E DO FATURAMENTO DE NOVAS EMPRESAS
DE BIOTECNOLOGIA NA ÁREA AGRÍCOLA
Empresa Gastos com P&D
Vendas
(US$ 10
6
)
Lucros
(US$ 10
6
)
US$ 10
6
(1991)
Crescim. %
(1991/90)
% do
Faturamento
US$ por
empregado
Biotechnica Intern. 5,1 -33,5 33,3 29,2 15,4 -15,0
Calgene (6/91) 11,1 7,0 42,7 49,3 26,1 -14,3
Crop Genetica Intern. 5,9 13,6 421,8 59,8 1,4 -8,3
DNA Plant Technology 6,4 18,7 71,0 44,9 9,1 -14,9
Econgen 6,4 17,0 102,7 80,1 6,2 -10,8
Escagenetics (3/91) 2,8 42,4 112,9 59,3 2,5 -4,1
Iddex Labs* 3,8 11,0 12,7 16,6 30,4 3,1
Mycogen 10,7 -2,7 58,4 38,2 18,3 -3,3
Neogen (5/91) 0,8 33,7 14,4 8,2 5,9 -0,7
Syntro (9/91) 2,1 9,6 52,1 46,6 4,0 -0,9
MÉDIA 5,5 5,0 46,4 43,2 11,9 -6,9
Fonte: BIO/TECHNOLOGY (Agosto de 1992).
As defasagens setoriais podem ser explicadas pela dinâmica concorrencial diversa dos
mercados e pelo diferente grau de dificuldade na obtenção de novos produtos pela biotecnologia.
Neste sentido, pode se dizer que os mercados agro-biotecnológicos são mais sensíveis ao
preço dos produtos, pois estes tem um caráter intermediário, sendo utilizados como insumos pelos
agricultores. No caso das sementes, trata-se de mercados bastante segmentados, seja pela
diversidade nas condições agro-ecológicas ou sócio-econômicas de produção, seja pela limitada
"apropriabilidade" e a consequente possibilidade do agricultor produzir sua própria semente, pelo
que existem limites ao exercício de práticas oligopólicas e à globalização dos mercados.
27
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Entretanto, mesmo se tratando de mercados menos dinâmicos do que o de biofármacos, o
setor de sementes tem investido maciçamente em pesquisa biotecnológica, em muitos casos
associado ao investimento do setor agroquímico, que vem, por um lado, incorporando empresas
sementeiras e, por outro lado, criando suas próprias divisões no ramo de sementes. Neste caso, o
interesse pela biotecnologia se deriva do esgotamento das trajetórias tecnológicas seguidas pelo
fito-melhoramento. A biotecnologia pode permitir o encurtamento nos longos prazos hoje
necessários para a geração de novos cultivares, além de uma redução no custo das pesquisas e
uma diminuição da incerteza derivada do caráter estocástico dos procedimentos de P&D
atualmente empregados, que passam a ser substituidos por outros de caráter mais determinístico.
No entanto, existem importantes obstáculos técnicos para o desenvolvimento da engenharia
genética em plantas, principalmente, no que diz respeito à tranferência de carateres poligênicos,
como são os que definem a produtividade agrícola. Assim, as principais aplicações da
biotecnologia ao fito-melhoramento estão seguindo "linhas de menor resistência", isto é, aquelas
linhas onde o conhecimento da bioengenharia mais tem avançado. Além disso, a escolha das linhas
de pesquisa está determinada pelas estratégias competitivas das empresas produtoras de sementes
e pesticidas, o que explica, por exemplo, a ênfase dada à obtenção de variedades resistentes a
herbicidas (Tabela 1.3).
TABELA 1.3
DISTRIBUIÇÃO DE EMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA AGRÍCOLA
POR ATIVIDADE DE PESQUISA
Característica almejada
Nº de
firmas
% sobre o
total
Resistência a herbicida
13 39,0
Resistência a pragas 6 19,0
Resistência a doença 7 21,0
Outros 7 21,0
Total 33 100,0
Fonte: Quintero (1991), elaborado por Salles Filho (1993).
No caso da indústria alimentar, existe um amplo potencial de aplicação da biotecnologia.
Todavia, o impacto produtivo destas técnicas é incipiente e bastante heterogêneo. Neste caso, as
maiores dificuldades para a introdução de inovações biotecnológicas provêm do ambiente
concorrencial pouco competitivo da indústria de alimentos, que tem se caraterizado por
investimentos relativamente menores em P&D (menos de 1% do faturamento em nível
internacional) e pela manutenção de um padrão "tradicional" de marcas e qualidade. Assim, com
relação a sua dinâmica inovativa, o setor pode ser caraterizado, de acordo com as categorias
propostas por Pavitt (1984), como predominantemente "dominados pelos fornecedores", onde as
inovações ocorrem a partir da incorporação de insumos e equipamentos. Só recentemente, a partir
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da segunda metade dos anos 80, é que seus gastos com P&D começaram a aumentar (Fanfani et
alii, 1992)2.
Esse maior interesse atribuído à questão tecnológica deve ser visto no marco do novo
ambiente concorrencial criado a partir do processo de concentração e de centralização de capitais
por que passa a indústria alimentar, através de várias aquisições e fusões de grandes grupos
alimentares do mundo, entre si, e com novos entrantes de atuação consolidada em outros setores.
Nos anos 80 foram feitas mais de 50 aquisições, algumas delas envolvendo cifras na casa dos
bilhões de dólares, como a compra da General Foods pela Philip Morris e da Nabisco pela J. J.
Reynolds3. Estes take-overs são resultado de estratégias voltadas à consolidação da presença dos
grandes grupos agroindustriais que atuam em nível multinacional e a atender um processo
crescente de diversificação da demanda na direção de produtos com características localmente
definidas, de maior especialização e, portanto, de menor massificação.
Neste contexto, a biotecnologia passa a ser uma opção importante ao setor alimentar,
dado seu potencial de contribuir à diferenciação de produtos. Diferente do setor farmacêutico,
agroquímico e de sementes, na área alimentar a biotecnologia não aparece como solução a
gargalos tecnológicos, nem se observa um esgotamento das trajetórias tecnológicas. No entanto, a
biotecnologia se apresenta como uma via complementar ao leque de opções tecnológicas,
podendo chegar a se transformar num elemento importante nas estratégias concorrenciais dos
grandes grupos. Além da pesquisa realizada in house, o setor produtor de aditivos para alimentos
se constitui num locus privilegiado do possível impacto das biotecnologias no setor de alimentos.
Dado que os produtores de insumos para a indústria alimentar podem ser caraterizados como
"fonecedores especializados"(Pavitt, 1984), a receptividade dos usuários e a contituição de uma
relação usuário-produtor são elementos chaves na definição do padrão inovativo e no peso das
variáveis tecnológicas na definição das estratégias concorrenciais das empresas produtoras de
aditivos. Assim, os segmentos mais dinâmicos da indústria alimentar exercem um efeito positivo
através de sua demanda qualificada à industria produtora de aditivos alimentares.
Muitos insumos da indústria alimentar, anteriormente produzidos pela via extrativa ou
química, podem ser substituídos com vantagens em termos de qualidade e eficiência, por variantes
biotecnológicas (ver Quadro 1.1).
2 Para se ter uma noção, na França os gastos com P&D na área alimentar representam cerca de 0,2% do
faturamento das empresas; a Nestlé, por exemplo, aplica algo em torno de 1,2% de seu faturamento em pesquisa.
No início dos anos 80 a média do setor entre os países da OCDE era de 0,4% do faturamento.
3 Para uma ampla discussão deste fenômeno ver WILKINSON (1989)
29
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Trata-se, em geral, de substâncias, como por exemplo enzimas e fermentos, que podem ser
produzidas por microorganismos bio-engenherados. Neste sentido, não existem maiores barreiras
técnicas, tendo sido obtidas importantes aplicações da biotecnologia nesse campo.
Além disso, uma vantagem adicional para a aceitação de novos insumos de conteúdo
biotecnológico pela indústria alimentar é sua escassa participação no custo de produção final dos
alimentos frente ao seu possível impacto na produtividade do processo e na qualidade dos
produtos finais.
Todavia, com relação ao setor agroalimentar, deve ser destacado que por se tratar de um
setor produtor de commodities de baixo valor agregado, a redução de custos é um dos principais
determinantes da competitividade. Neste sentido, os métodos de extração e síntese química,
utilizados tradicionalmente, ainda têm certo potencial de aperfeiçoamento e ganhos de
produtividade, o que poderá favorecer por um certo tempo o recurso a estes procedimentos
"tradicionais" (Fanfani et alii, 1992). Some-se a isto o fato de existir, em vários países, uma forte
regulamentação sobre o lançamento de novos produtos alimentares, assim como certa resistência
dos consumidores a estes novos produtos.
QUADRO 1.1
ALGUMAS PROPOSTAS DE SOLUÇÃO POR ENGENHARIA GENÉTICA
A PROBLEMAS DA PRODUÇÃO ALIMENTAR
PROBLEMAS SOLUÇÃO
A disponibililidade de renina para fazer queijos é
limitada
Induzir por transferência de genes para que leveduras
ou fungos produzam renina idêntica à bovina
Muitas enzimas têm pouca estabilidade para serem
usadas no processamento de alimentos
Fazer alterações na estrutura das moléculas de
enzimas para obter maior estabilidade em condições
ambientais adversas
Existem plantas que produzem proteínas, enzimas e
outros produtos de interesse, mas em muito baixas
concentrações
Amplificar o número de genes responsáveis do produto
de interesse e aumentar a produção em condições in
vitro
Os herbicidas são também tóxicos para plantas úteis,
além das hervas daninhas
Transferir o gene responsável pela produção da enzima
que cataboliza o herbicida para a planta de interesse
As hortalizas congeladas algumas vezes se tornam
râncias pela ação da enzima lipooxigenasa
Identificar o gene de lipooxigenase, entender sua
regulação e desenvolver métodos que limitem sua
expressão
Grãos e legumes importantes são deficientes em algum
aminoácido essencial, v. gr. milho é pobre em lisina,
soja tem baixo conteúdo de aminoácidos azufrados
Introduzir e amplificar genes de proteínas com alto
conteúdo do aminoácido essencial deficitário, avaliar o
valor nutricional e funcional das novas proteínas
Fonte: QUINTERO, 1991.
30
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2. O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA NO BRASIL E IMPACTOS SOBRE
A PRODUÇÃO DE ADITIVOS PARA A INDÚSTRIA ALIMENTAR
Nesta parte do estudo traçaremos um breve perfil comparativo da evolução da
biotecnologia no Brasil, tomando como referência os países desenvolvidos e a América Latina.
Em seguida, apresentaremos e discutiremos o trabalho de entrevistas que foi feito junto a 4
empresas do segmento de aditivos para a indústria alimentar, apontando impactos e tendências
para a estruturação daquele segmento industrial no Brasil. Antes porém faremos algumas
considerações de ordem mais geral sobre os impactos econômicos e sociais que são normalmente
apresentados quando se discute os efeitos da moderna biotecnologia nos países menos
desenvolvidos.
2.1. Alguns Aspectos sobre os Impactos da Biotecnologia na Produção Interna, e no Nível e
na Qualificação do Emprego dos Países Menos Desenvolvidos
Boa parte da literatura que trata do tema dos impactos da moderna biotecnologia para os
países pobres o faz pela ótica das oportunidades/ameaças, com forte predomínio nas ameaças de
substituição de produtos típicos de exportação desses países, notadamente produtos agrícolas "in
natura", ou processados. Este enfoque analítico decorre em grande parte do conhecido impacto da
substituição do açúcar de cana por adoçantes sintéticos ou naturais, tais como o aspartame e a
isoglucose, apenas para citar dois deles. A isoglucose, também conhecida por xarope de frutose, é
um adoçante obtido pelo processamento enzimático do amido do milho, o que pode ser
caracterizado como uma nova técnica biotecnológica. Sua entrada como edulcorante na
agroindústria alimentar foi notável nos últimos 15 anos, deslocando boa parte do mercado de
sacarose (a indústria de bebidas nos E.U.A já adoça metade de sua produção com outros
adoçantes que não a sacarose).
Este impacto concreto de substituição de produtos, causado pelo emprego de novas
tecnologias, foi tomado como exemplo paradigmático na análise das possíveis ameaças da
biotecnologia para os países menos desenvolvidos (PMDs). A partir disto, foram previstos
impactos semelhantes para o óleo de palma, a baunilha, o cacau e até mesmo o café. O temor de
que o potencial tecnológico da biotecnologia pudesse levar à substituição de produtos tradicionais
da pauta de exportação desses países foi o fundamento do enfoque de ameaças desenvolvido nos
anos 80 (ver Fowler et alii, 1988). Dado o desenrolar dos fatos, viu-se que tais temores eram, no
mínimo, precipitados, especialmente em se tratando da substituição de "commodities", que não
vem se generalizando como se imaginava há bem pouco tempo.
31
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Por outro lado, começam a aparecer impactos na substituição de mercados mais
localizados, não globais e não exclusivos de PMDs (ou não principalmente relacionados a estes).
Estes impactos decorrem do estímulo que as novas técnicas propiciam ao movimento de
reestruturação da indústria em geral, em âmbito internacional, levando ao aumento da
concentração técnica e econômica na maioria dos setores da indústria. Um exemplo atual, e que
será discutido mais adiante quando formos apresentar os estudos de casos feitos para a presente
pesquisa, é o da substituição de certos aditivos de origem extrativa, utilizados na indústria de
alimentos, por similares de origem microbiana/fermentativa, o coalho empregado na indústria de
laticínios, por exemplo, cuja obtenção original é feita por extração de estômago de bovinos e que
agora começa a ser produzido por via fermentativa, através do uso de microorganismos
geneticamente modificados para esse fim. Com isto, um produto que antes precisava ser
produzido localmente, em função da especificidade da matéria-prima empregada e dos limites de
escala impostos pelo próprio processo produtivo, pode agora ser produzido em moldes
completamente diferentes, prescindindo da matéria-prima original e rompendo limites de escala.
Do ponto de vista econômico, o resultado disso é um forte processo de concentração em
torno das firmas possuidoras da nova tecnologia. O suprimento do coalho pode, em tese, ser feito
a partir de poucas plantas estrategicamente localizadas, o que pressupõe o fechamento de
unidades produtivas em vários países, causando desemprego e sucateamento de uma mão-de-obra
que fora qualificada na "velha" tecnologia. O novo conhecimento e seus desdobramentos
econômicos requerem também um novo tipo de qualificação de mão-de-obra, notadamente no que
se refere ao desenvolvimento de microorganismos com essas novas características e aos processos
fermentativos aí envolvidos.
Em geral, tanto o nível de emprego como a qualificação da força de trabalho poderão ser
afetados pela introdução das novas tecnologias de base biológica. A ainda pequena disseminação
da moderna biotecnologia no tecido produtivo torna muito difícil a tarefa de quantificar os
impactos da biotecnologia sobre o nível de emprego e a qualificação da mão-de-obra. Do ponto
de vista qualitativo, dois enfoques são importantes: o da redução do nível de emprego interno nos
setores que perdem competitividade por não estarem acompanhando as transformações
tecnológicas resultantes da moderna biotecnologia, nos âmbitos nacional e internacional (como no
caso acima comentado); e o da perspectiva de criação de novos postos com novas qualificações
que se tornam necessários com as transformações tecnológicas em curso (como também acima
assinalado). Na verdade, os impactos gerais da biotecnologia, neste particular, em muito se
assemelham aos da informática, onde a questão do emprego e das relações de trabalho devem ser
vistas pelo binômio nível de emprego X qualificação da mão-de-obra. Sobre isto é possível
vislumbrar três tipos de situações:
32
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a) redução do emprego e sucateamento da qualificação existente pela perda de
competitividade em determinados setores, cujas unidades industriais ou agrícolas internas podem
ser fechadas ou recicladas. Aqui são mais comuns os casos de substituição de produtos naturais
ou extrativos por produtos fermentativos;
b) incrementos da produtividade que resultem em diminuição do número de empregos,
num determinado setor, além de eventualmente tornar necessária uma nova qualificação do
operário, que deverá atuar em processos podutivos por vezes completamente diferentes. Tomando
como exemplo a substituição de produtos extrativos por produtos obtidos por fermentação, a
redução global sobre o emprego tende a ser de 20% a 30% no novo processo, considerando-se
não apenas o emprego direto no processo produtivo, como também a mão-de-obra que seria
utilizada para a instalação das novas plantas industriais.trazidas pela introdução de novas
tecnologias de base biológica. Em compensação, não se pode desprezar a criação de novos
empregos decorrente de criação de novos mercados originados nas oportunidades tecnológicas do
novo conhecimento;
c) aumento do nível de emprego no meio rural e redução do emprego sazonal na
agricultura pela alteração dos ciclos biológicos das plantas e dos animais, o que permitiria cultivos
e criações durante todas as épocas do ano, sem os intervalos típicos de certas atividades
agropecuárias (Ahmed, 1991). Evidentemente que tal hipótese, embora presente, deve ser
mediada com outros critérios, como o nível de mecanização, a estrutura fundiária e a própria
redução de certas práticas agrícolas demandantes de mão-de-obra, proporcionada pela moderna
biotecnologia, como por exemplo a diminuição das operações de adubação e aplicação de
pesticidas em culturas cujas variedades sejam auto-suficientes em nitrogênio ou resistentes a
pragas e doenças.
Algumas perspectivas relativas ao emprego (assim como o grau de dificuldade de previsão
de impactos da biotecnologia) podem ser visualizadas no Quadro 2.1, extraído de Galhardi
(1993), que apresenta uma avaliação da biotecnologia agrícola/alimentar.
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QUADRO 2.1
IMPACTOS SOBRE O TRABALHO ADVINDOS DA BIOTECNOLOGIA
NAS ÁREAS AGRÍCOLA E ALIMENTAR
CULTURA INOVAÇÕES EFEITO NO EMPREGO
Milho fixação biológica de nitrogênio (por
microorganismos)
aumento na demanda por trabalho tradicional, devido aos
ganhos de produtividade; e na produção do inoculante;
resistência a herbicidas redução do uso de mão-de-obra no controle de ervas daninhas
resistência a seca e acidez do solo aumento da demanda por mão-de-obra pelo aumento da
intensidade de cultivo em determinadas regiões
resistência a insetos aumento líquido da demanda por emprego pela diminuição
das perdas (dependendo da mecanização)
Batata produção de batata-semente por
micropropagação
aumento do emprego pelo aumento da intensidade de cultivo;
aumento da demanda por trabalho pela ausência de oscilações
da produção; aumento da mão-de-obra especializada para as
fases laboratorial, de multiplicação e de produção comercial.
Feijão plantas livres de doenças, resistentes
a adiversidades de solo e clima
aumento dos requerimentos de mão-de-obra por ganhos de
produtividade, e devido à incorporação de novas áreas
fixação microbiana de N
2
idem
uso de micorrizas para ampliar a
absorção de nutrientes
idem
Café melhoramento e reprodução por
cultura de tecidos
aumento da demanda por mão-de-obra especializada em
cultura de tecidos em geral e na micropropagação
retenção dos grãos por mais tempo redução da necessidade de trabalho pela mecanização
valoração de aspectos qualitativos
sobre os quantitativos
neutro ou redução da ocupação de mão-de-obra
resistência a condições adversas redução da flutuação do emprego por estabilidade da produção
resistência a herbicidas redução da demanda por trabalho
Cacau aumento no rendimento e na
qualidade
neutro
resistência a doenças e pragas aumento da demanda por trabalho pela redução de perdas;
redução da demanda por eliminação de operações agrícolas
produção de clones aumento da demanda por trabalho
produção de manteiga de cacau por
vias fermentativas
perda de emprego e trabalho nos países subdesenvolvidos
Soja fixação microbiana de N
2
idem casos acima de fixação
controle biológico de lagartas, ervas
daninhas e brocas
aumento da demanda por mão-de-obra
variedades adaptadas a novas
situações edafo-climáticas
idem
Fonte: Galhardi, R. (1993), (simplificado).
34
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Como já dissemos, estas perspectivas são largamente especulativas e não se pode fazer
afirmações generalizantes sobre o tipo de impacto da difusão das técnicas biotecnológicas em
relação aos seus aspectos econômicos e sociais. É certo, porém, que apesar da ainda difusa
penetração da biotecnologia no tecido produtivo, há um processo de alargamento do "gap" do
conhecimento científico e tecnológico entre países avançados e atrasados. Os níveis de
investimentos e o movimento cumulativo de avanço no novo conhecimento são
extraordinariamente diferentes, podendo-se supor, sem grande medo de errar, que no momento
em que a biotecnologia se tornar um paradigma tecnológico, um novo e generalizado enfoque
para formular e resolver problemas, neste momento a distância entre países pobres e ricos será
ainda maior do que se apresenta hoje. Com conseqüências imprevisíveis para a nova divisão do
trabalho. Os impactos que se podem divisar no curto e médio prazos apontam para alterações
globais do tecido produtivo, num sentido que afeta tanto países desenvolvidos, quanto menos
desenvolvidos. Trata-se, por exemplo, do processo de concentração econômica e técnica de certas
indústrias, processo este que não depende só da biotecnologia, mas que por ela é acelerado.
2.2. Particularidades e Condicionantes do Desenvolvimento da Biotecnologia no Brasil
O desenvolvimento da biotecnologia no Brasil e na América Latina apresenta uma
diferença básica em relação aos países desenvolvidos, que identifica uma direção própria: a maior
participação relativa de empresas de agrobiotecnologias em comparação a outras áreas de
aplicação, inclusive saúde humana. Um estudo realizado por Jaffé (1991) evidenciou que de 62
empresas de biotecnologia na América Latina, 56% eram de agrobiotecnologias, seguidas pela
área farmacêutica com 16% e pela de alimentos com 14%, conforme pode ser visto na Tabela 2.1.
A explicação para esta diferença pode ser encontrada, de um lado, na forte representação
da pesquisa agronômica institucionalizada nos países do continente e, de outro lado, pela ausência
de capacitação científica e tecnológica em química farmacêutica, não se verificando atividades
sistemáticas de P&D. Sem exceções notáveis, o setor farmacêutico desses países latino-
americanos está, no máximo, baseado na formulação e venda de medicamentos cujos princípios
ativos são importados.
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TABELA 2.1
ÁREAS DE ATUAÇÃO DE 62 EMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA
NA AMÉRICA LATINA*
País Área de atuação das empresas
Propagação
vegetal e
melhoram.
genético
Reprodução
e genética
animal
Alimentos
Farmacêu-
tica
Produção
de
microorga-
nismos
Química Total
Argentina
4 0 0 3 0 1 8
Brasil 5 1 0 2 0 0 8
Chile 2 0 0 1 0 0 3
Costa Rica 3 0 0 0 0 0 3
México 6 0 0 2 0 3 11
Uruguay 2 0 2 1 3 0 8
Venezuela 3 0 2 0 0 0 5
Colombia 6 0 2 1 0 0 9
Perú 1 0 2 0 0 1 4
Equador 1 0 1 0 0 0 2
Paraguay 0 1 0 0 0 0 1
Total 33 2 9 10 3 5 62
% 53 3 14 16 4 8 100
* Amostragem feita por método Delphi, na qual a empresa foi considerada quando indicada por dois ou mais
especialistas consultados.
Fonte: JAFFÉ (1991:22).
A maioria dos investimentos em biotecnologia na Região orienta-se para projetos de curto
prazo, não sendo comuns a venda de serviços e os acordos pré-competitivos. O tamanho das
NEBs é normalmente pequeno e o grau de capacitação tecnológica requerido pelos projetos
encontra-se num nível intermediário de sofisticação entre a tecnologia de fronteira e aquela mais
tradicional. Recente estudo coordenado por Jaffé (1992), que avaliou a performance de 21
empresas de agrobiotecnologias em oito países da Região, mostrou que o faturamento médio das
empresas especializadas em biotecnologia não alcançava US$ 1 milhão, o que sinifica menos de
um décimo do faturamento médio de empresas similares nos E.U.A.
Um dos condicionantes mais importantes dessa situação, além da já comentada tendência
para a pesquisa agronômica, é a quase completa ausência de capital de risco, instrumento
fundamental na estruturação de pequenas empresas de alta tecnologia. Some-se a isto a ausência
de investimentos vindos de empresas estabelecidas de setores tradicionais, como o químico, o
farmacêutico, o de pesticidas, o de alimentos e o de sementes, e completa-se o quadro de
dificuldades de mobilização de capital. O interesse apresentado pelas grandes firmas presentes
nesses países é quase sempre de natureza imediatista, por onde se busca a biotecnologia de nível
intermediário de sofisticação principalmente naquilo que pode contribuir para reduzir custos4.
4 Existem exceções, exemplos de empresas que estão, até onde é possível, engajadas em projetos de mais longo
prazo e interessadas no processo de aprendizado de técnicas de fronteira. Ocorre que em boa parte desses países, ou
os mercados são muito pequenos e não justificam investimentos de longo prazo e de alto risco, ou, quando
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Assim, é característico nesses países e especificamente no Brasil um perfil evolutivo da
biotecnologia intimamente relacionado às instituições de pesquisa. Seguramente, mais de 80% das
atividades e dos investimentos em biotecnologia estão localizados em universidades e instituições
de públicas de pesquisa, que ademais concentram mais de 90% do pessoal qualificado.
O perfil da biotecnologia no Brasil é bastante parecido: "a maior parte dos investimentos
se relaciona com a área agrícola, seguida de perto pela de saúde humana. Entre uma amostra de
30 empresas (estabelecidas e NEBs), 14 atuam com agricultura vegetal e animal; 11 com saúde
humana; 4 com agroindústria alimentar; 5 com produtos bioquímicos, como enzimas e ácidos
orgânicos; 2 com energia (álcool) e 2 com tratamento de resíduos5. Aqui também a maior parte
da competência científica e tecnológica existente se encontra nas universidades e nos centros
públicos de pesquisa" (Salles Filho, 1993:202).
"As NEBs existentes atuam em áreas batante heterogêneas e trabalham invariavelmente
com processos de nível intermediário de sofisticação. A engenharia genética é praticada nas
universidades e nos centros públicos de pesquisa, com algumas empresas estabelecidas, que se
lançaram na P&D biotecnológica, capacitando-se em técnicas de mapeamento genético e, em
alguns casos, em engenharia genética de microorganismos, como são os casos de uma empresa
que adquiriu capacitação em produção de insulina humana e de outra que se capacitou para
desenvolver vacinas animais recombinantes" (idem).
A posição de destaque das empresas de agrobiotecnologia só se verifica em termos de
número de empresas, mas não em termos de desempenho. Não há hoje no país empreendimentos
de peso econômico na área vegetal e tampouco na área de aditivos para alimentos. Em geral, são
microempresas ou Centros de desenvolvimento tecnológico que operam em nichos reduzidos de
mercados de insumos agrícolas (como mudas e inoculantes para fixação biológica de nitrogênio) e
alimentares (aqui encontra-se apenas o Centro de Desenvolvimento Biotecnológico de Santa
Catarina, um empreendimento misto público/privado). Já nas áreas de saúde humana e animal
encontram-se empresas de maior porte, com procedimentos tecnológicos e comerciais mais bem
estabelecidos, como são os casos da Biobrás, da Cibran, da Valleé e até mesmo da BioFill, que
embora seja recente e dependente de apenas um produto, encontrou um nicho próspero de
mercado6. O Quadro 2.2 mostra um perfil resumido de 15 empresas que trabalham com a
moderna biotecnologia no Brasil.
justificam, a situação econômica de retração, de inflação e de inviabilização das instâncias de intermediação
financeira, tornam tal tipo de investimento desaconselhável.
5 O número total excede 30 porque várias empresas atuam em mais de uma área.
6 Assim mesmo, como veremos adiante, a Biobrás tem seus mercados bastante ameaçados pela entrada no Brasil da
Novo Nordisk.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Dois casos de investimento privado na área de biotecnologia vegetal nos anos 80 no Brasil
são particularmente interessantes. Biomatrix e Bioplanta foram duas típicas NEBs, de porte
relativamente grande para os padrões brasileiros e que buscaram explorar o negócio da moderna
biotecnologia no país, tendo ambas, por motivos em parte distintos e em parte comuns, vindo a
encerrar suas atividades ao final da década. Como grande parte das NEBs, essas empresas
estavam ligadas a grupos industriais maiores: a Biomatrix tornou-se subsidiária da Agroceres e a
Bioplanta foi implantada pela Souza Cruz (British American Tobacco Co.). Para ambas as
questões relativas ao relacionamento com os respectivos grupos e às dificuldades de consolidar
mercados foram os principais problemas enfrentados nas suas curtas trajetórias. Um estudo
recente realizado para o IICA enfocou a evolução destes dois casos e de outros dois de empresas
estabelecidas: Agroceres e Copersucar7.
Nesse estudo fica evidente que os principais motivos de fracasso dos dois
empreendimentos relacionaram-se às dificuldades de introdução nos mercados agrícolas dos
insumos desenvolvidos pelas empresas (particularmente mudas obtidas por cultura de tecidos de
espécies florestais, de batata semente, de frutas temperadas e de flores). Apesar de várias
tentativas de estabelecer contratos com empresas do ramo agrícola que são usuárias desses
produtos, ou mesmo da tentativa (no caso da Bioplanta) de criar suas próprias empresas para
comercializar os produtos, houve, em ambos os casos, uma reação muito aquém do esperado por
parte dos compradores de tais produtos. Assim, do ponto de vista de uma explicação geral para a
forma e o ritmo do desenvolvimento recente da biotecnologia agrícola, as empresas passaram pelo
mesmo tipo de problema que vem sendo verificado em âmbito internacional: a insensibilidade
relativa dos mercados agrícolas para a introdução de sementes e mudas com características e
preços muito diferenciados em relação aos produtos existentes, denotando uma competição de
trajetórias tecnológicas que ainda se apresenta favorável àquelas relativas aos produtos
tradicionais.
É claro que problemas de outra natureza, como barreiras de conhecimento associadas a
técnicas ainda em processo de rotinização; problemas de sustentação financeira de longo prazo -
normalmente necessária para iniciativas desse tipo; além de dificuldades dos grupos controladores
em aceitar investimentos de risco, como foram esses, contribuíram para ampliar o nível de
dificuldades enfrentadas, mas a conclusão mais importante a extrair desses casos é a de que,
naquele momento, por melhor que fossem as condições de oferta de novos produtos baseados em
novas tecnologias, dificilmente haveria condições de sua absorção nos mercados agrícolas
compradores, dado que muito provavelmente os preços superiores pagos pelos novos produtos -
novos insumos agrícola - não seriam compensados no âmbito dos mercados de produtos agrícolas.
7 SALLES FILHO, S.L.M.; SILVEIRA, J.M.F.J.; BONACELLI, M.B.; RUIZ OLALDE, A., Estratégias
empresariais em agro-biotecnologias no Brasil: um estudo de casos relevantes. Revista de Economia e Sociologia
Rural, 30, 1992f
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Assim, é notório que a situação aqui esteja bem aquém da verificada em nível
internacional, o que coloca problemas para todas as áreas de aplicação. Particularmente, sobre o
que nos interessa mais de perto nesse estudo, fica patente a quase inexistência de investimentos
em biotecnologia moderna voltados para o mercado na área de insumos para produtos
alimentares. Encontram-se iniciativas e certo nível de capacitação em instituições de pesquisa, mas
a ponte entre esta competência e os mercados ainda não está construída. Como vimos na primeira
parte deste estudo, o panorama que se avizinha é o de um processo de substituição de produtos e
processos nos segmentos de aditivos para a indústria alimentar, em âmbito internacional, cujos
impactos já começam a se fazer sentir no Brasil e que podem ter implicações negativas para o já
pequeno número de empresas nacionais, na medida em que certos processos e produtos tendem a
ser deslocados em proveito de outros, baseados nas novas tecnologias de base biológica. No
próximo item discutiremos alguns exemplos de impactos e de tendências que estão se
conformando para estes segmentos no Brasil, o que será feito com base em entrevistas realizadas
junto a empresas que aí atuam.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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QUADRO 2.2
PERFIL DE EMPRESAS ENVOLVIDAS COM BIOTECNOLOGIA NO BRASIL
(1990)
Empresa
Origem e
propried.
do capital
Produto
principal
Faturamento
(US$10
6
)
Gastos
com P&D
(% fat.)
Número
empregados
%
pessoal
P&D
Agroceres* Nac./Priv. Sementes
milho
híbrido
100,0 4,5 2.300 1,5
Biobrás* Nac./Priv. Insulina e
enzimas
27,0 1,8 510 24
BioFill** Nac./Misto
(25% púb.,
75% priv.)
Substituto
temporário
de pele
4,0 (sendo
3,7 devidos
a export.)
n.d. 32 16
Centro Desenv.
Biotecnológico*
Soc. Civil
Priv. s/
fins
lucrativos.
aminoácidos,
vitaminas e
enzimas
n.d. n.d. 30 65
Cibran S.A** Nac./Priv. Antibióticos 26,0 n.d. 600 2,5
Codetec** Nac./Misto
(51% púb.,
49% priv.)
Fármacos e
Biofármacos
1,5 (sendo
0,12 com
produtos
biotecnol.)
n.d. 70 50
Copersucar* Cooperativa Açúcar e
álcool
1.500,0 1,3 1.887 11
Embrabio** Nac./Priv.
Kits diagn.
(humana e
animal.)
3,0 30-40 55 40
Engenho Novo* Nac./Priv. Açúcar e
álcool
1,0 1,5 22 50
Leivas Leite* Nac./Priv. Produtos
veterinários
4,0 (sendo
1,0 com
biotec.)
n.d. 120 10
Microbiológica** Nac./Priv. Fármacos;
Hormônios
vegetais
1,0 n.d. 30 12
Natrontec** Nac./Priv. Serviço de
Engenharia
0,5 (sendo
0,05 com
biotec.)
n.d. 25 60
Nitral* Nac./Priv. Inoculantes
para
leguminosas
0,32 n.d. 46 11
SBS** Nac./Priv. Batata
semente
0,5 n.d. 10 40
Vallée* Nac./Priv. Produtos
veterinários
14,0 (sendo
12,0 com
biotec.)
n.d. 313 20
* Não é empresa específica de biotecnologia.
** Empresa específica de biotecnologia.
Fontes: Salles Filho (1993); para Biobrás e Engenho Novo, Cerantola (1991).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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2.3. Impactos e Tendências da Biotecnologia em Aditivos Alimentares no Brasil
Neste item descreveremos e discutiremos as entrevistas realizadas para esta pesquisa.
Trata-se de um conjunto de informações de cunho qualitativo, no qual se procurou identificar os
elementos mais importantes para o estudo da competitividade no segmento de aditivos para a
indústria alimentar. É portanto um item que busca complementar as informações até aqui
apresentadas, o que é feito através da ilustração de alguns casos que julgamos relevantes para
nossos objetivos.
Em função da amplitude e da diversidade do segmento de aditivos, que inclui uma gama
heterogênea de produtos e processos produtivos e, principalmente, de mercados, e dado que as
condições existentes nesta pesquisa previam a realização de poucas entrevistas, foram
selecionadas empresas cuja performance recente e perspectivas de inserção da moderna
biotecnologia como prática rotineira, servem de ilustração para o presente estudo. Ademais, outro
critério para a seleção de empresas foi a importância de suas atividades para as agroindústrias que
estão sendo enfocadas nesta pesquisa.
Assim, pareceu-nos importante tomar o exemplo de empresas que atuassem no ramo de
enzimas e fermentos, pois são especialmente relevantes para as agroindústrias de laticínios e de
sucos e legítimos representantes dos impactos presentes da moderna biotecnologia. Neste
segmento selecionamos 3 empresas: HA-LA do Brasil Christian Hansen's Laboratorium (capital
dinamarquês); Bela Vista Produtos Enzimáticos Ind. e Com. Ltda. (capital nacional) e Novo
Nordisk (capital dinamarquês). Complementarmente, tomou-se uma empresa do ramo de aromas e
fragrâncias - Ferminish (capital suiço) -, um segmento de extrema importância para o processo de
diversificação da indústria alimentar em geral e que traz informações bastante úteis para entender
a lógica inovativa (e competitiva) do setor agroindustrial. O Quadro 2.3 apresenta algumas das
características das empresas que serão descritas a seguir.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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QUADRO 2.3
CARACTERÍSTICAS GERAIS DAS EMPRESAS ENTREVISTADAS
Empresa
Origem e
propriedade
do capital
Produtos
principais
Posição
no ranking
setorial
Faturamento
(US$10
6
)
Número
emprega-
dos
Pessoal
P&D
Importância da
biotecnologia no
padrão
concorrencial
Bela Vista Nac./priv. Coalho 2 70 3 +++
HA-LA
(Christian Hansen)
Multin. Coalho;
fermentos
10 n.d. n.d. +++
Novo Nordisk Multin. Insulina;
coalho e
enzimas
n.d.* 20 200 3 +++
Ferminish Multin. Aromas e
fragrâncias
20
(7 devidos a
aromas)
110 4 +
n.d.: não disponível;
+: pouco importante; +++: muito importante.
* Líder mundial de insulina e de enzimas, no Brasil é líder em enzimas e deverá também ser líder em insulina.
Quanto aos produtos destinados à área alimentar, não foi possível detectar a posição da firma.
Passaremos a seguir a discutir os resultados das entrevistas, buscando não apenas uma
descrição por empresa, mas sobretudo uma análise dos impactos que a mudança técnica está
trazendo sobre os padrões competitivos dos segmentos envolvidos e sobre as agroindústrias que
se utilizam dessa fonte inovativa.
A primeira empresa que apresentaremos é a HA-LA do Brasil, que pertence ao Grupo
Christian Hansen da Dinamarca, que por seu turno baseia suas atividades pelo mundo em 3
principais empresas: a) Christian Hansen's Laboratorium (CHL), dedicada a coalhos e fermentos;
b) Christian Hansen's Bio Systems, voltada para outras aplicações de culturas bacterianas; e c)
Allergologisk Laboratorium, que se dedica à pesquisa e produção de produtos para diagnóstico e
controle de alergias humanas.
A HA-LA é uma empresa ligada à CHL e representa as atividades do Grupo no Brasil.
Além da HA-LA, a Christian Hansen possui mais dois investimentos no Brasil: Três Coroas Ind. e
Com. Ltda., uma empresa originalmente nacional de coalho bovino que foi adquirida pelo Grupo,
e a Agroindustrial Biotropical Ltda., empresa que está voltada para o desenvolvimento e produção
de urucum para a obtenção de corantes naturais.
O faturamento da empresa evoluiu de US$ 8 milhões em 1988 para cerca de US$ 10
milhões em 1992, tendo permanecido praticamente estável nos últimos 3 anos.
42
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Os principais produtos da empresa no mercado nacional são, pela ordem de importância
no faturamento: coalhos, fermentos lácteos, corantes e uma série de outros produtos de baixa
representação unitária nas vendas. O principal produto é o coalho bovino, seguido pelo coalho de
vitelo, ambos extraídos de partes de estômago destes animais. A HA-LA detém cerca de 60% do
mercado nacional deste produto, o que representa cerca de 66% do faturamento da empresa. Os
fermentos são totalmente importados (boa parte deles vindos de acordos comerciais com a
também dinamarquesa Novo Nordisk), representam 20% das vendas e cobrem 75% do mercado
brasileiro. Os corantes, juntamente com os outros produtos são responsáveis pelo restante do
faturamento.
A HA-LA é assim a empresa líder do mercado nacional de coalhos e fermentos lácteos,
operando junto aos principais mercados compradores do país, e.g., da LPC, Nestlé, Vigor,
Frigobrás, Sadia, Gessy Lever, entre outros.
O mercado de coalhos e fermentos no Brasil e no mundo é dominado por poucas empresas
e pode ser dividido, grosso modo, em dois segmentos: o industrial e o doméstico. Enquanto o
primeiro diz respeito às vendas para as firmas de laticínios, o segundo refere-se aos consumidores
de varejo. No primeiro grupo a concorrência se dá fundamentalmente pela qualidade do produto e
pela oferta de assistência técnica ao usuário. No segundo caso, a concorrência se dá
principalmente pelo preço, já que a grande parte dos consumidores domésticos não apresenta
preocupação quanto à influência do coalho na qualidade do queijo caseiro.
A HA-LA é líder nos dois mercados, mas obviamente concentra suas atividades para
atender ao mercado industrial, o maior e o que requer maior nível de capacitação e atualização
tecnológica. As principais concorrentes da empresa são a Bela Vista e a Coalhobrás, sendo a
primeira a que apresenta participação mais expressiva no mercado brasileiro, como veremos mais
adiante.
Assim, os principais elementos associados à liderança da empresa dizem respeito à
qualidade industrial de seus produtos, e a uma atuante rede de assistência técnica. Os preços
praticados pela empresa estão sistematicamente acima da média do mercado: 50% mais altos em
fermentos e de 10% a 100% em coalhos. Esta prática é possível não apenas pelo fato de que a
qualidade do produto é um fator importante de diferenciação, como também porque sua
participação nos custos de produção industrial na indústria de alimentos é em geral pouco
expressiva, variando em torno de 0,5% a 2,0%.
O esforço de vendas associado à assistência técnica é uma das principais bases da
competitividade da empresa, merecendo dotações orçamentárias expressivas, da ordem de 25% do
faturamento. Enquanto em 1988 a empresa contava com 3 funcionários de nível superior para
cuidar do planejamento e das atividades de vendas e assistência, em 1992 este número elevou-se
43
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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para 8 pessoas, sendo 4 de nível superior e 4 de nível médio. Este grupo encarrega-se de
coordenar 17 firmas contratadas para a veiculação dos produtos da empresa pelo país.
Por outro lado, a empresa mantém poucos acordos para contratação externa de serviços
para formação de recursos humanos e não tem plano de cargos e salários. A qualificação da mão-
de-obra está principalmente ligada ao pessoal de vendas e de assistência técnica. Na produção
aparentemente segue-se um padrão definido pela matriz.
Com relação às transformações tecnológicas e de mercado mais importantes para a
empresa, uma se coloca como particularmente importante: a substituição do coalho bovino pelo
coalho genético, obtido a partir de microoganismos modificados através de técnicas de ADN
recombinante.
Este ponto é absolutamente decisivo para o futuro do mercado de coalhos no Brasil e no
mundo. A situação hoje é de um processo de substituição de um produto obtido por extração de
tecidos de organismo animal (produto natural, extrativo), por outro obtido pela fermentação de
microorganismos geneticamente modificados. É fundamentalmente uma inovação radical, no
sentido dado por Freeman & Perez (1986), que provoca uma descontinuidade na forma de
produzir e no comportamento do mercado.
Na verdade, esta inovação não representa apenas uma mudança de processo de produção,
mas também uma inovação de produto, na medida em que o coalho obtido pela fermentação deste
tipo de organismo tem composição diferente daqueles obtidos por extração. O coalho bovino é
composto, em média, por 20% de quimosina (renina) e 80% de pepsina; o coalho de vitelo tem
esta proporção invertida e é por isso considerado de melhor qualidade pelos laticínios; por seu
turno, o coalho genético é composto em 100% por quimosina, o que o diferencia frente aos
produtos naturais, apresentando melhor rendimento industrial e condições mais homogêneas de
operação e controle nos laticínios. Entretanto, sua influência sobre o sabor do produtos que dele
se utilizam vem sendo questionada, no sentido de que haveria perda de qualidade no paladar.
Há hoje no mundo 3 produtores de coalho genético: Pfizer (E.U.A), Gist Brocades
(Holanda) e Christian Hansen (Dinamarca). Este produto está no mercado há cerca de três anos e
atualmente deve responder por quase metade do mercado norte-americano de coalhos. Entretanto,
sua entrada na Europa não foi assim tão expressiva, mantendo-se, nos países com tradição em
produtos lácteos, certa preferência pelo uso do coalho natural de vitelo, especialmente na
fabricação de queijos tradicionais "de região".
A substituição de um pelo outro depende de muitos fatores, mas essencialmente das
implicações para o mercado de laticínios. Ocorre aí uma situação onde se mostram nítidos
elementos de competição entre trajetórias tecnológicas alternativas: apesar da superioridade
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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técnica do coalho genético, que confere melhores condições para a produção do queijo, levando a
um produto final mais homogêneo e de melhor apresentação, há elementos relacionados aos
hábitos de consumo, paladar e tradição do mercado de alimentos, que colocam resistência a uma
mudança técnica dessa natureza.
Estes elementos são seguramente mais fortes que outros de ordem econômica mais direta,
como por exemplo custos de produção da indústria usuária. Ou seja, o fato do coalho genético
apresentar preços entre 20% a 30% mais elevados que o coalho natural ou animal, apesar de ser
um elemento a ser tomado em conta, não representa um impedimento decisivo à sua adoção, haja
vista a pequena participação deste tipo de insumo nos custos de produção de produtos lácteos. O
ponto central está, sem dúvida, ligado às possibilidades (ou ao interesse) de alterar características
organolépticas de produtos cujos mercados baseiam-se, em grande parte, na tradição de sabor,
textura e aroma conquistados durante muitos anos.
A HA-LA está iniciando importações do coalho genético de sua matriz, esperando
entretanto que o processo de substituição no Brasil seja lento, em função de um mercado de
queijos pouco diversificado e sem pressões significativas pelo lado da demanda, o que deve
imprimir um ritmo menor de introdução no mercado brasileiro (calcula-se que cerca de 10% do
coalho bovino seja substituído nos próximos 3 a 4 anos). Além da HA-LA, também mais duas
empresas nacionais estão em fase experimental para representarem no Brasil o coalho genético: a
Bela Vista, sobre quem falaremos mais adiante, representando o produto da Gist Brocades e a
Coalhobrás, representando o produto da Pfizer.
Uma implicação deste processo de mudança técnica para a estrutura atual de produção e
comercialização de coalhos, refere-se à tendência de concentração técnica da produção em nível
mundial, já que há a perspectiva de substituição de produções locais pela produção centralizada
nos três (e até agora únicos) produtores que detêm a tecnologia. Deter a tecnologia neste caso
significa criar e manter um conhecimento novo, altamente especializado, e que pressupõe (pelo
menos no início) a centralização da produção, para manter o controle sobre as cepas de
microorganismos desenvolvidas. Na verdade, ocorre aqui um fenômeno semelhante àquele que se
verifica com outros produtos gerados a partir de microorganismos geneticamente modificados.
Este fenômeno é exacerbado pelo fato de existir um conhecimento radicalmente novo embutido
(técnicas de ADN recombinante) e que prescinde do conhecimento anteriormente necessário para
a produção de coalho.
Este processo de concentração pode, entretanto, ser retardado ou amenizado pelo ainda
incerto grau de substituição entre produtos, pelos motivos acima discutidos. No Brasil,
aparentemente, a substituição será lenta e não deverá, num primeiro momento, provocar
reestruturações nos mercados que signifiquem o fim da produção local de coalhos de origem
45
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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animal. Mas por mais crente que se possa ser quanto a essa perspectiva, é lícito supor que no
médio prazo (entre 5 e 10 anos), o mercado brasileiro poderá ser predominantemente baseado no
coalho genético, deixando ao coalho animal uma parcela minoritária do mercado. Outro fator
decisivo para a determinação desse ritmo será o comportamento dos competidores: uma ação
mais ofensiva de uma empresa deverá desencadear atitudes de antecipação da introdução do novo
coalho no mercado.
Um problema de curto prazo colocado por essa situação diz respeito à divisão de tarefas
entre filiais da empresa na América Latina. Além do Brasil, a Christian Hansen possui uma planta
industrial na Argentina, que também produz coalho animal. A perspectiva concreta de integração
de mercados no âmbito do Mercosul, junto com a possibilidade de importações crescentes de
coalho genético, colocam uma nova condição de divisão de funções para a produção na América
Latina, que deverá culminar, aqui também, numa concentração técnica da produção de coalho
animal em um dos dois países, levando a que um país produza e outro represente. Entretanto, a
solução para uma possível ociosidade de capacidade produtiva ainda não está dada e dependerá
particularmente da intensidade do processo de substituição do coalho local pelo importado da
matriz.
Uma outra condição de mudança que está em curso na empresa é a busca de diversificação
da carteira de produtos. Neste sentido, tanto a busca de aromas quanto corantes naturais insere-se
nesta perspectiva. Um dos mais representativos projetos hoje em andamento refere-se ao
desenvolvimento de variedades melhoradas de urucum para extração da norbixina, um corante de
largo uso e sem características prejudiciais ao consumo. Para tanto, a empresa conta com um
empreendimento agrícola no estado do Pará (Agroindustrial Biotropical Ltda.), de cerca de 827
ha, onde conduz o trabalho de melhoramento e de testes agronômicos das variedades.
Tanto a diversificação quanto a busca de mercados externos são movimentos que foram
estimulados pelo baixo crescimento do mercado interno de seus principais produtos, os quais
(principalmente laticínios) têm estreita associação com o nível de atividade da economia e o poder
de compra da população8. Assim, as políticas mais prejudiciais ao desempenho de firmas nesse
segmento de mercado são aquelas que penalizam o nível de atividade econômica e a relação entre
preços e salários. No mais a empresa não se ressente diretamente de outras políticas, como
aquelas voltadas à definição da taxa de juros da economia (mas que a afeta indiretamente, via
demanda por seus produtos) e as de ordem regulatória, como as que definem os critérios para
registro de produtos junto aos órgãos competentes.
8 Na verdade, o processo de diversificação ocorre em âmbito internacional, sendo difícil separar o quanto as
condições internas foram determinantes ou não, mas se pode afirmar com segurança que a retração econômica
interna teve importante papel no estimulo ao movimento de diversificação.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Anote-se ainda que a política de abertura das importações com redução de alíquotas foram
bem recebidas pela empresa, na medida em que tais medidas facilitaram a relação de troca entre
filial e matriz, especialmente no que diz respeito à importação de uma série de produtos que a
HA-LA representa no Brasil (como por exemplo os fermentos lácteos). Os maiores problemas
levantados quanto à situação da infra-estrutura no país dizem respeito ao esgotamento da
capacidade das telecomunicações, que têm se apresentado "defeituosa e congestionada".
Em resumo, a posição competitiva da empresa é favorável, apesar das condições adversas
de consumo. A base tecnológica está na melhor situação para o mercado brasileiro e dispõe de
mecanismos que asseguram uma atualização e uma entrada em novos processos, mecanismos
esses que se encontram na dinâmica de atualização e inovação da matriz no exterior. A existência
de um novo processo (produção por microorganismos geneticamente modificados), que também
representa um novo produto, sob domínio da empresa, lhe confere uma posição vantajosa frente à
concorrência no curto e médio prazos, na medida em que, como líder atual do mercado e como
detentora da mais importante nova tecnologia, a empresa apresenta-se em condições favoráveis
para imprimir o ritmo das mudanças no mercado brasileiro. Isto implica verificar como estas
condições estariam afetando as empresas nacionais, o que procuraremos fazer a seguir, com
informações obtidas junto à principal concorrente da HA-LA, a empresa Bela Vista.
A Bela Vista - Produtos Enzimáticos Ind. e Com. Ltda., é uma empresa nacional, fundada
em 1977, que atua na produção de coalho e na representação de fermentos, culturas lácteas e
outros aditivos, como a nisina (agente anti-microbiano natural, utilizado em sucos e bebidas e em
certos lácteos). Além desta, que é a principal atividade da empresa, a Bela Vista opera também
com a produção por encomenda de algumas máquinas para a indústria de laticínios (como
empacotadeira, dosadeira e filtro rotativo). Recentemente, a empresa começa a ingressar ela
própria no ramo de laticínios, construindo uma planta industrial modelo que deve se dedicar à
formação de técnicos para o setor.
Atualmente a parte da empresa que atua na produção e comercialização de aditivos para
alimentos opera com 70 empregados, número que dobrou em relação ao que havia em 1986. O
coalho bovino é seu principal produto, respondendo por 80% a 90% das vendas, o que representa
cerca de 30% do mercado brasileiro. O segundo principal produto é a nisina, uma representação
que a Bela Vista tem da firma inglesa Aplin & Barrett Ltd., e que responde por cerca de 10% a
19% do faturamento, e 100% do mercado brasileiro. Por fim, vêm os fermentos e culturas lácteas,
que apresentam menor participação nas vendas.
O faturamento da empresa anda em torno de US$ 2,0 milhões (excluindo-se máquinas) e
estaria crescendo cerca de 30% ao ano desde 1990. Entre 1990 e 92 a empresa dobrou sua
capacidade produtiva. As exportações de coalho, que há 3 anos eram marginais, hoje respondem
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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por quase metade do faturamento deste produto e são principalmente dirigidas para a Venezuela,
através de um acordo comercial com uma firma local, de onde o coalho é exportado para a
Espanha e outros países da Europa.
A exemplo da HA-LA, os quesitos de qualidade do produto e de assistência técnica são os
pontos centrais da situação competitiva da empresa. No que pôde ser detectado, o produto
industrial da Bela Vista tem qualidade equivalente ao da empresa anteriormente descrita. Ademais,
a Bela Vista comporta-se de maneira coerente com o padrão competitivo vigente, criando uma
estrutura de assistência técnica que, como vimos, é absolutamente central para alcançar liderança
neste mercado. Na verdade, apenas essas duas empresas imprimem tal estratégia no país9. Assim
sendo, também o preço do produto está regularmente acima da média do mercado.
A origem da tecnologia e a busca de atualização tecnológica na empresa se dá de maneira
distinta daquela anteriormente descrita. Trata-se de um mecanismo que depende basicamente da
atuação dos donos da empresa (um de origem austríaca e outro de origem italiana) que trouxeram
experiência e conhecimento de empregos anteriores em empresas de laticínios, além, é claro, da
experiência derivada de suas próprias formações profissionais, implantando e mantendo
atualizada, do ponto de vista tecnológico, a linha de produção da empresa.
Não há um departamento ou uma divisão de pesquisa e desenvolvimento, embora haja um
laboratório piloto e técnicos de nível superior cuidando da otimização dos processos: os próprios
donos e mais uma engenheira química estão aí dedicados. Ao todo a empresa conta com 4
técnicos de nível superior e há uma política de enviar a pessoa encarregada do laboratório para
cursos no exeterior, o que normalmente é feito junto às empresas fornecedoras de produtos e
tecnologia que fazem parte da carteira de negócios da firma. Assim, não há uma dotação
orçamentária fixa para P&D.
O trabalho de assistência técnica tem sido conduzido por técnicos de nível médio. São dois
técnicos que trabalham todo o tempo junto às empresas usuárias dos produtos da Bela Vista.
Gerou-se aí uma capacitação que deve representar um novo ramo de negócio para a empresa, que
é a formação de pessoal técnico na área de laticínios, o que está sendo conduzido através da
implantação de um laticínio escola.
No que diz respeito à estratégia da firma para com a perspectiva de substituição do coalho
genético, há uma atitude de monitoração do mercado, que se expressa tanto por uma aposta de
que no curto e médio prazos o coalho bovino deverá se manter como o principal produto, como
por uma aproximação de empresas produtoras do coalho genético (no caso a holandesa Gist
9 Há entretanto uma diferença de estratégias, dado que a assistência técnica da Bela Vista é cobrada, enquanto que
a da HA-LA é gratuita.
48
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Brocades), para obtenção de representação do produto no Brasil. Além disso, a empresa tem
adquirido amostras do produto para testes no país junto a alguns laticínios, encontrando
resultados até agora inconclusivos, em face da heterogeneidade do comportamento industrial
apresentado pelo coalho testado em diferentes situações produtivas.
A empresa argumenta que a entrada do coalho genético deve ser lenta porque: a) não há
uma restrição de oferta do coalho bovino no mercado nacional; b) a produção de queijos mais
sofisticados dá preferência ao coalho de vitelo, dado que haveria uma estreita relação com certas
características organolépticas desejáveis na produção desses queijos e que estariam ausentes se se
empregasse apenas o coalho genético. Um exemplo prático seria a baixa adoção deste produto
nos mercados da França e da Itália; c) na Europa, o produto lácteo que é preparado com o coalho
genético não recebe autorização para emprego da "faixa verde", o que significa que não é
considerado um produto natural; d) a qualidade extremamente heterogênea do leite no Brasil seria
um obstáculo à larga adoção desse produto, uma vez que sua melhor performance industrial
dependeria exatamente do emprego de leite de qualidade superior e homogênea; e) o coalho
genético seria um produto muito mais sensível ao calor e portanto muito menos estável em climas
tropicais, exigindo ou comercialização mais rápida ou transporte e estocagem climatizados.
Entretanto, não há dúvidas de que este produto deverá, no médio e longo prazos, assumir
a posição de principal tipo de coalho, mas também parece razoável supor que continuará existindo
uma faixa de mercado para o coalho de origem animal, e que deverá estar ligada à preparação de
queijos tradicionais e/ou mais sofisticados. A generalização daquele produto deverá barateá-lo
crescentemente, além de tornar sua produção mais prática do ponto de vista das operações
industriais. Além disso, as resitências que ainda existem para que ele seja considerado um produto
natural não devem se sustentar por muito tempo, dado que se trata de um processo fermentativo,
que se utiliza de organismos vivos, cuja única característica "não natural" seria o fato de ter como
base microorganismos geneticamente modificados por técnicas de ADN recombinante.
No que diz respeito a outras estratégias de empresa, nota-se um movimento semelhante ao
da empresa anteriormente discutida, ou seja, diversificação da linha de produtos (laticínios, venda
de assistência técnica e busca da novas aplicações à nisina, aplicação de produtos para a indústria
farmacêutica) e aumento do mercado externo (acordo com empresa venezuelana). Quanto a este
últimmo ponto, além do referido acordo, há também uma determinação para encontrar
representações na Argentina ou no Uruguai, visando inserção no Mercosul.
Quanto aos impactos das políticas governamentais, a empresa não se mostrou descontente
com, por exemplo, a abertura de importações e a redução de alíquotas, até porque, como já foi
dito, o maior impacto seria na substituição do coalho bovino pelo genético, uma perspectiva na
qual a empresa já está tomando suas precauções, traçando acordo de representação com
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
produtores no exterior. Neste caso, a política de abertura seria bastante favorável e não deverá
penalizar a empresa nacional.
Também a política de propriedade intelectual não é um assunto que interfira negativamente
para a empresa. Nem a ausência nem a perspectiva de implantação de uma legislação de
propriedade mais restritiva. O nível tecnológico alcançado na linha de produção de coalho bovino
depende sobretudo do processo de aprendizado desenvolvido desde a implantação da firma e do
conhecimento detido pelos próprios donos da empresa. O conteúdo tácito existente no processo é
particularmente importante, reduzindo assim a importância da legislação de propriedade
intelectual na apropriação dos resultados do conhecimento alí embutido. Isto não quer dizer que a
existência ou não de legislação não tenha, no caso, nenhuma importância, até porque novos
processos estão sendo introduzidos, mas sua influência no atual padrão competitivo não é sentida
como um gargalo ao investimento e à modernização tecnológica.
Quanto à política de registro de produtos, as principais observações dizem respeito à
demora no registro e à falta de critérios claros de classificação10. A empresa reclama da falta de
qualificação técnica do pessoal responsável pelo encaminhamento e análise dos pedidos de
registro. A nisina, por exemplo, teria demorado cerca de 10 anos para conseguir aprovação para
uso em outros produtos que não queijo fundido.
Os dois principais aspectos da política governamental que trazem problemas ao
desempenho da empresa são: o nível de atividade econômica, porque o mercado de seus produtos
depende do crescimento do consumo de laticíncios e outros produtos alimentares; e as taxas de
juros que fazem com que os invsetimentos tenham de ser feitos sempre com recursos próprios.
Assim, a empresa não tem se valido sequer de empréstimos de bancos de desenvolvimento, à
exceção de uma operação de FINAME para aquisição de um equipamento (uma câmara fria).
Em suma, trata-se de uma empresa que apresenta posição de liderança no mercado,
baseada em tecnologia derivada dos fundadores e desenvolvida internamente, que procura acordos
comerciais com parceiros externos para ampliar não apenas seus mercados, mas também para
ampliar sua carteira de produtos. É uma empresa cujo futuro frente às mudanças técnicas mais
prementes (coalho genético) dependerá de estratégias comerciais bem sucedidas de representação
de produtos de competidores da Christian Hansen no exterior, procedimento que, como vimos, já
está sendo empreendido. Encontra, por outro lado, limitações para o investimento em razão do
custo proibitivo do financiamento bancário, o que pode vir a se tornar uma séria desvantagem
10 Citam o exemplo da dificuldade em registrar uma apresentação de coalho em gotas, porque as regras
determinam a existência de 3 tipos de apresentação: pó, líquido e pasta. Como gotas não especificava que se tratava
de produto líquido, houve então paralisação do procedimento de registro.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
competitiva no caso de outras multinacionais quererem, pessoalmente ou através de outros
representantes, entrar no mercado brasileiro de coalho genético.
A terceira empresa visitada foi a Novo Nordisk Bioindustrial do Brasil Ltda., uma filial da
Novo Nordisk S/A dinamarquesa. Está operando no Brasil desde 1989 e é, em nível mundial, o
maior produtor de enzimas e insulina. A empresa foi formada em 1989 pela fusão da Nordisk
Gentofte S/A (fundada em 1923), com a Novo Industri S/A (criada em 1925), ambas empresas
dinamarquesas. Conta hoje com atividades em 43 países, faturou em 1991 quase US$ 1,6 bilhão e
empregou, neste ano, cerca de 9,6 mil pessoas, das quais 24% estão engajadas em atividades de
P&D. Apesar de líder mundial no ramo de enzimas, é em saúde humana que se encontra a
principal área de negócios, respondendo, em 1991, por 68% do faturamento do grupo, dos quais
cerca de 85% são devidos ao mercado de insulina. A área bioindustrial, onde encontram-se as
enzimas, responde por 28% do faturamento, ficando outras atividades, como a produção de
biopesticidas e outros insumos para a indústria de alimentos, com os restantes 4%.
Trata-se portanto de uma empresa que vem investindo pesadamente na moderna
biotecnologia não só pela pesquisa in-house, mas também pela participação em Novas Empresas
de Biotecnologia nos E.U.A e no Japão (Zymo-Genetics em Seatle; Entotech em Davis; e Novo
Nordisk Bio-industry em Tóquio).
Os gastos em P&D em 1991 corresponderam a mais de 14% do faturamento, o que
representa algo em torno a US$ 230 milhões anuais para pesquisa. Deste gasto, 75% é destinado à
área de saúde humana, sendo 24% para diabetes; 18% para enzimas industriais e 5% para
proteção de plantas. O número de patentes registradas anualmente demonstra bem a base
tecnológica estratégica da empresa: 107, 135 e 139 novas patentes em 1989, 1990 e 1991,
respectivamente.
No Brasil a Novo entrou para comercializar boa parte de sua linha de produtos em âmbito
internacional, dando entretanto prioridade às enzimas industriais. A área de biofármacos está
também sendo introduzida, especialmente com a insulina, o que deverá deslocar o principal
concorrente nacional, a Biobrás, que até então detinha praticamente 100% do mercado brasileiro
deste produto. O hormônio de crescimento humano também faz parte da estratégia da empresa no
Brasil.
A fábrica existente no município de Araucária, nos arredores de Curitiba, possui cerca de
200 empregados, número que triplicou desde a implantação em 1989, e consumiu até agora
investimentos de US$ 30 milhões. Atualmente o faturamento da empresa situa-se na faixa de US$
20 milhões, valor que em 1989 foi de cerca de US$ 6 milhões.
51
ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Os maiores mercados para enzimas em nível mundial são, pela ordem: detergentes;
hidrólise de xaropes (produção de adoçantes, como o xarope de glucose); panificação; indústria
têxtil; laticínios; e tratamento de efluentes industriais. No Brasil esta importância é um pouco
diferente: detergentes; panificação; têxtil; e laticínios, são, pela ordem, os principais mercados de
enzimas, sendo que as proteases utilizadas em detergentes respondem por 50% das vendas de
enzimas. A empresa possui uma planta industrial multipropósito, que produz todo o tipo de
enzima comercializada. Relacionados à área alimentar, os produtos são: α amilase tradicional e
termoestável; amiloglucosidase; amilase fungal; α amilase farmacêutica; coalho microbiano; e β
glucanase.
A empresa exporta para os países do Mercosul, Dinamarca e E.U.A, embora tenha a
intenção de centrar suas exportações no âmbito latino-americano, no que chamam de área I -
Brasil, Argentina, Paraguai e Bolivia.
Em relação aos aspectos que conferem competitividade à empresa, encontram-se
principalmente aqueles relacionados à qualidade do produto e à assistência técnica junto ao
usuário. A tecnologia é totalmente obtida na matriz, embora tenha havido um processo de
adaptação às condições brasileiras, especialmente às condições climáticas. Não apenas a
tecnologia de processos é importada, como também e principalmente as cepas de
microorganismos, fonte original de ganhos de rendimento industrial11. A fábrica é totalmente
inserida no programa de controle de qualidade - Total Quality Control, desde o serviço de
secretaria até o de produção e comercialização.
Preço, a exemplo do que foi dito anteriormente, também não se constitui num elemento
competitivo importante, sendo superado pela qualidade e pela assistência técnica. Aqui, talvez
mais do que nos dois casos anteriores, a relação usuário produtor seja o ponto crucial da
competitividade, dado que boa parte dos produtos exige uma "customização" para o fim a que se
destina.
A planta tem um grau médio de automatização, chegando a um índice de cerca de 60% em
relação com a planta na Dinamarca, que é integralmente automatizada. A fábrica apresenta um
índice de 93% de nacionalização de equipamentos, contando mesmo com serviço próprio de
engenharia, à exceção da engenharia básica, esta trazida da matriz.
As atividades de P&D aqui são bem menos importantes que na matriz e nos laboratórios
de pesquisa que a firma mantém pelo mundo. Não contam com um departamento ou uma área
11 Embora tenha sido afirmado que a maioria dos microorganismos utilizados pela firma no Brasil tenha sido
obtida por técnicas de engenharia genética, não foi possível checar a informação com o material bibliográfico
obtido junto à empresa. De qualquer forma, acreditamos que algumas enzimas já estejam sendo produzidas por tais
técnicas, certamente na matriz e talvez no Brasil.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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específica para P&D, mas mantêm uma equipe de nível superior voltada à adaptação da planta às
condições locais. No total, a empresa conta com 11 profissionais de nível superior, sendo 3 com
mestrado.
No que toca à formação de pessoal, a firma conta com plano de carreira, gastos
permanentes com treinamento e atualização de mão-de-obra, que segundo informações estariam,
em média, na faixa de US$ 400 por funcionário por ano. A taxa de rotação da mão-de-obra foi
apontada como sendo de 0,3% e a de ausência no trabalho de 0,2%.
Com relação às políticas governamentais, os pontos cruciais foram praticamente os mesmo
apontados pela HA-LA, ou seja, retração do consumo. Nesta empresa também o nível de
atividade econômica e o poder aquisitivo da população tem influência direta, embora menos que
nas outras empresas, dado tratar-se de uma firma com uma carteira muito mais diversificada de
produtos, inclusive com imenso potencial de explorar certos segmentos do mercado farmacêutico.
A questão da propriedade intelectual, embora mais sensível para os produtos da empresa,
não foi considerada como um aspecto crucial da política de investimentos e de P&D, porque
apresentaria uma "importância econômica menor". Na verdade o controle sobre as cepas
microbianas é, sem dúvida, o elemento chave da propriedade industrial e a existência de uma
legislação, por mais restritiva que seja, seria um mecanismo a mais e não o principal mecanismo de
controle.
Em resumo, trata-se de uma empresa com capacidade de impactar fortemente o mercado
brasileiro de enzimas, deslocando produtores nacionais e, principalmente, de alterar o ranking de
certas classes terapêuticas no mercado farmacêutico, e.g. do mercado de insulina, que a nosso
juízo deveria ser alvo de estudo específico. A Novo constitui-se numa porta de entrada de
inovações biotecnológicas na área de aditivos para a indústria alimentar, dado seu esforço de P&D
e sua tradição de mercado.
A última empresa pesquisada foi a Ferminisch, uma firma suíça que opera no ramo de
aromas e fragrâncias12. Trata-se de empresa familiar que no Brasil opera uma fábrica em Cotia-
SP, com 110 funcionários, sendo 52 na produção, 22 na administração e 36 na comercialização.
Seu principal mercado é o de fragrâncias, representando cerca de 65% do faturamento, enquanto
aromas representam o restante. O faturamento da empresa gira em torno de US$ 20 milhões,
sendo US$ 7 milhões devidos aos aromas, cujo mercado total hoje no Brasil é de cerca de US$ 55
milhões.
12 Desde logo um esclarecimento: aromas referem-se a produtos utilizados na indústria alimentar, enquanto
fragâncias são produtos de aplicação à indústria de tocador. Assim, nossa análise se deterá sobre o segmento dos
aromas.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
IE/UNICAMP - IEI/UFRJ - FDC - FUNCEX
Os principais aromas comercializados pela empresa são os que apresentam sabor de
cítricos. Na verdade, a empresa é líder no segmento de cítricos, e detém a terceira posição nos
rankings nacional e mundial de aromas. O mercado de aromas é bastante concentrado no país,
sendo que as 5 maiores respondem por 73% do mercado. Os principais concorrentes são: a IFF,
líder com 22% do mercado brasileiro e principal empresa do segmento de "salgados"; Givaudan -
Roure, empresa da Hoffman La Roche, com 19% das vendas, especializada em aromas "fantasia";
Ferminisch, com 12%; Haarman, pertencente à Bayer, com 10% e especializada em complementos
salgados; e a Unilever, com 9%. Trata-se pois de um segmento dominado por empresas
multinacionais.
Os aromas e as fragrâncias são classificados como naturais ou artificiais, mas esta última
categoria subdivide-se em 3: "natural reforçado", "idêntico ao natural" e artificial. O produto
natural é sempre mais caro, e existe uma tendência, embora lenta, de substituição do artificial pelo
natural, ou pelo menos pelas outras duas categorias de "natural reforçado" e de "idêntico ao
natural". Esta tendência depende do tipo de produto a que se destina, tendo havido uma
substituição mais acentuada na produção de biscoitos (50% de incremento na procura por aromas
naturais nos últimos 3 anos) e de laticínios (30% de incremento).
O processo de substituição de aromas depende de uma série de fatores, onde o preço
muito mais caro do produto natural certamente participa da decisão de substituição (um aroma
natural hoje sai em média 10 a 20 vezes mais caro), mas outros fatores também influem e muito,
como o padrão de consumo dos produtos finais. Assim, por exemplo, enquanto o ciclo médio de
vida de uma fragrância é de 4 anos, o de um aroma é de 20 anos, justamente devido às
dificuldades muito maiores em se introduzir mudanças no gosto de um alimento vis-à-vis um
produto de limpeza, por exemplo. Ademais, o processo de introdução de novos aromas na
indústria de alimentos tem um componente de demanda muito mais pronunciado que de oferta. Ou
seja, o processo inovativo tem um peso maior pelo lado da demanda da indústria de alimentos -
em interação com o consumidor final -, que pelo lado da oferta de inovações pela indústria de
aromas. Já em fragrâncias ocorre exatamente o contrário.
Porém, seja num caso ou no outro, há necessidade de estreita relação entre usuário e
produtor de tecnologia. Tanto que a linha de produtos da empresa não se constitui numa listagem
fixa, mas ao contrário, os produtos são feitos à façon, segundo um processo que inclui o
"flavorista" da empresa, que é aquele que faz a composição do aroma, o usuário da empresa que
irá empregar o aroma e, indiretamente, o consumidor.
Este tipo de procedimento, como se pode depreender, leva a que os principais elementos
de competitividade neste segmento de mercado sejam, além da qualidade do produto, a
capacidade de atendimento ao cliente, desenvolvendo aquele produto específico, que apresente a
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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"nota" certa do componente aromático desejado. Disto decorre duas implicações importantes: a
necessidade de contar com uma equipe de vendas que seja ao mesmo tempo capaz de dar
assistência técnica; e a necessidade de manter o trabalho de desenvolvimento de produtos como
uma atividade indissociável da rotina da firma.
Quanto ao primeiro ponto, um dado revelador: cerca de 85% do pessoal de vendas
(constituído por 36 funcionários) são de nível superior. No que diz respeito ao segundo ponto, a
rotina exige que a produção esteja ligada às atividades de P&D, que na Ferminisch conta com 1
flavorista engenheiro de alimentos, que é quem vai "montar" o composto para uso em alimentos; 1
flavor technician, também engenheiro de alimentos, cuja função é a de "modular" os compostos
produzidos pelo flavorista; 1 engenheiro de alimentos para compor o produto no alimento; e 1
farmacêutico bioquímico que faz análise sensorial.
Não há, portanto, uma divisão específica de P&D, mas o processo inovativo é feito como
parte indissociável das atividades corriqueiras da firma. Tal não quer dizer que não haja pesquisa
descolada de demandas específicas, na verdade, ocorre um movimento paralelo de busca
permanente de inovações, especialmente para o aproveitamento de matérias-primas locais, que são
extraídas e encaminhadas para análises na matriz em Genebra. Além desse trabalho de apoio à
P&D da matriz, a empresa no Brasil faz acordos para a realização de testes de produtos junto a
outras empresas e a instituições de ensino e pequisa, como a SANBRA, a UNICAMP, o ITAL, a
USP, entre outros.
Quanto às tendências de inovação no mercado de aromas, anotam-se duas vias prioritárias:
o desenvolvimento de bons aromas naturais, produzidos a preços acessíveis, o que significa não
apenas empreender a busca, mas também ter alta tecnologia de extração, que é onde boa parte dos
problemas de custos podem ser resolvidos; e desenvolver aromas de elevada estabilidade e alto
poder de fixação, que resolvam problemas de volatilização e oxidação.
No que diz respeito às relações com as políticas governamentais, a empresa, como
importadora de tecnologia e de alguns insumos, vê como extremamente positiva a abertura de
importações e a redução de alíquotas. Registra, entretanto, que a ausência de legislação patentária
inibe a importação de tecnologia de fronteira para o país13.
Além dos impactos negativos impostos pelo nível de atividade econômica e pela queda do
poder aquisitivo, a empresa se ressente de um sistema de registro de produtos mais ágil e mais
especializado que o atual, dado que nas instâncias competentes, segundo a empresa, verificam-se
critérios confusos, falta de fiscalização adequada às empresas concorrentes e demora injustificada.
13 Isto não nos parece muito bem fundamentado, na medida em que a empresa opera basicamente com produção
sob encomenda e cada produto é extremamente qualificado para cada tipo de usuário.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Quanto às condições de infra-estrutura, os problemas mais graves estariam nas telecomunicações,
que estariam bastante aquém das necessidades.
Em resumo, trata-se de uma empresa cuja posição competitiva é dependente do processo
inovativo, que por sua vez está diretamente ligado a uma necessidade de atendimento rápido e
eficiente às demandas dos clientes, e vice-versa. Aparentemente (porque não pôde ser detectada a
estratégia da firma na matriz), a empresa não tem se dedicado às novas tecnologias de base
biológica e parece que seguem buscando inovações na síntese química e na busca de produtos
naturais por extração.
2.4. Políticas Implementadas no Brasil para Biotecnologia
A história das políticas públicas voltadas à promoção do desenvolvimento da biotecnologia
no Brasil remonta a 1982, quando no CNPq elaborou-se o Programa Nacional de Biotecnologia -
o PRONAB. De lá para cá as ações multiplicaram-se em programas e instrumentos do governo
federal e dos governos estaduais. Os estados economicamente mais importantes traçaram seus
programas de apoio e, em âmbito federal, tentou-se repetir a fórmula da Secretaria Especial de
Informática, criando-se a Secretaria de Biotecnologia, em 1987.
Como não pretendemos aqui discorrer sobre a trajetória das políticas nos anos 80, vale o
registro de que as experiências foram múltiplas, quase sempre descontinuadas e tiveram pouca ou
nenhuma organicidade. Dentro de um mesmo órgão, como por exemplo o Ministério da Ciência e
Tecnologia, conviviam diretrizes paralelas entre CNPq, FINEP e Secretaria de Biotecnologia.
Órgãos como Fundação Instituto Oswaldo Cruz e EMBRAPA conduziam suas orientações
próprias para biotecnologia nas áreas de saúde e agricultura, respectivamente.
Essa heterogeneidade de instâncias poucas vezes conseguiu aproveitar possíveis efeitos
sinérgicos que uma interrelação continuada poderia proporcionar. Na verdade, uma perspectiva de
mais longo prazo, e de orientação orgânica surgiu consubstanciada em dois programas: o PADCT
e o programa de formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas, o RHAE. Em âmbito
estadual merecem destaque as iniciativas do Centro de Biotecnologia do Rio Grande do Sul, do
Centro de Desenvolvimento Biotecnológico de Santa Catarina e da Fundação BIO-RIO, no Rio
de Janeiro14.
Destes exemplos, a Fundação BIO-RIO foi o mais ambicioso. Trata-se de uma tentativa de
implantação de um pólo de biotecnologia em terreno situado na Ilha do Fundão no Rio de Janeiro,
14 Há uma série de outros casos mais ou menos exitosos, mas preferimos citar apenas aqueles que não
apresentaram descontinuidade desde sua implantação.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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cujo objetivo inicial era oferecer instalações para encubadeiras, áreas para a instalação de 70
empresas que atuariam com biotecnologia, e serviços de laboratório e utilidades de uso comum,
onde entrariam desde material básico de consumo, como água e gases, até certos equipamentos
que poderiam ser utilizados por várias empresas. Os recursos para a implantação do pólo vieram
de várias fontes: CNPq, FINEP, BNDES, Prefeitura do Rio de Janeiro (pela isenção fiscal) e
Ministério da Educação (pela cessão de uso de uma área no campus da Universidade Federal do
Rio).
Até o final de 1990 tinham sido investidos cerca de US$ 7 milhões a fundo perdido, e
mesmo órgãos que dificilmente fazem esta modalidade de empréstimo, como FINEP e
principalmente BNDES, colocaram recursos expressivos no projeto. Passados mais de 4 anos,
pouco se conseguiu no pólo: utiiizaram-se da encubadeira cerca de 8 futuras empresas e até o
momento não se instalou sequer uma empresa em definitivo nas áreas destinadas a esse fim.
Atualmente a administração do BIO-RIO procura ampliar o escopo de atividades e de finalidades
do empreendimento, procurando atrair investidores de áreas correlatas à biotecnologia, como por
exemplo química fina.
As explicações para a demora em consolidar o projeto BIO-RIO são de diversas ordens,
desde argumentos baseados na conjuntura econômica desfavorável, até o questionamento da
existência de investidores e, principalmente, de mercados potenciais para o negócio da
biotecnologia no Rio de Janeiro e no Brasil15. Acreditando ser uma conjugação de vários fatores -
mesmo porque não cabe aqui fazer uma avaliação do projeto - o fato é que esta iniciativa revela
imensas dificuldades em tornar atraente o empreendimento biotecnológico para o empresariado
local.
Em âmbito federal, localizam-se a criação e o direcionamento de instrumentos para a
promoção da biotecnologia no país, desde o conhecimento científico básico e aplicado, até o
desenvolvimento tecnológico, passando, é claro, pela formação de recursos humanos. No que diz
respeito aos investimentos produtivos, a principal fonte de financiamento tem sido o sistema
BNDES, ainda que, como veremos, com uma atitude muito tímida. Até o final do Governo do ex-
Presidente José Sarney, o banco tinha uma linha de fomento dirigida para as áreas de tecnologia
de fronteira, onde naturalmente situava-se a biotecnologia. Posteriormente, o banco acabou com a
política de dar tratamento diferenciado para setores e também para estas áreas de fronteira,
centrando suas prioridades por temas, como qualidade, competitividade e capacitação tecnológica.
É portanto dentro das linhas de financiamento para estes temas que se enquadra o aporte de
15 Recentemente, a FINEP, solicitada a investir mais recursos na Fundação, pediu uma auditoria para tomar uma
decisão, a qual concluiu pelo condicionamento da liberação de novos recursos (no máximo US$ 100 mil) à
realização de uma série de alterações na estrutura do BIO-RIO.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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recursos para a biotecnologia. As linhas CONTEC, "tecnologia" e "capacitação tecnológica" são
as que têm sido acionadas para o financiamento de empreendimentos em biotecnologia.
Se tomarmos os anos de 1990 a 1992, veremos que os recursos daí originados foram
muito reduzidos. A Tabela 2.2 mostra a evolução dos financiamentos no período. Registre-se
também que não há nenhuma empresa de aditivos alimentares entre as contempladas por estas
linhas de financiamento. Ademais, cerca de 47% dos recursos para biotecnologia neste período
foram alocados para a Fundação BIO-RIO.
TABELA 2.2
FINANCIAMENTO DO BNDES PARA BIOTECNOLOGIA
(1990/92)*
Ano Desembolso para biot. Número de contratos
US$ % do total
contratos
em biot.
total de
contratos
1990 2.596.627 8,0 2 17
1991 354.678 2,0 3 22
1992 1.244.182 3,9 3 23
* exceto FINAME.
Fonte dos dados: BNDES; elaboração do autor.
Outra importante fonte de financiamento é a FINEP, tanto pelo programa Apoio ao
Desenvolvimento Tecnológico da Empresa Nacional - ADTEN, mas sobretudo para projetos de
cunho mais acadêmico, e particularmente dentro dos recursos do Fundo Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico e do programa PADCT - Programa de Apoio ao
Desenvolvimento Científico e Tecnológico, iniciado em 1985 e que conta com aportes do Banco
Mundial. É neste último que se encontra a principal linha de fomento da biotecnologia no âmbito
da FINEP.
A evolução dos recursos globais manejados pela instituição a partir de 1985 cresceu
durante dois anos, especialmente em 1987, quando houve injeção de recursos vindos do recém
criado Fundo Nacional de Desenvolvimento, o FND. A partir de 1988 os recursos vêm
apresentando tendência decrescente, pelo menos até o ano de 199116. A Tabela 2.3 mostra a
evolução desses recursos entre 1985 e 1991.
Entre as áreas prioritárias da instituição, listam-se 32 programas sistematicamente
apoiados, dos quais 2 estão diretamente ligados à biotecnologia (programas de Biotecnologia
Industrial e de Biotecnologia na Agropecuária) e 5 estão indiretamente relacionados
(Agroindústria, Ciência e Tecnologia da Alimentos; Produção Vegetal; Produção Animal;
Ciências Biológicas; e Ciência e Tecnologia em Saúde).
16 Registre-se que a evolução dos recursos vinha sendo, desde 1979, declinante.
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TABELA 2.3
EVOLUÇÃO DOS RECURSOS DA FINEP
(1985/91)
Ano
Recursos totais
(Cr$ 10
6
de dez. 1991)
1985=100
1985 217.780 100
1986 284.705 130
1987 392.209 180
1988 262.528 120
1989 176.672 81
1990 106.434 49
1991 156.189 72
Fonte: FINEP (1992).
Historicamente, a FINEP tem destinado a maior parte dos recursos para as aplicações da
biotecnologia na área de saúde humana, ficando a agropecuária em segundo lugar. Entre 1980 e
1984 a relação era de 60/40, de 1985 a 1989 alterou-se na direção de maior equilíbrio, chegando
quase a uma divisão eqüitativa. Em 1991, com recursos do PADCT, a institiução destinou cerca
de US$ 2,8 milhões para biotecnologia aplicada à área de saúde e US$ 2,3 milhões para a
agropecuária, perfazendo mais de US$ 5,3 milhões para projetos biotecnológicos, sendo que
enquanto os recursos para a área de saúde foram alocados em 5 projetos, em agropecuária eles
foram destinados a 8 projetos.
Dentre os projetos apoiados em 1991, há um relacionado ao desenvolvimento de insumos
para a indústria alimentar (melhoramento genético e otimização dos processos fermentativos para
a produção de α amilase); 3 na área de saúde animal; 2 em melhoramento genético animal; 3 em
melhoramento genético vegetal (sendo 1 visando qualidade industrial do produto agrícola, no caso
a soja, e 1 que se utiliza de técnicas de mapeamento genético em milho); e 5 na área de saúde
humana. Entre estes projetos, e além deles, se considerarmos os anos de 1990 e 1992, econtram-
se investimentos feitos pela FINEP na formação e consolidação de pólos tecnológicos e centros de
desenvolvimento, como o próprio BIO-RIO, o Centro de Desenvolvimento Tecnológico de Santa
Catarina; o Centro de Biotecnologia Aplicada à Agricultura da Universidade de Viçosa; o Centro
de Biotecnologia Vegetal em Alagoas; entre outros.
A FINEP não faz priorização dos projetos a serem apoiados, ela tem uma política de
atendimento à demanda, julgando os projetos por seu mérito e não por decisão de estimular certas
áreas. Apesar de ter colocado como objetivo financiar projetos que estejam mais voltados ao
desenvolvimento tecnológico e à aplicação comercial dos resultados, apenas nos últimos 2 anos é
que se registrou um efetivo crescimento da participação de empresas em projetos de cooperação
com universidades e centros de pesquisa. Colaborou muito para isso a ênfase dada à necessidade
de cooperação com empresas ou cooperativas no âmbito do PADCT.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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Tomando o PADCT como um todo, a área de biotecnologia foi a terceira área mais
apoiada na fase I (1984-91), representando 11,3% dos projetos financiados e tendo recebido
12,6% dos recursos totais, o que corresponde a cerca US$ 23. Atualmente, na fase II (1991-95),
ela é a segunda área mais apoiada, com investimentos previstos de US$ 40, representando 13,3%
dos recursos totais. A relação entre projetos "tecnológicos" (de objetivos mais aplicados) e
"acadêmicos" (de geração de conhecimento básico) vem sendo de 60:40.
Além dessas fontes de financiamento para biotecnologia (BNDES, FINEP e PADCT - que
está em parte incluído na FINEP) devem ser ressaltados os programas de bolsas de esudos do
CNPq e da CAPES e, especialmente, as bolsas concedidas no programa de Recursos Humanos
para Áreas Estratégicas, o RHAE, um programa do Ministério da Ciência e Tecnologia, gerido
pelo CNPq, FINEP e Secretaria de Coordenação de Programas do MCT, que vem funcionando
desde 1988. Trata-se de um programa bem sucedido, com continuidade e voltado à capacitação
de recursos humanos nas áreas de biotecnologia, informática/microeletrônica, novos materiais,
química fina, mecânica de precisão, energia, meio ambiente, tecnologia mineral e tecnologia
industrial básica. Até 1992 foram efetivamente implementadas 11630 bolsas.
As principais áreas são as de informática e biotecnologia. Nesta última o RHAE
endereçou, nos 6 primeiros meses de 1992, 1009 bolsas, das quais até então apenas 132 foram
efetivamente implementadas, engoblando universidades, centros e institutos de pesquisa,
fundações e empresas17. No total, foram concedidas nesse ano mais de 5000 bolsas, o que
significa que a biotecnologia sozinha representa algo como 28% das concessões. Ainda mais do
que a FINEP, o RAHE privilegia bolsas que contemplem projetos aplicados, voltados ao
desenvolvimento tecnológico.
Vale ainda ressaltar como está representada a política de biotecnologia em nível do MCT.
Hoje, a política para biotecnologia encontra-se institucionalizada na "Divisão de Biotecnologia e
Química Fina", dentro da Secretaria de Coordenação de Programas do Ministério. Tem
fundamentalmente tarefa de representação do Governo em vários órgãos, onde talvez a função
mais importante no momento seja a de coordenar a área de biotecnologia no RHAE, através de
uma sub-comissão para a área. Além disto, esta Divisão representa o MCT no Grupo Técnico do
PADCT e em várias ações multilaterais com organismos internacionais, como a OEA, o PNUD e
outros. Embora os técnicos da Divisão tenham orientações gerais de prioridades, tais não estão
expressas em um programa oficial do Governo Federal. Ou seja, o Governo não tem um programa
17 Nos anos de 1990 e 1991 as relações entre bolsas concedidas e implementadas foram de 65% e 53%,
respectivamente, o que se deve, em parte, à desistência de muitas empresas em enviar bolsistas ou em se
comprometer a contratar pesquisadores após os estágios de capacitação; fato intimamente ligado à conjuntura
econômica, pouco propícia a este tipo de atividade naqueles anos.
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de biotecnologia, embora já tenha tentado esboçá-lo em outras épocas, especialmente durante os
anos 80.
Assim, em linhas gerais, pode-se afirmar que as ações governamentais estão
prioritariamente focadas na formação de recursos humanos e na capacitação de alguns centros que
começam a se destacar em diversas áreas de aplicação da biotecnologia. Entretanto, e apesar de
haver um número expressivo de bolsas e de recursos empenhados a partir de programas do MCT,
não há uma organicidade na orientação, de modo a focalizar e priorizar projetos, prevalecendo
ainda uma política de "balcão". Ademais, verifica-se uma quase completa ausência de fontes de
financiamento apropriadas a investimentos privados de médio a longo prazo de maturação, o que,
aliado à ausência de capital de risco fora das agências e bancos de desenvolvimento, inibe
fortemente este tipo de empreendimento. Outra característica notável é o pequeno número de
projetos de capacitação em biotecnologia de fronteira, especialmente de técnicas de engenharia
genética, desde o mapeamento genético, até a manipulação molecular de genes.
Com respeito às relações multi e bilaterais na América Latina, as ações em biotecnologia
estão ainda em fase de estruturação. Além da iniciativa organizada pelo PNUD, de uma rede de
cooperação na Região, que visou estimular a colaboração entre laboratórios de biotecnologia para
projetos específicos, a ação mais notável de cooperação se dá no âmbito do CABBIO (Centro
Argentina-Brasileiro de Biotecnologia), criado no final de 1986, e da Escola Brasileiro-Argentina
de Biotecnologia, criada em 1987.
O CABBIO vem procurando se estruturar através de projetos entre empresas,
universidades e institutos de pesquisa dos dois países, destacando-se atualmente 3 projetos: de
produção de batata-semente; de produção de organismos aquáticos (camarões); e de anticorpos
monoclonais. Problemas de relações cambiais, de oscilação orçamentária e de normalização de
critérios de trânsito de organismos vivos (plantas e animais) entre os dois países têm sido
responsáveis, em parte, pela ainda tímida dimensão alcançada pelo Centro18. Os projetos
apresentados devem atender aos critérios de: existir contraparte argentina (no caso de projetos
brasileiros); ter interesse comercial evidente; apresentar estudo de viabilidade técnica e econômica;
ter impacto social positivo para os dois países; e ser de curto ou médio prazos.
A Escola de Biotecnologia tem como objetivos organizar cursos de complementação nas
áreas definidas como de interesse comum; estimular e participar de cursos de pós-graduação em
universidades dos dois países; promover e apoiar o intercâmbio de professores entre instituições
dos dois países; e apoiar a promoção de eventos científicos. Esta Escola começa a abrir vagas
18 Estes problemas são importantes, mas não os únicos e talvez nem mesmo os mais relevantes. A timidez dos
investimentos privados em biotecnologia no Brasil, conforme já comentamos, deve-se a um conjunto muito mais
amplo de fatores.
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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também para profissionais de outros países (Paraguai e Uruguai), já numa perspectiva de
integração ao Mercosul.
No âmbito do Mercosul, as atividades de biotecnologia começam a ser alvo de atenção
dentro do marco mais geral de colaboração em ciência e tecnologia, institucionalizado nas
Reuniões Especializadas de C&T ocorridas em março e em junho de 1993. Tais Reuniões estão
centrando esforços no intercâmbio de informação para a definição de um marco normativo que dê
conta das assimetrias nas legislações; para a criação de redes de comunicação; e para a criação de
sistemas de informação e serviços tecnológicos. A ponte entre estas instâncias do Mercosul e a
estrutura institucional dos países é feita por uma comissão de enlace, para a qual foram chamados
especialistas em biotecnologia (entre outras áreas do conhecimento) que estão introduzindo
questões e indicações que estimulem a cooperação multilateral em biotecnologia (como por
exemplo a extensão da experiência do CABBIO para o âmbito do Mercosul).
Um último ponto que gostaríamos de abordar refere-se à questão da propriedade
intelectual para produtos e processos biotecnológicos. Atualmente institui-se uma nova legislação
de propriedade intelectual no Brasil, que inclui um novo código de propriedade industrial e a
implantação de uma Lei de Proteção aos Cultivares (esta ainda na fase de propostas). Não
obstante ambas terem influência sobre a evolução da biotecnologia no país, o código de
propriedade deve afetar os processos e produtos biotecnológicos de forma mais ampla, enquanto a
proteção aos cultivares restringir-se-á ao desenvolvimento de novas variedades de plantas19.
As principais alterações em relação à situação anterior são20: a) ampliação do prazo das
patentes de 15 para 20 anos, com possibilidade de prorrogação por mais 4 anos, caso as atividades
de P&D tenham sido feitas integralmente no país e tenha havido a participação de empresas
nacionais21; b) previsão de patenteamento para produtos farmacêuticos, químicos e alimentos; c)
excluem-se os materiais biológicos encontrados na natureza, as descobertas que não possam ser
consideradas invenções, os processos biológicos naturais e os produtos que deles possam ser
obtidos; d) por omissão, são admitidas patentes para processos biológicos não naturais e os
produtos destes decorrentes, salvo espécies animais; e) permite que o depósito de materiais
biológicos substitua a descrição completa de produtos biológicos que apresentem clara dificuldade
técnica de descrição; f) a licença compulsória só será possível após 3 anos da concessão da
patente e se houver abuso do direito por parte do proprietário, como domínio dos mercados,
eliminação dos concorrentes, margens abusivas de lucros, não fabricação completa do produto no
19 Na verdade a separação não é tão clara, pois, como veremos, há superposições e antagonismos entre as duas
legislações em proposição.
20 Os pontos a seguir foram extraídos de Kageyama et alii (1992).
21 A questão dos prazos ainda não estava totalmente definida quando do término deste texto
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país, não uso do processo patenteado, e insuficiência de oferta para os mercados; g) a caducidade
da patente só ocorre 2 anos após a concessão de licença compulsória.
Já a proposta de lei de Proteção aos Cultivares procura seguir o modelo da legislação
européia, conhecida como UPOV - Union pour la Protection des Obtentions Végétales, na versão
de 1978, que representa uma legislação pouco restritiva. Por esta proposta passariam a ser
passíveis de proteção todas as sementes e mudas de espécies vegetais, por um período de 15 a 25
anos, dependendo do ciclo da espécie em questão (se cultura anual ou perene). Os direitos de
propriedade nesta legislação seriam retritos, já que seriam permitidos os usos para reprodução
pelo próprio agricultor e para o trabalho de melhoramento genético. Como nesta proposta se
prevê que este seja o único mecanismo de proteção às obtenções vegetais, há aí um ponto de
conflito com o PL 824, que permite o patenteamento de qualquer organismo vivo, salvo animais,
desde que obtidos por meios não naturais22.
Enquanto a nova lei mais geral de propriedade industrial já é um fato, a lei de proteção aos
cultivares deve demorar mais tempo para ser institucionalizada. Supondo entretanto que ambos
projetos venham a ser transformados em leis e que o problema do conflito existente entre eles seja
sanado, estarão colocados novos condicionantes para o investimento em biotecnologia no Brasil.
Entretanto, no médio e curto prazos os efeitos de tais mudanças nas regras do jogo podem não
representar modificações notáveis sobre as estruturas de mercado vigentes nos setores afins à
biotecnologia, nos níveis de investimento, e no grau de desenvolvimento da biotecnologia no país.
Pelo lado dos aditivos para a indústria alimentar, a natureza da mudança técnica que está
em curso no mundo, aliada a outros fatores, vem estimulando um movimento de concentração
técnica e econômica destes mercados, processo no qual os mecanismos jurídicos de
apropriabilidade, apesar de ainda importantes, tendem a ceder espaço para outros mecanismos,
como o segredo e a manutenção das fontes originais de inovação sob controle das matrizes das
empresas líderes dos mercados. Assim, vários motivos levam a crer que os impactos gerais de tais
legislações no Brasil estariam muito mais relacionados aos efeitos "benéficos" sobre o
comportamento dos agentes econômicos (existência de regras, ambiente institucional mais estável,
etc.) que propriamente como mecanismo de garantia de direitos de propriedade, dado que, por um
lado, a eficiência relativa dos mecanismos jurídicos em produtos e processos biológicos é menor23
22 Para uma boa discussão sobre a Lei de Proteção de Cultivares e seus possíveis efeitos no mercado brasileiro de
sementes, ver Kageyama et alii (1992).
23 Isto porque em processos e produtos biológicos interagem efeitos aleatórios capazes de alterar o produto
(mutações); existe a possibilidade de auto-reprodutibilidade (nos casos, por exemplo, de sementes e
microorganismos), e a possibilidade de completa descrição do objeto patenteado, além de ser tecnicamente difícil
ainda está sujeita a revisões constantes (justamente pela possibilidade de ocorrência de mutações e/ou de ocorrência
natural, ou ainda pela possibilidade de desenvolvimento de "parentes próximos" ao produto patenteado).
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ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA BRASILEIRA
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e, por outro lado, a existência de uma tal legislação não alteraria significativamente o elenco das
empresas que estão hoje na liderança da pesquisa biotecnológica.
Não se quer dizer com isto que tais mecanismos de apropriabilidade não sejam
importantes, eles o são, mas em termos de impactos para o desenvolvimento da biotecnologia no
Brasil, sua importância é reduzida, pelo menos dentro da atual conjuntura de ausência de uma
política mais geral e completa para o desenvolvimento do setor. A patente, ou qualquer outro
instrumento do gênero, só poderia ser encarada como algo transformador da atual situação se
estivesse considerada como um instrumento de política dirigido a um projeto de desenvolvimento
maior, ou, no caso, setorial. A existência de uma legislação mais restritiva de propriedade, dentro
da atual circunstância, onde de um lado há ausência de um projeto de desenvolvimento mais
global e de outro há um processo de concentração técnica e econômica por parte de quem está
criando e detendo o novo conhecimento, não deverá ser fator determinante nem do avanço nem
do fracasso da biotecnologia no país.
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3. ELEMENTOS PARA UMA POLÍTICA PARA O DESENVOLVIMENTO DA
BIOTECNOLOGIA NO BRASIL
O presente estudo evidenciou pontos gerais e específicos sobre o desenvolvimento da
biotecnologia em nível internacional, seu perfil atual no Brasil, destacando a área de aditivos para
a indústria alimentar. Nesta parte do estudo procuraremos retomar e resumir algumas conclusões
que podem ser extraídas das três partes anteriores, bem como fazer sugestões de políticas e de
indicadores que reflitam a forma e o grau do desenvolvimento da biotecnologia no país, em
particular na área de aditivos que vimos aqui enfocando.
3.1. Uma Interpretação da Situação Atual
Com relação às conclusões que podem ser extraídas do contexto evolutivo da
biotecnologia em âmbito internacional, podemos ressaltar algumas de suas características:
a) a biotecnologia não se constitui numa nova indústria, uma bioindústria. Esta continua
dispersa entre os vários setores tradicionais nos quais a biotecnologia está sendo aplicada;
b) há dificuldades sérias para o estabelecimento de firmas especializadas, sobretudo devido
a problemas para o desenvolvimento e colocação de produtos no mercado, problemas de
sustentação financeira de longo prazo e outros de corte institucional, como os relativos à
propriedade intelectual;
c) há defasagens setoriais sensíveis entre, de um lado as áreas de saúde humana e, de outro
lado as agrícola e alimentar (considerados, consensualmente, os maiores mercados da
biotecnologia);
d) a área de produção de aditivos alimentares está, depois da de saúde humana,
apresentando os maiores impactos em termos de substituição de produtos e processos, até porque
sua base inovativa está, da mesma forma que na produção de biofármacos, centrada na
manipulação de microorganismos e na otimização de processos fermentativos;
e) ainda indefinições marcantes sobre a conformação do ambiente institucional que
deverá compor o conjunto de normas e convenções indispensáveis ao processo decisório.
Alguns condicionantes podem ser alinhavados como explicação dessas características:
O primeiro refere-se às lacunas técnico-científicas. É consensual na literatura que existem
lacunas de base científica e de base técnica que resultam em condicionantes dos caminhos do
desenvolvimento da biotecnologia. No caso por exemplo das aplicações à área vegetal, as
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dificuldades de manipulação de caracteres poligênicos é um obstáculo objetivo para o progresso
da biotecnologia na agricultura. Já nos processos fermentativos baseados em micoorganismos
modificados por engneharia genética, os obstáculos referem-se ao domínio sobre a expressão das
características genéticas introduzidas e à estabilidade genética do organismo "engenheirado".
"O segundo condicionante remete à forma de organização dos mercados, nas seguintes
dimensões: a) setorial, da importância da inovação tecnológica (o grau de esgotamento dos
paradigmas e trajetórias) e biotecnológica para cada mercado em particular; e b) intersetorial, do
movimento de reorganização dos setores industriais envolvidos, que cria diferentes níveis de
'afinidades' com a biotecnologia, através da diversificação dos mercados. Em ambos os casos se
caracterizam posturas defensivas (de monitoramento), ativas (de investimentos em NEBs,
colaborações, ou em pesquisa in-house) e mistas" (Salles Filho, 1993:164).
"O terceiro condicionante geral refere-se aos aspectos institucionais, onde figuram aqueles
relativos à propriedade intelectual e à regulamentação da produção, da comercialização e do uso
de produtos biotecnológicos" (idem, p.166).
No Brasil, como vimos, há uma maior participação de investimentos em biotecnologia
agrícola, se compararmos com o que ocorre nos países desenvolvidos. Vimos também que não
apenas o número absoluto de firmas envolvidas com biotecnologia de uma maneira geral é
pequeno, como também é bastante reduzido o impacto comercial dos investimentos existentes,
destacando-se aí a falta de atração do negócio biotecnológico para o empresariado local. Tal
fenômeno se explicaria pelas condições econômicas adversas ao investimento que o país atravessa
há mais de 10 anos; pela completa inadequabilidade dos canais de financiamento hoje disponíveis;
pelos altos riscos e elevados prazos de maturação associados a este tipo de investimento; e pelo
fato de que os mercados mais dinâmicos atualmente para a biotecnologia em todo o mundo são
bastante concentrados e dominados por companhias multinacionais, que mantêm seu esforço de
P&D no âmbito das matrizes, acelerando o movimento de concentração técnica e econômica.
Antes de entrarmos na proposição de políticas, vale ainda acrescentar alguns comentários
sobre as aplicações da biotecnologia nos complexos analisados nesse estudo - óleos vegetais, café,
laticínios, abate e suco de laranja. Embora de um ponto de vista potencial exista um conjunto
bastante grande de possibilidades de aplicação desse novo conhecimento, que vão desde
inovações na parte agrícola, até a parte industrial, passando pela introdução de novos insumos, há
algumas implicações mais evidentes que merecem aqui ser enunciadas.
Em relação ao suco de laranja, como se pode ver na nota técnica específica, a
biotecnologia tem uma importante aplicação no desenvolvimento de métodos de controle de
doenças da laranja, particularmente do "Declínio", que pode trazer prejuízos substantivos à
lavoura. O desenvolvimento de kits de diagnóstico a serem usados no âmbito da propriedade,
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assim como a transformação genética dos organismos responsáveis pela doença (através por
exemplo de técnicas de ADNr "anti-sense") pode ser de grande utilidade no curto prazo.
Em óleos vegetais as implicações mais diretas na moderna biotecnologia estão no auxílio à
adaptação de novas espécies, como a canola, e no desenvolvimento de variedades de soja com
menor teor de ácidos graxos saturados. A forte capacitação tecnológica existente no Brasil em
soja é um ponto de partida importante mas insuficiente para tal tarefa, já que é preciso um
processo de reciclagem visando ao aprendizado do novo conjunto de técnicas e habilidades
requeridas para realizar, por exemplo, o mapeamento e a manipulação dos genes envolvidos.
No caso do café acontece algo semelhante à soja, no sentido de que há uma forte
capacitação interna para o trabalho do melhoramento, mas que também precisa sofrer reciclagem
na direção do novo conhecimento. As aplicações mais imediatas estão no desenvolvimento de
técnicas de cultura de tecidos para buscar ganhos de produtividade no curto prazo. Além disso,
deve-se avançar no mapeamento e identificação dos germoplasmas utilizados no melhoramento
para estabelecer rotinas de diferenciação qualitativa de variedades, visando a atender novas
demandas como menor teor de cafeína ou aspectos organolépticos mais valorizados pelos
consumidores.
Em suínos o trabalho de melhoramento dedicado a características nutricionais da carne
(menor teor de gordura, melhor qualidade protéica) e de alimentação animal (uso de hormônios de
crescimento, como a somatropina suína - PST - que inclusive proporciona carnes com menor
quantidade de gordura), são aspectos já em desenvolvimento no país e que podem e devem ter sua
base de P&D ampliada. Na área de bovinos o aporte fundamental no Brasil é o aumento da
produtividade através de depuração dos rebanhos por meio de técnicas de transferência e sexagem
de embriões. Vacinas para os rebanhos avícola, suíno e bovino são também alvos de curto prazo
para os quais a moderna biotecnologia está contribuindo com certa velocidade.
Por fim, em laticínios, como vimos no presente trabalho, são fundamentais as inovações
em aditivos e insumos empregados no processamento do leite, tais como coalhos, fermentos,
aromatizantes, etc. Ademais, vale registrar que o Brasil já dispõe de tecnologia de hormônios para
o aumento da produção de leite em escala comercial, que é o caso específico do BST -
somatropina bovina - comercializado pela Monsanto e por outras empresas no país.
Quanto ao caso específico do segmento de aditivos para a indústria alimentar, a presença
maciça de multinacionais empenhadas no desenvolvimento do novo conhecimento científico e
tecnológico indica que os impactos serão em grande parte ditados pelas estratégias dessas firmas
para com o mercado brasileiro.
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3.2. Proposições de Políticas
3.2.1. Políticas gerais para a estruturação técnica e econômica
Num nível mais geral, poderíamos enunciar algumas diretrizes com vistas à estruturação da
biotecnologia no país como base ao desenvolvimento tecnológico nas principais áreas de
aplicação, considerando: a) os condicionantes relativos ao conhecimento técnico-científico
consituem-se elementos objetivos de limite ao desenvolvimento empresarial e setorial; b) a
diferença no dinamismo tecnológico dos principais mercados afetos à biotecnologia, no que
respeita à maior ou menor premência por inovações, vem sendo o elemento atrator mais
importante no desenvolvimento tecnológico e na formação dos mercados da biotecnologia; c) a
necessidade de novos mecanismos institucionais de regulamentação para novos produtos e novos
mercados coloca condições "extras" de incerteza ao empreendimento empresarial. Parece-nos,
assim, importante implementar instrumentos de políticas que tomem em conta e que venham a
atender as necessidades e as questões estratégicas relacionadas a estes três elementos estruturais
básicos. Antes de qualquer sugestão em âmbito setorial, é fundamental que haja uma política
formal e orgânica que contemple o curto, o médio e o longo prazos.
Para o desenvolvimento do conhecimento técnico-científico, deve-se eleger centros de
excelência para o investimento em conhecimento básico e aplicável, nas principais áreas
disciplinares de aplicação da moderna biotecnologia, que são saúde humana (diagnósticos e
terapias), agricultura (produção, insumos e armazenagem), processamento de alimentos,
conservação e recuperação ambiental e geração de equipamentos e insumos para suporte da
aplicação da biotecnologia.
Não é possível alcançar algum nível de excelência, com uma defasagem temporal aceitável
em relação aos países desenvolvidos, se não houver uma política de concentração de recursos da
área de ciência e tecnologia não apenas para instituições específicas, mas para programas de
pesquisa específicos.
A identificação de áreas prioritárias do conhecimento, que representem âmbitos de
capacitação com grande poder de desdobramento (relativas às core technologies) e sua
localização em centros escolhidos para seu desenvolvimento, apresenta-se como uma necessidade
inadiável em face do ritmo de evolução que vem assumindo a biotecnologia nos países
desenvolvidos. A recuperação do atraso relativo deveria ser empreendida de imediato através,
entre outros mecanismos, do envio sistemático e dirigido de técnicos para formação nos principais
laboratórios do mundo.
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Em relação ao segundo item, relativo à importância desigual das áreas de aplicação da
biotecnologia, que em parte é devida aos diferentes dinamismos tecnológicos dos setores afetados
pelo novo conhecimento, as políticas de direcionamento de recursos de C&T para o
desenvolvimento tecnológico e para o investimento privado devem estar calcadas em análises que
apontem, tanto quanto possível, o potencial de absorção da nova tecnologia no curto e médio
prazos nos mercados já existentes, bem como o potencial de criação de mercados radicalmente
novos. Ademais, devem também ter em conta as capacidades de desdobramento das tecnologias e
dos mercados no longo prazo. Tal observação remete, obviamente, à existência de indicadores de
prioridades, mas que sejam constantemente revisados em função do caráter incerto e formativo
dos impactos econômicos da moderna biotecnologia.
Com respeito ao terceiro item, das condições de regulamentação dos novos produtos e
novos processos e de sua introdução na esfera produtiva, as políticas devem estar calcadas em
perspectivas que nem sejam obstaculizadoras do desenvolvimento (relativas, por exemplo, à
proibição da comercialização de produtos geneticamente modificados), nem tão inocentemente
liberais que deixem de aproveitar certas vantagens comparativas relacionadas ao meio físico e aos
mercados com maior capacidade de absorção tecnológica, ou com potencial de crescimento
dentro das novas regras do comércio internacional.
Exemplificando o primeiro ponto, a questão do aproveitamento do patrimônio genético
exige um tratamento urgente por parte da sociedade brasileira e que não pode mais se ater à esfera
da retórica. Esta vantagem estática do país só pode ser transformada em uma vantagem de fato no
caso de um empreendimento sistemático de reconhecimento, catalogação, formação de bancos de
germoplasma e, sobretudo, controle do fluxo internacional desse germoplasma. O Brasil necessita
de um programa para tornar dinâmica essa vantagem comparativa e ele pode, caso faça isso, vir a
ser um dos protagonistas desse fluxo.
No segundo ponto, das regras de liberação de organismos geneticamente modificados, o
país não pode, como vem fazendo, aceitar tacitamente que tal introdução se dê sem qualquer
regulação, sob pena de deixar de empreender, através de regras adequadas à realidade sócio-
econômica do país, instruções de regulamentação que possam eventualmente servir de
instrumentos de políticas.
Em linhas gerais, propomos a elaboração imediata de um programa de longo prazo,
descentralizado mas coordenado de prioridades, nos âmbitos do conhecimento científico e da
aplicação técnica; da consideração das especificidades dos mercados (existentes e em criação); e
dos instrumentos de regulação.
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3.2.2. Políticas setoriais
Justamente por apresentar uma grande heterogeneidade quanto aos impactos setoriais,
com maior e crescente desenvolvimento nos ramos produtivos relacionados à produção de
diagnósticos e terapêuticos vis à vis aqueles relacionados à agricultura e à produção alimentar; e
porque os setores apresentam dinamismos tecnológicos nitidamente distintos, parece claro que as
políticas para biotecnologia devem, a partir de um nível mais geral como o acima apontado, ser
setorializadas. Mais ainda, devem estar referidas, quanto à sua aplicabilidade para o crescimento
industrial e econômico, a segmentos de mecado dentro de um determinado setor ou ramo da
economia.
Nos projetos mais específicos de capacitação técnica e econômica para processos e
produtos biotecnológicos, a dimensão "nicho de mercado" deve ser um dos elementos decisórios
para o apoio; nicho não no sentido de mercados pequenos e de alcance restrito, mas de segmentos
onde embora possa ter resultados modestos num primeiro momento, a capacitação em
biotecnologia seja empreendida com vistas a desdobramentos futuros, ao crescimento do mercado
e das firmas nele atuantes.
Assim, tal perspectiva pode ser considerada tanto para novas e pequenas firmas de
biotecnologia, como para firmas estabelecidas cujos processos produtivos tenham afinidade com
as novas tecnologias ou cuja estratégia possa prever o ingresso em novos negócios. Além das
Novas Empresas de Biotecnologia, as empresas tradicionais que se "biotecnologizem" são também
um caminho desejável. Programas de avaliação da importância da biotecnologia para indústrias de
peso no país, como açúcar e álcool, sucos cítricos, laticínios, sementes, etc., são tão necessários
quanto outros que enveredem para a criação de novos setores industriais.
A modernização tecnológica de indústrias que já se utilizam de processos biotecnológicos,
embora com técnicas tradicionais, é um passo de curto prazo que apresenta as vantagens de já
contar com mercados organizados e escala para incorporar novos métodos produtivos e de
possuir uma certa capacitação tecnológica que, embora não esteja necessariamente referida ao
novo conhecimento, pode ser um importante ponto de apoio para uma estratégia mais global de
capacitação.
Uma necessidade a mais que se impõe para as empresas que já trabalham com processos
biológicos, ou que operam em mercados ameaçados pelas novas tecnologias, está relacionada às
perspectivas de substituição de processos e de produtos. Os casos da subsitiuição do açúcar de
cana por sucedâneos e de uma série de produtos terapêuticos outrora extraídos de órgãos
humanos e de animais e plantas, por similares obtidos através de microorganismos geneticamente
modificados, são ilustrativos.
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No caso da indústria de aditivos para o setor alimentar, vem ocorrendo algo semelhante,
como vimos. Tanto a mudança de processos como a introdução de novos produtos requerem um
movimento de atualização tecnológica para as firmas estabelecidas. No caso relatado, de
substituição do coalho bovino pelo coalho genético, fica evidente a situação de fragilidade das
empresas nacionais, que se veêm obrigadas ou a modificar seus processos produtivos para
competir com as multinacionais que incorporaram tal tecnologia, ou a se tornarem meras
representantes comerciais dos produtos dessas empresas.
Uma política de objetivos mais amplos deveria estimular a capacitação no novo
conhecimento, de modo a que as empresas deste ramo empreendam um esforço de aprendizado
dos novos processos, que as capacitem a voltar a produzir, agora sob a égide da nova base
técnica.
Quer dizer, é desejável que as empresas nacionais não se atenham à representação
comercial, mas ingressem na produção, empreendam metas de aprendizado, capacitando-se
técnica e economicamente para competir no mercado. Isto, além da habilidade técnica que tem de
ser desenvolvida, requer habilidade em fazer acordos com firmas estrangeiras, tanto com firmas
estabelecidas, quanto com NEBs.
Nesse sentido, a existência de uma legislação de propriedade intelectual pode trazer
benefícios, na medida em que diminui os entraves para a elaboração de tais acordos.
Paralelamente, é importante que haja um procedimento ostensivo de capacitação técnica de
pessoal, o que pode ser conseguido se houver um maior direcionamento dos programas de
formação de recursos humanos no país, como é o caso do RHAE, que poderia ser aproveitado
para fazer parte de uma política de capacitação de longo prazo.
3.2.3. Políticas relacionadas aos fatores sistêmicos
Em relação aos fatores sistêmicos, três aspectos são particularmente importantes: a)
relativos à existência de uma base institucional de pesquisa, desenvolvimento e ensino; b) relativas
à criação de normas para a pesquisa, a produção e a comercialização de processos e produtos
biotecnológicos; e c) relativas aos mecanismos de financiamento. Como já abordamos os dois
primeiros aspectos nos itens acima, valeria aqui tecer alguns comentários quanto ao ponto dos
mecanismos de financiamento.
Um dos motivos do Brasil apresentar um perfil diferente de evolução do investimento
privado em biotecnologia daquele observado nos E.U.A, refere-se à inexistência de capital de
risco, que obstaculiza o surgimento de novas empresas especializadas e limita as possibilidades de
cooperação entre empresas estabelecidas e empresas emergentes ou de desenvolvimento
71
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tecnológico. A participação pequena de NEBs no país e a dificuldade de engajamento de empresas
estabelecidas são, em parte, reflexos desse problema.
Como tal questão no fundo remete ao problema mais geral de instabilidade econômica
crônica no país, que impede que este tipo de mecanismo se estruture e cumpra seu papel na
economia, deve-se, num primeiro momento, atentar para a revitalização de linhas preferenciais de
financiamento por parte dos bancos de investimento, com critérios não apenas definidos em
moldes gerais, como foi feito durante um tempo para as chamadas áreas estratégicas, mas
alicerçados e integrados às definições de prioridades inscritas num programa de biotecnologia;
prioridades estas que devem ir além da mera indicação do que pode, num dado momento, ser
considerado mais importante, mas que contemplem um círculo virtuoso de capacitação prevendo
efeitos de transbordamento e de inserção futura em outras áreas e outros mercados.
Apesar de óbvio, merece ser repetido que a atual inadequabilidade dos mecanismos de
financiamento e a quase inexistência de meios minimamente satisfatórios de intermediação
financeira, decorrentes da escalada inflacionária e da política de taxas de juros muito elevadas, é
um fator impeditivo de qualquer iniciativa de mais longo prazo para a capacitação tecnológica em
biotecnologia no país.
Assim, as políticas para biotecnologia no país, no nosso entender, devem buscar, no curto
prazo, uma definição de prioridades de desenvolvimento e, para terem efeitos virtuosos devem,
necessariamente, ser conduzidas de forma orgânica: financiamento, fortalecimento de mercados,
formação de recursos humanos e participação de empresarios dispostos a empreender projetos de
criação de capacitação e de formação de mercados devem estar norteados por uma política que dê
diretrizes e oriente prioridades. Os mecanismos existentes, precisam ser reforçados e
coordenados. Os programas RAHE, PADCT e as linhas de financiamento da FINEP, do BNDES
(e de outros bancos de desenvolvimento), e os pólos de tecnologia, podem ser potencializados se
pensados de forma orgânica e se focalizadas certas prioridades. Tudo isto, é claro, deve ser feito
considerando-se a participação das grandes instituições de pesquisa (EMBRAPA, ITAL,
FIOCRUZ) e das universidades24. Esta, nos parece, é uma atividade básica, sem dúvida a mais
importante que pode ser empreendida no curto prazo.
24 De todo este conjunto de instituições, os centros de pequisa e as universidades parecem ser os mais difíceis de
engajar em planejamentos desse tipo. Com relação às universidades, acreditamos que o engajamento deva ocorrer
parcialmente, até porque não se pensa em desvirtuar suas qualidades decorrentes da liberdade de criação. Já quanto
aos centros de pesquisa, o engajamento é menos problemático e mais desejável. Um exemplo de como isso pode se
dar é o mecanismo de promoção do pesquisador que está sendo empregado em alguns centros da EMBRAPA, pelo
qual modificam-se os critérios de promoção, reduzindo o peso que têm as publicações científicas e aumentando o
peso da participação em projetos de desenvolvimento tecnológico. Tal procedimento começa a alterar o perfil da
instituição.
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4. INDICADORES DE COMPETITIVIDADE
No que diz respeito aos indicadores para avaliar a competitividade da biotecnologia no
país, fica muito difícil definí-los numa situação na qual ainda não há mercados minimamente
estruturados e onde a participação de empresas nacionais e mesmo multinacionais na moderna
biotecnologia é bastante reduzida. Entretanto, a experiência recente de avaliação do desempenho
de algumas empresas de biotecnologia no Brasil evidenciou alguns pontos que, acreditamos,
podem ser extrapolados para situações mais gerais. Tais são:
a) a influência da estrutura gerencial nos caminhos dos investimentos privados em
biotecnologia, no que diz respeito: (i) à capacidade de articulação ao ambiente externo, e (ii) à
dinâmica gerencial interna da firma;
b) a influência do tipo de mercado privilegiado sobre o desempenho das firmas, no que diz
respeito: (i) ao seu tamanho e ao seu potencial de crescimento, (ii) à sua capacidade em absorver
inovações (ou ao seu dinamismo tecnológico);
c) a influência da capacidade de sustentação financeira nos rumos do investimento;
d) a influência da estratégia de acesso aos mercados visados;
e) a influência dos limitantes técnico-científicos e a importância das cumulatividades
existentes e adquiridas.
Em termos mais concretos, os indicadores mais relevantes seriam:
- forma e grau de articulação com os grupos controladores (quando for o caso);
- a capacidade financeira das empresas maiores e sua importância para a cooperação com
pequenas empresas;
- planejamento de curto, médio e longo prazos para geração de caixa para sustentar
necessidades de investimentos de mais longo prazo;
- capacidade de realizar acordos pré-competitivos de cooperação para pesquisa, produção
e comercialização.
Numa perspectiva mais quantitativa, o desempenho de empresas de alta tecnologia pode
ser mensurado pelas seguintes medidas: burn rate, que mede quanto capital está sendo consumido
pela empresa por mês; burn rate de P&D, que representa o consumo em pesquisa e
desenvolvimento; burn rate de tecnologia, que é a soma dos gastos com P&D com os gastos
médios mensais com capital fixo; overall burn rate, que representa a soma de todos os custos e
gastos mensais; net burn rate, que é a overall menos as rendas mensais médias da firma, o que dá
73
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idéia do consumo líquido de recursos financeiros; survival index, que é uma medida entre o
consumo líquido de recursos financeiros sobre a disponibilidade de reservas das firmas (cash
book).
A constatação de uma burn rate elevada e de uma net burn rate positiva indicam que a
empresa está ainda em fase de estruturação, que não começou a gerar retornos suficientes para
cobrir seus gastos gerais e, particularmente com atividades de P&D. Da mesma forma, o
comportamento do survival index serve para medir se os investimentos em desenvolvimento
tecnlógico de produtos estão caminhando satisfatoriamente (índice decrescente) ou não (índice
crescente).
Na verdade este tipo de medição aplica-se sobretudo a novas firmas, sejam elas NEBs ou
joint ventures. São indicadores complementares e aplicáveis a mercados em formação.
Adicionalmente, é da maior importância monitorar os caminhos que estão sendo trilhados pelas
grandes companhias que estão investindo na moderna biotecnologia e suas possíveis estratégias
para os mercados correlatos e para o mercado brasileiro. Este monitoramento permanente é uma
tarefa essencial e complementar à determinação de prioridades para se traçar programas de
desenvolvimento da biotecnologia no país.
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RELAÇÃO DE TABELAS, QUADROS E FIGURAS
TABELA 1.1
PERFIL DOS GASTOS COM PESQUISA E DO FATURAMENTO DE NOVAS
EMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA NA ÁREA DE SAÚDE HUMANA....................26
TABELA 1.2
PERFIL DOS GASTOS COM PESQUISA E DO FATURAMENTO DE NOVAS
EMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA NA ÁREA AGRÍCOLA.....................................26
TABELA 1.3
DISTRIBUIÇÃO DE EMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA AGRÍCOLA POR
ATIVIDADE DE PESQUISA.......................................................................................27
TABELA 2.1
ÁREAS DE ATUAÇÃO DE 62 EMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA NA
AMÉRICA LATINA*...................................................................................................35
TABELA 2.2
FINANCIAMENTO DO BNDES PARA BIOTECNOLOGIA (1990/92)*....................57
TABELA 2.3
EVOLUÇÃO DOS RECURSOS DA FINEP (1985/91).................................................58
QUADRO 1.1
ALGUMAS PROPOSTAS DE SOLUÇÃO POR ENGENHARIA GENÉTICA A
PROBLEMAS DA PRODUÇÃO ALIMENTAR...........................................................29
QUADRO 2.1
IMPACTOS SOBRE O TRABALHO ADVINDOS DA BIOTECNOLOGIA NAS
ÁREAS AGRÍCOLA E ALIMENTAR..........................................................................33
QUADRO 2.2
PERFIL DE EMPRESAS ENVOLVIDAS COM BIOTECNOLOGIA NO
BRASIL (1990).............................................................................................................39
QUADRO 2.3
CARACTERÍSTICAS GERAIS DAS EMPRESAS ENTREVISTADAS......................41
FIGURA 1.1
DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DAS NEBS AMERICANAS SEGUNDO
ÁREA DE ATUAÇÃO..................................................................................................18
FIGURA 1.2
EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE EMPRESAS NAS ÁREAS DE APLICAÇÃO
DA BIOTECNOLOGIA NOS EUA (1983/90)..............................................................18
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