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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL E INSTITUCIONAL
INVENTANDO MUNDOS ENCANTADOS
A HISTORIA DE ENAÇÃO DA COMUNIDADE VIRTUAL SITECRIA
LUCIANE SA YURI SA TO
Orientadora: Léa da Cruz Fagundes
Porto Alegre
Junho - 2001
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Livros Grátis
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL E INSTITUCIONAL
INVENTANDO MUNDOS ENCANTADOS
A HISTÓRIA DE ENAÇÂO DA COMUNIDADE VIRTUAL
SITECRIA
LUCIANE SA YURI SA TO
Orientadora: Léa da Cruz Fagundes
Porto Alegre
Junho - 2001
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Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Instituto de Psicologia
Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional
Inventando Mundos Encantados A História
de Enação da Comunidade Virtual Sitecria
LUCIANE SA YURI SA TO
Orientadora: Léa da Cruz Fagundes
Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de
Mestre em Psicologia Social e Institucional. Programa de Pós-Graduação em
Psicologia Social e Institucional. Instituto de Psicologia. Universidade Federal do
Rio Grande do Sul.
Porto Alegre
Junho - 2001
Sato, Luciane Sayuri.
Inventando mundos encantados: a história de enação da
comunidade virtual Sitecria/ Luciane Sayuri Sato. Porto Alegre:
UFRGS/IP-PPGPSI, 2001.
ix, 109 p. ; il.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, UFRGS/IP - PPGPSI, 2001.
1. Psicologia Social Cognitiva. 2. Obercultura e Subjetividade
3. Comunidades Virtuais. 4. Ambientes Virtuais. I. Título. II.
Tese (Mestr. - UFRGS/IP - PPGPSI).
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Instituto de Psicologia
Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional
A dissertação
"INVENTANDO MUNDOS ENCANTADOS: A HISTÓRIA DE ENAÇÃO DA
COMUNIDADE VIRTUAL SITECRIA"
de autoria de
LUCIANE SAYURI SATO,
foi APROVADA pelos membros da Banca Examinadora em 29 de junho de 2001.
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Léa da Cruz Fagundes - Orientadora -
Universidade Federal do Rio Grande do Sul/ Instituto de Psicologia - UFRGS/IP
Prof. Dr. Cleci Maraschin
Universidade Federal do Rio Grande do Sul/ Instituto de Psicologia - UFRGS/IP
Prof. Dr. Sérgio Roberto Kieling Franco
Universidade Federal do Rio Grande do Sul/ Faculdade de Educação -
UFRGS/FACED
Prof. Dr. Rosa Maria Leite Ribeiro Pedro
Universidade Federal do Rio de Janeiro - Instituto de Psicologia - UFRJ/IP
"Para o sonhador integral a natureza é apenas
o sonho que mais atentamente poder ser estudado -
o sonho que dura o bastante para lhe descobrirmos
regras, leis, que talvez cada um outro sonhe nosso, -
ou o mundo dos nossos sonhos internos tenha,
tivéssemos nós tempo e faculdades para essa ciência da /sombra/.
A natureza não é mais real; é mais vívida que os sonhos.
A natureza é o sonho que as almas sonham em comum. "
Fernando Pessoa. Livro do Desassossego. Vol. I
Pai, mãe, Ni, Ko e Fofi,
Vocês me deram asas e força
para sonhar e criar realidades.
Minhas Amigas e meus Amigos,
Vocês são minha Família do Coração,
nesta e em outras dimensões de existência.
Julio,
Com você quero alçar vôos mais altos
em sonhos de realidades encantadas.
AGRADECIMENTOS
MEC/ CAPES, pelo apoio através do Programa de Apoio à Pesquisa em Educação à
Distância-PAPED/2000. Iniciativas governamentais como esta ainda nos permitem ter
esperanças.
Léa, que me acolheu e desafiou desde o início, mais do que tudo, pela sua sabedoria e
luz, sua intuição indescritível e sua energia inesgotável. Com você aprendi a lembrar da
minha criança curiosa e "perguntadeira", a acessar meu saber intuitivo esquecido e a
desafiar-me mais do que a qualquer outro.
Cleci, que me acompanhou durante o difícil, mas rico processo de fazer escolhas e
construir meu objeto de pesquisa: com você pude admirar sua dedicação, sua
disponibilidade e abertura para trocas Com você aprendi muito sobre a arte de ser
professora.
James, Eduardo, Telmo, Leandro, Roger, Décio, Antonio, Rute, Keli, Mikoka,
Paim, Sinara: pelos muitos pedidos de "Socorro!!!" atendidos, pelas conversas úteis e
"inúteis", mas sempre proveitosas. Com vocês comecei a vislumbrar o que pode ser
trabalhar em equipe, cooperativamente. Com vocês aprendi que idade é uma questão de
convenção, que a maturidade e a disponibilidade para a amizade vem da alma.
Débora, querida amiga de todas as horas, parceira de trabalho, estudo, pensamentos e
sentimentos: com você vivenciei o sentido exato de COOPERAÇÃO e RESPEITO MÚTUO.
Com você aprendi que podemos encontrar nossa própria ordem no caos alheio.
À Escola Municipal de Primeiro Grau José Mariano Beck/PoA e à Escola
Municipal de Primeiro Grau Incompleto Jacob Krôeff Neto/NH pela abertura
institucional para o desenvolvimento desta pesquisa.
Queridos(as) alunos(as) e professoras, parceiros dessa e de outras aventuras: com
vocês aprendi que compartilhar e querer bem são coisas raras e únicas, não se pode
deixar de viver esses momentos com intensidade. Com vocês aprendi que amizade,
dedicação e profissionalismo não são sinônimos de frieza e distância cortês. Infelizmente
não posso falar a cada um como são importantes, a seu modo. Mas espero ao citar seus
nomes, demonstrar minha gratidão e respeito.
Maria Inês | AnaD | Vânia | Lourdes | Angela | Raquel | Marlis |
Cristiano | Alexandre | Cintia | Ceniriane | Grasiela | Julia |
Marcelo | Rafael | Tiele | Elenita | Marcos | Rafael | Lucas |
Jéssica | Andrelise | Antonio | Ayrton | Bruno | Camila | Carla |
César | Juliano | Claudia | César | Vinnyl Beatriz | Daiane |
Diego | Derek | Claudio | Fábio | Mariangela | Juçara | Janete |
Jorge | James | Letícia |Diuáli | Marcelo | Maria | Edsandra |
ítalo | Fernanda | íris | Filomena | Lea | Ricardo | Maria
Helena | Keli | Idivan | Fernanda | Joana | Marcus | Matias
|Joao | Fernando | Jonatan | Julya | Eduardo | Rute | Valia |
Thaïes | Vinícius | Matias | Telmo | Ricardo | Francisco | Artur |
Maristela I William | Gabriela I Fernando I
RESUMO
- O estudo está baseado na Epistemologia do Encantamento, na qual sujeito-objeto-
. pesquisadora são construídos mutuamente, durante o processo do fazer ciência. O
- objetivo é compreender como ocorre a constituição de uma Comunidade Virtual (CV) a
partir do acoplamento do Mundo Virtual (MV) - Cibercidade-Sitecria/ LEC-UFRGS/OEA
(http://www.psico.ufrgs.br/ sitecria) - com os participantes - alunos e professores de duas
escolas públicas de ensino fundamental de Porto Alegre/RS e Novo Hamburgo/RS,
pesquisadora e técnicos. A partir das interações ocorridas e das ações dos participantes
foi possível verificar o transbordamento dessa CV para além do MV e do próprio
ciberespaço, enatuando um Ambiente Virtual (AV). Este AV enatuado (MV-CV) a partir da
ação dos participantes criou-se como um espaço de distinção pela convivência. Esse
processo de auto-organização apontou para a emergência de um fenômeno híbrido, da
criação de um artifício, mistura de "natureza" humana, cultura e técnica. Pela dinâmica
enatuaram indicadores que facilitam o mapeamento do processo: dimensões de
existência - digital, consensual e conectiva - por onde perspassavam domínios de
ação - movimentação, comunicação e reflexão -, com construção de conhecimentos
intersubjetivos - pessoal, social convencionado, técnico, contextual, cotidiano e
cooperativo/colaborativo. Da rede de relações que se forma entre esses indicadores foi
. possível observar os atratores da dinâmica de funcionamento desse AV. Os atratores
apontam para uma caracterização de cada dimensão existencial através das relações
entre os domínios de ação e entre os conhecimentos intersubjetivos. A dimensão
conectiva - espaço entre o digital e o consensual - aponta para uma nova forma de
subjetivação, um rematerialismo na qual corpo e mente extendem-se através de um
espaço de existência diferenciado. Nessa dimensão as fronteiras entre self e não-self
ficam explicitamente mais fluídas. A conectividade permite ao participante estar nos dois
mundos concomitantemente, criando uma cotidianidade característica desse entre. Essa
dinâmica facilita o estado de presença plena e consciência aberta, criando uma condição
facilitadora para distinção/criação de novas realidades desejadas.
ABSTRACT
The study is based on the Epistemology of Enchantment, in which subject-object-•
researcher are mutualy built, during the process of making science. The purpose is to
learn how a Virtual Community (VC) is constituted from the coupling of the Virtual World "
(VW) - Cibercidade-Sitecria/ LEC-UFRGS/OEA (http://www.psico.ufrgs.br/ sitecria) - with -
the participants (students and teachers at the elementary level from two public schools in
Porto Alegre/RS and Novo Hamburgo/RS, researcher and technicians). From the observed
participants' actions and interactions, it was possible to verify the overflow of this VC
beyond the VW and the cyberspace itself, enacting a Virtual Environment (VE). This VE
enacted (VW-VC) from the participants' action was created as the constitution of a space of
distinction by a living together. This self organization process pointed to the emergence of a
hybrid phenomenon, the creation of an artifice, a blend of human "nature", culture and
technique. Dynamics put in action data that helped the process mapping: life's digital,
consensual and connective dimensions which were overrun by domains of action -
motion, communication and reflection -, and contributed to build intersubjective
knowledges - personal, social-con ventioned, technical and cooperative/colaborative.
From the net of relations formed among these data, it was possible to observe the
atractors of the dynamic of functioning of this VE. The atractors point to the definition of
each dimension through the relations between domains of action and intersubjective
knowledges. The connective dimension - the space between digital and consensual
dimensions - points to a new form of subjectivity, a kind of re-materialism, in which
body and mind spread themselves through a distinctive space of existence. In this
dimension, the frontiers between self and no-self are unequivocally more fluid.
Connectivity allows the participant to enter two worlds simultaneously, and thus to create
a everyday life that is typical of this "between". This dynamics furthers the condition of
full presence and open consciousness, creating a advantageous situation to distinguish
and create the new desired realities.
SUMARIO
SUMÁRIO________________________________________________________________ 1
PARA COMEÇAR A CONVERSA ____________________________________________3
RELATO DE UM ENCANTAMENTO: ENCANTANDO O OBJETO DE
PESQUISA ______________________________________________________________11
O MUNDO VIRTUAL: UM CENÁRIO A SER ENCANTADO ____________________18
Um momento: Forma de ocupar o espaço___________________________________ 24
Um outro momento: Forma de interagir____________________________________ 26
OS ALQUIMISTAS E SEUS PASSOS: QUEM PARTICIPOU DO
ENCANTAMENTO E ONDE FICOU REGISTRADO ___________________________30
O ENCANTAMENTO: O QUE EMERGIU? ___________________________________41
DOMÍNIOS DE AÇÃO __________________________________________________ 53
DIMENSÕES DE EXISTÊNCIA __________________________________________ 58
CONHECIMENTOS INTERSUBJETIVOS__________________________________ 62
O QUE FICOU ENCANTADO?_____________________________________________65
Dimensão de Existência CONSENSUAL ___________________________________ 69
Dimensão de Existência DIGITAL ________________________________________ 75
Dimensão de Existência CONECTIVA _____________________________________ 80
PARA QUE CONTAR ESSA HISTÓRIA? _____________________________________92
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ________________________________________98
ANEXOS _____________________________________________________________ 103
índice de Figuras
Figura 1 - Entrada da Cibercidade Sitecria ____________________________________________19
Figura 2 - Alguns sub-ambientes do Cibercidade-Sitecria_________________________________20
Figura 3 - Prefeitura da Cibercidade-Sitecria __________________________________________20
Figura 4 - Barra de menu com os recursos do kit. _______________________________________21
Figura 5 - Espaços Interativos do Cibercidade Sitecria___________________________________22
Figura 6 - Gráfico do índice de Interatividade no Cibercidade Sitecria antes do acoplamento
com participantes.________________________________________________________________23
Figura 7 - Ambiente "Cemitério" construído por um dos participantes_______________________25
Figura 8 - Cantos criados como opção para os habitantes: Oceano \ Espaço \ Campo \ Montanha
_____________________________________________________________________________26
Figura 9 - Configuração inicial de participantes do grupo A. ______________________________34
Figura 10 - Configuração inicial dos participantes do Grupo B.____________________________34
Figura 11 - Configuração inicial de participantes do Grupo C. ____________________________35
Figura 12 - Esquema baseado nos eixos sócio-construtivistas de uma comunidade._____________38
Figura 13 - Configuração do Cibercidade Sitecria após interação com participantes ___________41
Figura 14 - Esquema das relações entre MV-CV-AV _____________________________________43
Figura 15 - Páginas de alguns Projetos dos participantes do Grupo A_______________________50
Figura 16 - Páginas de alguns Projetos dos participantes do Grupo B. ______________________51
Figura 17 - Páginas de alguns dos Projetos de participantes do Grupo C. ____________________51
Figura 18 - Gráfico com a Proporção de transferências de iniciadores e participantes. _________53
Figura 19 - Páginas do Projeto Supermercado Lua e Sol _________________________________61
Figura 20 - Esquema da configuração do Ambiente Virtual enatuado - processos. _____________ 66
Figura 21 - Esquema da configuração do Ambiente Virtual enatuado - indicadores ____________66
Figura 22 - Gráfico da rede dos indicadores pelas Dimensões de Existência __________________67
Figura 23 - Gráfico da Dinâmica de Relações entre os conhecimentos intersubjetivos -
Dimensão CONSENSUAL__________________________________________________________ 69
Figura 24 - Gráfico da Dinâmica de Relações entre os conhecimentos intersubjetivos -
Dimensão DIGITAL ______________________________________________________________76
Figura 25- Gráfico da Dinâmica de Relações entre os conhecimentos intersubjetivos -
Dimensão CONECTIVA ___________________________________________________________ 80
Figura 26 - Páginas do Projeto Escola ____________________________________________ 84
Figura 27 - Página do Projeto Vivendo Solitário________________________________________90
"... o que se coloca não é a morte da cultura ou a
incoerência da consciência, mas a revitalização da
totalidade de nosso estado de ser e uma renovação
das condições e da construção do que nós
escolhemos chamar realidade. Temos que deixar
para trás velhas oposições, as dicotomias rígidas
de direita e esquerda na política, leste e oeste na
cultura, certo e errado na moralidade, negro e
branco na raça, e procurar uma configuração mais
sutil de pontos de vista sobre nossos problemas.
PARA COMEÇARA CONVERSA
Não podemos mais negar a rápida criação de novas tecnologias nas
diferentes áreas como ciência, política, educação, em todo nosso cotidiano. Também
não podemos fechar os olhos para a possibilidade desse fenômeno estar produzindo
diferenças nos processos de aprendizagem, na produção de subjetividades e relações
sociais.
Teóricos e pensadores como Levy
2
, Turkle
3
, Rushkoff
4
, Tapscott
5
entre
outros têm realizado reflexões acerca da estonteante velocidade com que o
funcionamento social e as formas de atividade cognitiva vêm se modificando. Como
diz Turkle
6
, nós construímos nossas tecnologias, e nossas tecnologias nos constróem
e ao nosso momento histórico.
Assim, sob meu ponto de vista, a tecnologia pode ser um "objeto para
pensar com", idéia trazida por Turkle
7
, no sentido de ser algo que podemos usar
para pensar as diferentes formas de relacionar-se, as diversas formas de conhecer e
1
ASCOTT,R. Cultivando o Hipercórtex. [s.n.], 1996, fotocópia
2
LEVY, P. As Tecnologias da Inteligência: o futuro do pensamento na Era da Informática.
Rio de Janeiro: Editora 34. 1993. 203p.
3
TURKLE, S. Life on the screen: identity in the age of internet. New York: Touchstone, 1995.
346p.
4
RUSHKOFF, D. Um jogo chamado fururo: como a cultura dos garotos pode nos ensinar a
sobreviver na era do caos. Rio de Janeiro: Revan. 1997. 300p.
5
TAPSCOTT, D. Growing up Digital: The Rise of the Net Generation. Nova York: McGraw-Hill,
1998. 339p.
6
TURKLE, op. cit. 1995.
1
Id.
aprender. Ou, de outra maneira, podemos pensar em tecnologias como estruturantes
sociais que criamos para auxiliar-nos a classificar, ordenar. Porém, ao mesmo tempo
que criamos, somos afetados por essas tecnologias intelectuais
8
que nos perpassam
e fazem parte de nós. Como isso ocorre?
Para compreendermos melhor essa questão da tecnologia enquanto
fenômeno que produz subjetividades é interessante nos remeter aos três tempos
tecnológicos que Levy
9
mapeia: a oralidade, a escrita e a informática. São tempos
que podem ser resgatados sob o ponto de vista da lógica histórica linear, mas
também estão presentes e se atualizam no nosso cotidiano.
Na oralidade, a cultura está baseada na memória humana e o tempo é
cíclico, muito mais ligado aos tempos da natureza (dia-noite, verão-inverno,etc),
numa espécie de "devir sem marcas e vestígios" e que sempre retorna, sem ponto
de referência fixo. Qualquer informação, se não é recontada, retransmitida, e de
certa forma, recriada, acaba caindo no esquecimento e conseqüente
desaparecimento.
"A memória do oralista primário está totalmente encarnada em
cantos, danças, nos gestos de inúmeras habilidades técnicas. Nada é
transmitido sem que seja observado, escutado, repetido, imitado,
atuado pelas próprias pessoas ou pela comunidade como um todo'
10
Já no tempo da escrita, o que fica marcante é a noção histórica da
humanidade. Nossos modos de conhecimento e de temporalidade ainda estão
fortemente vinculados à essa visão. O tempo histórico é linear e portanto, a idéia de
que tudo, homens, coisas e acontecimentos, podem caminhar apenas para duas
opções: uma progressão ou um declínio. Aqui a memória, antes primordial, passa a
ser desvinculada do sujeito e da humanidade...está nos livros, escritos, impressos...o
poder do saber também desloca-se para fora do indivíduo enquanto representante
da humanidade...é a objetivação da memória...
Na era digital o tempo é o aqui-agora, o tempo pontual.
8
LEVY, Opdt 1993.
9
id
10
LEVY, ibid., pg.84
"A informática, ao contrário [da escrita], faz parte do trabalho de
reabsorção de um espaço-tempo social viscoso, de forte inércia, em
proveito de uma reorganização permanente e em tempo real dos
agenciamentos sociotécnicos: flexibilidade, fluxo tensionado, estoque
zero, prazo zero.
At
Com este panorama geral tento revisitar algumas das características do
que podemos chamar Ecologias Cognitivas com seus diferentes regimes cognitivos e
suas tecnologias prevalecentes. Num sentido geral, quando falamos de uma Ecologia
Cognitiva, buscamos mapear as relações que se estabelecem entre sistemas
diversos, quer sejam indivíduos, técnicas, artefatos, etc, de modo a constituir uma
configuração característica.
1213
Assim, podemos pensar que as tecnologias atuais configuram uma
ecologia cogntiva diferenciada, digital.
Desde essa perspectiva, ultrapassamos a etapa do "se isso ocorre?" para
nos perguntarmos "como ocorre?", ou "quais são?" na contemporaneidade as
implicações das diversas tecnologias, neste caso, sobretudo as tecnologias digitais da
informação e da comunicação, na produção da subjetividade e das relações sociais.
Com relação a essa "digitalização do cotidiano", dois extremos abarcam a
maior parte das reflexões: em uma "ponta", a crença no avanço tecnológico que está
somente a serviço de uma lógica capitalística e na qual os indivíduos estão tornando-
se cada vez mais individualistas e automatizados/robotizados, num mercado cada vez
mais competitivo e excludente, em que as relações estão deixando de ser humanas,
etc; e numa outra extremidade temos a crença numa sociedade que caminha para
essa grande desestruturação apontada acima, porém, a solução, o antídoto para
reverter esse processo são as novas tecnologias, é a panaceia tecnológica.
Certamente a maior parte dos teóricos já não se arrisca a posicionar-se
em extremos, mas a lógica de análise não se modifica, continuando sobre uma
"mesma moeda", por assim dizer. Nessa "moeda" de dois lados e vários meios,
11
LEVY, ibid, p.114.
12
BATESON, G. Pasos hacia uma ecologia de la mente. Buenos Aires : Editora Planeta, 1991.
318p.
13
LEVY, op.dtl993.
continua existindo uma entidade que representa perigo, o "mal" que todos devem se
defender, que é a desestruturação total da sociedade.
Mas é possível termos um olhar que vá além dessas dicotomias?
O que se chama de desestrutu ração é justamente o abalo em noções
fundamentais como tempo/espaço, diversas subjetividades e relações sociais se
constituindo...
Espero, como Pedro
14
sugere, conseguir um olhar "além ou aquém, [não
importa]...do dilema entre perspectivas saudosistas e revolucionárias", e quem sabe
também poder contribuir para reconstruirmos/criarmos novas formas também de
ver/ sentir/ perceber/ pensar/ analisar esses fenômenos sociais.
Mas, de que forma isso seria possível?
Claro que respostas não há, mas podemos "passear" por algumas
reflexões e mapeamentos realizados por alguns pesquisadores, pensadores
preocupados com essas questões nessa mesma perspectiva.
Para Levy
15
as duas grandes mutações no mundo tecnológico dizem
respeito aos dispositivos informacionais e comunicacionais.
Com relação à comunicação, quanto à questão emissor-receptor, as
tecnologias do século XIX, tais como telégrafo e telefone, podem ser categorizados
como do tipo um-para-um.
Na era dos meios de comunicação de massa como a televisão - um-para-
muitos - podemos ver/saber o que acontece em outros espaços/tempos, mas o nível
de interatividade (por mais que as emissoras coloquem-se enquanto "TV interativa")
é mínimo. Assim, sabemos da queda das bolsas na Coréia, sabemos que a Rússia
está em crise, que o presidente dos Estados Unidos sofre um processo de
impeachment, assistimos documentários sobre a Segunda Guerra, etc. Logicamente
não se pode imaginar que não haja, por esse meio, produção de subjetividade...mas
14
PEDRO, R.M. Cognição e Tecnologia: Híbridos sob o Signo do Artifício. Orientador: Márcio
Tavares D'Amaral. Rio de Janeiro: UFRJ/ECO 1996. 189p. Tese (Doutorado em Comunicação e
Cultura).
15
LEVY, P. Cibercultura. Rio de Janeiro: Editora 34, 1999. 210p.
em vistas a uma tecnodemocracia essa forma de interação deixa a desejar enquanto
possibilidades para a ação do sujeito.
As tecnologias digitais, especialmente a Internet, sendo redes de
comunicação do tipo muitos-muitos diferem das demais pois "possuem múltiplas
interconexões entre os diferentes canais, permitindo a integração de complexos
conjuntos de dados obtidos em diversas fontes antes de apresentá-los aos
receptores.
/áó
.
Assim, temos possibilidade de, muito além de nos "informarmos sobre",
"ir" em outros espaços e tempos. Acessar não mais informações selecionadas por
alguém, mas sim as próprias imagens do satélite, o que nos permite fazer nossas
próprias interpretações sobre o clima, nossas previsões metereológicas, por exemplo.
As rotas de navegação são escolhidas ativamente com cliques do mouse,
direcionadas por nós nessa rede de informações oceânica.
Junto a essa mudança na perspectiva comunicacional, novos dispositivos
informacionais - possibilidades de organizar a informação - rementem-nos a repensar
as formas de nos relacionarmos, na maneira como estabelecemos laços sociais.
As informações estão em fluxo, em contínua modificação, espalhados em
memórias virtuais - digitais ou não - máquinas interconectadas, com vínculos (links)
que podem ser percorridos, filtrados e apresentados ao cibernauta de acordo com
seus interesses. Essa modificação pode ser considerada por si só, importante.
Mas as formas, os dispositivos criados para "apresentar" esses canais
informacionais podem ser inúmeros. Talvez os mundos virtuais, como dispositivos
informacionais, sejam os que mais claramente revelem essa modificação.
Apresentam um espaço contínuo, no qual o usuário é considerado um explorador
que vai habitar aquele ambiente. Pode ser ele mesmo, enquanto navegador ou um
representante seu, um avatar que obedece seus comandos. É "uma reserva digital
16
FRANCISCO, D. Hibridações no Cotidiano Escolar: Escolas & "Novas" Tecnologias da
Comunicação e Informação. Orientadora: Mérion Campos Bordas. Porto Alegre: UFRGS/FACED,
1998. 197p. Dissertação (Mestrado em Educação)
de virtualidades sensoriais e informacionais que só se atualizam na interação com os
seres humanos'
17
.
Sem dúvida, nesse "info-mar" as novas formas de acesso à informação e
novos estilos de conhecimento são favorecidos.
18
Sherry Turkle
19
, com relação à mudança na perspectiva de entendimento
quanto aos estilos de conhecer e aprender, aponta para a prevalência histórica de
um estilo de programação que se tornou canónico e ortodoxo, top-down. Ou seja,
necessidade de planejamento antecipado do programa, organização em
subprocedimentos de modo a departamentalizar e fragmentar para facilitar a
depuração. Essa lógica, mais próxima ao abstrato e formal, foi transposta para
analisar relações outras que não os códigos de um programa de computador. As
pessoas, as relações sociais passaram a ser vistas por esse viés. A busca de
solucionar um problema necessariamente passaria por uma fragmentação em partes,
um planejamento do que será realizado antes de "chegar" próximo ao objeto a ser
analisado. É condizente com o paradigma do cognitivismo que segundo Varela et
ai.
20
, traz a idéia do cérebro como máquina, e a mente como processador de
símbolos.
Com o aumento dos computadores domésticos, a "filosofia Machintosh" ou
"Windows", ou melhor, de simulação, os usuários mergulharam em outra forma de
relacionar-se com esse mundo digital. Os comandos tornaram-se objetos a serem
manipulados, ainda que com toques de mouse. Outra lógica tornou-se "permitida" e
até mesmo privilegiada em alguns contextos - a de bottom-up ou bricolagem. Esse
estilo traz uma forma contextualizada de apreender o mundo em torno de nós, de
nos colocar próximos aos objetos.
O que podemos considerar como ganho com relação ao momento anterior
está muito mais no sentido de aceitação de outras lógicas diferentes da abstrata-
formal do que da prevalência dessa ou daquela. Assim, deixou-se de ter a idéia de
17
LEVY, P 0p at. 1999.
18
LEVY, P. Educação e Cibercultura: A Nova Relação com o Saber. Educação, Subjetividade &
Poder, Porto Alegre, v.5, n. 7. p. 9-19. 1998.
19
TURKLE, Op.cit 1995.
20
VARELA, F., THOMPSON, E. & ROSCH, E. De Cuerpo Presente: las ciências cognitivas y la
experiência humana Barcelona: Gedisa, 1997. 317p.
que estágios concretos são atrasados em relação aos abstratos, mas passou-se a
entender como estilos de aprender, estilos de aproximação aos objetos do mundo.
Neste contexto, será que podemos modificar nosso olhar, não mais vendo
o indivíduo no contexto, mas a relação entre indivíduos, entre indivíduos e objetos?
Um grupo de indivíduos pode atuar como agente ativo na construção de
"produtos". São essas produções que geram o ciclo de desenvolvimento dessa
mesma comunidade/ambiente em que estão inseridos. Nesse sentido, as relações
sociais também são consideradas construções sociais. Mais que isso, o próprio
ambiente é uma construção social em desenvolvimento.
21
Nesse sentido o ciberespaço
22
parece ser um facilitador, pois o ambiente
virtual está sendo constante e explicitamente construído pelos indivíduos que nele
atuam. Ou pelo mesmo motivo, dificultador, no sentido de existir poucos referenciais
do mundo não-virtual com os quais os usuários estão habituados.
A idéia de construção da realidade pode ser levada a um extremo, pois de
fato, não há como existir o ambiente sem as pessoas que navegam, ou seja, habitam
aquele espaço. O estar é acoplado ao existir de forma muito mais evidente do que
podemos perceber na realidade não digital.
A definição recíproca é uma via que nos permite sair de uma dicotomia
realismo x idealismo. Não adotamos nem a idéia de mundo externo pré-dado que é
representado por nós, nem de um mundo interno pré-dado que é projetado. É a
ação corporizada.
23
Optando por essa forma de aproximação a essas questões a dicotomia
individual x social também pode ser repensada. O mundo não existe separado do
conhecedor.
"Se somos obrigados a admitir que a cognição não se pode
compreender sem o senso comum, e que o senso comum não pode
21
SHAW, A. Social Constructionism and the Inner City: Designing Environments for Social
Development and Urban Renewal. Disponível na INTERNET via
http://el.wvvw.media.mit.edu/people/acs/thesis.txt Arquivo consultado em 15/04/2000.
22
Expressão criada por William Gibson em seu romance Neuromanœr. (MARTIN, R.S. William
Gibson: Cyberspace, Outer Space. Disponível na INTERNET via
http://www.space.com/sciencefiction/gibson_991926.html Arquivo consultado em 05/08/2000.)
23
VARELA et al,
;
Op.dt
se r outra coisa além de nossa história corporal e social, a conclusão
inevitável é que o conhecedor e o conhecido, a mente e o mundo,
relacionam-se mediante uma especificação mútua ou uma co-origem
dependente"
24
Sem dúvida as relações entre sujeito e objeto são alteradas. Podemos
dizer até que as noções de sujeito e objeto como tem sido colocadas pela ciência
também podem ser vistas de outro modo. E da mesma maneira, as relações que se
estabelecem entre os sujeitos e do sujeito consigo mesmo.
Assim, na Rede, "Nós somos repentinamente nômades do conhecimento,
nômades como nunca antes, informados como nunca antes, livres do especialismo
fragmentado com nunca antes - mas também envolvidos no todo do processo social
como nunca antes"
25
.
A Rede não é apenas uma metáfora que nos auxilia a entender as
mudanças nas formas de ser e estar no mundo contemporâneo; não é apenas um
instrumento técnico criado pelo ser humano; é tecnologia intelectual que modifica e
é modificada, que constitui e é constituída, é um objeto que auxilia a
compreendermos relações sociais contemporâneas e ao mesmo tempo é construído
por essas relações.
Acompanhando essa linha de pensamento, podemos seguir com Allan
Shaw
26
quando propõe inverter o que Marvin Minsky
27
diz sobre *a mente individual
que pode ser pensada como uma sociedade de vários agentes" para uma visão
ecológica, de "uma sociedade de agentes que pode atuar, freqüentemente como se
fosse uma mente individual'.
24
Ibid, p. 178.
25
MACLUHAN apud ASCOTT,R. Turning on Technology .Disponível na INTERNET via
http://wv\AA/.cooper.edu/art/techno/essays/ascott.html Arquivo consultado em 25/05/1998.
26
Shaw, Op.tit
27
MINSKY, Marvin. A sociedade da mente. Rio de Janeiro: Franscisco Alves, 1989. 260p.
"...o encantam/ento, al carecer de sustrato espacio-
temporal, al no tener sujeto ni objeto, no queda es
empiricamente verificable... conocimiento nuevo,
realidad nueva, proveniente de fuera de la realidad
empírica espacio-temporal, solo es posible por ei
concurso dei encantamiento, porque se trata dei
tipo de conocimiento que pude se Ilegar a los
limites de la realidad...y tocar lo ilimitado,
vislumbrar el
infinito../
1
RELA TO DE UM ENCANTAMENTO: ENCANTANDO O OBJETO DE
PESQUISA
Uma história, quando contada é sempre contada por alguém. Esta
também é apenas uma versão em meio a tantas possíveis.
Nessa versão relato um encantamento que aconteceu a partir de um
mundo virtual na Internet - Cibercidade - Sitecria (http://oea.psico.ufrgs.br/
sitecria)
2
-, desde sua criação até o momento em que foi habitado
3
pelos
participantes
4
(alunos, professores, equipe técnica e pesquisadora)
5
. Mas antes, é
preciso esclarecer que encantamento é esse de que falo, de que ponto de vista (ou
pontos de vista?!?) enxergo essa "mágica"...
1
CHRISTLIEB, P. F. La Lógica Epistemica de la Invención de la Realidadln: MONTEIRO, M.
Conocimiento, Realidad e Ideologia. Caracas: AVEPSO. 1994. p.28.
Cibercidade-Sitecria foi desenvolvido dentro do Projeto Multilateral de Formação de Professores Via
Telemática - MEC-OEA/1998-99. Coord. Geral: José Armando Valente e Nara Lucas. Coord. LEC/UFRGS: Léa
da Cruz Fagundes. Coord. Site: Luciane Sayuri Sato. Equipe: Rute Rodrigues, Eduardo Stelmatzyki, James
Zortéa, Leandro Meneghetu', Sinara Pureza e Telmo Brugnara, Keli Valente dos Santos e Maristela Futre.
3
Entendo habitar/morar aqui no sentido de "sentir-se em casa", ficar à vontade, apropriar-se do
espaço, em contraposição à noção de fixar-se, enraizar-se em algum lugar. Do grego morar = ser,
viver. FERNANDES, F.; LUFT,CP.; GUIMARAES,F.M. Dicionário Brasileiro Globo. São Paulo:
Globo, 1999.
4
Participantes no sentido dado por Levy (Cibercultura. Rio de Janeiro: Editora 34, 1999. 210p.)
para os 'exploradores' do mundo virtual, que irão construir não apenas o sentido viável, múltiplo,
inesperado, mas também a ordem de funcionamento e as formas de apropriação
5
Para detalhamento dos participantes ver Capítulo Os alquimistas e seus passos: Quem participou do
encantamento e onde ficou registrado.
Como Piaget
6
e Maturaria
7
, penso que no fazer ciência, sendo parte de
nosso domínio de viver, o sujeito se torna objeto e o objeto se torna sujeito, as
fronteiras não são estáticas.
Quando falo de meu objeto de pesquisa como pensá-lo? Só pude saber
à medida que fomos nos "criando" mutuamente: eu, sujeito que busca conhecer e
o objeto a ser conhecido. Pensava no início dessa caminhada que, talvez ao final
dessa "conversa" com o objeto estivéssemos modificados os dois. Sabia de
algumas trilhas que não queria percorrer com ele, mas sempre há o risco de nos
enganarmos. O que quero dizer com isso? Gostaria que nossa relação se desse a
partir de uma perspectiva construtivista de fato.
Uma epistemologia que seja exclusivamente da distância veria-o
como um ser totalmente separado de mim. Muito provavelmente nem estaríamos
tendo essa espécie de diálogo, pois nesta visão não existe nenhuma possibilidade
do objeto expressar o que "sente" e "pensa", não tem vida
8
. Como isso seria
possível? Talvez eu me aproximasse considerando-o algo já dado, pré-existente e
acabado, como se minha "chegada" e meu olhar não fossem alterar em nada a
dinâmica dessa comunidade, pois o objeto existiria assim como antes da nossa
relação começar. Eu, como pesquisadora, teria essa capacidade única de descobrir
suas características de funcionamento de forma neutra, objetiva e racional, pois
são como são, independente da minha existência. E ainda assim, eu teria esse
poder sobre meu objeto, de descobrir e revelar ao mundo exatamente como é.
Esse ponto de vista de observador leva a alguns "princípios":
neutralidade, objetividade e racionalidade. Porém, esse caminho não me satisfaz
pois analisa, diagnostica mas não intervém, não transforma a realidade social.
Mudando então de enfoque, podemos adotar um ponto de vista no qual a
6
PIAGET,! Biologia e Conhecimento. Petrópolis: Vozes, 1973a. 423p.
7
MATURANA, H. Ontologia del observar: los fundamentos biológicos de la autoconciencia y el
domínio físico de la existência. In: AMERICAN SOCIETY FOR CYBERETICS CONFERENCES,
Felton, 1988. Conférence Workbook Texts in Cybernetics, Felton, 1988. P.18-23
8
CHRISUEB, P.F. in MONTEIRO. M. Õp. Cit.
transformação produz transformação em nós mesmos; as pessoas têm idéias; as
pessoas têm ações para transformar; há mudanças nas relações entre as pessoas.
E essa talvez seja a questão mais crucial para mim: uma aproximação
que não provoque transformações não me satisfaz nem enquanto sujeito
cognoscente nem enquanto profissional da área de psicologia. Não me parece
satisfazer nem mesmo a meu objeto de pesquisa, pois uma comunidade é viva e
não há como estudá-la sem modificá-la de alguma forma. Além do mais, fiz parte
dela, o que de início retira toda possibilidade de um olhar "neutro". Penso até se é
possível outro tipo de aproximação.
Por outro lado, tenho refletido e até mesmo questionado algumas
posturas nas quais o pesquisador social "entra" tanto na comunidade que é seu
objeto de estudo, que acaba misturando-se demais e não consegue contribuir.
Nessa epistemologia da fusão
9
, o relacionamento com meu objeto seria como
que simbiótico, como se fôssemos um ser só, onde o pesquisador trabalha com a
comunidade, partilha a tarefa, torna-se ativista, se mescla, se funde com a
comunidade, mas não propõe análise, não compartilha seu conhecimento
específico, não produz conhecimento para a outra comunidade da qual faz parte, a
científica.
Tanto uma posição de distanciamento total como fusão total dizem
respeito a uma mesma moeda, a lógica parece ser a mesma: ou o sujeito
predomina ou o objeto predomina, como se não houvesse possibilidade das
diferenças coexistirem ainda que em sua diversidade, e contribuírem um com o
outro para a construção de um conhecimento que transforma a realidade social.
Qual a saída para nós então?
Por vezes me parece ser interessante resgatarmos algumas "coisas de
criança". Por que digo isso? Claro, é impossível voltarmos de fato a ser crianças,
mas talvez possamos resgatar aquele olhar sobre o mundo de curiosidade e
9
id.
fascínio quando estão descobrindo como as "coisas funcionam"! Uma das formas
de aproximação é a conversa com os objetos. Não mais tentar comandar,
controlar, mas conversar com eles.
10
A epistemologia do encantamento
11
parece ser uma trilha a
percorrer.
Nos contos de fadas, por exemplo, as personagens podem ser animais,
plantas e outros seres inanimados, eles têm voz, vontade, atitude, desejo... O
encantar diz respeito a isso: dar voz e ação ao objeto. É o olhar do observador que
considera o objeto como entidade viva, dinâmica, que transforma e é
transformado pela e na interação.
"Una vez que se le considera ai objeto como capaz de sus próprias
cu ai idades, y que se le permite que se comporte según su parecer,
entonces se puede interactuar com él (...) Lo que ha hecho ei
sujeto es encantar ai objeto: há realizado um encantamiento por
virtud dei cual las personas y animales y cosas alrededor se
convierten em entidades vitales.
,n
Nesse sentido, uma das idéias que perpassa "ao fundo" por toda a
minha argumentação para construir meu objeto de pesquisa é de que qualquer
conhecimento é construído a partir da interação dos sujeitos com os objetos (quer
sejam "coisas" ou pessoas), e ambos vão sendo construídos a partir disso. É um
processo que se dá nesse interjogo do subjetivo como a realidade objetiva. Assim,
qualquer aproximação a um objeto de pesquisa vai ser necessariamente construído
pelo pesquisador e na sua relação com o objeto em questão. Assim penso que
aconteceu conosco, eu e meu objeto.
"(...jAnálise mais profunda mostra que a ciência não conhece
fatos nus', pois os fatos de que tomamos conhecimento já são
vistos sob certo ângulo, sendo, em conseqüência, essencialmente
ideativos. Se assim é, a história da ciência será tão complexa,
caótica, permeada de enganos e diversificada quanto o sejam as
l0
TURKLE, S. Life on the screen: identity in the age of internet. New York: Touchstone,
1995. 346p.
11
CHRISLIEB. P.F. In: MONTEIRO, M. Op. Cit.
12
Ibid. p.25.
idéias que encerra(...) Cada qual lerá as palavras a seu modo e de
acordo com a tradição a que seja filiado''
13
Com essa concepção epistemológica a construção só pode se fazer
dinâmica e em processo.
Acredito que uma concepção de conhecimento como processo sempre
em construção, gera conseqüências éticas e políticas importantes com relação à
minha postura enquanto pesquisadora e enquanto cidadã inserida em uma
sociedade com traços fortes de competição, disputa de poder e mediocridade.
Como seres humanos buscamos explicações para a natureza, as coisas
do mundo e de nós mesmos, o que me leva a crer que o fazer ciência é um
processo contínuo de transformação do objeto pesquisado e do próprio
pesquisador. É como um voltar a ser criança, como propus anteriormente, um
constante processo de descentramento, no qual é necessário confessarmos nossa
ignorância, começar a estudar a ciência desde sua base, sua gênese. E também de
encantamento, enquanto processo vivencial e apaixonado.
" [um cientista] começou sendo criança, pois a infância é anterior
à idade adulta em todos os homens, incluindo aquele das
cavernas. Quanto a saber o que o cientista retira de seus primeiros
anos, não é uma coleção de idéias inatas, uma vez que há ensaios
e erros nos dois casos, mas um poder construtivo, e entre nós
alguém veio a dizer que um físico de gênio é um homem que
soube conservar a criatividade própria a sua infância ao invés de
perdê-la na escola"
14
Desse modo, se queremos uma estratégia adaptativa para nosso tempo
é, diz Rushkoff
15
, fundamental consultarmos nossas crianças. São mais jovens, mas
mais novas e mais "preparadas" para conviver nesse mundo cheio de incertezas e
imprevisibilidades.
13
FEYERABEND, P. Contra o Método. Francisco Alves: Rio de Janeiro, 1989. p.35.
14
PIAGET, J., GARCIA, R. Psicogénesis y historia de la ciência. México: Siglo Veinteuno, 1982.
p.65.
15
RUSHKOFF, D. Um jogo chamado funiro: como a cultura dos garotos pode nos ensinar
a sobreviver na era do caos. Rio de Janeiro: Revan. 1997. 300p.
Mas para haver encantamento é preciso transpor as dicotomias que já
estão tão "familiares", "naturalizadas":
"...en todo caso, ei conocimiento encantado ocurre cuando
cualquiera de los oiros dos se rompen, cuando son llevados hasta
el extremo o hasta el error o hasta cualquier outro callejón sin sa
lida, cuando dan de si y muestran que no eran tan autónomos y
autosuficientes como se creían.
16
É nessa tentativa de desconstruir uma perspectiva para construir outra é
que vejo a necessidade desse encantamento que permite dialogar no mesmo
momento em que o objeto faz-se existir. Somente posso construí-lo à medida que
o processo de criação está em andamento, pois é no entre que estamos trilhando:
"Frente la realidad del individuo y frente la realidad de las
instituiciones sistémicas, aparece pues uma realidad que no está
dentro de los indivíduos y las instituiciones, que no encarna ni en
unos ni em otras, de los que incluso prescinde, ni tampouco en los
grupos, sino que encarna en una tercera naturaleza,
incuantificable e impecablemente real, hecha de
comunicación...Esta es la tercera realidad, la de en medio, la
intersubjetividad
/l1
.
Nesse sentido, a objetividade necessariamente é colocada em
parênteses. Significa dizer que na experiência não podemos distinguir entre ilusão
e percepção. A experiência é uma condição própria do observador e por isso um
conjunto de observadores também não pode fazer tal distinção
18
. 0 que chamamos
de objetividade é então, um processo e não um estado.
19
Não se considera uma
realidade única, mas a possibilidade de diversas realidades distintas e distinguidas
pelo olhar/ação do observadora).
Se, então, consideramos cada participante como um observador, um
investigador curioso dos "mistérios do mundo", um pesquisador cientista, podemos
16
CHRISUEB, P.F. in: MONTEIRO, M. Op Cit. p.28/29.
17
Ibid. p.51.
18
MATURANA, H. Transformación em la Convivência. Santiago: Dolmen Ediciones, 1999. 282p.
19
PIAGET, J. Op. Cit.
dizer que cada um é também o responsável pelo encantamento. Todos -
professores, alunos, pesquisadores - são aprendizes.
Assim, o objeto é vivo, dinâmico e coletivo, deixa de ser MEU -
pesquisadora - e passa a ser NOSSO - do coletivo de integrantes da comunidade. É
uma comunidade virtual digital se constituindo.
"Nosso mundo moderno cotidiano começa a se
povoar dessas estranhas criaturas, quimeras
modernas: ícones de menus de computadores
regulando a composição de textos virtuais
(imagens que não são feitas para serem vistas,
mas para encadearem-se na ação), mouse cujo
deslocamento físico manipula objetos imateriais
(texto, imagem, etc).... Virtualizando objetos,
elas inventam necessariamente novas
modalidades para defini-los e animá-los,
constituindo um novo espaço de percepção em
que ver, falar, mover, sentir, recompõem suas
operações. "*
O MUNDO VIRTUAL: UM CENÁRIO A SER ENCANTADO
Um mundo virtual, considerado como uma rede de virtualidades, foi o
cenário para ser atualizado aqui, em nosso encantamento. Nos mundos virtuais em
geral, essa atualização pode ser mais ou menos interativa, imprevisível, deixando
uma parte variável para as iniciativas daqueles que nela mergulham. São
enriquecidos se habitados coletivamente
2
. Torna-se nesse caso, um lugar de
encontro e um meio de comunicação entre seus participantes.
O mundo virtual de que falo aqui é o Cibercidade-Sitecria
3
(http://oea.psico.ufrgs.br/sitecria). Inicialmente este espaço foi criado para facilitar
a interação para aprendizagem ativa de alunos. Sua criação tem por base a idéia
fractalizada, na qual o professor em formação via telemática que está
desenvolvendo projetos compartilhados, fazendo parte da construção da
comunidade virtual com seus pares, também acompanha seus alunos no mesmo
1
WEISSBERG, Jean-Louis Real e V/rtua/ln: PARENTE, A. Imagem Máquina: A Era das
Tecnologias do Virtual. Rio de Janeiro: Editora 34, 1996. p.117-126.
2
LEVY, P. Cibercultura. Rio de Janeiro: Editora 34, 1999. 210p.
3
Cibercidade-Sitecria foi desenvolvido dentro do Projeto Multilateral de Formação de Professores Via
Telemática - MEC-OEA/1998-99. Coord. Geral: José Armando Valente e Nara Lucas. Coord. LEC/UFRGS: Lia
da Cruz Fagundes. Coord. Site: Luciane Sayuri Sato. Equipe: Rute Rodrigues, Eduardo Stelmaszczyk, James
Zortéa, Leandro Meneghetti, Sinara Pureza e Telmo Brugnara, Keli Valente dos Santos e Maristela Furré.
processo de aprendizagem cooperativa. Assim, pode observar, aplicar,
experienciar, refletir as várias formas de interação e construção do conhecimento
no desenvolvimento de projetos
4
cooperativos em Educação à Distância - EAD -
com outros alunos e professores, enriquecendo assim sua formação e contribuindo
para a construção do conhecimento dos alunos.
5
Seu layout foi desenvolvido a partir de uma metáfora: a cidade.
Figura 1 - Entrada da Cibercidade Sitecria
Inicialmente é necessário que o interessado cadastre-se, aceitando ser
morador da Cibercidade-Sitecria e em seguida é convidado a nos ajudar, os
iniciadores
6
, a desvendar um "Grande Mistério". Esta foi a forma que encontramos
para que o usuário sentisse a necessidade de interação neste espaço, um desafio
inicial.
4
A concepção adotada é de Projeto de Aprendizagem, descrita em FAGUNDES, L; SATO, Luciane;
MAÇADA, Débora. Aprendizes do Futuro: as inovações começaram! Coleção Informática para
a mudança na Educação. Brasília: SEED/MEC/PROINFO. 1999. 95p.
5
SATO, L. S., RODRIGUES, R. Comunidade Virtual de Aprendizagem Ativa com Alunos e
Ambiente Virtual de Experienciação de Professores em Formação Via Telemática. Porto
Alegre: UFRGS/LEC. 1998. 2p. (Termo de Referência - Produto n°4 LEC/UFRGS. Projeto Multilateral
de Formação de Professores Via Telemática/ OEA-98/99. Coordenação/RS: Léa da Cruz Fagundes).
6
Utilizo de Levy {Op. Cit.), 'iniciadores' ou 'engenheiros de mundos' para remeter-me aos
desenvolvedores do Cibercidade-Sitecria no sentido de não serem os autores de uma obra acabada,
mas de um mundo por essência, inacabado.
Deste mundo virtual fazem parte algumas "instituições públicas":
prefeitura, espaço jornalístico, espaço artístico, espaço esportivo e banca. Esses
espaços foram criados na primeira estrutura para que o professor pudesse desafiar
seus alunos e estes entre si.
Figura 2 - Alguns sub-ambientes do Cibercidade-Sitecria
Além disso, há a opção de que os moradores também desenvolvam
projetos dentro do Sitecria, construam "sua casa". Assim, na prefeitura cada um
podia cadastrar seus projetos, conhecer os outros projetos em andamento e
acessar a lista com todos os moradores.
Figura 3 - Prefeitura da Cibercidade-Sitecria
Assim que sua senha e apelido são cadastrados, cada morador recebe
um kit com:
um guarda arquivos, que é, na realidade um espaço de publicação para
colocar por upload as suas produções: páginas de seu projeto, imagens
para a galeria e o que mais queira.
uma caixa de correio interno ao Sitecria, através da qual pode receber e
enviar mensagens para outros moradores.
um bloco de notas pessoal, no qual pode registrar suas idéias,
sentimentos, como num diário. O acesso é restrito ao proprietário do
bloco.
Figura 4 - Barra de menu com os recursos do kit.
Na criação do Sitecria esse conjunto de recursos era denominado kit-
casa, pois a idéia dos iniciadores era de oferecer a possibilidade de cada um
construir sua "casa" (homepage), seu projeto.
Além do correio, este mundo virtual proporciona alguns outros espaços
de troca: Portal Mix, com chat e fórum, e um Mural de recados e manifestos.
Ambos os espaços sao coletivos e abertos a todos os moradores.
Figura 5 — Espaços Interativos do Cibercidade Sitecria
Dessa maneira, nós, os iniciadores, procuramos oferecer o máximo de
possibilidade interativas de forma lúdica e prazerosa, a partir de três pilares
7
:
* um design que possibilite aos alunos sentirem-se convidados a fazer parte
da construção da comunidade virtual, com troca de experiências, e
priorizando interações que favoreçam a cooperação e a autonomia nas
relações;
* espaços/momentos em que os alunos possam participar de desafios
construídos por outros alunos, professores e pesquisadores, assim como
construí-los;
* espaços de comunicação sistemáticos síncronos tais como IRC e ICQ e
assíncronos como e-mail, formulários, lista de discussão.
7
SATO, L. S., RODRIGUES, R. Op. Cit.
Pode-se dizer que o Cibercidade-Sitecria é uma espécie de 'casca', um
cenário que tem sua dinâmica gerida pela própria comunidade. Pela concepção dos
iniciadores, este ambiente virtual constitui-se prioritariamente na interação.
Para tornar mais visível essa opção dos iniciadores pela alta
interatividade, podemos observar a "fotografia" - gráfico - abaixo (figura 6), onde
é evidenciada a configuração inicial do Sitecria com um índice de interatividade
obtido da proporção entre as duas formas de apresentação das informações (as
páginas em si), basicamente:
* Informativas/ "para consulta": nas quais o morador tem sua interação
limitada a leitura e links nos quais pode navegar;
* Interativas: nas quais o morador tem a possibilidade de inserir dados
(textos ou imagens), modificar, transformar de alguma forma aquele
espaço, ainda que tenha sido proposto pelos iniciadores.
Figura 6 - Gráfico do índice de Interatividade no Cibercidade Sitecria
antes do acoplamento com participantes.
Assim, o que faltava para que esse mundo virtual fosse encantado e se
transformasse em um ambiente no qual uma comunidade pudesse se construir? Os
participantes e suas interações, é claro!
Que dinâmica pode emergir das interações dos participantes com este
mundo virtual e entre eles?
Num primeiro momento foi realizada uma experiência piloto
8
para
observar como seria o acoplamento inicial dos participantes com este mundo
virtual proposto. Foram convidados dois grupos de alunos e professores de escolas
públicas a habitar esse mundo virtual livremente. A experiência teve duração de 2
meses, no período de outubro e novembro de 1999.
Como cada grupo interagiu com o Sitecria e o que aconteceu nessa
experiência?
UM MOMENTO: FORMA DE OCUPAR O ESPAÇO
Num primeiro grupo de exploradores faziam parte alunos de uma escola
pública municipal de Porto Alegre/RS, com idades entre 10 a 14 anos.
Logo que entraram no Cibercidade-Sitecria estes participantes
procuraram habitar o espaço de uma forma que não tinha sido pensada (ao menos
como início do processo) pelos iniciadores deste mundo virtual.
Podemos dizer que a maior parte das crianças preocupou-se mais em
habitar o espaço verificando que sub-ambientes não estavam sendo oferecidos e
que consideravam importante numa cidade: "Ei...não têm árvores nessa cidade!";
"É mesmo...falta um campo de futebol pra gente jogar bola"; " Não tem cemitério
também. Onde as pessoas são enterradas?"
A partir disso cada um iniciou o planejamento de como implementar seu
sub-ambiente.
8
Esta experiência está relatada em SATO, L; MAÇADA, D. & MARASCHIN,C. A virtual community
under construction: beginning of an enchantment. In: ED-MEDIA 2001—World Conference on
Educational Multimedia, Hypermedia & Telecommunications, Tampere, Finlândia. 2001 [no
prelo]
Nesse momento foi que deram-se conta de que cemitérios, oficinas
mecânicas, locadoras de vídeo no ciberespaço não podem ser iguais às do mundo
presencial. Foi então que surgiu outra questão: construir espaços que pudessem
ser interessantes e úteis para os demais colegas. Começaram a buscar soluções
para essas questões: "Posso colocar um daqueles para preencher [formulários],
perguntando o que o carro dele tem. Daí eu pesquiso e respondo como fazer para
arrumar...e mando de volta!
7
';
m
A gente pode fazer um parque com várias árvores
e com informação em cima de cada uma. Daí as pessoas podem saber como
plantar, que tipo de clima ela gosta, se gosta de água..." e assim por diante.
Cemitério - Ambiente em construção por moradores-alunos
Figura 7 - Ambiente "Cemitério'' construído por um dos participantes
Essa maneira de interagir com o Cibercidade-Sitecria estabeleceu uma
dinâmica que perturbou e "obrigou" o ambiente a se modificar, já que os desafios
iniciais propostos em cada sub-ambiente, ao menos nesse momento, não foram o
foco de maior interesse desses exploradores.
Propor novos espaços públicos, coletivos não estava na proposta inicial.
Mas passou a ser o eixo norteador deste mundo virtual, juntamente com a
interação entre os moradores. O acoplamento indivíduo - mundo virtual ocorreu
desta maneira nesse primeiro momento com estes participantes.
E como foi recebida essa perturbação? Cada morador passou a ter a
possibilidade de propor sua forma de habitar o mundo virtual - seu projeto no
Cibercidade-Sitecria - e contribuir para que deste espaço emergisse uma
comunidade. A concepção inicial de "kit-casa" foi considerada individualista e a
opção foi o habitar coletivo.
Para que o ambiente se adaptasse à proposta dos participante foram
feitas algumas alterações, transformações, foram criados quatro outros espaços:
Canto da Lua, Canto do Espaço, Canto da Montanha e Canto do Oceano. Esses
espaços estão disponíveis para que os exploradores possam escolher onde querem
desenvolver seus projetos.
Figura 8 — Cantos criados como opção para os habitantes:
Oceano | Espaço | Campo | Montanha
UM OUTRO MOMENTO: FORMA DE INTERAGIR
Num outro momento, um outro grupo de participantes optou por utilizar
os espaços de interação do Cibercidade-Sitecria. Desse grupo fizeram parte alunos
com suas professoras de uma escola pública municipal de Novo Hamburgo/RS,
com idades entre 8 a 11 anos.
Esses participantes demonstraram, em sua maioria, estar voltados para
suas dimensões de existência habituais. Ou seja, as mensagens trocadas diziam
respeito à sua vida cotidiana e foram dirigidas aos outros moradores que já
conheciam presencialmente, (convites para festa, poesias e brincadeiras quanto ao
tipo físico, etc).
"mulher gate?, por favor mande a seguite mensagem para o super
homem. Super homem tue feio d+ fas uma plástica'
10
"vampira você é super legal e d+
POEZIA!
NÃO TE DOU UMA ROSA PORQUE
NELA TEM ESPINHOS MAS TE DOU
MEU CORAÇÃO QUE ESTÁ CHEIO DE CARINHO"
A comunidade delimitou seu espaço através dessa construção e das
interações entre seus participantes. Nessa "fotografia" da dinâmica alguns tipos de
diferenciações não foram feitas. Quando falo em diferenciações me refiro às
distinções com relação ao ciberespaço em geral e com relação às outras
dimensões de existência que cada participante faz parte, para além de seu
cotidiano presencial.
Nesse caso, a dimensão de existência da vida cotidiana ainda é o
predominante com relação à vida da Cibercidade. A dimensão individual ainda
prevalece, não existindo a noção da inserção em um coletivo de participantes:
grande parte das mensagens são explicitamente de cunho particular e com uma
idéia de que mais ninguém tem acesso além do próprio receptor. Fica clara essa
9
Os nomes e apelidos originais foram substituídos por personagens de histórias em quadrinhos,
desenhos animados ou contos de fadas. A correspondência personagem-participante foi aleatória,
não tendo nenhuma relação com suas características.
10
Os textos e depoimentos dos participantes estão colocados exatamente como nos dados
originais, sem alterações ou correções ortográficas, gramaticais, para preservar a autenticidade dos
mesmos.
dinâmica pelo espaço de interação preferencial: o Correio, onde há possibilidade
de enviar mensagens pessoais.
Alguns aspectos podem ser levantados a partir da interação desses
grupos de crianças com o mundo virtual em questão:
* a maior parte das crianças preocupou-se mais em habitar o espaço,
verificando que sub-ambientes não estavam sendo oferecidos e que
consideravam importante numa cidade;
* as propostas dos sub-ambientes estavam baseadas nos interesses de
cada um, mas ao mesmo tempo houve um claro desejo de construir
ambientes que pudessem ser interessantes e úteis para os demais
colegas;
* os desafios iniciais propostos, ao menos nessa fase, não foram o foco de
maior interesse dos participantes, que concentraram-se mais em
comunicar-se entre si e propor novos sub-ambientes.
Podemos entender este espaço como um domínio de diferenciações que
se cria a partir das experiências que ocorrem, a comunidade foi se constituindo e
modificando o próprio espaço. A idéia dos vários sub-ambientes estava
predominantemente baseada na interação dos participantes, isto é, que fossem
atualizados, reconstruídos, reconfigurados a cada interação.
O que ocorreu então? Os eixos fundamentais do mundo virtual
passaram a ser: os projetos de seus moradores e os espaços de interação. O
aspecto de proposição de desafios tornou-se secundário.
Assim, na medida em que as interações ocorreram, emergiram relações
que transformaram e foram transformadas pelo mundo virtual.
Com esses acoplamentos iniciais será que poderíamos dizer que este
sistema recém constituído aponta para um indício de um processo de auto-
organização? Sem precipitações, podemos pensar esse fenômeno como uma
hibridação que indica um espaço de convivência?
"Jovens alquimistas digitais têm ao seu dispor
ferramentas de inteligência e poder
inimagináveis pelos seus predecessores. Telas de
computador sâo espelhos mágicos, apresentando
realidades alternativas nos vários graus de
abstração ao controle (invocação) do alquimista.
O mouse ou caneta da mesa digitalizadora são o
bastão, controlando o fogo do monitor e
amplificando a força criativa do operador. Discos
rodopiantes, drives, são os pentáculos, inscritos
com símbolos complexos, tabelas terrestres a
receber a entrada do "ar, " resultante da
impressionante velocidade da eletricidade
intelectual dos circuitos da CPU. Os chips RAM
são literalmente, os buffers ("piscinas buffer"), a
água, o elemento passivo capaz somente de
receber e retransmits a informação, a
refletindo".
1
OS ALQUIMISTAS E SEUS PASSOS: QUEM PARTICIPOU DO
ENCANTAMENTO E ONDE FICOU REGISTRADO
Desde o início venho falando dos participantes que me ajudaram a
inventar, criar esse objeto de pesquisa. Mas quem são eles? Como foram
"selecionados'?
0 convite para participar da pesquisa foi aberto a todos os integrantes
do Projeto de Profissionalização de Docentes e Administração Educacional/OEA-
2000
2
. Assim, houve a participação de alunos e professores
3
de duas escolas
1
LEARY, T., GULUCHSEN, G. O Cyberpunk como Alquimista Moderno Disponível na
INTERNET via http://www.rizoma.net/rizoma4/cyberpunk.htm Arquivo consultado em 21/05/2001.
2
Fizeram parte deste Projeto, além do Brasil, outros dezesseis países, entre os quais Argentina e
Chile. Coordenação Geral: José Armando Valente (UNICAMP/SP). Coordenação LEC/UFRGS/RS: Léa
da Cruz Fagundes. As coordenações de cada país definiram os critérios para selecionar as escolas
participantes.
O convite para participar desse encantamento/pesquisa foi aberto a toda a comunidade escolar
nas duas escolas. Assim, não houve seleção prévia, a adesão foi espontânea por parte de
professores e alunos.
públicas de Porto Alegre e Novo Hamburgo (RS) e de membros da equipe do
Laboratório de Estudos Cognitivos/LEC-UFRGS/RS
4
, do qual faço parte. O encanto
foi realizado no período de agosto a dezembro de 2000.
Alguns dos alunos e professores que estavam na experiência piloto
5
optaram por continuar neste segundo momento. Outros ficaram impossibilitados
por questões de disponibilidade de tempo, no caso dos professores; e os alunos,
por não estarem mais freqüentando a escola ou por problemas familiares (cuidar
da casa, cuidar do irmão mais novo, etc). Assim como na experiência piloto, a
faixa etária dos alunos variava de 8 a 14 anos.
É importante salientar que essa história que conto, mesmo sendo uma
entre muitas versões possíveis, está baseada em registros que foram realizados ao
longo do processo, é um estudo exploratório.
Ao longo desse relato de encantamento, trago alguns trechos,
"pedaços" do que aconteceu, de ações dos participantes para tornar mais clara
alguma passagem. Mas, com certeza, o que ficou registrado dos acontecimentos
engloba muito mais interações do que eu poderei mostrar aqui.
Que registros foram consultados?
* Chats: foram realizados encontros on-line, nos quais os participantes
discutiram sobre questões quanto ao funcionamento do Sitecria, trocaram
idéias sobre seus projetos, sobre outros assuntos de interesse pessoal,
etc. Foi utilizado o servidor de IRC
6
alocado no LEC/DPSI/UFRGS
(http://www.nietchze.ufrqs.br). Esse software tem possibilidade de
registro do debate através de gravação.
* Fórum-mix: foi utilizado pelos participantes como local para combinações
e trocas de idéias, sobretudo sobre seus projetos dentro do Sitecria. O
4
Os participantes, membros do LEC, eram também os iniciadores/ administradores do Sitecria.
5
Sobre a experiência piloto veja no capítulo O Mundo Virtual: um cenário a ser encantado, p.24.
6
Este servidor foi adaptado e é gerenciado por Daniel de Queiroz Lopes, pesquisador do
LEC/UFRGS.
software utilizado
7
possibilita que as mensagens enviadas fiquem
armazenadas no servidor no qual o MV está alocado.
* Notícias do Repórter Virtual
8
: as notícias enviadas pelos participantes ao
Jornal do Sitecria. Esse recurso foi utilizado principalmente para veiculação
de notícias do cotidiano pessoal e escolar dos participantes.
* Correio pessoal
9
: Através desse recurso os participantes enviaram e
receberam mensagens entre si. As mensagens recebidas ficaram
publicadas em uma página na Web, de acesso pessoal e dos
administradores do MV.
* Blocos de notas
10
: foram utilizados pelos participantes como uma espécie
de rascunho de algum material que estavam produzindo para as páginas
ou para mensagens que seriam enviadas posteriormente. Também
utilizaram esse recurso para colocar lembretes de atividades que
gostariam de desenvolver futuramente. Esses registros ficam
armazenamos no servidor no qual está alocado o MV.
* Mural
11
: esse recurso foi utilizado para trocas mais gerais e para
aproximações pessoais como apresentações pessoais. Essas
manifestações ficaram registradas em página publicada na web, dentro do
Sitecria.
7
O software do Fórum está baseado em CGIs. Foi criado por Telmo Brugnara, bolsista IC do
LEC/DPS/UFRGS.
8
Esse recurso foi desenvolvido com CGI criada por Eduardo Stelmaszczyk, bolsista IC do
LEC/UFRGS.
9
Esse recurso foi desenvolvido com CGI criada por Eduardo Stelmaszczyk, bolsista IC do
LEC/UFRGS.
10
Esse recurso foi desenvolvido com CGI criada por Eduardo Stelmaszczyk, bolsista IC do
LEC/UFRGS.
11
Esse recurso foi desenvolvido com CGI criada por Keli Valente e Maristela Furré, bolsistas IC do
LEC/UFRGS.
* Banco de Projetos da Prefeitura do Sitecria
12
: os projetos cadastrados
também serviram de registros das ações dos participantes. Esses dados
ficam armazenados em páginas web no Sitecria.
* Páginas publicadas:nesse material ficaram registradas as sistematizações dos projetos que o
s
* Os acessos (visitações e transferências) mapeados através do Analisador
de arquivos de log do servidor web Apache - ALOG
14
.
Além disso, transcendendo o Sitecria, utilizei entrevistas gravadas ou
filmadas, email's, relatos das professoras, depoimentos dos alunos, diários de
campo que realizei, questionários realizados pelas professoras com os alunos.
O conjunto de todos os dados foi mapeado. Cada ação, interação,
depoimento foi assinalado e categorizado.
Seguindo os passos dos participantes por esses registros, trago aqui
"fotografias" das relações entre os alquimistas no momento em que iniciaram essa
"magia". Cada qual trazia consigo seus históricos de acoplamentos anteriores
15
,
seus sistemas de significações já aprendidos
16
, os papéis que desempenhavam,
com suas realidades construídas e sua cultura local própria.
12
Esse recurso foi desenvolvido com CGI criada por Telmo Brugnara, bolsista IC do LEC/UFRGS.
13
Esse recurso de upload foi desenvolvido com CGI criada por Eduardo Stelmaszczyk, bolsista IC do
LEC/UFRGS.
14
Esse recurso foi criado por Telmo Brugnara, bolsista IC do LEC/DPS/UFRGS.
15
MATURANA.H., VARELA, F. A Árvore do Conhecimento - Campinas: Psy II. 1995. 281p.
16
MONTANGERO, J., MAURICE-NAVILLE, D. Piaget ou a Inteligência em Evolução. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1998. 242p.
GRUPO A
GRUPOB
Figura 9 - Configuração inicial de participantes do grupo A.
Figura 10 - Configuração inicial dos participantes do Grupo B.
GRUPOC
Figura 11 - Configuração Inicial de participantes do Grupo C.
Vamos pensar o que ocorreu durante o processo? Como essas
configurações ficaram na medida em que os participantes foram habitando o
mundo virtual e organizando-se em uma comunidade? Será que poderemos vê-las
com nitidez ao final desse encantamento?
Mas antes é importante compreendermos o que estou entendendo
como uma comunidade virtual.
Comunidade virtual tem sido entendida como um grupo de pessoas se
correspondendo mutuamente por meio de computadores interconectados
17
ou
mais detalhadamente, agregações sociais que emergem da Rede quando
determinado número de pessoas envolvem-se com discussões, com sentimentos,
RHEINGOLD, H. La Comunidad Virtual: Uma Sociedad sin Fronteras. Barcelona: Gedisa,
1994. 381p.
formando redes pessoais de relacionamentos no ciberespaço
18
. Ainda que não se
ignore essa definição mais geral, considero importante ressaltar algumas de suas
características que servem de elementos para refletirmos sobre a questão colocada
de início.
Essa interconexão, como um dos princípios da cibercultura, aponta para
uma cultura da telepresença generalizada. Para além de uma física da
comunicação, a interconexão constitui a humanidade num contínuo sem fronteiras,
cava um meio informacional oceânico, mergulha os seres e as coisas num mesmo
banho de conexão interativa. A interconexão tece um universo por contato
19
.
Nesse universo por contato, a construção de laços sociais ocorre muito
mais sobre afinidades de interesses, de conhecimentos, sobre projetos mútuos, em
um processo de cooperação ou de troca do que de relações por proximidade
geográfica, filiações institucionais ou relações de poder (o que não significa que
estas não existam). A comunidade virtual constitui-se sobre a reunião em torno de
centros de interesses comuns, sobre a aprendizagem cooperativa, sobre processos
abertos de colaboração.
20
"comunidades virtuais realizam de fato uma verdadeira atualização
(no sentido da criação de um contato efetivo) de grupos humanos
que eram apenas potenciais antes do surgimento do ciberespaço.
A expressão comunidade atual seria, no fundo, muito mais
adequada para descrever os fenômenos de comunicação coletiva
no ciberespaço do que comunidade virtual"
21
No caso da nossa Cibercidade, os participantes tinham um interesse
coletivo de habitar aquele espaço. E atualizaram suas relações sobretudo voltados
para o desenvolvimento de projetos para beneficiar a todos.
18
TAPSCOTT, D. Growing up Digital: The Rise of the Net Generation. Nova York: McGraw-
Hill, 1998. 339p.
19
LEVY, P. Cibercultura. Rio de Janeiro: Editora 34, 1999. 210p.
20
SHAW, A. Social Constructionism and the Inner City: Designing Environments for
Social Development and Urban Renewal. Disponível na INTERNET via
http://el.www.media.mit.edu/people/acs/thesis.txt Arquivo consultado em 15/04/2000.
21
LEVY, P. Op. Qt p. 130.
Essas redes de relações são baseadas em escolhas. Quando são
desconfortáveis é fácil optar por sair delas. Comunidades ensinam a tolerância, a
co-existência e o respeito mútuo. Para Alan Shaw
22
a maioria de nós busca estar
em comunidade. Não há regras pré-definidas, mas construídas nessa coletividade
e a todo tempo negociadas explícita ou implicitamente. É um exercício constante
de fazer escolhas e receber feedbacks.
23
MENSAGEM NO
FÓRUM-MIX
Assunto: bate papo
Por: Homem Aranha
MANIFESTO NO
MURAL
Data:
1/11/2000
Hora: 08:41:26
Enviado por:
gostaria que mandassem
mensagens para mim de
qual- quer assunto .
obrigado !
Alguém gostaria de bater um
papo com nosco. Nóstemos
muitas coisas interessantes para
falar com você. Quem sabe hoje
de tarde.
Vocês não estan
consiguindo se conectar
no chat por favor
fiquen tentando
estamos esperando
MENSAGEM NO
FÓRUM-MIX
Assunto: chat
Por: Homem
Aranha
SHAW, A. Op. Cit.
Desse modo, com relação a um mapeamento geral da dinâmica da
comunidade podemos tomar a perspectiva sócio-construcionista na qual emergem
três eixos interdependentes e que funcionam sinergicamente
24
:
* produtos: envolvem os constructos internalizados e externalizados pelos
membros do cenário social no ciclo de desenvolvimento da comunidade.
* processos: mecanismos de auto-organização e de interação pelos quais
são construídos os produtos.
* relações: conectam os indivíduos no meio sociocultural e os provém de
oportunidades e materiais necessários para a construção dos produtos.
COMUNIDADE
Figura 12 - Esquema baseado nos eixos sócio-construtivistas de uma comunidade.
Assim, temos como os três eixos interdependentes:
* as relações que se estabelecem na comunidade virtual no ciberespaço,
que são ao mesmo tempo o que a constitui;
23
TURKLE, S. Life on the screen: identity in the age of internet. New York: Touchstone,
1995. 346p.
24
SHAW, A. Op. Cit. 1995.
* a dinâmica que segue para se constituir, seu processo de auto
organização;
* os "produtos" gerados, em forma de conhecimento social, de constructos
sociais, a aprendizagem do próprio processo intersubjetivo, da inteligência
coletiva.
A partir dessa perspectiva, a comunidade torna-se ativa em seu próprio
processo de desenvolvimento, pode-se dizer, desenvolve dinâmicas próprias de
funcionamento, auto-organiza-se. São realizadas atualizações dessa Inteligência
Coletiva, mais como um campo de problemas que uma solução, mais como um
"modo de realização da humanidade que a rede digital universal felizmente
favorece, sem que saibamos a priori em direção a quais resultados tendem as
organizações que colocam em sinergia seus recursos intelectuais".
25
No nosso caso, o mundo virtual modificou-se de acordo com a forma de
acoplamento que os participantes experienciaram.
26
Ali fica explícita essa
concepção de comunidade e podemos ver o princípio de sua criação, de forma sutil
mas evidente.
E é nesse sentido que o objeto é coletivo, encantado. E só permanece
em encantamento enquanto nós, participantes, o consideramos em movimento, o
que Maturana e Varela
27
denominam deriva. Ou seja, cada momento é um
momento diferente, que vai ser determinado pelo histórico de interações que
ocorrerem, mas ao mesmo tempo, sempre se atualizando em suas estruturas. A
cada momento, um acontecimento, uma experiência.
Considerando-se essa concepção, podemos falar da emergência de
quais estruturas nesse acoplamento alquimistas-mundo virtual durante o processo
LEVY, P. Op. Cit. p. 100
1
Como descrito no capítulo Um mundo virtual a ser encantado MATURANA,H., VARELA,
F. A Árvore do Conhecimento - Campinas: Psy II. 1995. 281p.
de constituição dessa comunidade? Como ocorre o processo de auto-organização
da comunidade?
"Porque ainda não se sabe. Porque aprender-a-
viver é que é o viver, mesmo. O sertão me
produz, depois me engoliu, depois me cuspiu do
quente da boca... O senhor crê minha
narração?".
1
"Salvem-se cócega e mágica, para se
poder reler
a vida".
2
O ENCANTAMENTO: O QUE EMERGIU?
Agora que já conhecemos o cenário e os alquimistas, vamos ver o que
emergiu desse acoplamento.
De que forma poderíamos observar os acontecimentos a partir dessas
interações no ciberespaço? A questão que se coloca é: que dinâmica emerge
dessas interações?
Depois de habitado, temos a "fotografia" abaixo:
Figura 13 - Configuração do Cibercidade Sitecria após interação com participantes
1
ROSA, Guimarães. II seminário Guimarães Rosa - Vida e encantamento. Disponível na
INTERNET via http://www.guimaraesrosa.pucminas.br/ guimaraesrosa.html Arquivo consultado em
04/06/2001.
2
Id.
Anteriormente
3
vimos a "fotografia" (figura 06) do mundo virtual
Sitecria antes de ser habitado pelos participantes. Agora podemos ver os "efeitos"
do acoplamento mundo virtual-participantes na figura acima (figura 13).
As páginas de autoria são os produtos criados pelos participantes no
processo de construção da cidade. Não se trata somente de um acréscimo dessas
páginas. A estrutura toda do Sitecria se alterou em função desse encontro. A
proporção das páginas interativas alterou-se.
Essa transformação do ambiente aponta para um aumento na sua
característica interativa, agora, incluindo as produções de autoria dos
participantes. Pensando então, nesse encontro mundo virtual (MV) - comunidade
virtual (CV), fica clara a definição recíproca
4
. A comunidade só se constituiu
enquanto tal no momento em que interagiu nesse mundo. O mundo só passou a
ser "vivo" no momento em que os participantes o habitaram.
Esse encontro MV-CV criou uma organização que chamarei aqui de
Ambiente Virtual (AV).
Assim, entendo que, somente com as próprias interações dos
participantes com o mundo virtual e entre eles é que foi possível, neste AV,
emergir a dinâmica de funcionamento. Transformou-se na medida em que as
interações foram ocorrendo, que os participantes entraram em atividade cognitiva.
Foi atualizado a cada ação/operação e sua virtualidade se modificou a cada
problematização. Da mesma forma os participantes foram transformados na/pela
interação.
5
Nessa dinâmica, as fronteiras rígidas do que é meio, objeto e sujeito
deixam de existir. Um ambiente virtual, sob a perspectiva construtivista, constitui-
3
Veja o Capítulo Um mundo virtual a ser encantado.
4
VARELA, F.; THOMPSON, E.; ROSCH, E. De Cuerpo Presente: las ciências cognitivas y la
experiência humana Barcelona: Gedisa, 1997. 317p.
5
MAÇADA,D.; SATO,L & MARASCHIN, C. Educação sem distâncias: uma experiência de
convivência em ambiente digital de aprendizagem. Informática & Educação Florianópolis -
SBIE;UFSC-SC. Set/2001 [no prelo]
se sobretudo pelas relações que nele ocorreram. Assim, foi na convivência, através
das interações, questionamentos, ações/operações que este mundo foi sendo
construído/habitado. Criou-se um espaço de distinção pela convivência dessa
comunidade.
DEPOIMENTO
Reflexão realizada
por Elektra
Para mim o sitecria é divertido,
educativo e você pode falar com
pessoas no forum, pode construir
casas e até fazer seus próprios
negócios
Nesse AV, de construção mútua, ocorreu um acontecimento
aparentemente contraditório, mas comum nos fenômenos do ciberespaço
6
7
, a
comunidade virtual foi para além do mundo virtual, onde originou-se. Ou seja,
transcendeu o mundo virtual digital, transbordando para outras dimensões de
existência dos participantes: sua vida cotidiana, escolar ou pessoal.
Figura 14 - Esquema das relações entre MV-CV-AV
6
TURKLE, S. Life on the screen: identity in the age of internet. New York: Touchstone, 1995. 346p.
7
RHEINGOLD, H. La Comunidad Virtual: Uma Sociedad sin Fronteras. Barcelona: Gedisa,
1994. 381p.
Esse transbordamento não foi observado a partir de um ou outro
registro, mas do conjunto de todos os "passos" dados pelos participantes. Porém
aqui faço um recorte, com alguns trechos extraídos
8
para que fique mais clara a
idéia. Não tenho, contudo a pretensão de limitar esse fenômeno de
transbordamento a esses "pedaços" de nossa história.
9
Meu amigo Super
Homem eu quero te
comvidar para uma
festa de aniversario.
MENSAGEM NO CORREIO
Data: 11/8/2000
Hora: 14:31:18
Enviado por: pelé
assunto: convite para uma festa
MANIFESTO NO MURAL
Data: 21/9/2000
Hora: 11:21:18
Enviado por: Mística
OI pessoal sou do sitecria na nossa
escola estamos fazendo uma roda de
chimarrao no recreio venha participar
conosco para homenagear todos os
gauchos de PORTO
ALEGRE...atenciosamente MÍSTICA e
FÉNIX e MULHER INVISÍVEL
Desta perspectiva, a interface deixou de existir, o mundo virtual tornou-se
extensão do que se chama mundo real. Somos nós quem determinamos o
8
Os textos e depoimentos dos participantes estão colocados exatamente como nos dados originais,
sem alterações ou correções ortográficas ou gramaticais, para preservar a autenticidade dos
mesmos.
9
Os nomes e apelidos originais foram substituídos por personagens de histórias em quadrinhos,
desenhos animados ou contos de fadas. A correspondência personagem-participante foi aleatória,
não tendo nenhuma relação com suas características.
espaço. A ação dos participantes ali tornou-se extensão dos corpos, não um fim,
mas continuação de seus pensamentos/sentimentos. É como coloca Ascott,
"Toda fibra, todo nódulo, todo servidor na Rede éparte de mim...À
medida que eu interajo com a rede, eu me reconfiguro. Minha
extensao-rede define-me como meu corpo material me definia na
velha cultura biológica. Eu estou sem-peso e sem-dimensão em
um sentido exato. Sou medido pela minha conectividade...
40
Mas em que mesmo essa "conectividade", essa extensão-rede" modifica
nossa forma de nos colocarmos no mundo e de nos relacionarmos com ele? Ela
evidencia mais do que nunca nós, híbridos, seres em construção, em
transformação constante, junto com nosso mundo que criamos.
No encantamento deste AV, tornou-se evidente a hibridação
participantes-tecnologias-dimensões de existência, criando o que podemos chamar
de um artifício.
11
. Não há fronteiras claras do que pertence ao humano, ao
inumano, ao natural, ao artificial.
Porém, enquanto artifício, não busco separar, depurar, purificar o que
está misturado, delimitar fronteiras rígidas e estáticas. Mas buscar um olhar sobre
essa "mistura" mesmo, de seres, máquinas, tempos e espaços mais como fluxo
dinâmico de relações e coordenações de ações individuais e coletivas. É a idéia de
bricolagem como "mistrura teórica", descrita por Lévi-Strauss
12
. Porém, transposto
para nosso caso aqui, em que, como diz Turkle
13
, explorar/habitar a Rede é um
processo de tentar um caminho, tentar outro, fazer conexões, agrupar objetos, é o
10
ASCOTT,R. Cultivando o Hipercórtex. [s.n.], 1996, p.3. fotocópia
11
PEDRO, R.M. Cognição e Tecnologia: Híbridos sob o Signo do Artifício. Orientador: Márcio
Tavares D'Amaral. Rio de Janeiro: UFRJ/ECO 1996. 189p. Tese (Doutorado em Comunicação e
Cultura).
12
LEVY STRAUSS, M. apud. TURKLE, S. Op. Cit.
13
TURKLE, S. Op. Cit.
próprio exercício de bricolagem virtual. E vai além da mistura apenas teórica de
idéias.
Então, como mapear o processo de funcionamento deste AV? A partir
do entendimento de que este artifício criado é um sistema auto-organizativo, sua
totalidade emerge das interações entre suas "partes", e não uma totalidade
transcendente e universal. Essa dinâmica auto-organizativa visa a conservação do
sistema, ou seja, sua sobrevivência.
'Sobrevivência' aqui não relacionada com
x
o mais apto', mas 'àquele que
se adapta'. O sentido de 'adaptação' é vinculado ao de viabilidade
4
. É entendido
como uma compatibilidade entre os organismos como sistemas dinâmicos e seu
meio.
15
A busca da manutenção da existência, a sobrevivência, é uma
constante, desde os organismos mais simples e indiferenciados, desde as menores
escalas até falando do Universo inteiro. E essa busca expressa-se das mais
diferentes formas, até porque para cada criatura e em cada escala as necessidades
para a sobrevivência sao diversificadas.
Dentro dessa perspectiva o conhecimento torna-se estratégia de
sobrevivência, no sentido em que diz da relação do sujeito com os objetos e com
outros sujeitos. A cognição é entendida como uma atividade adaptativa
16
, diz
respeito ao como operamos nossas coordenações de ações e nossas relações para
conhecermos/criarmos nosso mundo
17
.
O conhecimento, assim, depende de estarmos no mundo inseparável de
nosso corpo, nossa linguagem e nossa história social, ou seja, de nossa
corporização
18
.
14
GLASERSFELD, E. A Construção do conhecimento. In: SCHNITMAN, D. Novos Paradigmas,
Cultura e Subjetividade. Porto Alegre: Artes Médicas. 1996.
15
MATURANA, H., VARELA, F. A Árvore do Conhecimento - Campinas: Psy II. 1995. 281p.
16
PIAGET,J. Biologia e Conhecimento. Petrópolis: Vozes, 1973a. 423p.
17
MATURANA, H. Cognição, Ciência e Vida Cotidiana, Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001. 203p.
18
VARELA et al. Opcit.
A proposta não é "eliminar" o corpo em favor de uma "super-mente"
que engloba tudo. É antes disso, um deslocamento nas concepções de corpo,
mente, cognição, para uma compreensão corporizada. Assim, o conhecimento é o
resultado de uma interpretação que emerge de nossa capacidade de compreensão.
Essa capacidade está registrada na estrutura de nosso corpo físico-biológico, mas
é vivenciada e experimentada dentro de domínios de ação consensuais e de uma
história cultural. E é essa compreensão corporizada que nos permite dar sentido ao
nosso mundo.
19
Assim, essa adaptatividade característica dos sistemas auto-
organizativos leva a pensar que é na relação que se estabelece essa origem co-
dependente
20
. Mas se é na relação que pautamos nosso conhecer/viver, é
necessário sermos (e assim somos) sistemas abertos, em interação.
21
Em seu estudo, Piaget
22
desenvolve a idéia de que todos os organismos
são sistemas abertos, e que nessa busca pela sobrevivência, o que é básico em
seu funcionamento é a tendência infinita em tornar-se um sistema fechado. Porém
cria-se um aparente paradoxo: na medida em que determinado organismo busca
tornar-se um sistema fechado torna-se um sistema mais equilibrado, mais estável.
Pois bem, mas quanto mais adapta-se ao meio, mais extende-o, ou seja, o campo
externo também se amplia. E esse processo torna-se infindável, forma um
continuum onde não há caminho pré-estabelecido e a construção é sempre
progressiva. Desse modo,
"... o indivíduo também não é um elemento independente ou uma
fonte primeira, pois é a resultante de múltiplas interações
dependentes da população inteira. Mas é a sede delas e não
somente a resultante, porque a própria população não é mais uma
'força' ou um 'organismo' que pesa de fora sobre os indivíduos,
mas o sistema de todas as interações. Rigorosamente falando, não
há mais por conseguinte nem indivíduos nem grupos, mas
19
id
20
MATURANA, H., VARELA, F. Op. cit.
21
PIAGET, Op. Cit, 1973a.
interações coordenadas, e, quer sejam descritas no interior do
indivíduo ou no grupo considerado como unidade (questão de
escalas), são as mesmas interações. Há portanto dois métodos de
análise, descrevendo os mesmos fenômenos por uma ponta ou
pela outra, assim como se pode analisar um objeto complexo
partindo de um ponto exterior ou interior em se furar um túnel
começando pelas duas extremidades, desde que não se perca o
plano de conjunto.
/23
Mas qual a relação que esta concepção de conhecimento tem com
nossa história de encantamento? 0 AV criado pode ser interpretado como um
sistema aberto e auto-organizativo, que tem na produção de conhecimento seu
"meio" de sobrevivência, de existência. Se entendemos a cognição então, nesse
sentido ampliado e vital, como é possível observar essa estratégia de sobrevivência
no contexto do Ambiente Virtual (MV-CV) constituído?
Para Varela,
"...a cognição depende das experiências originadas na posição do
corpo em diversas atitudes sensório-motoras;...essas atitudes
sensório-motoras estão baseadas em um contexto biológico,
psicológico e cultural mais amplo. Ao usar o termo ação,
desejamos enfatizar novamente que os processos motores e
sensoriais, a percepção e a ação são fundamentalmente
inseparáveis na cognição vivida. Na verdade, não estão só
baseadas nos indivíduos, mas evoluem juntos.
/24
Com essa noção a que Varela denomina enação, a ação dos
participantes é o foco central para podermos fazer emergir os elementos da
dinâmica de funcionamento dessa comunidade no seu acoplamento com o Mundo
virtual Sitecria. Compreendo, assim como Piaget, que
"...na vida social, como na vida individual, o pensamento procede da
ação e uma sociedade é essencialmente um sistema de
23
Ibid., p. 256.
24
VARELA, F. et al. Op. cit. p.203.
atividades, cujas interações elementares consistem, no sentido
próprio, em ações se modificando umas as outras...
/26
Essas ações são atualizadas a cada interação. Nesse sentido os
acoplamentos anteriores sao relevantes. 0 sistema de significações que o
participante trouxe quando iniciou a habitar o mundo especificou uma forma de
acoplamento particular. Nessa dinâmica enativa, podemos dizer, como Pedro que:
"em nossa experiência cotidiana a configuração de problemas
relevantes, longe de serem dados de antemão, emergem a cada
momento...das questões que formulamos...não podemos fazer
qualquer representação, apenas interpretação, uma atividade de
configuração (enacting) em que certos aspectos se tornam
relevantes porque nós os fazemos emergir a partir do senso
comum. *
7
Assim, focando as configurações dos participantes no início de nossa
história, pude identificar três dinâmicas que emergiram. Fica claro que essas
formas de acoplamento têm relação com o histórico de acoplamentos anteriores
dos participantes, pois manteve a configuração dos grupos iniciais:
Grupo A
Neste grupo os participantes criaram outros espaços significativos para
eles e que acreditavam ser importantes para os outros. A preocupação era
simultaneamente contribuir para que a Cibercidade-Sitecria fosse melhor, com
mais recursos, vendo o que faltava e; desenvolver o que gostavam: Casa de
Shows, Estádios de Futebol, Praias, Escola, Teatro, Games, etc
26
PIAGET,J. Estudos Sociológicos Rio de Janeiro: Forense, 1973b. p. 34.
27
PEDRO, R.M. Cognição e Tecnologia: Híbridos sob o Signo do Artifício. Orientador: Márcio
Tavares D'Amaral. Rio de Janeiro: UFRJ/ECO 1996. p. 144. Tese (Doutorado em Comunicação e
Cultura).
Teatro
Estádio de Futebol
Praia Nave Espacial
Figura 15 - Páginas de alguns Projetos dos participantes do Grupo A.
Grupo B
Estavam preocupados em como ocupar os Cantos de maneira ecológica,
preservando o espaço escolhido. Também propuseram sub-ambientes, mas
preocupados em conservar a Cibercidade-Sitecria.
Figura 16 - Páginas de alguns Projetos dos participantes do Grupo B.
GrupoC
Estavam preocupados em como alguém vive num lugar com tantos
absurdos (os Absurdos da Vida). Ao mesmo tempo criaram soluções para viver
com esses absurdos.
Figura 17 - Páginas de alguns dos Projetos de participantes do Grupo C.
Desse modo, cada grupo configurou um tipo de acoplamento possível
de ser diferenciado.
Porém, nas intersecções desses grupos é que vejo uma possível rede de
ações coordenadas que pode ser interessante observarmos. Podemos considerar
essas três dinâmicas gerais como uma forma de descrição dos acontecimentos
neste encantamento. Mas gostaria aqui de fazer uma inversão. Mais do que
mantermos o olhar sobre a continuidade das configurações anteriores ao
acoplamento com o Mundo virtual, ou o que se conservou, proponho que
observemos as transformações. Ou seja, o que emerge se focarmos as
transformações e não o que se manteve?
Com essa questão, volto meu olhar novamente para os acontecimentos,
um outro olhar.
Ainda considerando a ação cognitiva como central para continuarmos
nossa história, como atualizaram-se as dinâmicas no AV, tentando observar as
transformações?
Quando falo em atividades humanas entendo que cada ação implica em
diferentes tipos de interação. Assim, podemos entender que cada ação remete-nos
a um domínio diferente
28
. Um domínio cognitivo distingue-se a partir da ação dos
observadores - de quem 'faz a pergunta" - e de sua história de vida - seus
acoplamentos anteriores, seu sistema de significações, seus esquemas recorrentes.
Cada domínio cognitivo constitui-se de um domínio de ação efetiva (prática ou
teórica), no sentido dado por Maturana
29
. No nosso encantamento en-atuaram o
que chamarei de diferentes domínios de ação.
28
MATURANA, H. Ontologia dei observar: los fundamentos biológicos de la autoconciencia y ei
domínio físico de la existência. In: AMERICAN SOCIETY FOR CYBERETICS CONFERENCES,
Felton, 1988. Conference Workbook Texts in Cybernetics, Felton, 1988. P. 18-23
29
MATURANA, H. Transformation em la Convivência. Santiago: Dolmen Ediciones, 1999. 282p.
DOMÍNIOS DE AÇÃO
Movimentação
Diz respeito ao domínio de ação que modifica a posição do observador
espacialmente, um deslocamento, por exemplo, do corpo físico-biológico e/ou do
corpo-extensao na Rede digital.
De maneira geral, a "fotografia" mostrada no início deste capítulo -
(figura 13) Configuração do Sitecria após interação com participantes- indica uma
movimentação da comunidade que alterou o MV, em termos de visitação de
páginas. Foi possível perceber essas movimentações muito mais nos efeitos de
transformação do que no exato momento em que ocorreram.
Na "fotografia" abaixo (figura 18) podemos observar a proporção entre
participantes e iniciadores/administradores do MV quanto à movimentação ativa de
publicação, de autoria, a chamada transferência de páginas:
Figura 18 - Gráfico com a Proporção de transferências de iniciadores e participantes.
Relacionando os dois tipos de movimentos (visitação e transferência)
podemos confirmar a tendência dessa comunidade em adotar, prioritariamente
uma postura ativa e de autoria, contribuindo para a construção efetiva desse
Mundo virtual.
30
Esses movimentos mais gerais refletiram-se e puderam ser encontrados
nas ações de cada participante. Assim, procurei mapear essas movimentações em
cada manifestação.
Movimentos
recortados de
Chat 06/10/2000
Velma
.253) has joined
the conversation.
Movimento
recortado de
Chat
29/09/2000
She-ra
saiu da conversa.
She-ha diz: Alice do
País das Maravilhas,
estou saindo da sala,
bem mais feliz do que
antes, porque esta
ficando cada vez mais
claro, mais pe no chão.
Tchau.
PEDRO, R. Op. Cit.
Comunicação
Domínio de ação que diz respeito à interação com os outros moradores
através dos diversos recursos digitais, está relacionado com essa ação de
extender-se até o outro através da linguagem consensual. A linguagem não
entendida como representação do mundo, mas ação no mundo.
Comunicação
retirado de
chat de
15/09/2000
Alice diz:
Wilycat, eles
nao precisam
explorar tudo
para começar
a construir
coisas...deixa
a opcao para
eles se
quiserem ja
propor algo...
WilyCat diz:
Alice, os alunos da She-ra
estão explorando cada
ambiente do sitecria, o que
poderá levar muito tempo
ate que visitem tudo. Ja
utilizaram o correio
enviando mensg entre os
alunos e mandaram para o
jornal historias, noticias e
reportagens. Poderíamos
continuar explorando ou
tu acha que devemos
interferir?
OI AMIGOS!! COMO VAI?
GOSTARIA DE SABER SE VOCÊS
ESTÃO GOSTANDO DO SITECRIA?
MEU APELIDO É SUPER HOMEM
MANDE UMA MENSAGEM PARA MIM
PELO CORREIO
MAFESTO DO
MURAL
Data: 24/10/2000
Hora: 08:19:23
Enviado por:
superhomem
MENSAGEM DO
FORUM MIX
Assunto: PRAIA
Por: Homem
Aranha
EU GOSTARIA DE MARCAR
UM CHAT COM ALGUÉM
QUE ESTEJE FAZENDO UM
PROJETO SOBRE UMA
PRAIA QUE TAL QUINTA DE
MANHA LA PELAS 10:00
Reflexão
Domínio no qual fica explícito o pensar do participante sobre alguma
questão, questinando-se e questionando os outros. Aqui é entendida não como
ocorrendo sobre uma experiência, é a própria experiência, é corpórea e aberta, é
operação como ação interiorizada.
31
Eu sei que o meio ambiente está sendo destruído por
alguns homens. Ex: Cortando as árvores,poluindo os
rios,matando os animais,... E também sei que nós
não podemos fazer como esses homens,nós devemos
fazer ao contrario, nós não podemos destruir o meio
ambiente.Nós só podemos denunciar,e também tentar e
convencer estes homens a não cortar estas lindas
árvores,plantas,animais que pressisam desta
natureza. É o meio ambiete,que dá este ar puro,e se
não cuidar não teremos mais este ar pu- ro para
respirar.
Por Bat-girl
[ no
t
í
cia do Jornal do Sitecria]
31
PIAGET,J. O Desenvolvimento do Pensamento: Equilibração das Estruturas Cognitivas.
Lisboa: Dom Quixote. 1977a.230p.
DEPOIMENTO
Reflexão
realizada por
Dafne
[Sitecria] É um lugar aonde as
pessoas podem fazer algum projeto
como eu mesmo fiz e até acessar a
internet. (...) dentro do sitecria
pessoas do mundo todo podem olhar
estes produtos eu mesmo posso
olhar os dos meus colegas.[podem
conhecer] a maneira de usar
agricultura, pecuária...na plantação
de soja, milho e aroz e também
como se cuida dos animais. Foi bom
fazer em grupo e também teve
dificuldades . Ex. um quer fazer mais
os outros e dava uma briga
daquelas.
Considerando esses domínios enatuados, busquei tomar cada ação dos
participantes e localizá-la em um ou mais dos domínios, considerando-se que
houve um transborda mento da CV para além do MV. Assim, emergiram também o
que chamarei aqui de Dimensões de Existência. A cada ação, os participantes
circulavam por entre elas:
DIMENSÕES DE EXISTÊNCIA
Digital
Quando a ação diz respeito exclusivamente ao MV, às relações nesse
universo. Essa dimensão passou a existir no momento em que participantes, em
algumas ocasiões, fizeram uma imersão total no universo digital, no Sitecria.
EU ESTOU
GOSTANDO MUITO
DA CIDADE ASS:
Elektra
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 6/9/2000
Hora: 08:39:06
Enviado por:
Elektra
Trecho retirado
do chat de
06/10/2000
Alice says:
ok, Super
Homem...manda que
eu vou tentar ajudar
vcs...seres
espaciais... hehehe
Super homem says:
EU E MEUS
COLEGAS DO
ESPAÇO
GOSTARÍAMOS DE
FAZER AGUMAS
PERGUNTAS
Consensual
Essa dimensão é a mais "familiar" de todos nós, pois é a que estamos
acostumados a lidar, a mais recorrente, por assim dizer: vida cotidiana, escolar ou
pessoal de cada um dos participantes.
É importante ressaltar que, com a concepção de cognição e
conhecimento que venho adotando nessa história, a idéia de presença plena,
trazida por Varela et af
2
permite-nos aliá-los à experiência corpórea cotidiana, a
mente não se transforma em uma 'entidade' somente abstrata, desvinculada da
atividade do nosso dia a dia. É nesse sentido que essa dimensão emerge em nosso
contexto AV.
Um dia eu e meu irmão estávamos brincando com
um brinquedo novo então fizemos uma competição
e eu ganhei,então ele ficou chorando e não
dei- chou eu comemorar e me empurrou na ponta
de uma mesa então furou a parte de baixo do
meu olho.
por Super Homem [notícia
do Jornal do Sitecria]
MANIFESTO NO
MURAL
Data: 21/9/2000
Hora: 11:14:15
Enviado por: fénix
Para VAMPIRA Nossa escola esta
fazendo uma coisa que se chama-
se chimarreando no recreio. As
pessoas tem que trazer cuia e
bomba a erva é a sora que traz.
De FÉNIX e MULHER INVISÍVEL.
ESCOLA JOSÉ MARIANO BECK
VARELA, F. et al. Op. cit.
Conectiva
Em alguns momentos pude perceber uma "mistura", uma ponte entre
as duas dimensões acima. Esta dimensão é que talvez caracterize mais
marcadamente o que chamamos da criação de um AV-artifício.
Desse modo, transcendo a idéia de imaterialismo que o meio digital nos
traz para um remateríalismo. Uma espécie de "dupla consciência" - estado em
dois campos de experiência diferentes, duas concepções do mesmo
acontecimento, dois lugares separados e remotos ao mesmo tempo. No
interespaço real, virtual, o corpo busca reconstrução, recriação, é extensão do
corpo, "prótese" do self.
33
É no que essa dimensão se atualiza.
Oi Ciclope você acha que
os carros movidos a
alcool é melhor para
nossa cidade? Eu sou
Surfista Prateado tenho
9 anos e quero sua
opinião
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 6/9/2000
Hora: 08:41:55
Enviado por: Surfista
Prateado
assunto: O ALCOOL
DOS CARROS
Jubileu !!! você acha
posivel dia e noite na
mesma hora?
meresponda se puder
beijos Cheetara
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 18/10/2000
Hora: 09:05:04
Enviado por: Cheetara
assunto:: É posivel dia e
noite
ASCOTT,R. Cultivando o Hipercórtex. [s.n.], 1996, fotocópia
Figura 19 - Páginas do Projeto Supermercado Lua e Sol
Dessas ações dos participantes foram construídas algumas formas de
conhecimentos intersubjetivos como produtos, constructos sociais dessa rede de
interações. Aqui, o papel desses conhecimentos foi ao mesmo tempo extender as
formas materiais em formas de ações ou operações que pudessem ser mantidas e
provocar transformações na estrutura do AV e em cada participante na medida em
que foram sendo construídos. Assim, como "conteúdos" desses conhecimentos
emergiram os que seguem abaixo.
CONHECIMENTOS INTERSUBJETIVOS
1. Pessoal
Quando o participante está buscando ou relatando um conhecimento
que identifique, que construa uma imagem identitária de si e do outro, ou
confirme um conhecimento prévio já existente sobre o outro, (como é, quantos
anos, etc), diz respeito a "quem sou eu" e quem é o outro"
2. Social-convencionado
Relacionado com normas de comportamento das relações sociais tanto
trazidas da dimensão consensual como criadas no digital, tais como cumprimentos,
brincadeiras ou outras formas que possam aproximar as pessoas.
3. Técnico
Diz respeito a aspectos da manipulação da informática, da apropriação
tecnológica dos recursos utilizados para interagir no AV.
4. Contextual
Tem relação com o AV e o habitar/utilizar seus recursos, gerenciar seus
espaços coletivamente com os demais moradores.
5. Cotidiano
Acerca dos temas diretamente relacionados às ações desenvolvidas
pelos moradores na vida cotidiana dentro do Sitecria (seus projetos) e dos
conteúdos trazidos de seu dia a dia no espaço consensual não digital.
6. Cooperativo/colaborativo
Relacionado com conhecimento construído a partir das trocas, das
operações em comum (cooperação)
34
e de interações que possibilitaram outras
trocas ou geração de outros produtos.
A partir desses três "aspectos" do que chamarei, indicadores
enatuados, temos uma rede de relações.
34
PIAGET,! Op. Cit. 1977a.
35
"...[indicador] para designar aquellos elementos que adquieren signification gradas a la
interpretation del investigador, es decir, que su signification no es asequible de forma directa a la
experiência, ni aparece en sistemas de correlation. En este sentido lo subjetivo y lo objetivo
(utilizamos este ultimo término en el sentido estricto de designar aquello que proviene dei objeto),
se integran en una unidad indisoluble que solo tiene valor dentro de los limites del processo en que
resulta producido. El valor do indicador, fuera del processo de conocimiento que lo genera, solo
puede elaborarse en el curso de los procesos mas générales comprometidos con el desarollo de la
teoria" (REY, F. Investigador» en Pesquisa Qualitativa: rumbos y desafios. São Paulo:
EDUC. 1999. p.113)
Domínios de ação Conhecimentos Dimensões de
intersub
j
etivos Existência
Movimentação Pessoal Digital
Comunicação Social convencionado Consensual
Reflexão
Técnico
Contextual
Cotidiano
Coo
p
erativo/colaborativo
Conectiva
Agora podemos pensar o que esses indicadores apontam, não enquanto
elementos isolados, mas sobretudo nas suas relações. Nessa rede, quais os nós
que ficam em evidência na constituição deste AV que estamos acompanhando?
Para onde a dinâmica de ações dessa comunidade organizou-se?
"Estamos entrando na Mente-mundo, e nossos
corpos estão desenvolvendo a faculdade de
ciberpercepção - que é a amplificação e
enriquecimento tecnológicos de nossos poderes
de cognição e percepção. Esta nova faculdade é
ampliada pelo computador e telematicamente
extend ida... A rede hospeda o futuro que, a
propósito, estará tão distante de nosso presente
eletrônico e imaterial como nós agora estamos
do passado mecânico e material. Estamos nos
movendo rumo a uma radical re-materiaJização,
através da malha de bio-eletrônica e
nanotecnologia, rumo às reconfigurações das
estruturas moleculares de nosso mundo,
redesenhando a base atômica da realidade que
eu poderia chamar Natureza II (a versão beta).
O universo implicado na Rede está se
desdobrando, como David Bohm, em uma radical
re-materialização
M
O QUE FICOU ENCANTADO?
Nesse momento retomo um ponto de nossa história em que apresentei
os três eixos sócio-construtivistas
2
da dinâmica de uma comunidade
3
. Porém no
nosso caso, com o transbordamento da comunidade, vejo a possibilidade de
observarmos esses eixos na criação do artifício AV.
1
ASCOTT,R. Cultivando o Hipercórtex. [s.n.], 1996, fotocópia
2
Veja capítulo Os alquimistas e seus passos: quem participou do encantamento e onde ficou
registrado. Figura 12
3
SHAW, A. Social Constructionism and the Inner City: Designing Environments for Social
Development and Urban Renewal. Disponível na INTERNET via
http://el.www.media.mit.edu/people/acs/thesis.txt Arquivo consultado em 15/04/2000.
Figura 20 - Esquema da configuração do Ambiente Virtual enatuado - processos.
De forma mais precisa, podemos localizar os indicadores
4
que
emergiram organizados nessa dinâmica:
Figura 21 - Esquema da configuração do Ambiente Virtual enatuado - indicadores
Esse é um mapeamento "estático" da transformação ocorrida. Mas
como podemos observar a dinâmica sem transformar essa totalidade em
fragmentos desconexos?
Somente nas relações, nos movimentos desses indicadores é que
podemos fazer emergir a dinâmica para a qual esse AV se direcionou, ou seja, os
seus atratores. Chamo de atratores as relações entre os indicadores mais
recorrentes, e portanto, para onde a dinâmica do sistema AV é atraído, as "regiões
onde o comportamento de um sistema se estabelece'*
A partir do mapeamento
6
de cada indicador nos registros desse
encantamento
7
foi possível construir um gráfico
8
(figura 22) que nos dá algumas
pistas da dinâmica que se constitui como prioritária:
Figura 22 - Gráfico da rede dos indicadores pelas Dimensões de Existência
4
Veja capítulo O Encantamento: o que emergiu para ver descrição dos indicadores.
5
PEDRO, R.M. Cognição e Tecnologia: Híbridos sob o Signo do Artifício. Orientador: Márcio
Tavares D'Amaral. Rio de Janeiro: UFRJ/ECO 1996. p.100 Tese (Doutorado em Comunicação e
Cultura).
6
Para acesso aos dados freqüenciais quantitativos veja, tabelas construídas a partir das ações dos
participantes nos registros coletados: Domínio de Ação x Conhecimento Intersubjetivo (anexo I).
7
Veja as fontes de dados no capítulo Os Alquimistas e seus passos: quem participou do
encantamento e onde ficou registrado.
8
Gráfico construído a partir dos dados da tabela freqüencial quantitativa das ações dos
participantes nos registros coletados - Dimensões de Existência x Domínios de
Ação/Conhecimentos Intersubjetivos (anexo II). Para construção do gráfico foi utilizado o software
Microsoft Excel97, Copyright 1985-1997 Microsoft Corporation.
Assim, sem pretensão de qualquer precisão estatística, podemos
observar as três dimensões de existência e suas características em cada domínio
de ação. Podemos fazer, na figura acima, uma diferenciação entre os três domínios
através de cores:
Movimentação:
Comunicação:
Reflexão:
Observando a figura 22, temos um quadro
geral dos domínios de ação em cada dimensão. A prioridade de ação foi no
domínio da comunicação. Foi por essa via que houve possibilidade de realizar as
distinções entre as dimensões de existência.
Vamos tentar compreender melhor essa(s) dinâmica(s). Cada vez mais
tento aproximar a "camera", dando uma espécie de zoom sobre nossa história, não
só simplesmente relatada, mas revivida e atualizada numa posição de observador
distinta.
9
Antes, gostaria de salientar aqui que os domínios, dimensões e
conhecimentos que enatuaram não aparecem isolados. Suas fronteiras não são
claras, tendo a maior parte dos momentos uma imbricada rede desses indicadores.
Mesmo assim, aceito correr o risco de "fragmentar" os acontecimentos para
tentarmos ter uma visão mais clara dessa rede.
Tomo cada dimensão de existência para tentarmos observar o que
chamarei de "caminho" de inclusão
10
dos conhecimentos intersubjetivos
9
MATURANA,H. Ontologia dei observar: los fundamentos biológicos de la autocondenda y el
domínio físico de la existência. In: AMERICAN SOCIETY FOR CYBERETICS CONFERENCES,
Felton, 1988. Conference Workbook Texts in Cybernetics, Felton, 1988. P. 18-23
10
Esses gráficos foram construídos a partir dos Gráficos Inclusivos (veja anexo III) gerados no
software CHIC Versão 1.1. Copyright 1999. Régis Gras. IRMAR: Rennes. Este software foi
alimentado com os dados das tabelas freqüenciais quantitativas - Domínio de Ação x Conhecimento
Intersubjetivo em cada Dimensão de Existência (veja anexo I). Através de seu tratamento
enatuados. O que podemos dizer para clarear mais as dinâmicas em cada uma?
Em cada dimensão de existência foi possível fazer um intercruzamento dos
domínios de ação com os conhecimentos intersubjetivos, na forma como
emergiram dos registros coletados durante o encantamento.
11
DIMENSÃO DE EXISTÊNCIA CONSENSUAL
Podemos observar na figura 22 que a comunicação foi prioritária na
dimensão CONSENSUAL pela própria forma como registramos os fatos dessa
história e pela forma como levantei esses fatos/dados
12
.
estatístico é possível estabelecer níveis de implicação e inclusão entre as variáveis, com geração
dos gráficos. Mais detalhes em GRAS, R. L'Implication Statistique Paris: La Pensée Sauvage,
1996, 313p.
11
Veja tabelas dos dados freqüenciais quantitativos - anexo I.
12
Veja as fontes de dados no capítulo Os Alquimistas e seus passos: quem participou do
encantamento e onde ficou registrado.
13
Veja Gráfico Inclusivo - CHIC - a partir do qual foi criado em Anexo III-a.
mesmo grupo inicial
14
, que já se conheciam e que já tinham algum vínculo
presencial. Esse fato está relacionado com a própria característica dessa dimensão,
que é a mais recorrente e mais distinguida pelo histórico de acoplamentos dos
participantes.
Nessa dimensão de existência, as normas sociais são um tipo de
conhecimento que parece estar mais enraizado e já "plenamente" construído.
Assim, na interação somente apareceu em momentos pontuais, sem contudo
precisar ser construída a cada instante.
Houve o que Piaget
15
nos traz enquanto condições necessárias para
existir uma troca interindividual: escala comum de valores, igualdade geral dos
valores (conservação) e reciprocidade. No mundo criado por nós nessa dimensão
consensual já temos estas condições previamente construídas ou em processo de
construção mais equilibrado e estabilizado até por ser mais recorrente.
Capitão America
says:
@RAPUNZEL
DESCULPE PELA
BRINCADEIRA
Rapunzel
says: está
desculpado
Capitão
América
Mulher
Maravilha says:
Capitão
América a
Rapunzel é
gordinha mais
não é feia ok!
Trecho do chat
de 05/10/2000
Mulher Maravilha
says:
Capitão América
ainda bem que vc
reconheceu que foi
mal a brincadeira
Capitão
América
says:
@rapunzel
gorda
14
Veja os grupos iniciais em Os Alquimistas e seus passos: Quem participou do encantamento e
onde ficou registrado.
15
PIAGET, J. Estudos Sociológicos. Rio de Janeiro: Forense, 1973b. 231p.
Nesse registro acima podemos observar um dos participantes, Capitão
América, fazendo uma brincadeira com outra, Rapunzel . Logo em seguida, com a
interferência de outra colega, Mulher Maravilha, toma consciência
16
da
possibilidade de ofender a colega e pede desculpas. Rapunzel aceita o pedido.
Tanto essa tomada de consciência
17
de Capitão América como a aceitação de
Rapunzel demonstram uma escala comum de valores
18
e regras mais ou menos
constituídas de como proceder em uma situação social como esta. Todos "se
entendem", podemos dizer, mesmo que não compartilhem a mesma opinião.
Além disso, o conhecimento de si mesmo, a noção de identidade parece
fazer parte, estarincluído nas convenções socialmente construídas. Ou seja, no
mundo consensual somos o que já nos constituímos de acordo com o socialmente
aceito.
O conhecimento de quem é o outro também parece ser mais claro na
dimensão consensual, pois temos outros parâmetros de referência presenciais.
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 18/8/2000
Hora: 14:15:15
Enviado por: bat-
girl assunto:
conversa
Oi, mulher gato você
é legal d+ e você é
também é querida.
DE:BAT-GIRL PARA:
MULHER GATO
16
PIAGET, J.. A tomada de consciência. São Paulo: Melhoramentos e ADUSP, 1977b. p. 249
17
Ibid.
18
PIAGET,J. Op. at 1973b.
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 18/8/2000
Hora: 13:59:53
Enviado por:
garrincha
assunto: macadori
Ai super homem seco
o se você não comer
você vai desapareser
tahnm
Nos registros acima podemos identificar que, como já coloquei
anteriormente, essa dimensão emergiu a partir das relações já existentes entre os
participantes em cada grupo. Assim, já tinham alguns valores comuns e já tinham
outros parâmetros de quem é o outro a partir da interação presencial.
Podemos pensar até mesmo nos papéis a que cada um "chegou"
desempenhando: aluno, professor, pesquisador, técnico. Assim, cada participante
já trazia sua identidade razoavelmente definida, a partir do que se tem socialmente
estabelecido que seja cada um desses papéis. Abaixo podemos ter, como exemplo,
uma pequena amostra que evidencia a continuidade, nessa dimensão, da relação
professor-aluno.
Oi Velma, adorei a sua
mensagem, espero que
continue interessada no
trabalho do computador, pois
vai te ajudar muito
futuramente. Um abraço
Prof. WilyCat
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 18/8/2000 Hora:
14:30:36 Enviado
por: Wily Cat
assunto: Adorei
Oi professora
Wily Cat é bom
continuar
frequentando esta ]
escola linda (...)
MENSAGEM DO CORREIO
Data: 18/8/2000 Hora:
14:00:44 Enviado por:
velma assunto:
O conhecimento da vida cotidiana de cada um incluiu esses outros
conhecimentos como já fazendo parte do que estava estabelecido. Na dimensão
consensual esta lógica ficou evidenciada e posso dizer, quase óbvia. Mas ainda
assim, parece-me importante frisá-la.
Aqui nestes registros podemos observar que a vida cotidiana de cada
um está pautada sobre conhecimentos prévios de quem é o outro participante e
com um histórico de interações anteriores, um vínculo já existente.
Bat-girl vamos
brincar no
recreio.
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 11/8/2000
Hora: 14:46:23
Enviado por: bela
adormecida
Minha amiga mulher
gato eu quero que
tu venha no meu
aniversario
MENSAGEM DO CORREIO
Data: 18/8/2000 Hora:
14:11:53 Enviado por:
pelé assunto: Convite
para aniversario
Como já venho destacando durante todo esse relato de encantamento,
a interação, as relações são fundamentais, e portanto, o conhecimento
cooperativo/colaborativo inclui a construção de todo conhecimento cotidiano.
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 1/11/2000 Hora:
16:36:46 Enviado por:
cinderela assunto::
HOJE DE
MANHÃ
Querida Mulher Maravilha, Hoje estou
muito triste. Eu não estou mais
aguentando minha vida, meu pai
pega no meu pé, minha mãe pega no
meu pé ,meu irmão passa o dia todo
me enchendo o saco por causa
daquela história com o sadol, e agora
minha amiga ele está muito
ciúmento,por qualquer coisa já me
enche o saco.O pior Mulher Maravilha
é que hoje de manhã nós brigamos,e
agora se fizermos as pazes será só
segunda feira, quatro dias
brigados,quatro dias sem ele. Mulher
Maravilha me ajude por favor, eu
confio muito em você. Mil beijos,
wolverine vc é o máximo pena
que não somos mais amigos
não queira ser o além de vc
antes de amar alguém ame a
si próprio não fasse de sua
vida uma estrada onde todo
mundo passa e ninguém fica
um abraço de sua ex amiga
Mulher maravilha.te adoro
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 24/8/2000
Hora: 16:49:35
Enviado por:
mulher maravilha
assunto: advinha
Nos extratos acima não é possível observar a ação própria de
cooperação. Mas considero interessante observarmos a existência de um histórico
de relações que não aparece explicitamente aqui, mas que pode ser vislumbrada.
Assim, nesses dois casos a cotidianidade de cada um foi trazida e emergiu de uma
relação de troca e cooperação.
Mas como estamos falando aqui de uma dimensão consensual, que foi
pautada nas relações presenciais? Nesse relato, a dimensão consensual só pôde
tornar-se visível através do meio a partir do qual esse AV iniciou-se: a via digital.
Assim, os conhecimentos do cotidiano puderam ser expressos pelos participantes
através de uma apropriação técnica.
Nesse sentido, o que parece ser incoerente, ressalta mais ainda o
caráter dessa dimensão: sua concretude e proximidade com o nosso "mundo
conhecido". Sem um conhecimento técnico, os participantes não teriam
possibilidade de enviar mensagens, navegar pelo Sitecria, nem fazer emergir essa
dimensão consensual dentro desse AV.
DIMENSÃO DE EXISTÊNCIA DIGITAL
Peia figura 22, observamos que, na dimensão DIGITAL o domínio mais
presente foi o da movimentação. Essa dimensão emerge a partir desse domínio,
pois foi construído/criado a partir dele. Assim, sem as movimentações dos
participantes não haveria possibilidade dessa dimensão existir. É o espaço
privilegiado para essa ação dos participantes.
Como então os conhecimentos em processo de construção
coordenaram-se, criando uma rede de significações?
Figura 24 - Gráfico da Dinâmica de Relações entre os conhecimentos intersubjetivos -
Dimensão DIGITAL
Assim como na dimensão consensual, o conhecimento social
convencionado é trazido, de alguma forma já constituído. Porém, na dimensão
digital, a noção identitária que cada participante trouxe de seu histórico anterior
inclui as normas sociais. Foi, podemos dizer, a bagagem com o qual cada um
chegou para tornar-se habitante do Sitecria. Além disso, nessa dimensão agregam-
se os "códigos" de comunicação criados na própria dimensão digital.
19
Aqui temos um trecho de um chat em que podemos observar algumas
perguntas "básicas" da netiqueta
20
para iniciar uma conversa digital. Além de
"emoticons", que são símbolos sinalizando alguma mensagem, específicos da
dimensão digital e que já estão estabelecidos como parte de uma conhecimento
social-convencionado.
19
Veja Gráfico Inclusivo - CHIC - a partir do qual foi criado em Anexo III-b.
20
Denominação dada às regras de etiqueta na net.
Na interação os participantes puderam atualizar a idéia que tinham de si
Mulher
maravilha
says:
Da onde vc é?
Branca de
Neve says:
Sim, pode
ser :)
Mulher maravilha
says:
Branca de neve vc quer
teclar comigo?
Branca de neve says:
onde moro? Eu moro em
Porto Alegre e agora estou
no LEC, pois temos um
encontro marcado com os
moradores do Sitecria... e
vc?
Branca de Neve
says:
Oi MulherMaravilhaü
Trecho do CHAT
de 05/10/2000
Mulher maravilha
says:
Eu estou aguardando
o pessoal
Mulher
maravilha says:
Oi Branca de Neve
tudo bem?
mesmos e dos outros dentro do contexto do AV constituído. Foi como se cada um,
em sua ação, fizesse um re-conhecimento de si nesse contexto distinto do
habitual, até por este contexto AV estar em construção explícita.
Mil desculpas, Uni! Sou
mesmo apressada e nem
me dei conta que vc podia
ser O UNI...:-0 Espero que
vc não tenha ficado bravo
comigo! ;-) Beijos, Alice
MENSAGEM DO CORREIO
Data: 6/11/2000 Hora:
22:34:30 Enviado por:
Alice assunto::
Desculpas
Alice voce me chamou
de querida mas eu sou
espada!!!!
MENSAGEM DO CORREIO
Data: 1/11/2000 Hora:
08:20:57 Enviado por:
uni assunto:: quem
sou
Batman says:
Ah, esqueci, e a
WilyCat
Batman says: Oi
Alice, agora
consegui entrar.
Os alunos estão
ud\sando o teclec
Trecho do
CHAT de
06/10
Alice says:
o Teclec_ (estou com
teclado
desconfigurado...sem
ponto de
interrogação)
Alice says:
OI, Batman!
No caso destes recortes, podemos identificar a necessidade de, nessa
dimensão digital, estarmos a todo tempo nos re-construindo para nós e para o
outro. Esse processo de a todo tempo estarmos comunicando explicitamente
aspectos de nós mesmos que são considerados como já dados na dimensão
consensual, faz com que tomemos consciência a todo instante de quem somos. Na
dimensão digital parece-me que estamos em constante, rápido e explícito processo
de construção de nossa identidade (se é que podemos falar de apenas uma)
21
Além disso, a criação do próprio contexto AV
22
foi sendo gerenciada e
negociada pelas interações. Na troca abaixo, vemos o gerenciamento de espaços
dentro do Sitecria por uma das participantes:
21
TURKLE, S. Life on the screen: identity in the age of internet. New York: Touchstone,
1995. 346p.
22
Veja o capítulo O Mundo virtual a ser encantado e o capítulo O encantamento: o que emergiu?
Data: 23/8/2000
Hora: 16:52:27
Enviado por:
alice
OI, Elektra! Que bom que
estah morando aqui nesta
cibercidade! ;-) O que esta
achando?
Bom Alice, eu estou
gostando ! MAIS ESTAS
MENSAGENS DEVE MANDAR
PELO CORREIO
MANIFESTOS
DO MURAL
Data: 6/9/2000
Hora: 08:19:41
Enviado por:
elektra
Ola! Moradores!
Elektra
Data: 23/8/2000 Hora:
08:44:23 Enviado por:
elektra
Essa volta a si mesmo atualizada em contexto diferente possibilitou o
desenvolvimento de noções de cooperação/colaboração através da ação mesma
dos participantes. Ficou evidente, neste caso, que tanto o conhecimento pessoal
como das normas socialmente convencionadas são construídos ou re-conhecidos a
partir da interação com os demais participantes.
A forma como o conhecimento da vida cotidiana foi trazida pelos
participantes aponta, sobretudo para uma relação com a apropriação técnica para
agir na dimensão digital. Ou seja, não foi central nessa dimensão, mas não
podemos negar que faz parte de seus sistemas de significações e portanto,
interfere na interação nesse domínio. As tecnologias digitais, como diz Turkle
23
são
extensão da construção mental do pensamento de cada participante.
Assim, em vários projetos, os participantes, para efetivar uma
comunicação a partir da dimensão conectiva desencadearam uma movimentação
na dimensão digital. A ação de fazer páginas, criar links para um Banco ou Igreja
TURKLE, S. Op. Cit.
que criaram nessa dimensão faz parte de um conhecimento da vida cotidiana que
foi trazido pela apropriação técnica.
Aqui ocorreu algo semelhante ao que ocorreu na dimensão consensual:
o conhecimento cotidiano apareceu através da apropriação técnica, porém, de uma
maneira menos marcante.
DIMENSÃO DE EXISTÊNCIA CONECTIVA
Na dimensão conectiva, pela "fotografia" (figura 22) podemos observar
um maior equilíbrio entre os três domínios de ação. Ressalto aqui o maior nível de
reflexão com relação aos demais domínios. Parece apontar para uma maior
possibilidade de reflexão pela própria circulação entre as diferentes dimensões.
Essa possibilidade de diferentes posições de observador provoca uma mistura, que
parece criar mais condições para os participantes refletirem.
Vejamos como isso fica de maneira um pouco mais detalhada
24
:
24
Veja Gráfico Inclusivo - CHIC - a partir do quai foi criado em Anexo III-c.
Na dimensão de existência CONECTIVA, assim como na Digital, o
conhecimento das normas sociais convencionadas existem a partir da construção
prévia/existência de um padrão identitário que cada participante trouxe consigo. O
AV pode ser experienciado como um espaço entre o self e o não-self, nessa
fronteira não mais tão clara e marcada.
25
Garrincha sera
que vo joga
futebol
igual a ele
MENSAGEM NO CORREIO
INTERNO
Data: 18/8/2000 Hora:
13:47:27 Enviado por:
Ciclope assunto:
Perguntas
Nessa mensagem o participante traz uma idéia que tem de Garrincha-
jogador (de nossa Dimensão consensual) e "transporta" para outro morador com o
mesmo codinome. Esse movimento de buscar "fora" do MV e explicitamente trazer
para "dentro" é uma coordenação entre as dimensões digital-consensual que cria
esse espaço de conexão.
A(s) "identidade(s)" mostrou(aram)-se visível(is) nessa dimensão
através da apropriação técnica dos recursos. Esse conhecimento/habilidade
desenvolvido foi o que tornou possível a cada um atualizar-se nas suas ações
dentro do AV, na circulação entre os mundos (digital e não-digital). Assim, por sua
vez, o conhecimento técnico foi atualizado dentro e pelo contexto do AV.
TURKLE,S. Op. Cit.
Fera says:
Alice eu gostaria de saber se voce poderia colocar as casas
devolta etirar afabrica e colocar um campo de futbol
Alice says:
Fera, quais casas vc queria que voltassem_
Fera says:
Alice todas as casas - a casa pobre
Alice says:
Fera, vc quer tirar a casa pobre_
Fera says:
resposta sim vc acertou
Alice says:
POrque Fera_
Fera says:
para dar as pessoas pobres uma vida mehlor
Alice says:
Fera, talvez vc tenha razão...que acha que marcarmos uma
conversa (chat) sobre isso com os outros moradores^
Fera says:
ótima ideia horariol3:15 as 15:00
Alice says:
Fera, vcs nao podem na quarta ou quinta_
Fera says:
quinta as 10:00 no chat esta hora esta bem
Alice says:
Fera, esta ótimo...Fera..coloca esse convite la no Forum Mix
Fera ([email protected]3) has left the conversation. Fera
([email protected]) has joined the conversation. Fera says:
Alice ja coloquei o anuncio no forom mix (...)
Nesse trecho de um chat vemos a combinação entre dois participantes,
num movimento cooperativo. E a movimentação de Fera - sair do chat, ir ao
FórumMix e retornar ao chat - demonstrou conhecimento técnico e contextual,
com desenvoltura para gerenciar e circular entre os ambientes e entre as
dimensões consensual e digital. É nesse entre que se constitui a dimensão
conectiva.
A ação no contexto AV somente foi possibilitada, como vimos, através
da cooperação/colaboração entre os participantes. Nessa dimensão a relação
conhecimento contextual - conhecimento cooperativo/colaborativo esteve muito
próxima, pois o AV só pôde ser construído, só passou a existir de fato a partir das
interações entre os participantes. Estes, por sua vez, também tiveram a
necessidade de construir conhecimentos cooperando, colaborando. Há uma
circularidade própria da dinâmica de definição recíproca.
26
27
Vamos observar esse movimento tendo como foco o projeto de uma das
participantes. Rapunzel cadastrou seu projeto Escola no Banco de Projetos da
Prefeitura do Sitecria
APELIDO PROJETO PARCERIA
CERTEZAS
PROVISÓRIAS
DUVIDAS
TEMPORÁRIAS
ONDE
MODELC
DA CASA
Rapunzel Escola
Com meus
amigos
Eu sei que tem
que ter
funcionários
Se tem que Ter
posto de saúde
Floresta Casa02
A preocupação de Rapunzel era de como construir uma escola que
agradasse a todos os outros moradores do Sitecria. Assim, criou uma página com
um formulário que seria preenchido pelos outros participantes, dando sugestões e
contribuindo para a escola.
26
PIAGET, J. Op. Cit. 1973b
27
MATURANA,H., VARELA, F. A Árvore do Conhecimento - Campinas: Psy II. 1995. 281p.
Como sua preocupação era a troca com os outros moradores não quis
"perder tempo" com a parte estética de sua escola. Aqui quero destacar também o
que Turkle
28
diz quanto às possibilidades de aprendizagem com as tecnologias
digitais. Nessa Ecologia Cognitiva existem várias formas de aproximação d/nesse
objeto técnico, o que possibilita a manifestação dos diversos modos de aprender.
Alguns participantes priorizaram o aspecto visual, estético de seu projeto e outros,
como Rapunzel, preocuparam-se com a interatividade ou o "conteúdo em si".
No caso de Rapunzel, seu formulário precisava de uma programação em
CGI - Common Gateway Interface - que fosse adaptada às suas necessidades.
Para isso, eu, como pesquisadora e administradora tentei auxiliá-la,
disponibilizando uma rotina de CGI já utilizada por outro morador no projeto de
Estádio de Futebol. Porém essa adaptação não estava tendo sucesso. Mesmo
assim, Rapunzel recebeu contribuições por outras vias que não a sua própria
página.
TURKLE,S. Op.Cit. 1995.
MENSAGEM DO
CORREIO
Data: 24/8/2000
Hora: 16:32:51
Enviado por: mulher
maravilha
assunto: advinha
Rapunzel eu acho que uma
escola deve ter bastante
funcionários p/conserva-la
sempre limpa e também tem
que ter um refeitório limpo e
organizado é o penso que
deve ter ass: Mulher Maravilha
sua amiga
Essa contribuição demonstra a coordenação das duas dimensões na
ação de comunicar.
É importante salientar que além da ação visando
cooperação/colaboração, os participantes demonstraram flexibilidade para interagir
uns com os outros nos diversos espaços interativos oferecidos.
Em um dos chats outros moradores interessaram-se por construir uma
escola. Abaixo selecionei as interações que dizem respeito a esse tema:
Trecho
selecionado
do CHAT de
06/10/2000
Batman says:
EU QUERO FEZER UMAS ECOLAS?
Alice says:
Batman, vc sabe que ja tem uma pessoa fazendo uma escola_
Alice says:
Batman, vc quer fazer junto com ela_
Batman says:
QUEM E ESTA PESSOA E COMO E FASO PARA ME COMICAR COM ELA?
Alice says:
Batman, o apelido dela eh RapunzeL.o correio nao esta funcionando,
mas pode colocar recado pra ela no mural ou no Forum Mix
Batman says:
DA ONDE E A RAPUNZEL E DE QUE ESCOLA?
Alice says:
Batman, vai la na Prefeitura e clica em Cadastro de Moradores..aparece
o nome dela la... Batman [email protected].71.253) has left the
conversation. Guest52939 (JAVGUEST@200.132.71.253) has joined the
conversation. Guest52939 says:
EU QUERO TER 1 CHAT COM A ESCOLA MARIANO?
Alice says:
Guest52939...faz um convite no FOrum Mix Guest52939
(JAVGUEST@200.132.71.253) has left the conversation.
E, como podemos ver pela movimentação de saída no extrato do chat, o
grupo de participantes interessado vai para o FórumMix. Abaixo estão algumas
interações que ocorreram nesse fórum em função de combinações para o chat
sobre a construção da Escola:
MENSAGEM DO FORUM MIX
Assunto: sobre rescola por:
Colossus
Rapunzel eu queria te ajudar a
montar esta escola com alunos,
professores, diretores...falo com voce
Quinta feira, dia 19 as 9e35 DIA 19
NO CHAT QUE MARCAMOS COM
VOCÊS.
Colossus não estou
conseguindo entrar em
nenhum dos dois endereços
estamos no uol, cidades e
estado. RS Doa3.
MENSAGEM DO
FORUM MIX
Assunto: sobre a
escola para Colossus
por: rapunzel
Colossus você e quem
quiser podem ajudar na
escola
Porém, observando a figura 25, como podemos entender que o
conhecimento cotidiano englobe todos os demais nessa dimensão conectiva? Aqui
penso ser um dos pontos importantes na diferenciação com a dimensão
exclusivamente digital. Numa perspectiva de rematerialismo
29
da dimensão
conectiva, o conhecimento cotidiano amplia-se, tornando parte do AV. É
transformado e transforma.
Na seqüência trago um trecho de um chat em que as questões do
mundo consensual e digital se intercruzam e provocam reflexões nos participantes.
29
ASCOTT,R. Op. Cit.
Trecho do
CHAT do dia
06/10/2000
hulk says:
oi alice eu quero saber como alugar uma casa homem borracha
(jav[email protected].253) has joined the conversation. Alice says:
hulk, nao precisa alugar, nao...vc pode ter o seu espaço...eh so decidir o que quer
fazer no Sitecria e colocar no cadastro de projetos...;-) hulk says:
alice como podemos fazer dinheiro
Alice says:
Hulk, nao sei...como vc acha que poderia ser o dinheiro_ He-
man says:
Alice como eu vendo eu me sustento
Alice says:
He man, ainda nao existe dinheiro no Sitecria...nao sei como poderia vender...
Homem Borracha says:
eu homem borracha quero diser ce eu posso botar casas de alugel
Alice says:
Homem borracha, como vc cobraria o aluguel.
Homem borracha says: Homem borracha eu
cobraria con dinhero. Alice says:
Homem borracha, e como seria esse dinheiro_
Homem Borracha says: u cobraria con Alice
says:
Homem Borracha, como vc pensa que pode ser o dinheiro no Sitecria_
Homem Borracha says: verde coma minha foto Alice says:
Homem Borracha, mas como vc vai passar o dinheiro de uma pessoa para outra_
Homem Borracha says: vocedecide Alice says:
Homem Borracha quem quer colocar dinheiro na cidade eh vc.como eu posso
decidir_
Homem Borracha says: fazendo
un banco de dinhero Alice
says:
Homem Borracha, quem fabrica o dinheiro_
Homem Borracha says: a fabrica de papel
Alice says:
Homem Borracha..mas no sitecria nao tem fabrica de papel..nao tem nem papel
eu acho...
Homem Borracha says:
tiau Alice Alice says:
tchau, Homem Borracha...quero saber como vai resolver para colocar dinheiro no
Sitecria.:-)
Nesse sentido, a dimensão conectiva parece oferecer maior
possibilidade de transformação em nosso cotidiano. A virtualidade do AV passou a
fazer parte do cotidiano, assim como criou-se uma espécie de cotidianidade
própria do AV.
Na continuidade da discussão ocorrida no trecho de chat mostrada
acima, Homem Borracha retoma, respondendo a questão de como seria o dinheiro
no Sitecria, ao mesmo tempo que traz uma questão do seu cotidiano na dimensão
consensual - a festa de Halloween. É nesse sentido que parece apontar para a
emergência de uma cotidianidade diversa, que fica nessa dimensão conectiva.
Qual é a mascara? hoje é dia
de halloween!!!! O dinheiro
vai ser verde com a minha
assinatura e com a minha
foto ciao
MENSAGEM DO CORREIO
Data: 31/10/2000
Hora: 09:53:35
Enviado por: homem
borracha
assunto:: festa de halloween
Em outra situação ocorreu o mesmo fenômeno, em um dos projetos:
Vivendo Solitário.
APELIDO NOME PARCERIA
CERTEZAS
PROVISÓRIAS
DUVIDAS
TEMPOR
Á
RIAS
ONDE
MODELO
DE CASA
Lion Vivendo
Solitário
Com
ninguém
Eu já sei que as
pessoas podem se
comunicar
mandando e-mail e
ligações e atras
disso elas não
precisam sair de
casa.
Eu quero saber se
o homem
consegue viver
muitos anos
solitário
floresta Casa03
Nesse caso a perturbação partiu da dimensão digital, pois as questões
emergiram da navegação pelo Sitecria. Com a pesquisa realizada, Lion conseguiu
chegar a algumas conclusões e reflexões com relação à vida na dimensão
consensual. Utilizou-se também da interação no correio para trocar idéias com os
outros moradores. Assim, Lion circulou a maior parte do seu habitar pela dimensão
conectiva.
Essa dinâmica de ir e vir, essa mobilidade própria dessa dimensão,
pareceu caracterizar uma maior e melhor consciência, flexibilizando a rigidez
identitária e única para evidenciá-la múltipla e diversificada.
Como tentei tornar evidente, os atratores apontaram para uma dinâmica
na qual a possibilidade de rematerialismo que a dimensão conectiva proporcionou
trouxe mais e melhores relações com o domínio da reflexão. Considerando este
domínio como fundamental no processo de tomada de consciência de cada
participante e da possibilidade de uma comunidade ativamente construída,
podemos vislumbrar a contribuição que as tecnologias digitais criaram para esse
interjogo.
Assim, a partir dessas reflexões sobre os acontecimentos desta história
que relato, o processo de constituição deste AV (MV-CV), penso que podemos
retirar elementos para refletirmos como nossas relações sociais dentro e fora do
ciberespaço têm sido transformadas e transformam nossas formas de ser e estar
no mundo "real".
"O que: aquilo nunca parava,
não tinha começo nem fim?
Não havia tempo decorrido.
Ecomo ajuizado terminar, então? Precisava.
Efiz uma força, comigo, para me soltar do
encantamento.
Não podia, não me conseguia (...).
Entendi. Cada um de nós se esquecera de seu mesmo,
e estávamos transvivendo, sobrecrentes, disto:
que era o verdadeiro viver?
E era bom demais, bonito - o milmaravilhoso -
a gente voava, num amor, nas palavras:
no que se ouvia dos outros e no nosso próprio falar.
,d
PARA QUE CONTAR ESSA HISTÓRIA?
Chegamos então ao final desta história, (será?!?).
E agora, parece-me difícil dar um "ponto final". Mas, afinal, para que
serve o final? Talvez para que tenhamos a chance de recomeçar, renascer,
transformar o que pode ser transformado, enfim, seguir vivendo.
Como Guimarães Rosa, faço força para me soltar deste encantamento
para dar chance a que outros aconteçam.
Este relato não pretendeu ser o único, mas um dentre tantos outros
possíveis, viáveis. Assim como na vida, a multiplicidade de possibilidades tornou
rica essa experiência, mas ao mesmo tempo, tornou difícil fazer escolhas. Difícil
decidir o que deixar "para mais tarde", trilhar por aqui e por ali, compartilhando
idéias de/com pensadores deste e de outros tempos, navegando por entre as
1
ROSA, Guimarães. Grande Sertão Veredas in: n seminário Guimarães Rosa - Vida e
encantamento. Disponível na INTERNET via http://www.guimaraesrosa.pucminas.br/
guimaraesrosa.html Arquivo consultado em 04/06/2001.
ações dos participantes (meus parceiros), enxergando luz onde só parecia ter
vazio...e ainda assim, tentando não deixar o leitor "a ver navios".
Iniciei tecendo uma rede em que a proposta foi pensarmos as relações
sociais condicionando e sendo condicionadas pelo meio, numa definição recíproca.
Assim, penso que não podemos separar as ciências cognitivas das tecnologias
cognitivas.
Foi nesse sentido que o ciberespaço me pareceu ser um vasto campo
virtual para atualizações interessantes em termos de subjetivação e de construção
de conhecimentos intersubjetivos, colocando-nos mais próximos da possibilidade
de experienciar/ vivenciar algo diferenciado em termos de relações sociais e
comunicação.
Desde a construção do Mundo Virtual Cibercidade Sitecria até o
acoplamento MV-CV fui buscando tornar clara a concepção sobre a qual eu navego
e teço quando crio/ conto a história. No processo de encantamento cada um é vivo
e pode agir contribuindo para a invenção da realidade.
Considero que o fazer ciência faz parte de nossa existência, de nosso
domínio do viver. Então como querer que exista apenas A Ciência? Como querer
que exista A Verdade sobre os objetos e sujeitos, sobre o mundo enfim?
Por concordar com teóricos como Piaget, Garcia, Maturana e Varela é
que penso que podemos aprender muito quando resgatamos um "ser criança"
curioso e entusiasmado, contente por buscar o que procura, feliz por estar em um
caminho, em viver aquele momento do caminhar. A epistemologia do
encantamento ajudou-me muito a exercitar essa faceta, o que tornou essa
aventura muito prazeirosa: aceitar que nem tudo fica como planejamos de início e
achar isso muito bom.
Para minha surpresa, o acoplamento MV-participantes trouxe muitos
aspectos interessantes, alguns já esperados, mas grande parte inesperados. A CV
constituiu-se transbordando para além do MV Sitecria, criando um Ambiente
Virtual, um híbrido, misto de humano, técnico. Mais que um híbrido, um artifício,
pois não era algo a ser depurado ou fragmentado, mas observado e respeitado
dentro de sua complexidade. Parece redundante, mas foi encantador observar o
encanto em seus efeitos.
Se foi pela ação dos participantes que tudo aconteceu, fica claro porque
escolhi utilizar-me da enação, entendida como o fazer emergir, o que entra em
cena. A dinâmica foi, aos poucos, entrando em cena e tornando-se mais complexa.
Talvez, para o contador de histórias (e nisso me incluo agora), o difícil seja
encontrar as palavras e as formas de expressar o que sente/vê/pensa, tudo de
uma vez.
Assim, emergiram os indicadores que me ajudaram a explicitar o que eu
relatava. E a cada palavra expressa parecia-me que eu oscilava entre mergulho
total nos registros do encantamento e volta à companhia de pensadores que me
auxiliaram. A cada passo, parecia-me que tudo se "iluminava" ou então que tudo
estava confuso demais.
Os domínios de ação - movimentação, comunicação, reflexão -
emergiram a partir do enfoque que procurei dar, centrando minha atenção na ação
dos participantes. Cada um deles caracterizava uma forma de interação tanto entre
os participantes como com o MV. Mas a questão seguinte era: aonde isso tudo
está ocorrendo?
Com a constatação da extrapolação do MV, não podia fechar os olhos a
outras dimensões além da digital. O AV acabou, então, possibilitando (e/ou sendo
possibilitado) pelas dimensões consensual, digital e conectiva. Esta última mais
impalpável do que a digital, pois fica entre ambas, num espaço que só existe no
momento da ação do participante.
Essa dimensão conectiva tornou-se quase como a questão que se
estabelece entre matéria/energia, da Física
2
3
. No momento em que nos
2
TOBEN, B., WOLF, F.A. Espaço-Tempo e Além. São Paulo: Cultrix, 1982. 150p.
posicionamos em um ponto vemos a partícula e no outro, é onda. No nosso caso,
ora via ações na dimensão digital, ora na dimensão consensual. Por que então,
não me satisfiz em observar apenas essas duas dimensões? Creio que justamente
por ser um desafio apreender o impalpável. Investi no que Ascott nos traz como
dupla consciência, um rematerialismo. Compreendi que em determinados
momentos nós, participantes estávamos nesse "estado/lugar". E isso nos dava um
"poder", ou talvez seja melhor dizer, uma possibilidade de conectarmos com os
dois mundos, coordenarmos duas realidades distintas e nos tornarmos mais
flexíveis e ágeis para lidar com as questões que iam surgindo: as dúvidas dos
projetos de cada um, o gerenciamento dos espaços virtuais, as relações de troca
entre os grupos, etc.
Mas enfim, dentro da perspectiva que adotei para a dinâmica de
constituição da comunidade virtual, senti falta do "motor" ou do "produto" de toda
essa história.
Penso, como Piaget, que cada conhecimento que construímos parte de
uma necessidade biológica/cognitiva/afetiva. Então, a nossa sobrevivência como
viabilidade de nossa existência depende de estarmos constantemente construindo
algum tipo de conhecimento. No nosso caso, observei emergir conhecimentos que
chamei de intersubjetivos, por terem sido construídos pela comunidade, pela
interação colaborativa ou cooperativa.
Mapeei alguns tipos de conhecimentos: pessoal, social convencionado,
técnico, contextual, cotidiano e cooperativo/colaborativo. Esses conhecimentos
entrelaçavam-se entre si, formando uma rede produzida na ação/circulação entre
as dimensões, a cada momento focalizando um ou mais domínios de ação.
Do caminho de inclusão dos conhecimentos foi possível observar o que
já apontei acima com relação à dimensão conectiva. O conhecimento cotidiano
acabou abarcando os demais, como se criasse uma nova cotidianidade, não
3
ASCOTT, R. Turning on Technology .Disponível na INTERNET via
http://www.œoper.edu/art/techno/essays/asœtt.html Arquivo consultado em 25/05/1998.
apenas consensual, nem mesmo apenas digital. Essa cotidianidade virtual aponta
para uma relação dessa comunidade virtual em que as tecnologias digitais e o
contexto virtual foram bem integrados a sua 'Vida normal", como podemos chamar
nossa dimensão consensual concreta, ou nosso "mundo real".
Talvez possamos pensar que nessa dimensão conectiva estamos mais
próximos do que Varela
4
denominou presença plena/consciência aberta. Algo da
ordem da impermanência da existência, marcando uma transformação existencial
dentro da experiência subjetivo/ objetivo.
Disso tudo, o que nos resta? Ou, para que contar essa história?
Penso nas implicações de como se constituiu esse AV para o contexto
educacional, área na qual venho atuando profissionalmente.
Construir conhecimento não precisa ser algo sofrido, pois é no viver que
se constrói. Se as relações humanas podem ser fundadas na emoção do amor
5
,
entendida como aceitação mútua, então, a enação de um AV no qual cada
participante habita o espaço como deseja, interagindo com os demais, sendo
chamado a uma relação de respeito mútuo, além de circular entre dimensões,
pode ser um caminho interessante.
No caso da Educação à Distância - EAD - via Internet é imprescindível
que o professor possa compreender os processos de aprendizagem dos seus
alunos. De que outra forma este profissional poderá desenvolver novas práticas
pedagógicas, utilizando recursos que a tecnologia digital oferece e que podem
ampliar e dar suporte a uma aprendizagem de maior qualidade?
Um dos grandes perigos tem sido reduzir a educação a distância a aulas
com textos para serem lidos e respostas certas a serem dadas para correção do
4
VARELA, et ai. De Cuerpo Presente: las ciências cognitivas y la experiência humana
Barcelona: Gedisa, 1997. 317p.
5
MATURANA, H. Transformation em la Convivência. Santiago: Dolmen Ediciones, 1999. 282p.
professor. Dessa maneira, a tecnologia digital é somente suporte para um ensino
sem mudanças, não abre espaço para a criação do inesperado, do artifício.
Para uma EAD via Internet com qualidade e que realmente faça
diferença, é fundamental a nós, educadores, compreendermos que a mudança não
se dá somente no suporte tecnológico, mas nas próprias práticas pedagógicas, no
currículo, em toda a organização escolar. A competência do professor não é mais
"saber tudo" de determinada matéria, mas saber como criar ambiente propício e
facilitador, sabendo desafiar cada aluno na busca de soluções para suas próprias
questões, autônoma e cooperativamente.
E, pensando para além da educação formal, que implicações poderia
haver? Sei que são somente especulações, mas espero estar contribuindo para que
possamos observar mais atentamente a constituição desse AV, com as dimensões
enatuadas, pois quem sabe, a versão beta de que fala Ascott pode estar mais
próxima de nós do que tenhamos consciência. As conseqüências para nossas
formas de estar no "mundo real", nossa forma de subjetivar podem ser totalmente
diversas.
Mas são apenas elucubrações...quem pode dizer que ainda não caímos
na "toca do coelho", como Alice?
"Era muito agradável em casa, quando eu não vivia crescendo e
diminuindo desse jeito... Quase gostaria de não ter caído naquela
toca do coelho...porém...é bem curioso este tipo de vida. Queria
saber o que foi que aconteceu comigo! Quando eu lia contos de
fada, imaginava que essas coisas nunca aconteciam, e agora estou
no meio de um deles!"
6
6
CARROLL, L. Alice no País das Maravilhas. Porto Alegre: L & PM, 1999. 172p.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASCOTT,R. Cultivando o Hipercórtex. [s.n.], 1996, fotocópia
_______ Turning on Technology .Disponível na INTERNET via
http://www.cooper.edu/art/techno/essays/ascott.html Arquivo consultado
em 25/05/1998.
AXT,M. & MARASCHIN, C. Prática Pedagógica na Indissociabilidade
Conhecimento-Subjetividade. Educação &. Realidade, Porto Alegre, v.22,
n.l, p. 50-80. 1997.
BATESON, G. Pasos hacia uma ecologia de la mente. Buenos Aires: Editora
Planeta, 1991. 318p.
CHRISTLIEB, P. F. La Lógica Epistemica de la Invención de la Realidad In:
MONTEIRO, M. Conocimiento, Realidad e Ideologia. Caracas: AVEPSO.
1994. p. 19-47
FAGUNDES, L. Projeto Educação a Distância em Ciência e Tecnologia -
EducaDi. CNPq. Disponível na INTERNET via http://educadi.psico.ufrgs.br.
Arquivo consultado em 14/03/1997.
__________; SATO, Luciane; MAÇADA, Débora. Aprendizes do Futuro:
as
inovações começaram! Coleção Informática para a mudança na
Educação. Brasília: SEED/MEC/PROINFO. 1999. 95p.
FERNANDES, F.; LUFT,C.P.; GUIMARÃES,F.M. Dicionário Brasileiro Globo.
São Paulo: Globo, 1999.
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126.
ANEXOS
ANEXO I - TABELAS COM DADOS FREQUENCIAIS QUANTITA TIVOS DAS AÇÕES DOS PARTICIPANTES A PARTIR DOS REGISTROS
COLETADOS
DOMÍNIO DE AÇÃO X CONHECIMENTO SUBJETIVO
Dimens
ã
o de Exist
ê
ncia
CONECTIVA
ANEXOU- TABELAS COM DADOS FREQÜENCIAIS QUANTITATIVOS DAS AÇÕES Dos PARTICIPANTES A PARTIR Dos REGISTROS
COLETADOS
DIMENSÃO DE EXISTÊNCIA X DOMÍNIO DE AÇÂO/CONHECIMENTO SUBJETIVO
DIMENSÃO CONSENSUAL DOMÍNIOS DE A ÇÃO X CONHECIMENTOS
ANEXO III-A - GRÁFICO INCLUSIVO GERADO NO CHIC
DIMENSÃO DIGITAL DOMÍNIOS DE AÇÃO X CONHECIMENTOS
ANEXO III-B - GRÁFICO INCLUSIVO GERADO NO CHIC
DIMENSÃO CONECTIVA DOMÍNIOS DE AÇÃO x CONHECIMENTOS
ANEXO III-C - GRÁFICO INCLUSIVO GERADO NO CHIC
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