meu lado, de apertar a tua mão, que nem me lembrava como
te devia parecer ridícula uma mulher que, sem te conhecer,
te permitia tanto.
"Quando nos separamos, arrependi-me do que tinha feito.
"Com que direito ia eu perturbar a tua felicidade, conde-
nar-te a um amor infeliz e obrigar-te a associar tua vida a uma
existência triste, que talvez não te pudesse dar senão os tor-
mentos de seu longo martírio?!
"Eu te amava; mas, já que Deus não me tinha concedido a
graça de ser tua companheira neste mundo, não devia ir rou-
bar ao teu lado e no teu coração o lugar que outra mais feliz,
porém menos dedicada, teria de ocupar.
"Continuei a amar-te, mas impus-me a mim mesma o sa-
crifício de nunca ser amada, por ti.
"Vês, meu amigo, que não era egoísta e preferia a tua à
minha felicidade. Tu farias o mesmo, estou certa.
"Aproveitei o mistério do nosso primeiro encontro e es-
perei que alguns dias te fizessem esquecer essa aventura e
quebrassem o único e bem frágil laço que te prendia a mim.
"Deus não quis que acontecesse assim; vendo-te só em
um baile, tão triste, tão pensativo, procurando um ser invisí-
vel, uma sombra e querendo descobrir os seus vestígios em
algum dos rostos que passavam diante de ti, senti um prazer
imenso.
"Conheci que tu me amavas; e, perdoa, fiquei orgulhosa
dessa paixão ardente, que uma só palavra minha havia criado,
desse poder do meu amor, que, por uma força de atração inex-
plicável, tinha-te ligado à minha sombra.
"Não pude resistir.
"Aproximei-me, disse-te uma palavra sem que tivesses tem-
po de ver-me; foi essa mesma palavra que resume todo o poe-
ma do nosso amor e que, depois do primeiro encontro, era,
como ainda hoje, a minha prece de todas as noites.
"Sempre que me ajoelho diante do meu crucifixo de mar-
fim, depois de minha oração, ainda com os olhos na cruz e o
pensamento em Deus, chamo a tua imagem para pedir-te que
não te esqueças de mim.
"Quando tu te voltaste ao som da minha voz, eu tinha en-
trado no toilette; e pouco depois saí desse baile, onde apenas
acabava de entrar, tremendo da minha imprudência, mas ale-
gre e feliz por te ter visto ainda uma vez.
"Deves agora compreender o que me fizeste sofrer no tea-
tro quando me dirigias aquela acusação tão injusta, no momen-
to mesmo em que a Charton cantava a ária da Traviata.
"Não sei como não me traí naquele momento e não te
disse tudo; o teu futuro, porém, era sagrado para mim, e eu
não devia destruí-lo para satisfação de meu amor próprio ofen-