Inês – Não desejo enviuvar de novo...
Isaías – Vaso ruim não quebra...
Inês – Desengana-se, senhor: não são os seus ditados que me hão de fazer mudar de
resolução! (Passeia.) Oh!
Isaías (Acompanhando-a .) – Talvez façam, talvez!... Devagar se vai ao longe... muito tolo
É quem se cansa... (Inês volta-se param defronte um do outro.) Menina, antes só do que mal
acompanhado... Olhe que o pior cego é aquele que não quer ver...
Inês (À parte.) – Vou pregar-lhe uma peta. (Alto.) Mas se me faltasse esse noivo, outros
rapazes há que me têm feito pé-de-alferes.
Isaías – Águas passadas não movem moinhos!
Inês – E entre eles...
Isaías –O passado! Passado!
Inês – Não me interrompa!.. E entre eles há um ricaço que em outro tempo...
Isaías –O tempo que vai não volta!
Inês – Não me interrompa, já disse! E entre eles há um ricaço que noutro tempo se
esqueceu da promessa...
Isaías – O prometido é devido!
Inês – Ai, mau!... se esqueceu da promessa que me havia feito; mas que está outra vez pelo
beicinho...
Isaías – Cesteiro que faz um cesto faz um cento... (Movimento de Inês. Com força.) Se tiver
verga e tempo! E quem é esse... ricaço?
Inês – É segredo.
Isaías – Segredo em boca de mulher é manteiga em nariz... (A um gesto de Inês.) de
homem! Mas faz bem, faz bem: o segredo é a alma do negócio...
Inês – O senhor tem na cabeça um moinho de adágios! Passa!...
Isaías – O que abunda não prejudica.
Inês – Bem! Para maçadas basta. Mude-se!
Isaías – Os incomodados é que se mudam.
Inês – Mas eu estou em minha casa, senhor!
Isaías – Descobriu mel de pau!
Inês – Irra! Que homem sem-vergonha!
Isaías (Examinando cinicamente a costura.) – Quem não tem vergonha todo o mundo é
seu.
Inês – Se o meu noivo o visse aqui! Ele, que jurou dar cabo do primeiro rival que...
Isaías – Cão que ladra não morde.. E eu sou homem!... tenho força... E contra a força não
há resistência!...
Inês (Irônica.) – Ora, por quem é, não faça mal ao pobre moço, sim?
Isaías – Faço!... Quem o seu inimigo poupa às mãos lhe morre. Julga que não estou falando
sério? Uma coisa é ver a outra...
Inês (No mesmo.) – Ora não faça tal.
Isaías – Faço! Isto tão certo como dois e três serem cinco. São favas contadas. Quem não
quiser ser lobo não lhe vista a pele!
Inês – Ma sabe que ele é valente?
Isaías – Também eu sou! Cá e lá más fadas há! Duro com duro não faz bom muro, e dois
bicudos não se beijam!
Inês – Ponha-se ao fresco, preciso sair; tenho que fazer lá fora.
Isaías – E eu tenho que fazer cá dentro. Um dia bom mete-se em casa. (Pausa.) Olhe,
senhora, olhe bem para mim acha-me feio; não acha?
Inês – Ai, ai, ai!...
Isaías – Eu também acho, e feliz é o doente que se conhece. Mas muitas vezes as
aparências enganam e o hábito não faz o monge. Experimente e verá. (Suplicante.) Case comigo.
Inês – Gentes!
Isaías – Ah! Se fôssemos casadinhos, outro galo cantaria! Por exemplo: em vez de sair
agora à rua, com este sol de matar passarinho, mandava-me a mim, ao seu maridinho...
Inês (Arremedando-o .) – Ao seu maridinho... (À parte.) Oh! Que idéia! Vou me ver livre
dele. (Alto.) Então, sem sermos casados, não pode prestar-me um pequeno serviço?